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A noção de documento no espaço-tempo da Ciência da Informação: críticas e pragmáticas de um conceito

The ‘document’ in InformationSciencespace-time: critical and pragmatic reflections of a concept

Resumo

Diante da crescente discussão internacional sobre uma possível neodocumentação, em oposição a uma menor disseminação da abordagem clássica da Documentação, torna-se necessário tratar da relação entre as duas abordagens para uma compreensão da noção de documento em Ciência da Informação, bem como reconhecer a vigência de outras tradições de apropriação do conceito no campo informacional. Objetiva-se discutir a literatura sobre ‘documento’, partindo do olhar francófono (Bélgica e França, precisamente), no sentido de objeto material e simbólico, produto da prática documentária. Além disso, procura-se estabelecer relações entre esta conceituação e aquela da literatura de orientação anglo-americana denominada genericamente 'neodocumentação'. O percurso da reflexão, fruto de uma abordagem teórico-conceitual, sob uma via epistemológico-histórica e pragmática, discute a) a noção de documento proposta por Paul Otlet no início do século XX, em seguida desenvolvida por franceses, b) a produção anglófona que, em especial, a partir da década de 1990, toma por base ideias de Paul Otlet e Suzanne Briet para desenvolver suas argumentações, c) o ponto de vista de outras culturas de apropriação do conceito, como a espanhola, a italiana e a brasileira. Como apontamos conclusivos, observa-se que a construção histórica da noção de documento aponta que o mesmo é produto de ações de mediação, as quais se realizam por atividades como seleção, representação, ordenação, exposições, enquanto, sob outro ponto de vista, a abordagem dos neodocumentalistas privilegia o documento quanto às relações de poder que envolvem enquanto objeto produzido pelo homem, portanto, relações localizadas histórica, social e politicamente.

Palavras-Chave:
Documento; Documentação; Neodocumentação; História da Ciência da Informação; Epistemologia da Ciência da Informação

Abstract

The growing discussion about a possible neodocumentation and the less dissemination of the classical type of documentation makes it necessary to deal with the relationship between the two approaches to an understanding of the notion of document in Information Science. We aim to discuss the literature on 'document', starting from the French-speaking gaze (Belgium and France, precisely), in the sense of a material and symbolic object, product of documentary practice. It seeks to establish relations between this conceptualization and that of the literature of Anglo-American orientation denominated generically 'neodocumentation'. The course of reflection, a theoretical-conceptual approach, under an epistemological-historical and pragmatic approach, discusses a) the notion of document proposed by Paul Otlet at the beginning of the 20th century, then developed by the French, b) Anglophone production which, in particular, from the 1990s, builds on Paul Otlet and Suzanne Briet's ideas to develop their arguments, and c) the view of other cultures of appropriation of the concept, such as Spanish, Italian and Brazilian cultures. As we have pointed out, the historical construction of the notion of document indicates that it is the product of mediation actions, which are carried out through activities such as selection, representation, ordination, expositions, while, from another point of view, the approach of the neodocumentalists privileges the document regarding the relations of power that they involve as object produced by the man, therefore, relationships located historically, socially and politically.

Keywords:
Document; Documentation; Neodocumentation; Information Science History; Information Science Epistemology

1 Introdução

Entre a teoria e a metodologia, entre a definição e a sua aplicação, a noção de documento representa um conceito central no campo da Ciência da Informação (CI). Se a corrida epistemológica pós-anos 1960, de fundo estadunidense, buscou pela teorização da noção de informação, esse movimento político-ideológico não anulou, nem ocultou o desenvolvimento da amplitude conceitual do documento desenvolvida desde o início do século XX. Em diferentes tradições, o documento (construção da realidade mediada por artefatos) permaneceu no cenário da afirmação epistemológica do campo.

Trilhar os percursos de compreensão da noção de documento requer, portanto, um olhar que reconheça a concorrência pela centralidade e pela prioridade dos discursos constituídos no campo. Entretanto, reconhecendo o(s) lugar(es) do documento na construção da cientificidade da Ciência da Informação, uma pragmática do conceito, pela via de Wittgenstein (1979WITTGENSTEIN, L. Investigações filosóficas. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979.), torna-se fundamental: compreender os usos da noção de documento, de Paul Otlet aos trabalhos contemporâneos, permite perceber os significados múltiplos, que conduzem à crítica e à criatividade potenciais presentes na noção. Uma epistemologia histórica, atenta às dinâmicas de uso do conceito, ou seja, da operacionalização da noção de documento como conceituação em Ciência da Informação, permite adentrar o universo das apropriações e das transfigurações do termo em teorias, métodos, processos, técnicas e produtos. Podemos, assim, falar em uma imaginação conceitual, ou seja, o conjunto de potencialidades criativas oriundas do termo, como decorrência do seu uso intenso e, ao mesmo tempo, distinto na literatura do campo.

Do ponto de vista das “pragmáticas”, trata-se de revisar os usos da construção do conceito em seu espaço-tempo. Estritamente aqui, em diálogo com a filosofia pragmatista da linguagem aplicada à reflexão epistemológico-histórica do campo, trata-se de compreender como um dado termo é significado a partir de cada comunidade e de cada autoria em seu contexto de fala. Atenta-se aqui para o modo como cada voz coloca em questão a noção de documento em suas tradições de “uso” (conceito central da filosofia pragmatista), pois é a racionalidade que confere, junto à morfologia e à semântica, os significados do termo.

Considerando, por exemplo, a crescente discussão sobre uma possível neodocumentação, a qual apresenta enfoques com diferentes níveis de historicização, e a abordagem clássica da Documentação, de menor disseminação e reconhecimento, faz-se necessário tratar da relação entre as duas abordagens para uma compreensão da noção de documento em Ciência da Informação.

Se, em um período de ampla produção e propagação do discurso anglo-americano sobre o conceito de informação, verificou-se uma corrida pela tentativa de definir tal termo (que se desdobrou em mutações não apenas epistemológicas, como também político-institucionais, como a alteração de nomenclaturas de departamentos, escolas, institutos, disciplinas, eventos, grupos de trabalho e de pesquisa), por outro lado, o conceito de documento permaneceu com uma das centralidades da discursividade epistemológica do campo, principalmente no contexto francófono.

A partir da geração que sucede o pensamento construído por Paul Otlet, recolocado por Suzanne Briet, a noção de documento na França, nos anos 1960, exerceu, com Robert Escarpit, Jean Meyriat e Robert Estivals, um papel semelhante ao conceito de informação anglo-americano (ainda que em hipótese alguma idêntico), repercutindo epistemológica e politicamente no âmbito do ensino, da pesquisa e da atuação profissional. Em outros termos, enquanto o documento em sua pragmática na França ganhou lugar em diferentes contextos de produção de significados, passando do escopo pedagógico ao profissional, no contexto anglo-americano, o conceito de informação se emancipava.

Por sua vez, a partir dos anos 1990, desenvolve-se, na produção informacional anglófona, um olhar sobre a corrente francófona clássica (otlet-brietiana), em que o documento passa a ser discutido fora do contexto das aplicações para acesso à informação. Atores teóricos como o australiano Boyd Rayward, o alemão Bernd Frohmann, o britânico Michael Buckland e o estadunidense Ronald Day, junto do norueguês Niels Lund, são responsáveis por essa abordagem histórico-crítica na produção anglófona, que coloca em suspeição a noção de informação construída na perspectiva de sua subjetivação excessiva e da ausência de um plano histórico e social e sua condição política.

No encalço desse cenário, fruto de uma reflexão epistemológico-histórica realizada desde o início do século XX, interessada no processo de construção dos conceitos nucleares da Ciência da Informação nos contextos nacional e internacional, o objetivo deste trabalho é, partindo da tradição histórica de produção da noção de documento, avançar para outros apontamentos comparados, demonstrando a vitalidade do conceito para o campo. Assim, o que o presente percurso se propõe, no plano internacional, é colocar em debate a produção da atual corrente neodocumentalista, se a mesma puder ser assim chamada, frente à construção histórica do conceito de documento, de cunho francófono, fundado no seio da proposta da Documentação (SALDANHA, 2012SALDANHA, G. S. Uma filosofia da Ciência da Informação: organização dos saberes, linguagem e transgramáticas. 438f. 2012.Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola de Comunicação, Rio de Janeiro, 2012.; 2013). Tecemos igualmente a problematização de outras abordagens a partir de diferentes possibilidades de recepção do pensamento estrangeiro sobre o documento em nosso campo no Brasil, percebendo a imaginação conceitual que emana dessa experiência.

