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DESAFIOS NO COMPARTILHAMENTO DE DADOS: ANOMIA RELACIONADA AOS DIREITOS AUTORAIS

CHALLENGES IN DATA SHARING: COPYRIGHT RELATED ANOMIE

RESUMO

Cooperação e trabalho articulado entre as partes interessadas no ciclo da comunicação científica são cruciais para que o compartilhamento de dados seja eficaz e permita a localização e a reutilização dos dados. A anomia, termo aqui associado à falta de clareza de informações, normas e diretrizes, à perda das referências normativas, ao descumprimento de regras ou a negação da moral, é barreira para tal compartilhamento. As vertentes do direito autoral são preponderantes nas orientações dos publicadores de dados para melhor reuso e citação dos autores, e perpassam por diversas temáticas. O objetivo foi apresentar a investigação sobre indícios que contribuam para a compreensão de como o estado de anomia a respeito de direitos autorais pode inibir o compartilhamento de dados. Foi utilizada a pesquisa documental, exploratória e o método Análise de Conteúdo com aplicação de framework que considera as dimensões institucional e individual. Os resultados apontaram indícios de que os pesquisadores têm pouca clareza sobre as leis e as normativas, gerando um desequilíbrio entre metas institucionais e os meios para atingi-las, incluindo o descumprimento de diretrizes. Conclui-se que há orientações sobre direitos autorais tanto, entretanto foram identificados elementos que apontam para um estado de anomia relacionado a tais orientações.

Palavras-chave:
Compartilhamento de dados; Anomia; Direitos autorais; Gestão de dados

ABSTRACT

Cooperation and concerted work among the various stakeholders in the science communication cycle are crucial for effective data sharing and to enable data to be located and reused. Anomie, a term here associated with the lack of clarity of information, norms, and guidelines, the loss of normative references, the disregard for rules, or the denial of morals, is a barrier to such sharing. Copyright aspects are prevalent in the data publishers' guidelines for better reuse and citation of authors, and run through several topics. The objective was to present research on evidence that contributes to the understanding of how the state of anomie regarding copyright can inhibit data sharing. It was used the documentary, exploratory research and the Content Analysis method with framework that considers the institutional and individual dimensions. The results indicated that the researchers have little clarity about the laws and regulations, which generates an imbalance between institutional goals and the means to achieve them, including the noncompliance with guidelines. It is concluded that there are guidelines on both moral and patrimonial copyrights, however, elements were identified that point to a state of anomie related to such guidelines.

Keywords:
Data sharing; Anomie; Copyright; Data management

1 INTRODUÇÃO

O compartilhamento de dados entre pesquisadores pode ser essencial em diversificadas áreas e contribuir para acelerar a colaboração científica, conduzir estudos comparativos, permitir pesquisas em larga escala, verificar e validar resultados de pesquisas, aumentar a eficiência e a qualidade da pesquisa, contribuir em diversos campos de atuação e facilitar a reutilização e a reprodutibilidade de dados por terceiros (KIM; ZHANG, 2015KIM, Y.; ZHANG, P. Understanding data sharing behaviors of STEM researchers: the roles of attitudes, norms, and data repositories. Library & Information Science Research, Noorwoold, v. 37, n. 3, 189-200, 2015. Disponível em: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0740818815000584. Acesso em: 21 mar. 2020.
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; PINFIELD; COX; SMITH, 2014PINFIELD, S; COX, A. M.; SMITH, J. Research data management and libraries: relationships, activities, drivers and Influences. PLoS ONE, San Francisco, v. 9, n. 12, p. 1-28, 2014. Disponível em: http://web.b.ebscohost.com/ehost/pdfviewer/pdfviewer?vid=1&sid=fbf9aa61-6c97-. Acesso em: 28 out. 2017.
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; PIWOWAR; CHAPMAN, 2010PIWOWAR, H. A.; CHAPMAN, W. W. Public sharing of research datasets: a pilot study of associations. Journal of Informetrics, Amsterdam, v. 4, n. 2, p. 148-156, abr. 2010. DOI: 10.1016/j.joi.2009.11.010. Disponível em: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S1751157709000881. Acesso em: 2 jun. 245 2019.
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).

Esforços significativos de diferentes agentes são observados para o encorajamento e conscientização da comunidade científica para compartilhar e reutilizar dados de pesquisa com o intuito de melhorar a reprodutibilidade e avançar nas descobertas científicas, mas com a segurança que os dados não serão copiados, modificados ou distribuídos ilegalmente e que os autores serão reconhecidos e citados (MONTEIRO, 2021MONTEIRO, E. C. S. A. Operacionalização de repositórios de dados: uma análise sobre as perspectivas e atitudes dos pesquisadores nas questões de autoria e licença. 2021. 268 f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2021. Disponível em: http://hdl.handle.net/11449/214671. Acesso em: 5 maio 2022.
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).

O compartilhamento de dados oriundos de pesquisas científicas com financiamento de agências de fomento, é recomendado e os repositórios de dados, periódicos científicos entre outros canais de comunicação, são vias para a publicação. As questões intrínsecas à propriedade intelectual de dados estão evidenciadas em diversos documentos de tais canais.

Para a World Intellectual Property Organization (20--) a expressão “propriedade intelectual” engloba duas vertentes:

  • Propriedade Industrial: inclui patentes, marcas, desenhos industriais, indicações geográficas e obtenções vegetais.

  • Direitos autorais: abrangem obras literárias como: romances, poemas e peças; filmes, música, trabalhos artísticos como, por exemplo, desenhos, pinturas, fotografias e esculturas e projeto arquitetônico.

Em virtude do compartilhamento, os pesquisadores podem ter uma série de preocupações referentes aos seus conjuntos de dados, com enfoque nas premissas de como serão reconhecidos pela autoria dos dados e como esses dados serão liberados para reutilização. Tais premissas fazem parte do direito autoral, o qual apresenta, fundamentalmente, dois aspectos: o moral, que garante ao criador (pessoa física ou jurídica) o controle à menção de seu nome no uso, reprodução ou divulgação de sua obra e o respeito a sua integridade; e o patrimonial, que visa regular as relações jurídicas da utilização econômica das obras intelectuais (GANDELMAN, 2007GANDELMAN, H. De Gutenberg à internet: direitos autorais das origens à era digital. 5. ed. Rio de Janeiro: Record, 2007.).

Apesar de incentivos para o compartilhamento e instituições e comunidades científicas ter diretrizes e recomendações de boas práticas científicas para a citação de dados e uso de licenças, é possível que os detentores dos dados tenham preocupações relacionadas ao reconhecimento da autoria dos seus conjuntos de dados e sobre como os dados poderão ser disponibilizados e reutilizados devido às questões pessoais, administrativas ou de recursos, assim como relacionadas ao tempo despendido e aos custos na geração ou coleta, no tratamento, na análise e na gestão de dados. Tais preocupações, além da falta de clareza das regras institucionais, podem instaurar um estado de anomia nos pesquisadores inibindo o compartilhamento dos dados.

