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Psicotrópicos e Atenção Primária à Saúde: a subordinação da produção de cuidado à medicalização no contexto da Saúde da Família

Psychotropic drugs and Primary Health Care: the subordination of care provision by medicalization in the context of Family Health

Psicotrópicos y Atención Primaria de la Salud: la subordinación de la producción de cuidado a la medicalización en el contexto de la Salud de la Familia

Resumos

Este estudo teve como objetivo compreender o fenômeno da medicalização e do uso de psicotrópicos em longo prazo com base na percepção dos usuários de uma Unidade de Saúde da Família (USF). Trata-se de um estudo qualitativo, fundamentado no método autobiográfico e na narrativa do sujeito. Utilizou-se um roteiro para conduzir entrevistas semiestruturadas, realizadas com usuários intencionalmente selecionados. A análise temática possibilitou vislumbrar a incorporação da medicamentalização nas concepções de vida e de sofrimento dos usuários no contexto da Saúde da Família (SF), perspectiva que vai ao encontro da medicalização social e tem subsídio no modelo biomédico que subordina o processo de trabalho da Atenção Primária à Saúde (APS).

Palavras-chave
Psicotrópicos; Medicalização; Atenção primária à saúde


This study aimed to understand the medicalization of the long-term use of psychotropic drugs from the perception of users of the services provided by a Family Care Center. We conducted a qualitative study using autobiographical narrative analysis using semi-structured interviews with services users selected using purposeful sampling. The thematic analysis revealed that medicalization was incorporated into the life concepts and suffering of service users, which is consistent with social medicalization supported by the biomedical model, which subordinates Primary Health Care work processes.

Keywords
Psychotropic drugs; Medicalization; Primary health care


El objetivo de este estudio fue entender el fenómeno de la medicalización y del uso de psicotrópicos a largo plazo a partir de la percepción de los usuarios de una Unidad de Salud de la Familia. Se trata de un estudio cualitativo, fundamentado en el método autobiográfico y narrativa del sujeto. Se utilizó un guion para realizar entrevistas semiestructuradas, realizadas con usuarios intencionalmente seleccionados. El análisis temático posibilitó vislumbrar la incorporación de la medicamentalización en las concepciones de vida y de sufrimiento de los usuarios en el contexto de la salud de la familia, perspectiva que sale al encuentro de la medicalización social y tiene subsidio en el modelo biomédico que subordina el proceso de trabajo de la Atención Primaria de la Salud.

Palabras-chave
Psicotrópicos; Medicalización; Atención primaria de la salud


Introdução

Esta pesquisa se debruça sobre o fenômeno da medicalização, circunscrevendo-o no cuidado em saúde e tomando-o como categoria de análise para o problema do consumo excessivo de psicotrópicos no contexto da Atenção Primária à Saúde (APS). A evolução histórica do conceito de medicalização vem provocando sua complexificação, sua ramificação e sua polissemia, situação que justifica a necessária apreensão de um determinado referencial teórico para elucidar as lentes que auxiliarão nossas análises.

Nesse sentido, Conrad11 Conrad P. The medicalization of society. Baltimore: Johns Hopkins University Press; 2007. tem sido um dos teóricos utilizados na problematização dos dados empíricos oriundos do trabalho em saúde, sob o enfoque de três níveis processuais da medicalização: conceitual, institucional e interacional, definindo-a como o processo pelo qual problemas não médicos são definidos e tratados como problemas médicos, reduzindo-os a doenças ou transtornos diagnosticáveis11 Conrad P. The medicalization of society. Baltimore: Johns Hopkins University Press; 2007.,22 Camargo KR Jr. Medicalização, farmacologização e imperialismo sanitário. Cad Saude Publica. 2013; 29(5):844-6. Doi: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000500002.
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. Esse horizonte, contudo, tem-se ampliado de tal modo que aponta a ocorrência generalizada de uma “medicalização do social”11 Conrad P. The medicalization of society. Baltimore: Johns Hopkins University Press; 2007.