O percurso de discussão conceitual apresentado no estudo não tem interesse em defender uma ou outra abordagem, nem se posicionar perante as tradições recentes da anglofonia informacional aqui também explorada. Não é foco do trabalho, do mesmo modo, reconhecer uma possível unidade na abordagem de uma neodocumentação, nem tratar tal abordagem como fruto de um posicionamento epistemológico claro. Nesse último caso, é fundamental reconhecer que os discursos de autores como Buckland e Frohmann são distintos entre si, no que se refere à existência ou não de uma neodocumentação e ao reconhecimento do papel histórico de Otlet e de Briet.

Retomando, no plano epistemológico-histórico sob o qual se posiciona a presente reflexão, o foco está em compreender o conceito de documento em suas (re)elaborações no cenário francófono e no contexto recente anglo-americano, reconhecendo seu potencial teórico e político para a consolidação do que hoje, em geral, se estabelece no plano mundial como campo, sob as denominações, em língua inglesa, Information Science e Library and Information Science, e no Brasil, Ciência da Informação.

2 O documento segundo Otlet e seus desenvolvimentos

A noção de documento em Otlet ganha complexidade não apenas pelo fato de alteração do significante, mas por estabelecer relações pontuais ao longo do Traité de Documentation, de 1934 (OTLET, 1934OTLET, P. Traité de documentation: le livre sur le livre: théorie et pratique. Bruxelles: Mundaneum, 1934. Disponível em: <Disponível em: http://lib.ugent.be/fulltxt/handle/1854/5612/Traite_de_documentation_ocr.pdf >. Acesso em: 20 jul. 2017.
http://lib.ugent.be/fulltxt/handle/1854/...
), com a noção de livro, cujo estudo permite explorar uma interpretação coerente de documento. Esse percurso demarca a impossibilidade de construção da noção de documento sem a intrínseca relação filosófica e epistemológica com as noções de livre, Livre, biblion, document e gramme que ele cita (OTLET, 1934, p. 9).

O percurso realizado por Otlet no Traité nos permite inferir que, para ele, todo e qualquer objeto pode ser abordado como documento - e, ao mesmo tempo, todos se relacionam em um contexto enciclopédico e sistemático dentro do Livre (em maiúscula). A ideia é tomada como revolucionária por ampliar no plano conceitualos estudos bibliológicos, a prática bibliográfica e os fazeres e normas praticados em bibliotecas, todos pautados essencialmente no livro e demais escritos- mesmo tendo as bibliotecas nacionais, até ali, uma experiência complexa de acúmulo material: a cultura institucional ali experenciada até o contexto de Otlet (e mesmo nos dias atuais) sempre se apropriou de uma gama de artefatos de naturezas extremamente distintas, indo de cartas a objetos tridimensionais, passando por mapas e gravuras. Não como fator ocasional, os projetos de internacionalismo, via as trocas documentárias do Instituto Internacional de Bibliografia, possuíam como principais parceiros no mundo tais instituições, a saber, as bibliotecas nacionais, como o caso brasileiro (JUVÊNCIO, 2016).

A atualidade do pensamento de Otlet pode ser atestada na perspectiva científica expressa por ele, no Traité, quanto à necessidade de consistência terminológica aos estudos bibliológicos, a partir de um conjunto de termos técnicos que fixe o sentido especializado fornecendo adequação e regularidade ao campo, como trataram Sagredo Fernández e Izquierdo Arroyo (1982, p. 163). Segundo estes autores, Otlet já vinha discorrendo sobre o objeto livro apontando para o conceito de documento em material com fins didáticos produzido em parceria com Wouters (OTLET; WOUTERS, 1922OTLET, P.; WOUTERS, L. Résumé du cours préparatoire aux examens du bibliothécaire. Syllabusducours de l'Ecole Centrale de Service Social. Bruxelles: IIB; Union de Villes et ComunesBelges, 1922.) - depois impresso várias vezes sob o título Manuel de Bibliothèque Publique (OTLET; WOUTERS, 1930) -, mas tratou o tema de modo expresso no Traité (OTLET, 1934). A despeito de apoiar-se na Bibliologia, tratada por Gabriel Peignot no início do século XIX, há certa unanimidade quanto ao pioneirismo de Otlet para uma conceituação de documento.

Quanto à Documentação, Otlet apontou a relação entre Informação e Comunicação (OTLET, 1934OTLET, P. Traité de documentation: le livre sur le livre: théorie et pratique. Bruxelles: Mundaneum, 1934. Disponível em: <Disponível em: http://lib.ugent.be/fulltxt/handle/1854/5612/Traite_de_documentation_ocr.pdf >. Acesso em: 20 jul. 2017.
http://lib.ugent.be/fulltxt/handle/1854/...
, p. 217, seção 243, parte c), mas a ideia foi propriamente desenvolvida por seus predecessores franceses quando este campo ganhou agenda própria.

Suzanne Briet, importante intérprete da obra de Otlet e principal teórica de aprofundamento dos conceitos otletianos após a morte do advogado belga, recoloca muitos dos princípios estabelecidos por ele, em especial por meio da obra clássica Qu’est-ce que la documentation?, publicada em 1951 (BRIET, 1951BRIET, S. Qu’est-ce que la documentation? Paris: Édit - Éditions Documentaires Industriales et Techniques, 1951. 48 p. Disponível em: <Disponível em: http://martinetl.free.fr/suzannebriet/questcequeladocumentation/briet.pdf >. Acesso em: 20 jul. 2017.
http://martinetl.free.fr/suzannebriet/qu...
)1 1 Tradução para a língua portuguesa publicada em versão eletrônica em 2017 pela Editora Briquet de Lemos. . A bibliotecária trouxe maior precisão à ideia de que todo objeto pode ser um documento ao condicionar a este objeto a atribuição de um indício, conservado ou registrado, com a finalidade de representar, reconstituir ou provar um fenômeno físico ou intelectual.

Briet exemplificou a ideia com a foto de uma estrela e o antílope em um museu cujas informações constam em verbete de enciclopédia, em oposição à estrela e ao antílope eles mesmos. Os exemplos apontam, menos para a imagem de um objeto ou as informações escritas a respeito dele, e antes para o lugar simbólico em que o objeto é colocado, seja a estrela ou sua foto, seja o antílope vivo, empalhado ou descrito. Daí resulta, muito provavelmente, a proposta e a disseminação dos termos - tão caros ao campo - ‘documento original’ e ‘documento secundário’, este produzido a partir daquele com fins comunicacionais.

Após uma lacuna correspondente ao período da Segunda Guerra Mundial, abordagem infocomunicacional ganhou adeptos em movimento iniciado nos anos 1960, conhecido ainda hoje, no plano político-institucional, como Sciences de l’Information et de la Communication, incluindo estudos sobre Documentação e a noção epistemológica de Bibliologia, e formado por pesquisadores como Roland Barthes, Robert Escarpit, Jean Meyriat e Robert Estivals, entre outros.

Para Meyriat (1981MEYRIAT, J. Document, documentation, documentologie. Schéma et Schématisation, Paris, 2º trimestre, n. 14, p. 51-63, 1981., p. 51-52)2 2 Texto traduzido para a língua portuguesa e publicado na Revista Perspectivas em Ciência da Informação, v. 21, n. 3, p. 240-253, jul./set. 2016. , a definição de documento opera por meio de duas noções conjuntas e inseparáveis uma da outra: uma de natureza material (o objeto que serve de suporte), e outra conceitual (o conteúdo da comunicação, ou seja, a informação). Por este raciocínio é que o autor discorre sobre duas categorias de documentos, as quais não têm relação com os objetos em si, mas com sua condição informacional, que é sempre situacional, temporal. Ele fala em objetos produzidos com intenção de funcionarem como documentos, reconhecendo o papel privilegiado dos escritos como ‘documentos por intenção’, e objetos que receberam esta atribuição posteriormente, como a bicicleta que funciona como meio de transporte, e as vestimentas dos camponeses do século XVII que tinham a função de roupa para proteção de seus corpos.

Meyriat (1981MEYRIAT, J. Document, documentation, documentologie. Schéma et Schématisation, Paris, 2º trimestre, n. 14, p. 51-63, 1981., p. 54) afirma que o documento é produto de uma vontade - a de informar ou a de se informar -, sendo a segunda sempre necessária. Isto porque, segundo ele, se o desejo de fornecer informações não encontrar uma resposta no receptor, a informação permanece virtual, e o objeto em questão ainda não é um documento. O artigo deixa como marca a afirmação do autor de que o usuário faz o documento.

