Acessibilidade / Reportar erro

Estudo do leite de éguas sadias ou portadoras de mastite subclínica, pelo teste de Whiteside, análise microbiológica e contagem de células somáticas

Study of the milk in healthy mares or mares with subclinics mastitis using Whiteside test, microbiological culture and somatic cell count

Resumos

Com o objetivo de identificar a microbiota existente no leite de éguas normais ou portadoras de mastite subclínica, coletaram-se amostras (10 a 15 ml) de leite de 38 animais, que foram examinadas pelo teste de Whiteside, após a homogeneização das amostras dos dois tetos de cada animal. Os resultados foram negativos. Os exames microbiológicos realizados em meios de ágar sangue bovino 10% e ágar MacConkey revelaram presença de bactérias do gênero Staphylococcus spp. e Streptococcus spp. A contagem de células somáticas de amostras individuais de cada teto revelou números superiores a 500.000 células/ml de leite em somente 9,3% das 73 amostras de leite examinadas. Os resultados sugerem a realização de novos estudos objetivando-se a padronização do número de células somáticas no leite de éguas.

Leite de égua; Análise microbiológica; Contagem células somáticas


To identify the bacterial population in the milk of healthy mares and with subclinical mastitis, samples (10 to 15 ml) of 38 animals were collected, homogenized and examined using the Whiteside test. The results were negative. The microbiological culture was carried out in 10% agar bovine serum and in agar MacConkey. Both exams revealed the presence of Staphylococcus spp. and Streptococcus spp., predominantly. The somatic cell counts (SCC) was performed in individual samples of each teat and showed a number higher than 500,000 cels/ml of milk in only 9.3% of the 73 samples examined. These results obtained suggest that new researches should be done aiming the standardization of the somatic cell in equine milk.

Mare milk; Microbiological analysis; Somatic cell counts


Estudo do leite de éguas sadias ou portadoras de mastite subclínica, pelo teste de Whiteside, análise microbiológica e contagem de células somáticas* * Apoio: FAPESP. 1 Departamento de Reprodução Animal e Radiologia Veterinária da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP 2 Departamento de Higiene Veterinária e Saúde Pública da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP 3 Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Botucatu – SP

Study of the milk in healthy mares or mares with subclinics mastitis using Whiteside test, microbiological culture and somatic cell count

Nereu Carlos PRESTES1 * Apoio: FAPESP. 1 Departamento de Reprodução Animal e Radiologia Veterinária da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP 2 Departamento de Higiene Veterinária e Saúde Pública da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP 3 Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Botucatu – SP ; Hélio LANGONI2 * Apoio: FAPESP. 1 Departamento de Reprodução Animal e Radiologia Veterinária da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP 2 Departamento de Higiene Veterinária e Saúde Pública da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP 3 Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Botucatu – SP ; Luiz Augusto Vieira CORDEIRO3 * Apoio: FAPESP. 1 Departamento de Reprodução Animal e Radiologia Veterinária da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP 2 Departamento de Higiene Veterinária e Saúde Pública da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP 3 Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Botucatu – SP

CORRESPONDÊNCIA PARA:

Nereu Carlos Prestes

Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária

Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP

Distrito de Rubião Júnior

18618-000 – Botucatu – SP

e-mail: nereu@fmvz.unesp.br

RESUMO

Com o objetivo de identificar a microbiota existente no leite de éguas normais ou portadoras de mastite subclínica, coletaram-se amostras (10 a 15 ml) de leite de 38 animais, que foram examinadas pelo teste de Whiteside, após a homogeneização das amostras dos dois tetos de cada animal. Os resultados foram negativos. Os exames microbiológicos realizados em meios de ágar sangue bovino 10% e ágar MacConkey revelaram presença de bactérias do gênero Staphylococcus spp. e Streptococcus spp. A contagem de células somáticas de amostras individuais de cada teto revelou números superiores a 500.000 células/ml de leite em somente 9,3% das 73 amostras de leite examinadas. Os resultados sugerem a realização de novos estudos objetivando-se a padronização do número de células somáticas no leite de éguas.

UNITERMOS: Leite de égua; Análise microbiológica; Contagem células somáticas.