2 Camargo KR Jr. Medicalização, farmacologização e imperialismo sanitário. Cad Saude Publica. 2013; 29(5):844-6. Doi: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000500002.
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3 Birman J. Mal-estar na atualidade. A psicanálise e as novas formas de subjetivação. 3a ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2000.
-44 Ferrazza DA, Luzio CA, Rocha LC, Sanches RR. A banalização da prescrição de psicofármacos em um ambulatório de saúde mental. Paideia (Ribeirão Preto). 2010; 20(47):381-90. Doi: https://doi.org/10.1590/S0103-863X2010000300010.
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No subprocesso conceitual, situa-se a prática médica em seu aspecto político do gerenciar a vida humana, assumindo o papel normativo e pedagógico cuja ação permanente culmina no corpo social. A racionalidade médica, mais evidente no campo da Saúde Mental, atua no caminho de distribuir conselhos, regendo as relações físicas e morais do indivíduo e da sociedade. A cada dia apresentam-se novas rotulações diagnósticas e novas formas de tratamento do sofrimento psíquico, criando termos e definições terapêuticas que se tornaram parte da linguagem cotidiana44 Ferrazza DA, Luzio CA, Rocha LC, Sanches RR. A banalização da prescrição de psicofármacos em um ambulatório de saúde mental. Paideia (Ribeirão Preto). 2010; 20(47):381-90. Doi: https://doi.org/10.1590/S0103-863X2010000300010.
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,55 Zorzanelli RT, Cruz MGA. The concept of medicalization in Michel Foucault in the 1970s. Interface (Botucatu). 2018; 22(66):721-31. Doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622017.0194.
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No alinhamento entre a medicalização e o avanço da racionalidade biomédica hegemônica, o modelo de saúde está centrado no reducionismo, no individualismo e na tecnologização66 Clark J. Medicalization of global health 1: Has the global health agenda become too medicalized? Glob Health Action. 2014; 7(1):23998. Doi: https://doi.org/10.3402/gha.v7.23998.
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,77 Barbosa VFB, Cabral LB, Alexandre ACS. Medicalization and indigenous health: an analysis of the consumption of psychotropics by the xukuru de cimbres indigenous people. Cienc Saude Colet. 2019; 24(8):2993-3000. Doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232018248.22192017.
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. A abertura do saber médico à medicalização de novos espaços, priorizando uma teoria das doenças e da anatomoclínica, apresenta peculiaridades: uma visão do corpo humano como máquina, das doenças como concretas e sem variações em sujeitos e espaços distintos – como questões sociais, subjetivas, históricas e culturais – e da exacerbação do discurso sobre a imperfeição dos corpos. Esse complexo e imbricado sistema dialoga com a lógica capitalista emergente88 Foucault M. O nascimento da medicina social. In: Machado R, organizador. Microfísica do poder. 25a ed. São Paulo: Graal; 2012. p. 143-70.,99 Nogueira C. A sociological view on the epistemic privilege of biomedicine: deconstructing the metanarrative. Saude Soc. 2018; 27(4):1019-32. Doi: https://doi.org/10.1590/s0104-12902018180590.
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Ao visar máxima rentabilidade econômica, a lógica de mercado faz que o humano passe a ser visto como um prolongamento da maquinaria industrial, uma concepção instrumental e mecanicista alinhada à visão médica reducionista99 Nogueira C. A sociological view on the epistemic privilege of biomedicine: deconstructing the metanarrative. Saude Soc. 2018; 27(4):1019-32. Doi: https://doi.org/10.1590/s0104-12902018180590.
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. Esse processo encontra apoio na indústria farmacêutica e ignora os contextos dos sujeitos e da coletividade, reduzindo as explicações de problemas e ignorando os fatores sociais, culturais, psicológicos ou ambientais que influenciam o fenômeno da medicalização33 Birman J. Mal-estar na atualidade. A psicanálise e as novas formas de subjetivação. 3a ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2000.,44 Ferrazza DA, Luzio CA, Rocha LC, Sanches RR. A banalização da prescrição de psicofármacos em um ambulatório de saúde mental. Paideia (Ribeirão Preto). 2010; 20(47):381-90. Doi: https://doi.org/10.1590/S0103-863X2010000300010.
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,1010 Bezerra IC, Jorge MSB, Gondim APS, Lima LL, Vasconcelos MGF. “Fui lá no posto e o doutor me mandou foi pra cá”: Processo de medicamentalização e (des)caminhos para o cuidado em saúde mental na atenção primária. Interface (Botucatu). 2014; 18(48):61-74. Doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622013.0650.
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11 Pelegrini MRF. O abuso de medicamentos psicotrópicos na contemporaneidade. Psicol Cienc Prof. 2003; 23(1):38-41. Doi: https://doi.org/10.1590/S1414-98932003000100006.
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12 Merhy EE. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. 2a ed. São Paulo: Hucitec; 2005.