Anos depois, Meyriat (2006MEYRIAT, J. Pour une compréhension plurisystémique du document (par intention). Sciences de la Societé, Toulouse, n. 68, p. 11-28, 2006. (Dossier Dimensions sociales du document).) retoma a noção de documento e esclarece que a prática documentária resulta em documentos (quando há vontade de informar), ou seja, os documentos existem de algum modo antes mesmo que os usuários os tomem como tal (caso da vontade de se informar). Segundo o autor, o documento por intenção é aquele especialmente produzido para veicular a informação, de tal modo que, se o autor produz um livro ou um artigo, o documentalista legitima este livro ou artigo como documento, inserindo-o em processos de circulação, por meio de atividades que se articulam às de outros grupos, como editores e livreiros (MEYRIAT, 2006MEYRIAT, J. Pour une compréhension plurisystémique du document (par intention). Sciences de la Societé, Toulouse, n. 68, p. 11-28, 2006. (Dossier Dimensions sociales du document)., p. 12).

Contemporâneo de Jean Meyriat, Robert Estivals estabelece diálogos com o interlocutor do contexto de fundação-formalização das Sciences de l’Information et Communication na França, demarcando papel epistemológico-histórico do conceito de Bibliologia (buscando seguir os passos de Gabriel Peignot e Paul Otlet). Estivals (1981) estabelece uma teoria do documento a partir do circuito da escrita, sob a corrente sociológica marxista.

Tais teorizações estivalsianas são demarcadas, centralmente, no calor epistemológico-histórico dos anos 1970, um período não só de consolidação político-institucional da Ciência da Informação na França, mas, ao mesmo tempo, de expansão da citada corrida pela formalização do conceito de informação na tradição estadunidense que se espalhava pelo mundo (repercutindo, por exemplo, no Brasil, com a fundação do primeiro programa de pós-graduação stricto sensu em Ciência da Informação, do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia - IBICT, diretamente influenciado pela normatividade do termo information).

Duas correntes são mapeadas por Estivals (1981ESTIVALS, R. A dialética contraditória e complementar do escrito e do documento. R. Esc. Bibliotecon. UFMG, Belo Horizonte, v. 10, n. 2, p. 121-152, set. 1981.) ali: de um lado a construção da noção de documento a partir da ideia de “escrito”, fruto da subjetividade humana, via um sistema de signos ou de escrita (fonética ou ideográfica). Estivals (1981) observa a importância dessa noção para a visão de Louise-Nöelle Malclés e o desenvolvimento de sua teoria bibliográfica. Em síntese, o documento é visto aqui como uma mensagem fixa manuscrita ou impressa. A outra corrente, segundo Estivals (1981), é aquela desenvolvida por Jean Meyriat, fundada em uma visão pragmática: o documento como processo de interpretação, de inferência de significado a partir do uso. Ou seja, “o documento só existe como tal a partir do instante em que encontra seu usuário. Antes disso, não é documento.” (ESTIVALS, 1981ESTIVALS, R. A dialética contraditória e complementar do escrito e do documento. R. Esc. Bibliotecon. UFMG, Belo Horizonte, v. 10, n. 2, p. 121-152, set. 1981., p. 124).

Essa é, para o teórico, uma divisão clara (ainda que a noção epistemológica de Bibliologia possa comportar as duas perspectivas em um cenário epistemológico-histórico, como se pode ver na própria trajetória de Estivals pós-anos 1970), a saber: a documentação orientada para uma pragmática (o documento é o seu uso); a bibliologia orientada para uma teoria do gesto criador (subjetivista, ou, no léxico estivalsiano, essencialista e idealista). Segundo Estivals (1981), a abordagem documentológica foi aceita e desenvolvida pelos próprios bibliólogos franceses, como ele próprio.

A leitura crítica da noção de documento em Estivals (1981ESTIVALS, R. A dialética contraditória e complementar do escrito e do documento. R. Esc. Bibliotecon. UFMG, Belo Horizonte, v. 10, n. 2, p. 121-152, set. 1981.) segue, pois, uma trilha que dialoga inicialmente com noção de “escrito”, mas, recorrente a Paul Otlet, como o fez a corrente de Jean Meyriat, o olhar estiavalsiano propõe a retomada da noção de “esquema” como central para o desenvolvimento da Bibliologia e, logo, do documento - é a partir desta noção que se constitui uma preocupação em Estivals (1980) de relacionar as condições de conceituação da escrita primária - os documentos - e da escrita secundária - os metadocumentos, fruto da prática documentária. O esquematismo responde por um percurso - e uma teoria - que vai da reflexão mental sobre a organização das ideias à construção dos esquemas teóricos e dos esquemas bibliográficos, como classificações. Em outros termos, a prática reflexiva metadocumental é ao mesmo tempo um processo epistemológico e um processo teórico-aplicado na centralidade dos estudos bibliológicos, de onde parte uma teorização que hoje trataríamos como metainformacional. No discurso estivalsiano, uma metaesquematização bibliológica da comunicação.

O recuo necessário, na visão do teórico, carece de uma dimensão contextual e social. Em seus termos, é necessário da mensagem, voltar ao canal. Do canal, chegar ao posicionamento comunicacional, adentrando, pois, o universo psico-econômico que cria e utiliza o documento. A noção de “circuito do documento” (ESTIVALS, 1981ESTIVALS, R. A dialética contraditória e complementar do escrito e do documento. R. Esc. Bibliotecon. UFMG, Belo Horizonte, v. 10, n. 2, p. 121-152, set. 1981., p. 130) é, desta maneira, central para a teorização sobre documento, e inclui a vida social, econômica, política, militar, científica de um dado grupo social. Funda-se a partir da análise da vida social do documento, na teoria estivalsiana, o que o autor trata como “dialética da superestrutura intelectual”, na relação escrito-documento-sociedade (ESTIVALS, 1981, p. 135).

Na trilha da tradição meyriatiana, a discussão contemporânea é desenvolvida por Couzinet (2009COUZINET, V. Complexidade e documento: a hibridação das mediações nas áreas em ruptura. RECIIS- R. Eletr. de Com. Inf. Inov. Saúde, Rio de Janeiro, v. 3, n. 3, p. 10-16, set. 2009.) ao conjugar as noções de mediação, complexidade, partilha dos saberes e cultura de informação para desenvolver um debate em busca de uma teoria do documento. O conceito de mediação é central para o desenvolvimento da Ciência da Informação na França, com foco na relação político-epistemológica entre informação e comunicação - ou, simplesmente, sciences de l’information et communication, como tratamos. A mediação, enquanto significante, se estabelece como parte de uma construção pós-otletiana.

A afirmação requer uma crítica epistemológico-histórica, ou seja, retornar a Otlet (1934OTLET, P. Traité de documentation: le livre sur le livre: théorie et pratique. Bruxelles: Mundaneum, 1934. Disponível em: <Disponível em: http://lib.ugent.be/fulltxt/handle/1854/5612/Traite_de_documentation_ocr.pdf >. Acesso em: 20 jul. 2017.
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), como exercício reflexivo necessário de toda a experiência da imaginação conceitual. O autor utiliza centralmente a noção de “intermediário” (potencial base para o desenvolvimento de uma teoria do documento a partir da noção de mediação). Em diferentes momentos do Traité de Documentation, o discurso otletiano aponta para tal possibilidade. São exemplos: no fragmento §223.2 La Parole et L'Ecrit (OTLET, 1934OTLET, P. Traité de documentation: le livre sur le livre: théorie et pratique. Bruxelles: Mundaneum, 1934. Disponível em: <Disponível em: http://lib.ugent.be/fulltxt/handle/1854/5612/Traite_de_documentation_ocr.pdf >. Acesso em: 20 jul. 2017.
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, p. 92), aparece a noção de “língua intermediária”; e no fragmento §241.213 Especes et Types de Traités, na discussão dos Documentos Bibliográficos, Otlet (1934, p. 133) fala dos tratados epistemológicos como intermediários entre as obras clássicas e as memórias originais de obras especializadas.

Couzinet (2009COUZINET, V. Complexidade e documento: a hibridação das mediações nas áreas em ruptura. RECIIS- R. Eletr. de Com. Inf. Inov. Saúde, Rio de Janeiro, v. 3, n. 3, p. 10-16, set. 2009.) parte da concretude do documento (conceito e artefato) para refletir sobre a sua centralidade na Ciência da Informação. O “dar forma” da noção de informação encontra, pois, na ideia de documento, este ser-estar concreto, que permite, dentre outras possibilidades, a manifestação dos processos de mediação. Essa, por sua vez, é uma possível leitura meyriatiana de Paul Otlet, ou seja, a concepção de uma teoria do documento a partir de uma teoria da mediação. Por sua vez, no encalço do desdobramento da conceituação otlet-meyriatiana, Couzinet (2009, p. 14) aponta para a percepção do documento como objeto híbrido, socialmente construído, fruto de negociações ou, ainda, de mediações. Assim, segundo o olhar da pesquisadora, o documento seria um “testemunho das interações”, e ainda, na perspectiva de uma espécie de dispositivo, o documento é o criador de outras realidades.