INTRODUÇÃO

No Ocidente, o leite eqüino geralmente não é utilizado para consumo humano, porém em países como a Alemanha e França é usado em hospitais na alimentação de crianças nascidas de parto prematuro. Dentre os mamíferos, o leite de éguas é o que apresenta maior semelhança com o leite da mulher, no tipo de amamentação contínua com intervalos curtos em virtude de sua maior digestibilidade, no baixo teor protéico, predominando albumina, no alto teor de lactose e no equilíbrio albumina-globulina6.

A égua, em geral, é simplesmente requerida para suprir a quota de leite necessária ao potro, e sendo a única fonte de nutrição nas suas primeiras semanas de vida, é de extrema importância para este1.

A ocorrência de mastites em éguas é considerada baixa quando comparada a vacas. Ocorre em fêmeas secas e lactantes, e a sua incidência é maior no período seco ou seguinte a uma injúria dos tetos, durante a lactação. Os microrganismos mais comumente isolados do leite e de secreções de glândulas mamárias de vacas são os Streptococcus beta-hemolíticos e Staphylococcus spp.1. Na suspeita de mastite, é fundamental que se proceda ao cultivo bacteriano4.

Welsh12 relatou um caso envolvendo duas éguas que estavam no quarto mês de lactação, e que apresentavam exsudato purulento em ambas as glândulas mamárias, cuja citologia evidenciava grande quantidade de neutrófilos, com o isolamento de Streptococcus zooepidemicus em cultura pura.

Em estudo realizado no período de 1985 a 1988, com 33 éguas de várias raças, com diferentes idades entre 4 e 14 anos, com mastite aguda, foram isolados os seguintes microrganismos: 36 Streptococcus spp., destes 25 beta-hemolíticos, Staphylococcus aureus (9), Coliformes (6), Escherichia coli (3), Klebsiella spp. (2) e representantes da família Neisseriaceae (3). O exame das amostras de leite obtidas em 31 éguas saudáveis durante os primeiros 7 dias após a parição mostraram que 13 (41,9%) delas apresentavam mastite e de 21,0% foram isoladas bactérias contaminantes, sendo que o Streptococcus spp. apresentou maior prevalência2.

McCue; Wilson5, em revisão de 28 casos de mastite clínica em éguas, encontraram maior prevalência de Streptococcus spp. (36,8%), seguido por Staphylococcus spp. e Actinobacillus suis (10,5%).

A contagem de células somáticas (CCS), incluindo leucócitos, macrófagos, linfócitos e células epiteliais se constitui em método seguro para o diagnóstico das mastites9. Durante o período neonatal, a contagem de células somáticas na secreção mamária eqüina é menor que 0,36 x 10/ml. Para Kehrli; Shustar3, as células somáticas do leite desempenham um papel de proteção contra doenças da glândula mamária bovina por sua atividade fagocitária.

Levando-se em consideração a importância das mastites para a espécie eqüina e a escassez de literatura sobre o tema, o presente trabalho teve por objetivo estudar os aspectos citológicos e microbiológicos do leite de éguas normais ou portadoras de mastite subclínica e verificar se o potro apresentava distúrbio digestivo pela ingestão de leite contendo bactérias.

MATERIAL E MÉTODO

Foram utilizadas 38 éguas adultas de diferentes raças. As amostras em volume de 10 a 15 ml foram colhidas individualmente de cada teto, após higienização do úbere com água e sabão, secagem com papel toalha e desinfecção com algodão embebido com álcool 70%. Após desprezar os primeiros jatos de leite, colheu-se a amostra, em frascos estéreis, identificados com os dados de cada animal, fechados imediatamente e acondicionados em caixa de isopor com gelo reciclável e transportados para o laboratório.

Inicialmente procedeu-se ao exame microbiológico, semeando-se 0,1 ml de leite da amostra dos dois tetos, homogeneizada, em meio de ágar sangue bovino 10% e ágar MacConkey, observando-se o desenvolvimento bacteriano após 24, 48 e 72 horas de incubação a 37ºC, estudando-se, morfologicamente, as colônias isoladas pelo método de Gram, e repicando-se para meio de caldo cérebro-coração para obtenção de mênstruo bacteriano para a realização de provas taxonômicas.