13 Freitas F, Amarante P. Medicalização em psiquiatria. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2017.

14 Caliman L. Infâncias medicalizadas: para quê psicotrópicos para crianças e adolescentes? In: Caponi S, Vásquez-Valencia M, Verdi M. Vigiar e medicar: estratégias de medicalização da infância. São Paulo: LiberArs; 2016. p. 47-60.

15 Santos RB, Zambenedetti G. Comprensión del actual proceso de medicalización en el contexto de la salud mental. Salud Soc. 2019; 10(1):22-37. Doi: https://doi.org/10.22199/S07187475.2019.0001.00002.
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-1616 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Uso de medicamentos e medicalização da vida: recomendações e estratégias. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2019..

Em um continuum, o processo de medicalização associado ao uso de medicamentos é nomeado medicamentalização, e refere-se à prescrição e ao uso de medicamentos como única terapêutica capaz de responder às situações da vida cotidiana. Desse modo, o uso de psicotrópicos, como recurso terapêutico mais utilizado nos serviços de saúde, é uma das consequências mais notáveis da medicalização1313 Freitas F, Amarante P. Medicalização em psiquiatria. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2017.

14 Caliman L. Infâncias medicalizadas: para quê psicotrópicos para crianças e adolescentes? In: Caponi S, Vásquez-Valencia M, Verdi M. Vigiar e medicar: estratégias de medicalização da infância. São Paulo: LiberArs; 2016. p. 47-60.

15 Santos RB, Zambenedetti G. Comprensión del actual proceso de medicalización en el contexto de la salud mental. Salud Soc. 2019; 10(1):22-37. Doi: https://doi.org/10.22199/S07187475.2019.0001.00002.
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-1616 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Uso de medicamentos e medicalização da vida: recomendações e estratégias. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2019..

Nessa direcionalidade, os psicotrópicos passaram de coadjuvantes a protagonistas dos tratamentos psicológicos e o que se constata nos serviços de saúde são: terapêutica reduzida à farmacologia, com pouca comunicação entre profissionais e usuários; aumento da psicologização dos problemas sociais; ambulatorização da demanda e do uso escasso de tecnologias leves e leve-duras, ou seja, tecnologias relacionais e saberes estruturados1010 Bezerra IC, Jorge MSB, Gondim APS, Lima LL, Vasconcelos MGF. “Fui lá no posto e o doutor me mandou foi pra cá”: Processo de medicamentalização e (des)caminhos para o cuidado em saúde mental na atenção primária. Interface (Botucatu). 2014; 18(48):61-74. Doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622013.0650.
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.

A prevalência de diagnósticos de transtornos mentais na população mundial é de 12%, sendo que mais de 450 milhões de pessoas são acometidas e grande parte desses usuários é atendida na APS. Órgãos internacionais alertam sobre o uso indiscriminado e o controle insuficiente de medicamentos psicotrópicos nos países em desenvolvimento. Estudos realizados no Brasil, Europa e América Latina indicam o aumento da utilização de psicotrópicos nas últimas décadas55 Zorzanelli RT, Cruz MGA. The concept of medicalization in Michel Foucault in the 1970s. Interface (Botucatu). 2018; 22(66):721-31. Doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622017.0194.
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,1717 World Health Organization. Integrating mental health into primary care. Geneva: WHO; 2008.