No decurso francês de apropriação do conceito de documento, Fraysse (2011FRAYSSE, P. Document. In: GARDIÈS, C. (Dir.). Approche de l’information-documentation: concepts fondateurs. Toulouse: Cépaduès, 2011. p. 36-73., p. 68), afirma que o documento é portador de uma relação que o define. Ele precisa as questões que apresentamos sobre os textos de Meyriat ao dizer que os profissionais, ao criarem os documentos secundários para indicar os documentos primários, virtualizam estes documentos. Fraysse discorre sobre a noção de virtualidade, chamando a atenção para o fato de que ela não está reservada aos documentos eletrônicos, pois o tratamento da informação se constitui como mediação complexa que conduz a documentos, ou mais especificamente, a documentos secundários. Trata-se de pensar a virtualidade em sua condição filosófica e conceitual primária, ou seja, como potência. Além disso, como lembra Couzinet (2009COUZINET, V. Complexidade e documento: a hibridação das mediações nas áreas em ruptura. RECIIS- R. Eletr. de Com. Inf. Inov. Saúde, Rio de Janeiro, v. 3, n. 3, p. 10-16, set. 2009.), por estar ancorado nas pesquisas de Jean Davallon, Fraysse é atento aos modos como o documento cria contextos, e é reapropriado para a construção de outras intencionalidades (como a relação entre patrimônio histórico e o turismo).

Por sua vez, em paralelo ao desenvolvimento das interpretações francófonas nas últimas décadas, na Espanha, a Documentação repercutiu, inicialmente, a partir de Lasso de la Vega (1947; 1969), ao discorrer sobre os fundamentos e métodos do tratamento da massa documental como necessários para a produção científica. Posteriormente, José López Yepes, com seu livro Teoría de la Documentación (LÓPEZ YEPES, 1978LÓPEZ YEPES, J. Teoría de la Documentación. Pamplona: Ediciones Universidad de Navarra (EUNSA), 1978. 337 p.), realizou compilação das vertentes ou escolas produzidas ao longo do tempo em vários países, em que a Documentação é colocada em relação crítica com outras abordagens.

Já Desantes Guanter (1978), em prólogo à obra de López Yepes, faz uma associação em que afirma que a documentação e a informação estariam amputadas em boa parte de seu campo de atuação, de estudo e de solução deproblemas se fossem mantidas afastadas uma da outra. Para ele, todos os processos a que a documentação se submete se justificam somente se desembocam em um processo informativo, atual ou potencial. No ano anterior, López Yepes (1977, p. 91) se ocupou do tema do documento, afirmando que os estudos dos conceitos de documento e de análise documentária contribuem para a configuração da ciência que nos ocupa, segundo citamos espanhóis, Sagredo Fernández e Izquierdo Arroyo (1982, p. 162). Para eles, o artigo de López Yepes foi pioneiro a apresentar um esclarecimento linguístico e antropológico do conceito de documento.

De fato, estes autores (SAGREDO FERNÁNDEZ; IZQUIERDO ARROYO, 1982SAGREDO FERNÁNDEZ, F.; IZQUIERDO ARROYO, J. M. Reflexiones sobre “documento”: palabra / objeto (I). Boletín Millares Carlo, v. 3, n. 5, p. 161-197, 1982. Disponível em: <Disponível em: http://mdc.ulpgc.es/cdm/ref/collection/bolmc/id/97 >. Acesso em: 20 jul. 2017.
http://mdc.ulpgc.es/cdm/ref/collection/b...
) discorrem, em extenso artigo, sobre a etimologia da palavra documento e se propõem a desenvolver seu lugar teórico em Documentação. Os mesmos autores, em seguida, produziram uma reflexão conceitual crítica sobre a produção otletiana denominada Concepción lógico-lingüística de la documentación (SAGREDO FERNÁNDEZ; IZQUIERDO ARROYO, 1983). Segundo eles (1983, p. 265), de modo similar a Meyriat, um documento só existe quando é utilizado como tal, ou seja, é o uso que decide sobre seu caráter documental. Para eles, o documento é em si um objeto manufaturado (quanto ao registro em um suporte) e ‘mentefaturado’ (quanto ao conteúdo significativo gerado pela mente) que pode funcionar como documento propriamente ou como um objeto qualquer. Publicado mais de 10 anos depois, caberia registrar também a análise sistemática sobre o Traité, realizada por Izquierdo Arroyo (1995) e publicada em dois volumes.

Segundo Salvador Bruna (2006), em análise qualitativa da literatura, a introdução e difusão da concepção otletiana forneceu a base teórica na qual foi edificada a teoria documentária enquanto disciplina acadêmica espanhola. A produção espanhola apresentada evidencia o viés comunicacional da Documentação, como desenvolvimento da orientação otletiana e em função da formação humanística de seus pesquisadores, e talvez, também, porinfluência francesa dos estudos realizados no âmbito das Sciences de l’Information et de la Communication.

Como tratado em Ortega e Lara (2010ORTEGA, C. D.; LARA, M. L. G. de. A noção de documento: de Otlet aos dias de hoje. DataGramaZero: Revista de Ciência da Informação, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.brapci.ufpr.br/brapci/index.php/article/download/12626 >. Acesso em: 20 jul. 2017.
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), nos desenvolvimentos da proposta otletiana da noção de documento realizados por franceses e espanhóis, os traços iniciais se mantiveram, mas avançaram especialmente quanto aos elementos que se relacionam ao signo e à comunicação da informação. Para estas pesquisadoras, documento seria objeto simultaneamente de natureza material e conceitual, e potencialmente informativo, por apresentar capacidade de conservação, transporte, reprodução e comunicação do signo. Outro ponto é aquele relativo às tipologias de objetos que caracterizariam os documentos, dado o pensamento atual, já colocado por Otlet, de que não é o tipo de objeto que define o documento, mas o lugar simbólico que lhe é atribuído. As definições iniciais de documento e Documentação já continham os significados iniciais da atual noção de informação.

Em outro estudo contemporâneo, as mesmas autoras (LARA; ORTEGA, 2012) tratam da ideia de que a leitura do objeto que o transforma em documento para o sistema de informação segue uma política que privilegia perspectivas institucionais e comunidades discursivas potenciais. Essa leitura é feita por atividades documentárias que envolvem uma série de escolhas, uma vez que os documentos são organizados em categorias por meio de aspectos que são priorizados frente a outros, implicando uma construção que é permeada de elementos ideológicos. Desse modo, enquanto signo, o documento é uma construção, uma leitura do real sob determinada perspectiva (LARA; ORTEGA, 2012, p. 381-382). Essa perspectiva de leitura é sempre, e necessariamente, de caráter social, político e cultural. A abordagem linguística de que se constitui a Documentação permite a compreensão de que a língua é um elemento da cultura, de tal modo que operar com aquela implica navegar em contextos circunscritos por esta e vice-versa.

Também no contexto atual e no território brasileiro, Rabello (2011RABELLO, R. A dimensão categórica do documento na Ciência da Informação. Enc. Bibli: R. Eletr. Bibliotecon. Ci. Inf., Florianópolis, v. 16, n. 31, p.131-156, 2011.) parte da preocupação epistemológica para realizar uma perspectiva histórico-conceitual da noção de documento dentro da CI, identificando os aspectos teóricos de apropriação do termo na História, na Diplomática e na Documentação. Sob a via teórico-metodológica da história dos conceitos, o pesquisador chega até a condição do “caráter categórico do documento” no pensamento informacional. No âmbito do jogo “inovação” e “tradição”, Rabello (2011) nos permite compreender as pragmáticas da noção no contexto das ciências humanas e sociais que orbitam, atravessam e influenciam as transformações do conceito na CI.

3 As propostas da chamada neodocumentação para o documento

Reconhecendo as visões otlet-brietiana, autores como Day (2001DAY, R. The modern invention of information: discourse, history and power. Illinois: Southern Illinois University Press, 2001.; 2005) e Frohmann (1990FROHMANN, B. Rules of indexing: a critique of mentalism in information retrieval theory. Journal of Documentation, v. 46, n. 2, jun. 1990.; 2011), bem como Michael Buckland (1991BUCKLAND, M. K. Information as thing. Journal of the American Society of Information Science , v. 42 , n. 5, p. 351-360, jun. 1991.), percebem a necessidade de um modo pragmático de elaboração das coisas por meio de suas representações. Em outros termos, a pregnância do simbólico é demarcada na perspectiva do documento enquanto objeto em toda a estrutura espaço-temporal de sua elaboração social. No entanto, como indicado acima, tais autores, partem de um diálogo, por vezes tomado como inaugural, com as noções históricas de documento, sem acompanhar o debate histórico no território francês. Neste sentido, em grande medida, a noção clássica de documento mostra-se presente na proposta dos autores neodocumentalistas, assim como, evidencia-se sua ampla arena crítica ainda por ser reconsiderada.