A anomia ocorre quando os valores culturais (conjunto de valores normativos que governam a conduta dos membros de uma determinada sociedade ou grupo) e as metas institucionais encontram-se em desequilíbrio, pendendo para uma maior relevância dos valores culturais em relação às metas institucionais (MERTON, c1968MERTON, R. K. Sociologia: teoria e estrutura. São Paulo: Mestre Jou, c1968.). Assim, os indivíduos percebem-se em desconformidade com que as instituições requerem sendo possível a prática de condutas desviantes.

Este artigo tem como objetivo apresentar investigação sobre indícios que contribuam para a compreensão de como o estado de anomia a respeito de direitos autorais pode inibir o compartilhamento de dados. Foi aplicado um framework com 13 índices que fazem parte do contexto dos pesquisadores para a avaliação do estado de anomia. O framework se baseia em duas estruturas teóricas: na Teoria institucional (TI) de Scott (1995SCOTT, W. R. Contemporary institutional theory. In.: SCOTT, W. R. Institutions and organizations. London: Thousand Oaks: SAGE, 1995. cap. 3, p. 32-62.) e na Teoria do comportamento planejado (TCP) de Ajzen (1991) e em um modelo de pesquisa sobre comportamento de compartilhamento de dados de Kim (2017KIM, Y. Fostering scientists’ data sharing behaviors via data repositories, journal supplements, and personal communication methods. Information Processing & Management, Elmsford, v. 53, n. 4, p. 871-885, 2017. https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0306457316305908. Acesso em: 20 set. 2018.
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). A TCP é uma teoria específica da motivação individual, e foi aplicada para examinar até que ponto o entendimento dos pesquisadores sobre como as políticas de direitos autorais impactam em suas atitudes em relação ao compartilhamento de dados. Esta pesquisa se propõe a fornecer insights aos profissionais da informação, em especial aos bibliotecários, para auxiliar os pesquisadores na gestão de dados e no esclarecimento sobre os direitos de autor.

Embora os dados estejam em evidência na comunicação científica, o compartilhamento de dados nem sempre é uma prática comum, ou compreendida ou bem implantada como uma prática das pesquisas na comunidade científica (KIM; ZHANG, 2015KIM, Y.; ZHANG, P. Understanding data sharing behaviors of STEM researchers: the roles of attitudes, norms, and data repositories. Library & Information Science Research, Noorwoold, v. 37, n. 3, 189-200, 2015. Disponível em: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0740818815000584. Acesso em: 21 mar. 2020.
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; PIWOWAR; CHAPMAN, 2010PIWOWAR, H. A.; CHAPMAN, W. W. Public sharing of research datasets: a pilot study of associations. Journal of Informetrics, Amsterdam, v. 4, n. 2, p. 148-156, abr. 2010. DOI: 10.1016/j.joi.2009.11.010. Disponível em: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S1751157709000881. Acesso em: 2 jun. 245 2019.
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).

2 ANOMIA E O COMPARTILHAMENTO DE DADOS

A palavra anomia tem origem do grego anomos, em que “a” representa ausência, inexistência ou privação de; e “nomos” significa lei, norma (ALEIXO, 2020ALEIXO, D. V. B. O estado de anomia dos dados no acesso aos dados governamentais abertos no Brasil. 2020. 260 f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2020. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/191686/aleixo_dvbs_dr_mar.pdf%20?sequence=3&isAllowed=y. Acesso em: 25 fev. 2021.
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).

Ao longo da história, escritores sofistas, filósofos, sociólogos, entre outros, empregaram ou definiram anomia nos contextos social e psicológico do ser humano. Um dos escritores foi o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman que apresenta anomia como: “A ausência, ou a mera falta de clareza das normas - anomia - é o pior que pode acontecer às pessoas em sua luta para dar conta dos afazeres da vida. As normas capacitam tanto quanto incapacitam [...]” (BAUMAN, 2001BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001., p. 28).

A Ciência Aberta advoga mudanças nas práticas científicas com adaptação ou ampliação das diretrizes e normas para os dados de pesquisas científicas. As áreas do conhecimento ou pesquisadores individuais, que não estavam acostumados ou não eram adeptos a disponibilização pública dos dados, deparam-se com a necessidade de adaptações nos processos e práticas na gestão de dados e sua disponibilização para atendimentos de tais diretrizes e normas. As adaptações podem seguir em duas direções: fluir como o líquido se ajustando às orientações sobre a abertura e compartilhamento dos dados; ou precisar de uma tensão de força para o mesmo acontecer.

As adaptações nas atuais práticas científicas podem gerar tensões ou enfraquecimento nas relações sociais ou na ordem estabelecida nas comunidades científicas. Essa abordagem tem como princípio a complexidade que a sociedade está atingindo, fator observado e discutido por Émile Durkhein em seus livros Da divisão do trabalho social - publicado em 1999 - e O suicídio - publicado em 1977. Durkheim é o sociólogo da moral e ressalta a importância da consciência coletiva, do compartilhar formas de pensar e de agir identificando males da sociedade, definidas por ele como “anomia”, ou seja, negação da moral, falta de clareza e descumprimento das regras existentes.

No livro Da divisão do trabalho social, Durkheim (1999DURKHEIM, E. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 1999.) explanou sobre as consequências da divisão do trabalho na vida dos indivíduos e da sociedade considerando que, sob a tensão de mudanças repentinas na sociedade, nas normas e nas regras sociais já estabelecidas, as mesmas tornam-se obsoletas e “[...] falham em manter a uniformidade com atitudes e expectativas, consequentemente, quando estabelecidas de forma inapropriada resultam no desprezo por todas as outras regras” (QUEIROZ, 2015QUEIROZ, V. Anomia social e alienação: Émile Durkheim. [s.l.]: Colunastortas, 2015. Disponível em: https://colunastortas.com.br/anomia-social/. Acesso em: 6 abr. 2021.
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). Nesse aspecto, Durkheim apresenta o estado de anomia que a sociedade se encontra. Para Durkheim, a anomia está associada a: negação da moral; falta de clareza; perda das referências normativas e descumprimento das regras existentes; condição em que as normas sociais e morais são confundidas, pouco esclarecidas ou simplesmente ausentes (ALEIXO, 2020ALEIXO, D. V. B. O estado de anomia dos dados no acesso aos dados governamentais abertos no Brasil. 2020. 260 f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2020. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/191686/aleixo_dvbs_dr_mar.pdf%20?sequence=3&isAllowed=y. Acesso em: 25 fev. 2021.
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; QUEIROZ, 2015; RIBEIRO, 2012RIBEIRO, F. M. V. Nuances da sociologia do desvio em Émile Durkheim. Revista Cadernos de Ciências Sociais da UFRPE, Recife. v. 1, n. 1, jul./dez. p. 1-19, 2012. Disponível em: http://www.journals.ufrpe.br/index.php/cadernosdecienciassociais/article/view/233/204. Acesso em: 6 abr. 2021.
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).

