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Agradecemos o privilégio de receber comentários de pensadores tão importantes, como Barros, Zoboli e Oliveira, ao nosso artigo, representativos do movimento da reforma sanitária brasileira e da reflexão sobre as relações entre o Sistema Único de Saúde e a indústria farmacêutica. Suas considerações, que aqui comentaremos com a brevidade que o espaço permite, possibilitarão, aos leitores, uma visão complementar ao exposto e debatido em nosso artigo. Embora tenhamos procurado dar um foco, em nossa abordagem, para a questão específica da promoção e propaganda de medicamentos nos espaços de ensino-aprendizagem da Medicina, nossos comentadores incluíram a discussão mais geral sobre as relações entre a indústria farmacêutica e as Escolas Médicas e/ou sociedades científicas. Ofereceram também, aos leitores, acesso a importante material de referência que não havia sido incluído em nosso trabalho original. Sobre esta relação mais geral, faremos alguns comentários mais adiante, já que, inicialmente, focaremos no objeto específico deste artigo: a propaganda de medicamentos nos ambientes acadêmicos.

A princípio, gostaríamos de destacar que não propomos uma nova legislação que proíba a propaganda para estudantes de medicina. Essa regulamentação já existe e está em vigor. Ela proíbe a propaganda a não prescritores, e os estudantes de medicina não são prescritores, a despeito dos desvios existentes no campo da sua formação prática na qual, muitas vezes, atuam efetivamente como médicos, embora contem apenas com uma supervisão meramente formal de seus professores. Assim, ou se muda a regulamentação já existente, para tornar essa prática autorizada, ou se cumpra o que já está previsto. Mas estão certos nossos comentadores quando, implicitamente, reconhecem que não nos anima o propósito da discórdia ou de algum ato discriminatório contra algum segmento da Economia brasileira. Entendemos, sim, que o setor como um todo precisa ser regulamentado, e defendemos que essa regulamentação se dê mediante um amplo debate que deixe claro os legítimos interesses em jogo. Mas, por outro lado, não se pode abrir mão de alguns princípios balizadores desse debate, negligenciando a proteção da população usuária dos serviços de saúde e clientes da indústria farmacêutica e da medicina, em prol de interesses de um segmento específico da população. Por outro lado, as consultas públicas que a Anvisa salutarmente realiza têm pouca transparência, deixando de apresentar, de forma clara e inequívoca, os critérios utilizadas para incorporar, ou não, as considerações apresentadas por entidades e/ou pessoas físicas em geral, como no caso da consulta pública sobre a RDC 102 (consulta Pública 84 em 2005), referidas tanto por Barros como por Oliveira.

O poder econômico e político da indústria farmacêutica é quase incomensurável na área da saúde. Daí que a proteção de indivíduos e organizações deve ser maximizada, para que não sejam esses indivíduos - médicos, professores ou estudantes isoladamente - os responsáveis por lidarem com essa relação. Diz-se hoje, sem nenhum constrangimento, que não se faz um Congresso Médico sem o apoio da indústria farmacêutica. E não é, de fato, o problema esse apoio não ser desinteressado. É razoável que a indústria tenha o seus interesses, mas as programações dos congressos ou reuniões científicas, os temários, os expositores convidados e, até mesmo, as atividades que terão repercussão na mídia não podem ser, de forma alguma, impostas pela indústria, como habitualmente acontece, ainda que formalmente eles apenas apresentem "sugestões ".

Como se opor a uma influência indevida, da indústria, a esse poderio econômico? Poderio este que é visto, por grande parte das corporações da saúde, como algo benéfico, posto que atende a seus interesses imediatos; e elas não fazem uma avaliação das implicações dessa atuação em uma perspectiva mais duradoura. Hoje, boa parte dos eventos, científicos ou não, dos estudantes de medicina - a despeito das posições defendidas por sua organização maior, a DENEM (Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina) - é patrocinada pela indústria farmacêutica. Quando questionados sobre essa prática, minimizam sua relevância por não haver interferência direta nas programações dos eventos, que se limitam à distribuição de brindes e folhetos. Isso, de fato, é verdade, já que faz parte de um pacote maior de relacionamentos que inclui, como bem assinalou Zoboli, almoços e outros brindes. É o estabelecimento de uma relação que esperam seja capaz de interferir na efetiva prescrição dos futuros médicos, em detrimento da estrita racionalidade científica e da adequada avaliação ética que deveria orientar sua conduta.

Todavia, discordamos da generalização implícita na afirmação de Oliveira, de que medida de controle "já vem sendo utilizada com sucesso há bastante tempo por diversas entidades médicas e de representação do setor saúde em seus eventos científicos ". De fato, ninguém desconhece que as ações que o Conselho Federal de Medicina tem implementado vão, de fato, na direção de se evitar qualquer relacionamento que sugira a possibilidade de conflito de interesses. O mesmo não se pode dizer das associações científicas médicas - algumas chegam a emprestar seu prestígio apoiando peças publicitárias destinadas ao público em geral, sabe-se lá o porquê.

E para não parecer que apenas os médicos e a medicina estão expostas a esse tipo de influência ou conflito de influência, podemos assinalar que ele se verifica entre todo setor que se dedica a produzir recursos necessários para determinadas práticas profissionais e seus praticantes. Observa-se também, tal tipo de influência, por exemplo, na prática odontológica, na fisioterápica, na fonoaudiológica, mas, certamente, em nenhum desses campos profissionais a interferência da indústria é tão sistemática e disseminada como na prática médica.

Assim como os comentadores, acreditamos que as relações das universidades com a indústria devem ser objeto de regulação cada vez mais estrita, para que se possa, efetivamente: proteger a liberdade de pesquisadores e professores, garantir o rigor científico com que lidam com as inovações tecnológicas, e - nosso foco central - permitir que se desenvolva, na comunidade de ensino, um espírito crítico em relação às informações provenientes dos representantes farmacêuticos. Evitar o contato destes últimos com os estudantes certamente promoverá distanciamento fundamental para que se possa avaliar criticamente a propaganda da indústria. Da mesma forma, as universidades devem deixar muito claros os valores que adotam. Se priorizam a assistência e bem-estar dos pacientes que procuram seus serviços, basearão a conduta terapêutica no conhecimento científico, e não na propaganda da indústria.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Ago 2012
  • Data do Fascículo
    Dez 2008
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