A prova de Whiteside modificada11 foi realizada utilizando-se 5 gotas de leite e 1 gota de hidróxido de sódio a 4%, homogeneizando-se por 20 segundos com bastão de vidro, procurando-se verificar a formação de grumos ou gelificação.

Para contagem de células somáticas, procedeu-se ao método de Prescott; Breed7, utilizando-se 0,01 ml de leite distribuídos em 100 mm2 sobre lâmina de vidro desengordurada. Após a confecção do filme de leite, as lâminas eram mantidas em estufa a 37ºC por 24 horas em superfície plana, para desidratação e fixação. Posteriormente, foram coradas pela técnica de Broadhurst-Palley, modificada por Santos; Vilela10. A contagem das células mononucleares (MN) e de polimorfonucleadas (PMN) foi realizada em microscopia óptica utilizando-se objetiva de imersão, contando-se 100 campos, e o resultado obtido foi multiplicado pelo fator de trabalho do microscópio, determinando-se assim o número de células por ml de leite. Dos potros coletou-se o histórico da ocorrência ou não de diarréia.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Das 38 amostras de leite examinadas, 11 (28,9%) não apresentaram desenvolvimento microbiano, sendo que das 27 restantes, obtiveram-se 51 isolamentos identificados e distribuídos da seguinte forma: 17 (33,3%) como Staphylococcus spp.; 15 (29,4%) Streptococcus spp.; 10 (19,6%) Corynebacterium spp.; 5 (9,8%) Bacillus spp. e 4 (7,9%) como Pasteurella spp., Candida spp., Enterobacter cloacae e Shigella spp. Estes resultados, inclusive com sua associação, podem ser apreciados na Tab. 1, que mostra ainda a idade do potro no momento da colheita da amostra de leite, bem como sua situação, ou seja, se apresentava diarréia ou não. Pode ser observada a presença de diarréia nos potros quando as éguas mães apresentam o primeiro cio pós-parto. Ressalta-se que nem todos os microrganismos foram classificados taxonomicamente. A apresentação na Tab. 1 foi mantida de acordo com os isolamentos obtidos individualmente e não agrupados por espécies.

Tabela 1

Embora – não se tenha a classificação das espécies bacterianas de todos os gêneros isolados, verificou-se a importância do Staphylococcus spp. e do Streptococcus spp., que foram os mais freqüentemente isolados (33,3% e 29,4%, respectivamente), o que coincide em parte com outros autores, diferindo, entretanto, a importância entre os dois gêneros, pois para Bostedt et al.2, o Streptococcus spp. foi o mais prevalente nos casos de mastite aguda. Resultados semelhantes foram obtidos por McCue; Wilson5, com o isolamento em 36,8% das amostras estudadas.

Não foi possível estabelecer correlação entre a ingestão de leite pelos potros e a ocorrência de diarréia, mesmo naqueles casos onde se isolou Shigella spp., bactéria considerada como agente oportunista, causadora de gastrenterites em diferentes espécies animais e seres humanos8. Tal fato pode ser explicado como decorrente da baixa concentração do agente no leite, associado à higidez orgânica dos potros, possibilitando resistência à infecção.

Os resultados dos estudos citológicos das amostras de leite dos tetos direito (D) e esquerdo (E) de cada égua podem ser apreciados na Tab. 2. Para o leite bovino, admite-se como normal contagens celulares até 500.000/ml de leite, sendo que contagens superiores classificam mastite subclínica nesta espécie3. Embora não exista padronização para a espécie eqüina, pôde-se verificar que das 73 amostras de leite examinadas três éguas apresentavam um dos tetos sem produção láctea e somente 7 (9,6%) ultrapassaram o limite de 500.000 céls./ml. Os exames de Whiteside foram todos negativos, cujos resultados correlacionados com a contagem de células somáticas no leite permitiram constatar que o número de células somáticas para leite da espécie eqüina é menor do que aquele descrito para a espécie bovina.

Tabela 2

Concluindo, os resultados mostraram que na microbiota láctea de éguas havia predominância de Staphylococcus spp. e Streptococcus spp., entre outros microrganismos, que em alguns animais foram obtidos em isolamento puro e em associação com outros agentes bacterianos. A microbiota identificada, os resultados negativos de provas de Whiteside e as baixas contagens de células somáticas em mais de 90% das amostras devem trazer reflexão para a relevância de pesquisas estabelecendo padrões para contagem de células somáticas como indicativos de infecção intramamária na espécie eqüina.