O sociólogo Merton (1973MERTON, R. K. The normative structure of science. In.: MERTON, R. K. The Sociology of Science: theoretical and empirical Investigations, University of Chicago Press: Chicago, 1973. p. 223-280.), relevante teórico para a burocracia e para a sociologia da ciência, deu continuidade ao debate acerca da Teoria da anomia iniciado por Durkheim e elucidou a conduta de cientistas e o que os motivam: a recompensa e a intimidação. Para Merton (1973), de acordo com as normas tradicionais da ciência, os cientistas devem compartilhar suas descobertas científicas e as informações a elas relacionadas. Nesse aspecto, os dados de pesquisa também devem ser compartilhados. Entretanto, “[...] tradições disciplinares, barreiras institucionais, [...] preocupações com a propriedade intelectual e percepções individuais impedem os cientistas de compartilhar seus dados (KIM; STANTON, 2016, p. 777, tradução nossa).

Em sua teoria funcional, o autor apontou como essa teoria tenta determinar o modo pelo qual a estrutura cultural (conjunto de valores normativos que regulam o comportamento em uma determinada sociedade ou grupo) e a estrutura social (relações sociais em que os membros estão inseridos) pressionam para comportamentos socialmente divergentes em pessoas situadas em posições diferentes nessas estruturas (MERTON, c1968MERTON, R. K. Sociologia: teoria e estrutura. São Paulo: Mestre Jou, c1968.).

Posto isso, o termo anomia é empregado com definições diversificadas, atribuídas sobre a vivência do indivíduo em sociedade com sua cultura, suas relações sociais e institucionais e atuações. O emprego do termo pelos autores apresentados caracteriza a dimensão cultural e a institucional, com suas normas e baixa aderência, ou não observância, entre as normas e a atuação dos indivíduos.

Considera-se como estado de anomia a baixa aderência entre o reconhecimento e prática das normas estabelecidas e as ações dos pesquisadores. Parte-se do pressuposto que existem normas, porém não são seguidas em conformidade com o estabelecido.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Pesquisa documental de abordagem qualitativa com aplicação do método Análise de Conteúdo (BARDIN, 2010BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2010.; FRANCO, 2008FRANCO, M. L. P. B. Análise de conteúdo. 2. ed. Brasília, DF: Liber Livros, 2008.) para estruturação da coleta e análise dos dados. Foram seguidos os procedimentos da Análise de Conteúdo na fase da Pré-análise com a leitura flutuante e aplicando a regra da pertinência.

O escopo da pesquisa foi o repositório e-cienciaDatos do Consórcio Madroño, um repositório de dados constituído pelas seis universidades do Consórcio Madroño: Universidad de Alcalá, Universidad Autónoma de Madrid, Universidad Carlos III de Madrid, Universidad Politécnica de Madrid, Universidad Rey Juan Carlos y Universidad Nacional de Educación a Distancia (UNED). O repositório armazena e preserva os conjuntos de dados de cada uma das universidades cooperantes.

Os procedimentos metodológicos foram aplicados em dois universos:

  • o primeiro constituído pelas universidades do Consórcio Madroño com o repositório e-cienciaDatos. Os dados foram coletados com a análise dos documentos elaborados e disponibilizados pelas bibliotecas e pelo Consórcio Madroño, das entrevistas e dos questionários aplicados aos bibliotecários em dezembro de 2018. Para a coleta de dados com os bibliotecários foi aplicado um questionário composto por 30 perguntas sendo 10 abertas e 20 fechadas abordando as atividades desenvolvidas com a gestão dos dados e as competências e habilidades necessárias para atuarem nos repositórios, tanto em serviços técnicos quanto no auxílio e treinamento dos usuários. Os documentos selecionados para a leitura flutuante foram as Leis e Normativas, manuais, diretrizes, audiovisuais, infografias, declarações e informes. Na etapa da Pré-análise, a leitura flutuante se iniciou com os documentos disponibilizados nas páginas das bibliotecas, do Consórcio Madroño e os enviados pelos bibliotecários; a escolha dos documentos foi feita a posteriori seguindo a regra da pertinência; com a leitura foram levantados categorias e índices que fizeram parte de um framework (MONTEIRO, 2021MONTEIRO, E. C. S. A. Operacionalização de repositórios de dados: uma análise sobre as perspectivas e atitudes dos pesquisadores nas questões de autoria e licença. 2021. 268 f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2021. Disponível em: http://hdl.handle.net/11449/214671. Acesso em: 5 maio 2022.
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    ; MONTEIRO; SANT’ANA, 2022).

  • o segundo, composto pelos pesquisadores coordenadores dos grupos de pesquisas que depositaram seus conjuntos de dados no repositório. Foi aplicado um questionário com 19 questões, sendo sete abertas e 12 fechadas. As perguntas abertas serviram para o roteiro da entrevista. Os pesquisadores ficaram livres para comentarem as perguntas fechadas. Os entrevistados tiveram a liberdade de se retirarem da pesquisa a qualquer momento e não foi necessário responder a nenhuma pergunta para avançar no questionário ou na entrevista. A aplicação do questionário e da entrevista foram feitas via Skype e Hangout e as mesmas foram gravadas com autorização dos participantes. As respostas foram transcritas para análise final. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido precedeu a entrevista e foi apresentado aos participantes da pesquisa no início da entrevista.

Na leitura flutuante dos documentos do primeiro universo foram definidos os índices: Cultural, Ciência aberta, Princípios Findable, Acessible, Interoperable, Reusable Principles (FAIR), Plano de Gestão de Dados (PGD), Agências de fomento, Repositório Normas e Leis, Benefícios, Riscos, Esforços, Suporte dos bibliotecários, Benefícios para a Sociedade e Ética.

A continuação da leitura flutuante identificou-se os indicadores: Direitos Morais, Direitos Patrimoniais, Licenças de uso e Citação do autor. Explorando um pouco a ideia de indicadores, Rozados (2005ROZADOS, H. B. F. Uso de indicadores na gestão de recursos de informação. Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da Informação, Campinas, v. 3, n. 1, p. 60-76, jul./dez. 2005. Disponível em: http://basessibi.c3sl.ufpr.br/brapci/_repositorio/2015/12/pdf_4248c73f66_0000015274.pdf. Acesso em: 10 abr. 2021.
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) destaca que os indicadores são medidas qualitativas ou quantitativas, reservadas para a descrição ou representação de um dado evento ou fenômeno servindo para sua avaliação, além de possibilitar comparações internacionais. Para o artigo os indicadores estão direcionados para os aspectos do direito autoral. Ademais, com a leitura flutuante, foram selecionadas as categorias identificadas na análise dos documentos. O tipo de análise escolhida para essa pesquisa foi a Análise Categorial do método Análise de Conteúdo. Foram definidas as categorias a posteriori, que emergem do conteúdo analisado, seguindo o critério da pertinência em que uma categoria deve estar adaptada ao material de análise escolhido e ao quadro teórico definido e deve, também, refletir as intenções da pesquisa e as questões do pesquisador. Foram identificadas seis categorias: Cognitiva, Normativa, Reguladora, Carreira, Recursos e Social. As categorias e os índices compuseram o framework apresentado na seção Modelo conceitual. As categorias e índices serviram de base para as perguntas do questionário aplicado no segundo universo.