Na compreensão do neodocumentalismo, dentre as várias potencialidades interpretativas, duas chamam pontualmente a atenção: de um lado, a refundação de noções centrais para a construção discursiva otlet-brietiana em língua inglesa, partindo da noção de documento e tocando em um conjunto de potencialidades que perpassam a materialidade, a institucionalidade e a política; e, de outro, uma corrente de pensamento, presente no discurso de autores como Buckland e Frohmann, que encontra em um contexto de ampla profusão documental - o contexto otletiano, do final do século XIX e início do XX - ferramentas conceituais preliminares para discutir outro momento de profunda criação e difusão documental sob novas plataformas tecnológicas e modos de comunicação.

Buckland (1991BUCKLAND, M. K. Information as thing. Journal of the American Society of Information Science , v. 42 , n. 5, p. 351-360, jun. 1991., p. 355) termo genérico o suficiente para incluir todas as coisas informativas sugere ‘discurso’. Apresenta como possibilidade dividir objetos em: artefatos com intenção de constituir discurso (como livros), artefatos que não tinham esta intenção (como barcos), e objetos que não são artefatos (como os antílopes). Do mesmo modo que os franceses e espanhóis citados, Buckland elenca exemplos explicativos das origens dos objetos informacionais e suas funções posteriores, como no caso do livro que pode ser usado como um peso para portas.

Por sua vez, a abordagem de Lund (2010LUND, N. W. Document, text and medium: concepts, theories and disciplines. Journal of Documentation, v. 66, n. 5, p. 734-749, 2010.) permite a compreensão de um processo histórico aberto de elaboração da noção de documento, no plano de uma ‘neodocumentação’, que não se interessa por uma reificação do termo (como se deu, em diferentes momentos, com uma chamada ‘filosofia da informação’, principalmente na crítica frohmanniana, apontada a seguir). Lund (2010) demonstra a relevância analógica entre as noções de texto, mídia e documento para a compreensão da última noção. Em termos otletianos (objetivamente afirmados no trabalho de Lund, Frohmann e Day, por exemplo), trata-se de perceber a extensão do conceito de documento como capaz de reunir as mais diferentes mídias, permitindo, dentro de uma epistemologia (nesse caso, sob a noção de Documentação), escolher o instrumento adequado para tratar deste ou daquele problema de fundo documental.

O foco retrospectivo de Lund (2010LUND, N. W. Document, text and medium: concepts, theories and disciplines. Journal of Documentation, v. 66, n. 5, p. 734-749, 2010.) recorre aos pressupostos históricos do pensamento e das ações de Paul Otlet: retomando a noção de Bibliografia e reconhecendo tal episteme como uma sociologia dos textos, como o pensamento britânico abordara, o olhar lundiano ‘reencontra’ a querela entre materialidade e significado, centrais para o ‘afastamento’ de percepções, em ciências humanas e sociais, do continente e do conteúdo. Diferentemente da noção de ‘texto’, para Lund (2010), o conceito de documento servirá como a base para o enfrentamento de uma visão ingênua sobre as condições simbólicas dos artefatos (a materialidade) e sua distância das discussões culturais de apropriação (o significado em sua dimensão pragmática, em seu uso).

A noção de documento, em suas raízes históricas (para aquém de Otlet) é então colocada em suspeição por Lund (2010LUND, N. W. Document, text and medium: concepts, theories and disciplines. Journal of Documentation, v. 66, n. 5, p. 734-749, 2010.): a materialidade em jogo aqui não é mais a frágil significância daquilo que ‘pode ser tocado’. O discurso e o gesto, segundo o olhar histórico-conceitual lundiano, podem ser reconhecidos, na tradição antiga, como documentos. As condições de fixação e de memória é que são distintas. Não é apenas a fundamentação da antiga ‘tradição de prova’ que estabelece, pois, uma epistemologia histórica para o documento. Outras condições fundam tal noção em sua pragmática, ou seja, em seu uso no espaço-tempo a partir da forma doceo, como: contar, informar (a uma pessoa sobre um fato, por exemplo); instruir (no sentido jurídico); demonstrar, mostrar (através de argumentos e outros significados); ensinar (no sentido propriamente dito da ação educacional); produzir um jogo (discursivo).

No encalço desse retorno à Antiguidade, nota-se que o movimento de apropriação do conceito de documento em Lund (2010LUND, N. W. Document, text and medium: concepts, theories and disciplines. Journal of Documentation, v. 66, n. 5, p. 734-749, 2010.) é, claramente, mesmo sem a assertiva do autor, um (re)encontro com a Retórica Antiga e as possibilidades de fundamentação do discurso, junto de seus meios de fixação e de reprodução (seu diálogo com Roland Barthes demarca pontualmente essa influência sob condições indiretas de apropriação). Essa relação - Retórica e Documentação, discurso e documento, ou, ainda, documento-palavra - encontra abrigo nos estratos conceituais que estão presentes na noção de documento e na ação do conceito desde a Antiguidade, a saber, instruir, demonstrar (provar), registrar. Do mesmo modo, Lund (2010) apenas reafirma questões que já estavam presentes na forma histórica do docere presente em Otlet (1934OTLET, P. Traité de documentation: le livre sur le livre: théorie et pratique. Bruxelles: Mundaneum, 1934. Disponível em: <Disponível em: http://lib.ugent.be/fulltxt/handle/1854/5612/Traite_de_documentation_ocr.pdf >. Acesso em: 20 jul. 2017.
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) e na própria relação escrita-documento tecida pelo pensamento de Estivals (1981ESTIVALS, R. A dialética contraditória e complementar do escrito e do documento. R. Esc. Bibliotecon. UFMG, Belo Horizonte, v. 10, n. 2, p. 121-152, set. 1981.).

A procura, em Lund (2010LUND, N. W. Document, text and medium: concepts, theories and disciplines. Journal of Documentation, v. 66, n. 5, p. 734-749, 2010.), está, pois, em unificar todas as ações do informar e do comunicar pela percepção da potência presente no conceito de documento. Tal conceito é capaz, na argumentação lundiana, de entrecruzar as mais diferentes ciências humanas e sociais, o que faz da Documentação uma espécie de campo transdisciplinar sócio-humano, permitindo, com isso, pensar permanentemente a dinâmica de reclassificação das próprias ciências do homem. Essa pujança potencial do documento parece ser a mesma presente na percepção de Ronald Day.

A argumentação em Day (2001DAY, R. The modern invention of information: discourse, history and power. Illinois: Southern Illinois University Press, 2001.) busca, em sua via, uma teoria crítica para a informação (presente objetivamente também em Bernd Frohmann), e encontra nas bases documentalistas do projeto de Paul Otlet sua estrutura epistemológico-histórica. Uma crítica materialista à informação enquanto unidade epistêmica se depara, pois, com a materialidade do documento como fundamento para uma construção do modelo crítico de análise do campo informacional. Uma historiografia informacional necessita, pois, em Day (2001) de um processo de co-constituição com a história cultural e uma abordagem ética (como, outra vez, será verificado em Frohmann), capaz de estabelecer o ponto de inflexão e as lacunas políticas do processo de reificação da informação (ou, ainda, de uma metafísica informacional fundada no fetiche do termo e suas operações técnicas a partir de meados do século XX).

A crítica a um conceito vago de informação, fundado na metafísica clássica (DAY, 2005DAY, R. Poststructuralism and information studies. Annual Review of Information Science Social and Technology (ARIST), v. 39, p. 575-609, 2005.), leva o pesquisador a se aproximar, no plano epistemológico-cultural, do pensamento otletiano. Mais uma vez estamos diante do conceito de documento: a noção de fragmento, por exemplo, encontrada na elaboração conceitual em Paul Otlet, conduz ao um processo de teorização sobre os documentos que reabre o plano crítico de compreensão do significado. O documento, complexo de camadas fragmentárias de fundo material e simbólico, constitui-se, assim, na reflexão dayana, como central para uma reconstituição da historicidade dos estudos informacionais (como pode ser visto em sua análise crítica de uma ‘moderna invenção da informação’ em 2001), bem como para uma reflexão (pós)estruturalista do próprio documento estrutural (de fundo otletiano).

As leituras pós-estruturalistas da abordagem otletiana em Day (2005DAY, R. Poststructuralism and information studies. Annual Review of Information Science Social and Technology (ARIST), v. 39, p. 575-609, 2005.) conduzem a visão do teórico estadunidense a pensar, à moda derridiana, a informação, abordada a partir da noção ampliada de documento, com um papel similar à ideia de écriture générale. A ideia remete, centralmente, segundo Derrida, à condicionante contingencial, à pragmática do documento: a escritura geral é sempre fruto das formas sociais, materiais e tecnológicas historicamente estabelecidas. Os diálogos de uma outra compreensão sobre o documento em Day (2005) aproximam-se objetivamente de Foucault e Wittgenstein, sujeitos teóricos por sua vez igualmente influentes na argumentação neodocumentalista de Bernd Frohmann.