SUMMARY

To identify the bacterial population in the milk of healthy mares and with subclinical mastitis, samples (10 to 15 ml) of 38 animals were collected, homogenized and examined using the Whiteside test. The results were negative. The microbiological culture was carried out in 10% agar bovine serum and in agar MacConkey. Both exams revealed the presence of Staphylococcus spp. and Streptococcus spp., predominantly. The somatic cell counts (SCC) was performed in individual samples of each teat and showed a number higher than 500,000 cels/ml of milk in only 9.3% of the 73 samples examined. These results obtained suggest that new researches should be done aiming the standardization of the somatic cell in equine milk.

UNITERMS: Mare milk; Microbiological analysis; Somatic cell counts.

Recebido para publicação: 16/10/1997

Aprovado para publicação: 26/11/1998

  • 1
    - BLOOD, D.C.; RADOSTITIS, O.M.; HENDERSON, J.A. Clínica veterinária, Rio de Janeiro : Guanabara Koogan, 1989. p.1260.
  • 2
    - BOSTEDT, H.; LEHMANN, B.; PEIP, D. Mastitis in mares. Tierarztliche Praxis v.16, n.4, p.367-71, 1988.
  • 3
    - KEHRLI Jr., M.E.; SHUSTAR, D.E. Factor affecting milk somatic cells and their role in health of the bovine mammary gland. Journal of Dairy Science, v.77, n.2, p.619-27, 1994.
  • 4
    - KOTERBA, A.M.; DRUMOND, W.H.; KOSCH, P.C. Equine clinical neonatology, USA : Lea & Febiger, 1990. 844p.
  • 5
    - McCUE, P.M.; WILSON, W.D. Equine mastitis – a review of 28 cases. Equine Veterinary Journal, v.21, n.5, p.351-3, 1989.
  • 6
    - MORAIS, M.T.; SIMONE, E.M.; ROMANO, L.A. Estudo da composição do leite de égua e comparação com o leite da mulher. A Hora Veterinária, ano 16, n.25, p.37-43, 1997.
  • 7
    - PRESCOTT, S.C.; BREED, R.S. The determination of the number of body cells in milk by a direct method. Journal of Infections Disease, v.7, p.632, 1910.
  • 8
    - QUIN, P.J.; CARTER, M.F.; MARKEY, B.K.; CARTER, G.R. Clinical veterinary microbiology, Spain : Wolfe, 1994. 648p.
  • 9
    - ROSSI, R. Mastitis: prevention and diagnosis. Somatic cells as important indicator. Professione Allevatore, v.20, p.26-9, 1993.
  • 10
    - SANTOS, E.C.; VILELA, M.A.P. Pesquisa de células somáticas no leite cru como critério de avaliação da qualidade. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.3, p.907-19, 1983.
  • 11
    - SILVA FILHO, F.S.; PORTO, E. Valor da prova de Whiteside modificada, na descoberta da mastite bovina crônica. 1. Reação de Whiteside e conteúdo leucocitário. Boletim da Indústria Animal, v.22, p.171-80, 1964.
  • 12
    - WELSH, R.D. The significate of Streptococcus zooepidemicus in the horse. Equine Practice, v.6, n.9, p.6-16, 1984.
  • *
    Apoio: FAPESP.
    1 Departamento de Reprodução Animal e Radiologia Veterinária da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP
    2 Departamento de Higiene Veterinária e Saúde Pública da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Campus de Botucatu – SP
    3 Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP, Botucatu – SP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Set 2000
    • Data do Fascículo
      1999

    Histórico

    • Aceito
      26 Nov 1998
    • Recebido
      16 Out 1997
    Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia / Universidade de São Paulo Av. Prof. Dr. Orlando Marques de Paiva, 87, Cidade Universitária Armando de Salles Oliveira, 05508-270 São Paulo SP Brazil, Tel.: +55 11 3091-7636, Fax: +55 11 3031-3074 / 3091-7672 / 3091-7678 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: brazvet@edu.usp.br