A seleção e delimitação dos índices e categorias foram amparadas pela TI de W. Richard Scott (1995SCOTT, W. R. Contemporary institutional theory. In.: SCOTT, W. R. Institutions and organizations. London: Thousand Oaks: SAGE, 1995. cap. 3, p. 32-62.), TCP de Icek Ajzen (1991) e no Modelo de pesquisa de comportamento de compartilhamento de dados de Youngseek Kim (2017KIM, Y. Fostering scientists’ data sharing behaviors via data repositories, journal supplements, and personal communication methods. Information Processing & Management, Elmsford, v. 53, n. 4, p. 871-885, 2017. https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0306457316305908. Acesso em: 20 set. 2018.
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), sendo o último estruturado para fatores que influenciam o comportamento dos cientistas que compartilham dados por meio de repositórios de dados. Dito isso, o autor afirma que “[...] as pressões institucionais, motivações individuais e recursos afetam os diversos comportamentos de compartilhamento de dados dos cientistas [...] (KIM, 2017KIM, Y. Fostering scientists’ data sharing behaviors via data repositories, journal supplements, and personal communication methods. Information Processing & Management, Elmsford, v. 53, n. 4, p. 871-885, 2017. https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0306457316305908. Acesso em: 20 set. 2018.
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, p. 879).

4 MODELO CONCEITUAL

Este artigo apresenta um Framework (FIGURA 1) para investigar como os fatores institucionais e individuais os quais são possíveis influenciar a percepção e os comportamentos de compartilhamento de dados de pesquisadores. O Framework é baseando na teoria institucional de Scott (1995SCOTT, W. R. Contemporary institutional theory. In.: SCOTT, W. R. Institutions and organizations. London: Thousand Oaks: SAGE, 1995. cap. 3, p. 32-62.), na TCP de Ajzen (1991) e no modelo para comportamento de compartilhamento de dados de cientistas de Kim (2017KIM, Y. Fostering scientists’ data sharing behaviors via data repositories, journal supplements, and personal communication methods. Information Processing & Management, Elmsford, v. 53, n. 4, p. 871-885, 2017. https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0306457316305908. Acesso em: 20 set. 2018.
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).

Figura 1
Framework das perspectivas e atitudes do compartilhamento dos dados

A TCP é “[...] uma teoria projetada para prever e explicar o comportamento humano em contextos específicos [...]” com fator central onde há “[...] a intenção do indivíduo em executar um determinado comportamento” (AJZEN, 1991, p. 181, tradução nossa). A TCP explica a racionalidade dos comportamentos dos sujeitos com base em suas motivações atitudinais e condições facilitadoras de recursos que promovam, inclusive, seus comportamentos em compartilhar dados (KIM, 2017KIM, Y. Fostering scientists’ data sharing behaviors via data repositories, journal supplements, and personal communication methods. Information Processing & Management, Elmsford, v. 53, n. 4, p. 871-885, 2017. https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0306457316305908. Acesso em: 20 set. 2018.
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). Essa teoria ajuda a explicar as motivações subjacentes e a disponibilidade de recursos, facilitando o compartilhamento de dados dos pesquisadores no contexto institucional (AJZEN, 1991; KLIM; ADLER, 2015).

A TI advém de estudos sociológicos e organizacionais e contribui para a conexão entre as forças entrelaçadas de instituições, infraestrutura e pessoas, além de examinar como os atores sociais executam comportamentos aceitáveis para serem legitimados diante das pressões institucionais (KIM, 2017KIM, Y. Fostering scientists’ data sharing behaviors via data repositories, journal supplements, and personal communication methods. Information Processing & Management, Elmsford, v. 53, n. 4, p. 871-885, 2017. https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0306457316305908. Acesso em: 20 set. 2018.
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; SCOTT, 1995SCOTT, W. R. Contemporary institutional theory. In.: SCOTT, W. R. Institutions and organizations. London: Thousand Oaks: SAGE, 1995. cap. 3, p. 32-62.). O contexto em que os cientistas estão atuando fornece insights sobre como os atores sociais são influenciados pelas pressões institucionais dentro do ambiente institucional (KLIM; ADLER, 2015; SCOTT, 1995). O compartilhamento de dados pelos pesquisadores está associado em seus respectivos contextos institucionais, incluindo universidades ou institutos de pesquisa, agências de fomento, editores de periódicos e áreas de conhecimento fazendo-se necessário examinar as influências institucionais nos comportamentos de compartilhamento de dados dos pesquisadores (KLIM; ADLER, 2015).

O modelo de pesquisa de Kim (2017KIM, Y. Fostering scientists’ data sharing behaviors via data repositories, journal supplements, and personal communication methods. Information Processing & Management, Elmsford, v. 53, n. 4, p. 871-885, 2017. https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S0306457316305908. Acesso em: 20 set. 2018.
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) fornece um mapa dos comportamentos de compartilhamento de dados dos cientistas e elucida de que forma os pesquisadores tomam suas próprias decisões para o uso de métodos diversificados para compartilhar dados. O autor considera como influência as pressões regulatórias de agências de financiamento e editores de periódicos e a pressão normativa das expectativas de seus colegas. Da mesma forma, o autor considera a TCP para embasar o comportamento de compartilhar dados seguindo as influências na sua carreira. O modelo esclarece de que forma os pesquisadores tomam a decisão de compartilhar seus dados e como os fatores que envolvem o compartilhamento diferem em diferentes formas de comportamento (MONTEIRO, SANT’ANA, 2022MONTEIRO, E. C. S. A.; SANT’ANA, R. C. Factors that influence researchers' state of anomie in the research data sharing process. Mobile Network Applications, New York, v. 27, [s.n.], 2022. DOI: https://doi.org/10.1007/s11036-022-01967-x.
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).

Conforme ilustrado no Framework, as categorias são: Cognitivo com seu índice Cultura; Normativo com seus índices Ciência Aberta, Princípios FAIR, Agências de fomento, PGD e Repositórios; Regulador com seu índice Normas e Leis; Carreira com os índices Benefícios, Riscos e Esforços; Recurso com o índice Suporte dos Bibliotecários e Social com os índices Benefícios para a Sociedade e Ética. Os índices e suas definições estão no quadro 1.

Quadro 1
Índices e suas definições

As teorias são apropriadas para examinar os comportamentos de compartilhamento de dados de pesquisadores sob as lentes institucionais e individuais, portanto, foram utilizadas para embasar o framework desenvolvido e a discussão do referencial teórico neste estudo.

5 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os resultados obtidos retratam os fatores que podem levar a um estado de anomia no compartilhamento de dados por pesquisadores sob a perspectiva do direito autoral. Os resultados são apresentados e discutidos em três dimensões apresentadas no framework: Dimensão Institucional; Dimensão de Análise e Dimensão Pesquisador os quais têm potencial para estimular ou inibir o compartilhamento dos dados.