Frohmann (2004FROHMANN, B. Documentation redux: prolegomenon to (another) philosophy of information. Library Trends, v. 52, n. 3, p. 387-407, 2004., p. 405-406) ressalta que as reflexões contemporâneas devem muito ao movimento documentalista do final do século XIX e início do século XX, salientando a importância de repensar essas práticas documentárias iniciais. O teóricoentende que a documentação cobre um terreno maior que o dos estudos de informação (information studies) e que, portanto, a filosofia da informação é subordinada à filosofia da documentação. Desse modo, o autor ressalta o papel da materialidade para se pensar a informação, e exemplifica tratando dos estudos sociais da ciência que mostram que a informação científica, para sua emergência, depende de práticas documentárias culturalmente específicas, historicamente determinadas e institucionalmente disciplinadas.

Assim, Frohmann questiona autores como Luciano Floridi, Rafael Capurro e Michael Eldred por entenderem que uma filosofia da informação seria especialmente urgente para a era digital. Para ele, a forma digital dos documentos contemporâneos não cria nenhum imperativo filosófico especial, uma vez que o conceito de práticas documentárias já estava presente. Em texto posterior, Frohmann reforça que o reconhecimento da materialidade dos documentos permite uma compreensão de seu papel social na atualidade.

Apoiando-se em Foucault, o autor (FROHMANN, 2006FROHMANN, B. O caráter social, material e público da informação na contemporaneidade. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 7., 19 a 22 nov. 2006, Marília. Anais... Marília: ANCIB ; UNESP, 2006. s.p. ) afirma que a documentação tem um papel mais significante que o da comunicação da informação, em função do que aquele chama de ‘escrita disciplinar’, a qual envolve indivíduos e circuitos específicos institucionais. Assim, a documentação seria o modo de relacionar a análise do discurso ou enunciações de Foucault e os estudos da materialidade da informação. Segundo Frohmann, as práticas documentárias institucionais funcionam por meio da materialização da informação, cujo peso, massa, inércia e estabilidade configuram profundamente a vida social.

A prevalência da noção de documento sobre uma possível filosofia da informação permite Frohmann (2000FROHMANN, B. Cyber ethics: bodies or bytes? International Information & Library Review, v. 32, p. 423-435, 2000.) observar um plano político, epistemológico e ético avançado a partir de tal elaboração conceitual. A informação como polo crítico para a elaboração da visão frohmanniana é tomada, em oposição ao documento, como um tipo de substância mental, oriunda epistemologicamente da tradição cartesiana. Tomando as abordagens foucaultianas e wittgensteinianas que relacionam, respectivamente, linguagem e poder, e linguagem e ação, Frohmann (2000) percebe o documento como fruto de uma prática social. O documento aqui engloba todos os tipos de mídia e suas dinâmicas socioculturais, de tal modo que, outra vez, encontramos no trato neodocumentalista da noção de documento outras possibilidades de manifestação conceitual.

As práticas sociais de fundo documentário, segundo terminologia adotada por Frohmann que comentamos à frente, são, estruturalmente, ações materiais, que envolvem as lutas por hegemonia e as disputas por espaço-tempo. Em consequência, a noção de documento é central para uma condição ética nos estudos informacionais: a filosofia do documento postula a necessidade de uma filosofia materialista da informação, que estabeleça as relações entre as tantas materialidades que as práticas sobre documentosengendram, incluindo o próprio corpo humano, não existente sem sua condição política (vide a influência foucaultiana de Frohmann) e material.

Logo, ‘documento’, em uma linha de reflexão ‘neodocumentalista’, de fundo frohmanniano, repercute condicionantes políticas plurais e em luta social constante. Trata-se de postular que, por trás do conceito, situa-se, desde Otlet, um fundamento geopolítico de extrema relevância para as conformações sociais. O documento relaciona, estabelece e produz poder. Por sua vez, é força de combate e de contraposição aos discursos hegemônicos, atuando como potencial energia crítica à substancialização do mundo informacional-digital em suas aparências virtuais, ou seja, em sua pretensa onipresença imparcial. O documento é, pois, no plano social, um conceito central para a construção de um debate ético na contemporaneidade, posição frohmmaniana essa diretamente dialogada com as visões pós-estruturalistas de Ronald Day e, em grande parte, de Niels Lund.

4 A documentação clássica, a frente neodocumentalista e outras propostas

Diferentemente de Buckland, no entanto, Frohmann refere-se à terminologia documentária em uma concepção mais ampla dos estudos de informação que aquela das práticas documentárias estritas que constituem sistemas e serviços. Para Lara (2014LARA, M. L. G. de. Documentação, materialidade e práticas documentárias. In: COLÓQUIO INTERNACIONAL DA REDE FRANCO-BRASILEIRA DE PESQUISADORES EM MEDIAÇÕES E USOS SOCIAIS DE SABERES E INFORMAÇÃO - REDE MUSSI, 3., 2014, Salvador. As transformações do documento no espaço-tempo do conhecimento. Anais... Salvador, Bahia: UFBA, Instituto de Ciência da Informação, 2014. v. 1. Disponível em: <Disponível em: http://www.coloquiomussi.ici.ufba.br/ >. Acesso em: 20 jul. 2017.
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), a proposta de Frohmann é relevante por colocar em destaque frentes de pesquisa que observam o documento em sua materialidade, simultaneamente a sua potencialidade informativa, além de avaliar criticamente a faceta profissional, uma vez ser ainda predominante seu tradicional descolamento dos problemas contemporâneos. No entanto, Lara entende que essa faceta deve ser revisitada, considerando a inserção contextual dos documentos como meio de concretizar o papel social da Documentação. Segundo ela, diminuir a importância da faceta profissional da Documentação contribui para não colocar em debate o problema. Assim, quanto à terminologia usada pelo autor, Lara discute sua interpretação no âmbito da prática documentária, em especial, aquelas relativas ao tratamento da informação. Da análise realizada por Lara, podemos afirmar que há deslocamento conceitual sobre os termos documentação e prática documentária no texto de Frohmann de 2004, se considerados no âmbito originário da Documentação.

Anteriormente, Ortega e Lara (2010ORTEGA, C. D.; LARA, M. L. G. de. A noção de documento: de Otlet aos dias de hoje. DataGramaZero: Revista de Ciência da Informação, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.brapci.ufpr.br/brapci/index.php/article/download/12626 >. Acesso em: 20 jul. 2017.
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) já haviam observado que a abrangência atribuída por Frohmann às práticas documentárias não contempla especificamente o fenômeno da institucionalização da informação que circunscreve o trato da massa documental como requisito para a comunicação documentária, indicando antes aspectos da produção e uso dos documentos disciplinados institucionalmente que as operações realizadas sobre o documento com fins de uso qualificado da informação que caracterizam o campo. No entanto, é mister reconhecer, ainda que de modo indireto, que a reflexão crítica sobre os modos de regulação institucionais via documentos é essencial para uma compreensão contextual da prática efetivamente documentária. Já para a operacionalização destas práticas, os parâmetros contextuais, ou seja, pragmáticos, devem estar diretamente relacionados aos objetos, processos e objetivos em questão.

Uma vez que, revisitar os conceitos de um campo é movimento inerente à prática científica, importa observar os termos neodocumentalista e neodocumentaçãoquanto aos autores citados e os pontos de referência desenvolvidos por eles, a despeito das diferenças culturais. Sob o ponto de vista da orientação anglo-americana, fortemente presente entre espanhóis e brasileiros, os estudos sobre as ideias e propostas da Documentação - por constituírem pensamento próprio, típico de qualquer disciplina ou vertente -, soam hoje como descoberta e parecem bem colocados sob o rótulo de novos estudos. Por sua vez, franceses, espanhóis e brasileiros, entre outros, continuaram os estudos iniciados pela Documentação, ainda que com lacunas temporais, atrasos bastante alargados e esquecimentos recentes.

Esta é uma questão central para pensar o papel de uma ‘neodocumentação’ e as possibilidades de avaliação crítica de sua condição epistêmica: em que medida não estamos adentrando apenas um território discursivo pontual de reconhecimento tardio de Otlet, o que implica também o não enfrentamento de uma parcela do campo desenvolvida desde então sob o pensamento otletiano; ou, por outra linha de interpretação, estamos diante de um novo uso da noção de documento, com influências remotas de Otlet? Um ponto de inflexão é: se a questão documental em outro plano, que não o otletiano, se estabelece no olhar neodocumentalista sem uma discussão sobre as práticas documentárias, estaríamos de fato a tratar de algo neodocumental, ou de outra expressão epistemológica distinta, que usa a noção de documento sob outras figurações? A questão se dá, pois, se a mesma responde por um “sim”, não poderíamos falar em “neodocumentação”, pois não tratar-se-ia de um diálogo com a Documentação, mas, de outra abordagem que adota o significante “documento” para sua teorização.