As entrevistas foram realizadas com quatro pesquisadores, identificados pelas letras P e um número, em ordem sequencial. Nas respostas em que os pesquisadores poderiam ser identificados individualmente eles foram identificados como “Um dos pesquisadores”, para manter sua privacidade.

Os resultados indicam que a cultura perpassa os diversos índices apresentados no artigo e, na comunidade científica, pode influenciar os comportamentos de pesquisadores. A cultura em cada área do conhecimento revela as possíveis práticas de compartilhamento ou retenção dos conjuntos de dados antes da finalização das publicações dos resultados das pesquisas como, também, da prática da citação de dados. Scott (1995SCOTT, W. R. Contemporary institutional theory. In.: SCOTT, W. R. Institutions and organizations. London: Thousand Oaks: SAGE, 1995. cap. 3, p. 32-62.) destaca que em ambientes sociais é considerado natural que as pessoas sigam interesses idealistas ou coletivistas.

Nesse aspecto, os dados indicam que interesses coletivistas ou idealistas dependem de cada área do conhecimento ou de determinada comunidade. No interesse coletivista, é possível que um pesquisador siga ou, ao menos reconheça, os interesses em sua comunidade. Esse aspecto é corroborado pela resposta do pesquisador P2, com sua opinião sobre o compartilhamento de dados, ao enfatizar as características da sua área de atuação:

Eu acho que, para entender um pouco a postura do pesquisador ou a postura coletiva que temos do projeto, tem que esclarecer que viemos de [...] um campo de pesquisa que tradicionalmente tem sido caracterizado por ser bastante proprietário e conservador em relação aos dados, ou seja, era muito comum coletar os dados e que os dados estivessem disponíveis apenas para quem os tinha coletado, e era muito difícil acessá-los (P2, grifo nosso).

Em virtude da cultura, pesquisadores estão propensos ou não às práticas da Ciência Aberta, que pressupõe a abertura de todo o processo científico maximizando sua transparência e colaboração e inclui uma gama de práticas e estratégias abertas que envolvem conceitos abertos como acesso aberto às publicações e aos dados, aos softwares e às ferramentas de código aberto, aos fluxos de trabalho, à ciência cidadã, aos recursos educacionais, aos métodos abertos, alternativos para apoiar a pesquisa como a revisão por pares de forma aberta, entre outros (PONTIKA et al., 2015PONTIKA, N. et al. Fostering Open Science to Research using a Taxonomy and an eLearning Portal. In.: INTERNATIONAL CONFERENCE ON KNOWLEDGE TECHNOLOGIES AND DATA DRIVEN BUSINESS, 15., 2015, Graz. Anais [...]. Graz: The Open University, 2015. Disponível em: http://oro.open.ac.uk/44719/2/kmi_foster_iknow.pdf. Acesso em: 10 jan. 2019.
http://oro.open.ac.uk/44719/2/kmi_foster...
) conforme ilustrado na figura 2 e seguindo a Open Science Taxonomy.

Figura 2
Políticas na Open Science

A figura 2 mostra a indicação das políticas da Ciência Aberta que englobam as políticas dos órgãos financiadores, governamentais e as institucionais que, nesse contexto, têm uma forte contribuição. As políticas são implementadas de acordo com a realidade de cada comunidade. Cabe destacar na figura 2 o impacto das métricas abertas que estão sendo recomendadas para os dados de pesquisa.

Oportuno enfatizar que na Open Science Taxonomy, na prática Open Data, está relacionado o Open Data use and Reuse (FIGURA 2). A prática “openness” não implica que os dados publicados abertamente não devam ser citados, não ter seus autores reconhecidos ou liberados sem indicações de licenças de uso. As questões legais também são apresentadas na Open Science Taxonomy enfatizando a propriedade intelectual dos dados (FIGURA 3).

Figura 3
Aspectos legais direcionados à dados

Os resultados demonstraram que os pesquisadores desconheciam a filosofia da Ciência Aberta e suas diretrizes de compartilhamento de dados

Eu mentiria se dissesse que eu conheço suas diretrizes, li um par de algumas declarações [...] (P2).

[...] a verdade é que não sei muito bem a que esse termo se refere. Eu não conheço (P3).

Quando os pesquisadores foram questionados se estão dispostos a compartilhar seus dados, aplicando a licença Creative Commons (CC0) e cedendo todos seus direitos de autor, P1 e P2 estão totalmente de acordo, entretanto, P3 e P4 estão totalmente em desacordo. Destaca-se que P3 não tinha conhecimento a respeito da abrangência dos direitos de autor, sendo necessário a autora deste artigo explicar o tópico.

Não sei muito bem a que se refere todos os direitos autorais. É que não conheço os detalhes do que significa todos os direitos autorais (P3).

Os resultados obtidos mostram que os princípios FAIR estão diretamente relacionados ao indicador Cultura pois requerem mudanças consideráveis em termos de cultura e prática de pesquisa entre todos os atores envolvidos. Os pesquisadores P1 e P4 declararam que não conheciam o tema, inclusive P4 perguntou o que significava cada uma das questões relacionadas ao tema. Assim, os pesquisadores desconheciam que nos princípios FAIR há menção da indicação da autoria dos conjuntos dos dados, a qual tem aderência com o princípio Findable, e, também, desconheciam que os princípios mencionam sobre as licenças, sobretudo, qual é a indicação para compartilhar os dados, corroborando com o princípio Reusable. Como ao longo da entrevista a autora do artigo foi dialogando com os pesquisadores, P4 fez a seguinte pergunta:

Atuam como diretrizes para melhorar reutilização de dados? (P4)

Com as declarações, um dos autores deste artigo fez uma breve explanação sobre o tema para informá-los sobre o assunto. Após a explanação, P1 destaca que esses são bons princípios e que os dados deveriam ser encontráveis e reutilizáveis. O pesquisador P4 também destaca que “parecem ser bons princípios” e novamente enfatiza que não os conheciam.

Referente ao PGD, é recomendável que seja elaborado observando aspectos como a identificação da propriedade intelectual e as licenças aplicadas aos dados, o que contribui para evitar futuros problemas e conflitos éticos e legais inclusive conflitos decorrentes de violações de propriedade intelectual. Os pesquisadores desconheciam ou tinham pouca clareza sobre o tema, destacando-se a fala de um dos pesquisadores:

É que eu não o conheço, sem dúvida que estamos por fora do assunto [...] ao declarar este plano, eles o pedem para que?” (Um dos pesquisadores).

A obrigatoriedade do envio do PGD não é unânime entre as agências de fomento. Assim, um dos pesquisadores mencionou que a elaboração para o seu projeto não estava prevista, sendo assim, não foi elaborado. As agências de fomento podem dispor de requisitos específicos para o compartilhamento dos dados. Dependendo das orientações do edital, é possível disponibilizar os dados com aplicação de licenças.

Os pesquisadores foram questionados até que ponto estavam de acordo com as políticas obrigatórias do financiador sobre compartilhamento de dados, considerando a liberação com menor restrição. Destaca-se que os projetos liderados por eles receberam financiamento. Os pesquisadores P1, P3, e P4 concordam totalmente, enquanto P2 discorda moderadamente.

As agências indicam em suas instruções a possibilidade de disponibilizar os dados via repositórios. O índice Repositório está vinculado ao Pilar Normativo do framework. As respostas dos pesquisadores indicam claramente que eles não se informaram a respeito das políticas do repositório quando forneceram seus conjuntos de dados, evidenciando a falta de clareza ou desconhecimento das mesmas. Com as respostas, é possível identificar uma possível lacuna na divulgação e até mesmo na conscientização da relevância do compartilhamento dos dados e da visibilidade que é possível alcançar com o depósito em repositórios.

As respostas dos pesquisadores chamam a atenção por alguns fatores: primeiro pelo fato do pouco esclarecimento sobre as orientações e políticas do repositório; segundo, por um dos pesquisadores não ter conhecimento que os conjuntos de dados de seu projeto estavam disponibilizados via repositório; terceiro, outro pesquisador não sabia o nome do repositório e o confundiu com outro.

Os repositórios elaboram suas diretrizes e normas baseadas em Leis e diretrizes. De fato, é notório a importância de Leis e diretrizes que orientem e regularizem os aspectos da propriedade intelectual para que a comunidade científica disponha de um sistema que gere confiança no compartilhamento e reuso dos dados e, assim, contribuir para assegurar a fluidez nos processos da comunicação científica, a fim de minimizar o receio pela perda da originalidade nos seus estudos, possibilidades de plágio e uso indevido dos dados.

Os pesquisadores relataram ter pouco conhecimento sobre as Leis e diretrizes a respeito da propriedade intelectual, como destacado:

Eu a vi muito por acima [...] eu não conheço toda a legislação, principalmente porque é uma coisa terrivelmente imensa a da propriedade intelectual. [...] Porque, além disso [...] ao invés de eliminar tudo e fazer algo novo bem, eles vão adicionando, modificando uma coisa à outra [...] (P2, grifo nosso).

É que eu não sei quais são as regras de propriedade intelectual [...]. Eu sei que há uma tendência que os dados devem ser abertos, é a única coisa que eu sei, mas toda a legislação e diretrizes eu não conheço, não conheço (P4, grifo nosso).

As respostas dos pesquisadores revelam a ausência ou perda das referências normativas. Destaca-se a fala de um dos pesquisadores onde menciona que a legislação é extensa e com várias modificações e que, segundo o pesquisador, deveria eliminar a lei existente e fazer uma nova, e, também, de outro pesquisador que sabe da tendência do acesso aberto aos dados, sem fazer referência a Lei.

A continuação, o pesquisador P2 menciona aspectos que podem levar a confusão das normas ou descumprimento das mesmas:

Eu sei que toda vez, ao meu modo de ver, vai se tornando mais complicado as questões que nos afetam como o direito de citação e o direito de reprodução que, alguns anos atrás, era manifestado de uma forma bastante mais aberta [...]

Um segundo aspecto destacado pelo mesmo pesquisador:

[...] nossa disciplina, por um lado, não há esse costume de depositar e, por outro lado, tampouco, como diria em muitos casos, são pesquisas tão específicas que a possibilidade de que alguém vá acessar estes conjuntos de dados e utilizá-lo, pois, é muito, muito remoto.

Mesmo que os pesquisadores tenham em mente que seus dados não são de interesse para outros, a disponibilização pública dos dados propicia benefícios. O índice Benefício, pertencente à Categoria Carreira do framework, está relacionado ao direito moral visto que engloba o direito do autor sobre seus conjuntos de dados. O compartilhamento dos conjuntos de dados, possibilita aumentar o número de citações e, consequentemente, o aumento das métricas e reconhecimento entre seus pares. Nos aspectos citados, os pesquisadores concordam, mas com a ressalva de que é difícil mensurar ou demonstrar tais aumentos. Com a reposta do pesquisador P1, é possível relacionar o índice Benefício ao índice Esforços. O pesquisador comenta que a avaliação dos dados por pares permite ao pesquisador melhorar a análise de seus dados tornando-os mais confiáveis e mais rigorosos cientificamente.

Outro pesquisador relata que não acompanha se há aumento das citações, e complementa

O problema sempre neste tipo de consideração é que, geralmente, é muito difícil ser capaz de demonstrá-lo. Isso significa que você teria que ter um universo paralelo no qual eu não tivesse publicado esses materiais e saber se eu era mais conhecido ou não por publicá-lo. Eu suponho que sim, que algo aumentou. Particularmente eu não tenho visto (P2, grifo nosso).

Outro quesito relacionado aos Benefícios, e que está relacionado ao índice Esforços, é o reconhecimento entre pares. Na mesma linha de pensamento relacionada ao Índice Esforços, para o pesquisador P3, os dados devem ter autoria associada para dar referência ao trabalho, assim como ter referência para as atualizações ou correções dos dados.

[...] parece-me que é razoável que dados que requerem muito trabalho gerar e requerem muito esforço, tenham uma referência da pessoa que gerou, da equipe de pesquisa que gerou essa informação, por um lado para dar reconhecimento ao trabalho que foi feito [...] (P3, grifo nosso).

Sobre os riscos na carreira, a maioria dos pesquisadores concorda sobre o risco de não serem citados. Um dos pesquisadores enfatiza a anomia no sentido do descumprimento das regras e boas práticas de citação que poderiam acontecer com os dados, da mesma forma que ocorre com as publicações tradicionais, demostrando o descumprimento das regras estabelecidas

Nós também temos os materiais publicados por outras vias, então, quem não vai nos citar, pois, não nos citariam igual por um [repositório] ou por outro. É, infelizmente, uma prática bastante usual [...] (P2, grifo nosso).

O prisma apontado por P1 menciona práticas de plágio, o que é observado em pesquisas científicas, onde é possível que o mesmo se estenda aos dados publicados. Com a fala de outro pesquisador, percebe-se sua preocupação de não ter seu nome vinculado com a propriedade intelectual dos dados, o que levaria a não citação

[...] estou dando a conhecer [os dados] com todo o prazer, mas minha autoria não está clara [...] não aparece, ou seja, se procurar no repositório não sabe que esses dados correspondem a mim, ao fato de compartilhar os dados, então isso é incômodo porque sim, realmente deveria citar por essa referência e não se é citado assim (P4, grifo nosso).

Esforços, último índice da Carreira está associado ao índice Benefícios. Disponibilizar os dados publicamente antes das publicações dos resultados das pesquisas e das análises dos dados pode depender do quanto de esforço o pesquisador teve, e como ele avalia o cenário para a publicação dos dados. É possível verificar esse aspecto na fala do pesquisador 1:

[...] publica [os dados] dependendo do tipo de esforço. Em nosso caso que tem sido uma longa pesquisa de anos e publicamos [os dados] abertamente em uma página Web depois de ter feito uma série de publicações. Não foi uma publicação foi um grupo de publicações (P1, grifo nosso).