Desse modo, ao saltar o diálogo com a tradição de reflexão documentalista francófona e espanhola, por exemplo, a corrente neodocumentalista termina por abrigar um duplo problema epistemológico: de um lado, uma fratura histórica que responde pela ausência, não só do presente, mas também do passado: Otlet aparece como fundamental para a reflexão, mas seus conceitos servem aqui apenas para uma nova expressão de construção crítica, ou seja, não há um debate historiográfico que procura uma crítica teórica do passado, mas uma tentativa de resolver as noções do presente sob alguns aportes remotos (como a querela documento versus informação); por outro lado, a neodocumentação deixa como margem problemática a dificuldade de diálogo entre diferentes tradições contemporâneas de pensamento: a possibilidade de uma reflexão comparada permitiria apontar os possíveis diálogos agora silenciosos, mas a ausência de trocas objetivas parece sugerir uma noção de documento completamente distinta no sentido anglófono daquela historicamente desenvolvida sob uma francofonia.

De qualquer modo, a neodocumentação é, para além de um discurso histórico tardio de transposição da francofonia documentalista para a anglofonia informacional, uma reflexão epistemológica sobre a relevância da noção de documento para a fundamentação da informação na contemporaneidade. Os jogos de poder sob a pele da linguagem e as estruturas e superestruturas que condicionam, tanto a vivência do documento como sua invenção enquanto tal, são fundamentos de uma noção de documento contemporânea que está atravessada pelas redes digitais.

A proposta de uma epistemologia histórica a partir da pragmática dos usos da noção de documento nos demonstra, até aqui, a vitalidade de um conceito. A noção nos permite observar que, a partir de Paul Otlet, encontramos distintas e complexas movimentações no uso, na inferência de significados e na sua operacionalização como categoria analítica e discursiva. Assim, no intuito empírico de comprovação desta pragmática, além da documentação clássica e de uma neodocumentação, recorremos rapidamente a alguns estudos contemporâneos que demarcam essa condição das múltiplas documentações na epistemologia histórica da Ciência da Informação. Dentre elas, destacamos o trabalho de Joacim Hansson (2017HANSSON, J. Professional value and ethical self-regulation in the development of modern librarianship: the documentality of library ethics. Journal of Documentation, v. 73, n. 6, p. 1261-1280, 2017.), que coloca em discussão a questão da documentalidade e da ética na Biblioteconomia moderna; Maurizio Ferraris (2012FERRARIS, M. Perspectives of documentality. Phenomenology and Mind, v. 2, p. 40-48, 2012.), que aprofunda a noção de documentalidade sob o ponto de vista da intencionalidade; e Ciaran Trace (2016TRACE, C. B. “Ethnomethodology”: foundational insights on the nature and meaning of documents in everyday life. Journal of Documentation, v. 72, n. 1, p. 47-64, 2016.), que propõe um debate sobre a natureza e o significado dos documentos dentro do plano da etnometodologia.

Hansson (2017HANSSON, J. Professional value and ethical self-regulation in the development of modern librarianship: the documentality of library ethics. Journal of Documentation, v. 73, n. 6, p. 1261-1280, 2017.), professor do Departament of Library and Information Science, na Linnaeus University, Suécia, concebe uma visão que nos permite compreender o papel social e político do documento a partir de um ethos por ele mediado. Trata-se de discutir o modo como o documento estabelece os potenciais de demarcação comportamental, representando parte fundacional na própria caracterização epistemológica e profissional de um dado saber, neste caso, a Biblioteconomia. A codificação ética de Hansson (2017) é abordada a partir das noções de “documentalidade” e de “agência documentária” de Bernd Frohmann, que nos levam à compreensão da amplitude da vivência documental nas relações sociais, bem como demarcam os modos de institucionalização de comportamentos a partir de agenciamentos oriundos de tal meio social. Por sua vez, o diálogo hanssoniano atinge diretamente a proposta do italiano Maurizio Ferraris, pela afirmação de que nenhuma instituição se faz sem documento, nem se desenvolve sem definir o papel dos documentos em seu contexto.

O diálogo de Hansson com a teoria da documentalidade em Bernd Frohmann e Maurizio Ferraris pode ser assim traçado. Primeiramente, Hansson (2017) percebe a potência documental e sua concretude no plano social das demarcações éticas da formação do pensamento e da práxis em Biblioteconomia, dentro da experiência da autonomia da agência documentária e da institucionalidade da profissão. Porém, a posição hanssoniana também aponta para uma paisagem aberta, ligada à luta extra-agência, para uma legitimação da Biblioteconomia e do bibliotecário, vislumbrada nas reivindicações que surgem nos discursos sobre o ethos do bibliotecário, do movimento social que pode ou não constituir um quadro de comportamentos a partir de documentos. A documentalidade socialmente legitimadora demonstra, pois, um espaço de resistência e de resiliência de um dado grupo social.

A abordagem de fundo fenomenológico de Maurizio Ferraris (2012FERRARIS, M. Perspectives of documentality. Phenomenology and Mind, v. 2, p. 40-48, 2012.), apesar do recurso a noções de origem idealista, permite perceber, segundo um diálogo com a noção de ontologia socialmente predicada, ou seja, o ser colocado no plano social, neste caso, o plano dos documentos (aqui, no plural), uma abordagem axiomática que toma a documentalidade como conjunto de objetos sociais em atos associados, que gera artefatos (documentos) e processos (de documentação), elementos centrais para a construção das instituições e da vida social.

A repercussão do pensamento de Ferraris vai do plano filosófico propriamente dito ao plano ético da práxis do bibliotecário, passando ainda pelas análises epistemológicas e históricas do campo, como a discussão sobre a falha digital presente em Salarelli (2017). O jogo entre o filosófico e o social (distinção a priori demarcada na predicação da ontologia como social, já realizada por outros filósofos) reintegra, em parte, alguns elementos da metafísica tardia otletiana - a máxima potência neutra da Bibliologia e seu conceito central, o Livre apresentada na fundamentação do Traité (OTLET, 1934OTLET, P. Traité de documentation: le livre sur le livre: théorie et pratique. Bruxelles: Mundaneum, 1934. Disponível em: <Disponível em: http://lib.ugent.be/fulltxt/handle/1854/5612/Traite_de_documentation_ocr.pdf >. Acesso em: 20 jul. 2017.
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) -, bem como se aproxima das abordagens contemporâneas do papel ontológico na filosofia dos estudos informacionais.

Um dos conceitos centrais para o desenvolvimento da teoria da documentalidade em Ferraris (2012FERRARIS, M. Perspectives of documentality. Phenomenology and Mind, v. 2, p. 40-48, 2012.) está na noção de intencionalidade, em diálogo crítico com John Searle e Jacques Derrida. A noção é retirada e apropriada a partir do ponto de vista da intencionalidade coletiva, orientada para um modo de concretização de proposições individuais. Essa concretização é, por sua vez, o próprio documento. A teoria da documentalidade, sob um plano social, concebe, pois, o documento como um objeto social.

Sem manifestar os diálogos e as aproximações, a proposta teórica ferrarisiana recupera, em grande parte, um ponto de vista da expressão filosófica da Bibliologia otletiana do Traité, ou seja, a máxima potencialização da noção de livre e de document, como energia que se atualiza em todas as condições da vida humana. Mais especificamente, Ferraris (2012FERRARIS, M. Perspectives of documentality. Phenomenology and Mind, v. 2, p. 40-48, 2012.) pode ser interpretado, em sua teorização, como adepto da noção de Livre (com letra maiúscula), que estabelece um ponto ontológico de onde partem todas as concretudes do ser sob o contexto hoje tratado como informacional. O documento é a marca de uma relação entre o ser e o mundo social, a presença de todo o desenvolvimento das relações sociais mediada por documentos.