Destaca-se os pesquisadores têm pouco conhecimento na gestão de dados para torná-los disponíveis. A fala de um dos pesquisadores se alinha aos apontamentos de Merton (1973MERTON, R. K. The normative structure of science. In.: MERTON, R. K. The Sociology of Science: theoretical and empirical Investigations, University of Chicago Press: Chicago, 1973. p. 223-280.) sobre a motivação de pesquisadores: recompensa e punição e, também, ao índice Benefício, pois seus esforços trazem recompensas como o prestígio entre seus pares.

Neste momento eu tenho [certa habilidade para a gestão de da dos]. Em um tempo eu tive algum problema de preguiça por falta de habilidades porque significa um esforço e um esforço de tempo significa [...] recompensa em termos de prestígio (P1, grifo nosso).

Declarações de outros pesquisadores revelam preocupações com o compartilhamento dos dados no caso de terceiros se beneficiarem quando concorrentes em bolsa de estudo ou contrato profissional. Percebe-se que esses são fatores que podem, também, influenciar a carreira e, consequentemente, influenciar na retenção dos dados pois os pesquisadores percebem os riscos associados com seus esforços. Em outra fala, o pesquisador, novamente, demostra sua preocupação em não ter seu nome associado a autoria dos dados, aspecto que pode causar entendimento do mesmo de que terceiros utilizarão seus dados sem dar sus devidos créditos. Em outra fala, um pesquisador declara que caso seu esforço favoreça outros pesquisadores, ele ficará feliz. Todas as falas se conectam com os outros índices da categoria Carreira do pesquisador.

O Suporte dos bibliotecários está vinculado à categoria Recursos do framework. A respostas dos pesquisadores revela que os mesmos não participaram de treinamentos oferecidos pelos bibliotecários e não tiveram incentivos para depositar seus dados no repositório. Nesse aspecto, é possível perceber que, apesar de todo o trabalho realizado pelos profissionais, os pesquisadores não têm familiaridade com tal trabalho junto aos dados e aos repositórios. Em uma das falas dos entrevistados, é relatado que o mesmo só depositou seus dados depois de um contato com a biblioteca para solicitação de International Standard Serial Number (ISSN) e, posteriormente, entraram em contato e o consultaram sobre a possibilidade de disponibilizar seus dados no repositório.

Os Benefícios para a sociedade estão vinculados à categoria Social do framework. Ao longo das entrevistas os pesquisadores mencionaram diversos fatores que beneficiam a sociedade com o compartilhamento dos dados como colaborações de pesquisas, projetos conjuntos, manejo de dados reais e conhecimento de pesquisas que não estavam previstas.

O último índice, Ética, vinculado à categoria Social perpassa os outros índices do framework, assim como o índice Cultural. Fatores como pressão da comunidade científica ou das exigências das agências de fomento têm o potencial de fazer com que os autores disponibilizem seus dados e renunciem ou não a todos os direitos de autor, colocando seus dados em domínio público. Em relação ao aspecto apresentado, na fala de um dos pesquisadores é possível notar ambos fatores: pesquisadores que concordam em colocar seus dados em domínio público e a pressão institucional:

Nós, como muitos, podemos aspirar [aos direitos autorais] e o fazemos mais por estas obrigações acadêmicas de usar os direitos morais de autoria. Temos uma página na web, porque [os usuários] têm que nos citar dessa forma. Digamos que seria a postura que adotamos e a postura institucional como projeto, mas, a verdade é que muitas vezes eu estaria incluso mas perto da postura de liberação para o domínio público, inclusive abrir mão do direito de citar [...] digamos que nós mantemos, acima de tudo, para esse assunto acadêmico, e que depois veem e nos perguntam: como se cita? como colocamos? que impacto tem? e como é que nós mantemos? (P2, grifo nosso).

Referente à questão sobre o dever ético dos investigadores de compartilhar os dados em acesso aberto, todos os pesquisadores estão totalmente de acordo. Destaca-se que nos depoimentos anteriores, os pesquisadores enfatizaram que só compartilharam seus dados depois das publicações dos artigos e, em algumas falas, foram enfatizadas que só depois. Na fala de um dos pesquisadores é destacado a carência de infraestrutura suficiente para armazenar e gerir todos os dados que podem ser disponibilizados:

[...] devem compartilhar, mas não mobilizar moralmente, eu acho que deveria ser obrigatório, mas não posso exigir a partir do momento em que vejo que não há infraestrutura suficiente (Um dos pesquisadores).

Em depoimento de outro pesquisador foi apresentada a preocupação de o sistema da publicação científica dos dados se alinhar ao mesmo da publicação tradicional em que periódicos comerciais fiquem como detentores dos dados e a comunidade científica ter como opção o mesmo que no sistema vigente atual: pagar para publicar os dados ou para acessá-los.

Outro pesquisador reflete sobre o papel das instituições públicas nos níveis nacional e internacional para o financiamento de pesquisas e a utilização de materiais de pesquisa com fins comerciais, além da forte cultura enraizada que gira em torno dessa dinâmica. O pesquisador faz um destaque de tal sistema ser “imoral”.

O cenário apresentado relaciona fatores institucionais e profissionais com as perspectivas e percepções de pesquisadores. As instituições consistem de estruturas cognitivas, normativas e reguladoras, os três pilares propostos em Scott (1995SCOTT, W. R. Contemporary institutional theory. In.: SCOTT, W. R. Institutions and organizations. London: Thousand Oaks: SAGE, 1995. cap. 3, p. 32-62.), apresentados no artigo e que compuseram o framework (FIGURA 1) e provêm estabilidade nos comportamentos sociais onde cada pilar fornece uma base para a legitimidade. As influências cognitiva, normativa e reguladora apontam ter uma relação expressiva com as atitudes de compartilhamento de dados.

Para que os pesquisadores compreendam o comportamento social é preciso considerar os significados que intermedeiam a ação social. Os mesmos atribuem significados aos eventos em sua volta, mas não respondem mecanicamente aos estímulos ou fatores inibidores; primeiro eles os interpretam e, em seguida, moldam sua ação e comportamentos (SCOTT, 1995SCOTT, W. R. Contemporary institutional theory. In.: SCOTT, W. R. Institutions and organizations. London: Thousand Oaks: SAGE, 1995. cap. 3, p. 32-62.).

Com relação à categoria Normativo (Ciência aberta, Princípios FAIR, PGD, Agências de fomento e Repositórios) a introdução e ampla divulgação dos princípios e concepções da Ciência aberta e princípios FAIR, além das orientações e exigências das agências de fomento em seus vários tópicos, estão primando pelo modelamento da cultura das comunidades científicas para o compartilhamento dos dados, tendo em sua disponibilização, mudanças na cultura de todos os envolvidos e no modus operandi da pesquisa e sua comunicação.