Por fim, com alguma proximidade do papel da “documentalidade”, ora em Frohmann (2011FROHMANN, B. Reference, representation, and the materiality of documents. In: COLÓQUIO CIENTÍFICO INTERNACIONAL DA REDE MUSSI, 2., 2011. Anais... Toulouse: Université de Toulouse 3, 2011. p. 55-68.; 2004), ora em Ferraris (2012FERRARIS, M. Perspectives of documentality. Phenomenology and Mind, v. 2, p. 40-48, 2012.), Trace (2016TRACE, C. B. “Ethnomethodology”: foundational insights on the nature and meaning of documents in everyday life. Journal of Documentation, v. 72, n. 1, p. 47-64, 2016.) nos permite discutir a questão do documento a partir de uma pragmática que toma a noção segundo um ponto de vista de fundo processual, repercutindo nas ações do pesquisador e do profissional do campo. O plano do método discutido pela abordagem traciana é dado a partir da etnometodologia, a partir da qual Trace (2016) destaca o modo como os sujeitos transformam experiências em documentos, estes que permitem a justificação de ações e de inferências. Do mesmo modo, os documentos modificam determinados contextos, passando de objetos que recebem a significação para objetos que dão significados a dadas interações no mundo social. Logo, decisões são tomadas a partir de formações ideológicas fundadas neste ou naquele documento.

Retomando as fundamentações e projeções iniciais da etnometodologia, Trace (2016TRACE, C. B. “Ethnomethodology”: foundational insights on the nature and meaning of documents in everyday life. Journal of Documentation, v. 72, n. 1, p. 47-64, 2016.) indica que o conjunto de métodos que o enfoque reúne está relacionado a estudos que perpassam a análise de interações via oralidade até os estudos de contextos locais sob as mais distintas formas de comunicação. A ancoragem teórica etnometodológica pode ser compreendida como uma teoria social que busca compreender como uma dada realidade é ordenada. Próxima do interacionismo simbólico, intimamente relacionada com o pragmatismo americano e com a fenomenologia alemã, o enfoque tem como horizonte o sujeito como agente dos processos sociais e a construção de significados na estrutura social.

Dentro deste cenário teórico-metodológico, Trace (2016TRACE, C. B. “Ethnomethodology”: foundational insights on the nature and meaning of documents in everyday life. Journal of Documentation, v. 72, n. 1, p. 47-64, 2016.) se propõe problematizar o documento como possibilidade direta de análise pela via da etnometodologia. O autor está interessado em destacar a potencialidade das relações entre o estudo do documento e as pesquisas informacionais. O documento é, pois, sob a abordagem etnometodológica, compreendido como produto do contexto das interações sociais, não representando, a priori, um repertório de fatos dados, ou fonte de informação para experiências espaço-temporais.

Sob a linha de pensamento etnometodológico, o documento é um objeto indexical que, portanto, tem significado apenas em seu contexto. É também um objeto que só pode ser entendido no plano de uma reflexividade, no sentido de que as práticas com os documentos alteram e recondicionam sua experiência semântica. Logo, a noção de documento pela via da etnometodologia busca enfatizar que existem laços entre os documentos e a ordem social por estes criada. Reflexividade e indexicalidade são, pois, propostas conceituais para interpretação da noção de documento a partir do enfoque etnometodológico.

Dentre estes três autores - Joacim Hansson (2017HANSSON, J. Professional value and ethical self-regulation in the development of modern librarianship: the documentality of library ethics. Journal of Documentation, v. 73, n. 6, p. 1261-1280, 2017.), Maurizio Ferraris (2012FERRARIS, M. Perspectives of documentality. Phenomenology and Mind, v. 2, p. 40-48, 2012.) e Ciaran Trace (2016TRACE, C. B. “Ethnomethodology”: foundational insights on the nature and meaning of documents in everyday life. Journal of Documentation, v. 72, n. 1, p. 47-64, 2016.), - nem herdeiros da Documentação clássica, nem proclamados como neodocumentalistas, apenas o primeiro trata efetivamente de Documentação, no entanto, pela via - também legítima - da Biblioteconomia e da profissão bibliotecária, observando-as de dentro, no que tange ao significado da prática documentária e sua ética, e de fora, quanto ao papel social e político que exerce e pode exercer. Já os outros dois autores aproximam-se da proposta neodocumentalista, em função da exploração da produção e uso de documentos em seu sentido social e político mais amplo, constituído pelas formas institucionais que moldam esses documentos, ao mesmo tempo em que estes as constituem como tal. Por sua vez, se o primeiro autor (Hansson) não explicita o documento em sua dimensão simbólica, como objeto que significa, a exemplo do viés documentalista clássico, é o último autor (Trace) que ressalta essa característica documental junto ao plano da significação, ao tratar do que chama de reflexividade e indexicalidade.

A despeito da coerente e fundamentada trajetória da concepção otletiana, sua discussão a partir do contraponto neodocumentalista pode dicotomizar a questão, mais que contribuir para aprofundá-la e atualizá-la. Fazendo o mesmo raciocínio a partir da neodocumentação, embora Otlet seja mencionado como fonte, outras referências precisam ser levadas em conta. Daí a relevância dos três autores citados acima, cujo confrontamento com as ideias aqui apresentadas ainda está por ser feito.

6 Considerações finais

É neste contexto que tratamos da ideia de documento como construída por camadas de significação ao objeto, desde as mensagens propostas por meio dos procedimentos documentários até a interpretação dos usuários, a qual é influenciada por aquelas mensagens. Entretanto, é preciso reconhecer que o pensamento do campo se cristalizou fortemente via procedimentos de base empírico-normativa. Tal normatividade está ancorada claramente em uma base positivista da noção de neutralidade do suporte, bem como de seu mediador, portanto, alheia à abordagem comunicacional e ao instrumental metodológico que permite realizá-la. No entanto, este pensamento que ainda predomina no campo em que, não se reconhece o caráter intencional de comunicação da prática documentária, não elimina seus aspectos (inerentemente) sociais, políticos e culturais.

De fato, a construção histórica da noção de documento aponta que ele é produto de ações de mediação, as quais se realizam por atividades como seleção, descrição, indexação, ordenação, exposições a partir de quaisquer objetos. Sistemas e serviços e demais atividades constituem os dispositivos documentários, que funcionam como proposta de percurso dos sujeitos no mundo da informação. Deste modo, a noção clássica de documento e suas derivações fundamentam a operacionalização, na contemporaneidade, das atividades citadas. Sob outro ponto de vista, a abordagem dos neodocumentalistas privilegia o documento quanto às relações de poder que o envolvem enquanto objeto produzido pelo homem, portanto, relações localizadas histórica, social e politicamente.

Cumpre-nos observar criticamente que o pensamento de Otlet e o conceito de documento presente, principalmente após suas conferências e trabalhos da primeira, da segunda e da terceira décadas do século XX até a consolidação no Traité, demonstram ainda uma potencialidade interpretativa gigantesca, dada a margem de interpretações possíveis. Em diferentes momentos, ao longo de sua principal obra, Otlet oferece esboços nocionais que permitem localizar um pós-estruturalismo futuro, o simbolismo do objeto e de suas representações, e as multiplicidades de suportes e de redes de comunicação entre eles e o sujeito conhecedor no escopo da experiência histórica da mediação. Mais que isso, faz-se necessário investigar mais profundamente, não apenas a produção otletiana, mas também aquela que lhe foi decorrente até a contemporaneidade, no que tange aos aspectos nocionais, simbólicos e tecnológicos citados, no contexto da mediação documentária que se faz no percurso de transformação do objeto em documento.

Como estes estudos são realizados no mesmo campo, faz-se necessário questionar se eles têm em vista a busca por interlocução, intrínseca à prática científica, ou trata-se de movimentos concorrentes de construção de espaços cognitivos e sociais. Afinal, assim como a rápida presença da Documentação na primeira parte do século XX nos Estados Unidos, antes que fosse proposta a Information Science, a neodocumentação pode estar evidenciando a necessidade de estudos mais abrangentes, no que tange a autores e ao significado de suas ideias.

Deste modo, antes de estabelecer a necessidade de demarcação de um novo conceito de documento, percebemos que os estudos neodocumentalistas propõem visões distintas, buscando um diálogo com os preceitos do foco documentalista, em contínuo discurso de reapropriação da noção de documento, mas sob configurações ainda carentes de recuo histórico crítico e de uma interpretação contemporânea abrangente.

Ali e aqui, em Otlet e Buckland, a materialidade continua sendo uma discussão central para se reconhecer algo de uma filosofia do documento, a documentalidade, expressa na vida do homem. Mas, afinal, o que significa tal materialidade em espaço-tempos tão distintos, e sob influências teóricas aparentemente tão distantes? A noção de documento continua como potencial resposta para tal indagação, representando, pois, um dos mais profícuos elementos epistemológicos do campo.

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  • 1
    Tradução para a língua portuguesa publicada em versão eletrônica em 2017 pela Editora Briquet de Lemos.
  • 2
    Texto traduzido para a língua portuguesa e publicado na Revista Perspectivas em Ciência da Informação, v. 21, n. 3, p. 240-253, jul./set. 2016.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Set 2019
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2019

Histórico

  • Recebido
    12 Mar 2019
  • Aceito
    12 Mar 2019
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