Os achados da análise dos dados se fundamentam na ideia da teoria da anomia de Robert Merton e Emile Durkheim. A teoria de Durkheim (1999DURKHEIM, E. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 1999.) teve sua gênese no período pós-revolução Industrial, final do século 19 e início do século 20, momento em que ocorriam mudanças sociais com o êxodo rural, ocasionando transformação social e, também, o enfraquecimento das normas, as quais a maior parte da população não conseguia compreender as mesmas normas e os mesmos valores. Para o autor, o conceito de anomia enfatiza a incapacidade sofrida pelo indivíduo de reconhecer as regras sociais que, depois de afetadas por mudanças repentinas na estrutura normativa, dificultam indivíduos a se submeterem a elas.

Correlativamente as considerações de Durkheim (1999DURKHEIM, E. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 1999.), o contexto dos pesquisadores indica transformações com as novas práticas científicas, incluindo a gestão dos dados para o compartilhamento. As respostas dos pesquisadores demostram a pouca aptidão do trabalho com a gestão dos dados de pesquisa em seu ciclo de vida a fim de prepará-los para o compartilhamento, assim como a limitação em reconhecer ou compreender as regras e cumpri-las como foram propostas.

De forma semelhante a Durkheim (1999DURKHEIM, E. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 1999.), Merton (c1968MERTON, R. K. Sociologia: teoria e estrutura. São Paulo: Mestre Jou, c1968.) apresenta a anomia enfatizando, também, a incapacidade da estrutura social em proporcionar a certas pessoas o que precisam para superarem seus desafios sociais. Esse aspecto pode ser relacionado aos resultados apresentados, destacando uma das falas dos pesquisadores ao mencionar que o compartilhamento de dados deveria ser obrigatório, mas na medida que a infraestrutura seja suficiente para todos os dados. Da mesma forma, outra fala aponta indícios que os repositórios não teriam profissionais em quantidade suficiente ou capacitados para todo o trabalho e suporte aos pesquisadores. Seguindo os preceitos dos autores, a anomia é, também, a incapacidade de pesquisadores atingirem as metas propostas devido a insuficiência de meios institucionalizados para tal.

Merton (c1968MERTON, R. K. Sociologia: teoria e estrutura. São Paulo: Mestre Jou, c1968.) relaciona a estrutura social e os valores da estrutura cultural. Para o autor, a estrutura cultural, com seus valores normativos, serve para estabelecer as metas da sociedade, e a estrutura social, estabelecer quais são as normas institucionais, mostrando quais são os meios encontrados na sociedade para chegar até as metas.

A percepção e crenças dos pesquisadores sobre carreira (Benefícios, Riscos e Esforços), aspectos sociais (Benefícios para a sociedade e Ética) e recursos disponíveis (Suporte dos bibliotecários) podem influenciar seus comportamentos em relação ao compartilhamento de dados e tem potencial de alinhar com os ideais apresentados da comunicação científica. Merton (1973MERTON, R. K. The normative structure of science. In.: MERTON, R. K. The Sociology of Science: theoretical and empirical Investigations, University of Chicago Press: Chicago, 1973. p. 223-280., p. 274, tradução nossa) preconizava que “A concepção institucional da ciência como parte do domínio público está ligada ao imperativo de comunicação das descobertas. O sigilo é a antítese dessa norma”. Os resultados demonstram que as atitudes de compartilhamento dos pesquisadores corroboram com os preceitos de Merton (1973) quando relacionadas à comunicação de seus dados ser feita após a comunicação de suas descobertas com a publicação científica tradicional.

Conforme apresentado no índice Carrera, a gestão dos dados ao longo do seu ciclo de vida é relevante para as publicações científicas. A comunicação científica é imprescindível para o desenvolvimento da ciência, geração de novos conhecimentos e reconhecimento das pesquisas realizadas por outros pesquisadores. A comunicação dos dados fornece insights para novas análises e descobertas contribuindo para novas comunicações. Os dados são, portanto, parte de um ciclo de credibilidade, que lhes confere um valor de uso (para a produção de novas publicações) e um valor de troca (como moeda de troca no contexto de colaborações com parceiros).

Referente aos índices Benefícios para a sociedade e Ética, eles podem influenciar os comportamentos dos pesquisadores em relação ao compartilhamento de dados. Isso sugere que tais índices têm o potencial de apoiar a conscientização dos pesquisadores em comportamentos que levam ao compartilhamento de dados, mesmo antes da conclusão dos projetos e publicação de todos os resultados.

6 CONCLUSÕES

Este artigo apresentou indícios para a compreensão de fatores que podem levar pesquisadores a um estado de anomia resultando na redução do compartilhamento de dados. A anomia é utilizada sob a perspectiva dos autores Durkheim e Merton em que o conceito está relacionado à falta de clareza e conhecimento de normas, descumprimento de regras institucionais ou sociais, perda de referências normativas, recompensas e intimidação.

O framework apresentado contém cinco categorias e 13 índices. As categorias Cognitivo, Normativo, Regulador, Carreira, Recursos e Social, e seus respectivos índices Cultural, Ciência aberta, Princípios FAIR, PGD, Agências de fomento, Repositório, Normas e Leis, Benefícios, Riscos, Esforços, Suporte dos bibliotecários, Benefícios para a Sociedade e Ética, têm potencial para influenciar a atitude de pesquisadores em compartilhar ou reter seus conjuntos de dados. Para o enfoque do artigo, todos os índices foram relacionados ao Direito autoral.

O framework oferece um cenário de prováveis fatores influenciadores que podem induzir ou inibir os pesquisadores em relação ao processo de compartilhamento de dados. Assim, foi apontado que o framework poderia direcionar futuras pesquisas em vários aspectos da gestão de dados e seu compartilhamento, bem como em diferentes áreas do conhecimento. Foi adicionado a possibilidade de relacionar outras temáticas além do direito autoral.

Os pesquisadores envolvidos no contexto apresentado precisam de orientações sobre direitos autorais, tanto moral quanto patrimonial, e, assim, evitar um estado de anomia que possa impactar negativamente a aderência entre suas percepções, perspectivas e o compartilhamento de dados.

Os pesquisadores demonstraram não ter habilidades para preparar seus dados para reutilização e, ainda, pouca clareza das normas e condutas necessárias relacionadas aos elementos presentes nos índices do framework: Ciência aberta, Princípios FAIR, Agências de fomento, Plano de gestão de dados, Repositório e Suporte dos bibliotecários, sendo possível notar a imprescindibilidade de upgrade nos serviços de dados. Os resultados sugerem indícios de que embora esses temas tenham sido apresentados no contexto europeu há vários anos e o compartilhamento dos dados, em muitos casos, são estimulados ou mesmo estabelecidos por agências de fomento, podem ter pesquisadores que estão no estado de anomia pois desconhecem ou não tem clareza de suas normas e orientações.

Esses resultados contribuem para entender as percepções de pesquisadores e seus comportamentos no compartilhamento de dados, e levantam algumas questões relevantes para promover melhores práticas de compartilhamento de dados.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    02 Set 2022
  • Aceito
    22 Jun 2023
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