18 Firmino KF, Abreu MHNG, Perini E, Magalhães SMS. Fatores associados ao uso de benzodiazepínicos no serviço municipal de saúde da cidade de Coronel Fabriciano, Minas Gerais, Brasil. Cad Saude Publica. 2011; 27(6):1223-32. Doi: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000600019.
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-1919 Rodrigues MAP, Facchini LA, Lima MS. Modificações nos padrões de consumo de psicofármacos em localidade do Sul do Brasil. Rev Saude Publica. 2006; 40(1):107-14. Doi: https://doi.org/10.1590/S0034-89102006000100017.
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A APS, que tem na Estratégia Saúde da Família (ESF) sua prioridade para expansão e consolidação, surgiu como aposta e possibilidade para reversão da lógica de Atenção à Saúde, desconstruindo o modelo biomédico e pari passu desenvolvendo o modelo da vigilância à saúde e o da promoção da saúde. Organiza-se com o mais alto grau de descentralização, próximo da vida das pessoas, e deve ordenar o fluxo entre os serviços da rede de saúde e o percurso dos usuários, além de proporcionar uma série de tecnologias e estratégias como escuta qualificada, acolhimento e vínculo2020 Oliveira A, Luchini D Jr, Fonseca GS, Biesek LL, Silva JKO, Cordeiro JMSM, et al. Sofrimento mental atenção básica: abordagens da literatura brasileira. In: Ribeiro EAW, Mota AA, Giraldez CG, organozadores. Conexões da saúde mental e território. Blumenau: Instituto Federal Catarinense; 2019. p. 23-9.

21 Araújo LLC, Oliveira EN, Araújo GG, Gomes FRAF, Gomes BV, Rodrigues ÂB. Distribuição de antidepressivos e benzodiazepínicos na estratégia de saúde da família de Sobral-CE. Sanare (Sobral). 2012; 11(1):45-54.
-2222 Quinderé PHD, Jorge MSB, Franco TB. Rede de atenção psicossocial: qual o lugar da saúde mental? Physis. 2014; 24(1):253-71. Doi: https://doi.org/10.1590/S0103-73312014000100014.
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Pelo exposto, investigar a problemática do uso de psicotrópicos por meio da experiência dos usuários no contexto da APS contribui com novas perspectivas, concepções e interpretações, que possibilitam uma interlocução ampliada com os referenciais da medicalização. Argumenta-se que é nesse contexto que se encontram os usuários de psicotrópicos, em uma penumbra da zona biomédica sem elucidação diagnóstica, em que se medicalizam os sofrimentos mais gerais da vida. Sendo assim, este trabalho pretendeu compreender o fenômeno da medicalização e do uso de psicotrópicos em longo prazo pela percepção dos usuários de uma Unidade de Saúde da Família (USF).

Metodologia

Trata-se de um estudo qualitativo desenvolvido entre julho/2019 e janeiro/2020 em um município localizado no centro-oeste paulista com população estimada de 146.497 habitantes2424 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Portal Cidades: População: Botucatu [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2020 [citado 23 Ago 2020]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/
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. Durante a coleta de dados, a APS compunha-se de 21 serviços: duas unidades de Centro Saúde Escola, sete Unidades Básicas de Saúde (UBS) e 12 USF. Assim, 59,76% da população dispunha de cobertura de algum serviço da APS, sendo que 40,50% referente ao modelo Saúde da Família (SF)2525 e-Gestor Atenção Básica: informação e gestão da Atenção Básica [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2020 [citado 21 Ago 2020]. Disponível em: https://egestorab.saude.gov.br/paginas/acessoPublico/relatorios/relHistoricoCoberturaAB.xhtml;jsessionid=b41rHT2h+feGxJjd6TwXjk5Y
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Selecionou-se uma USF como cenário da investigação, considerando ter sido uma das primeiras inauguradas no referido modelo e o fato de os pesquisadores estarem vinculados à unidade. Acerca da organização, conta com duas equipes mínimas de SF, dividindo a mesma estrutura física. Quinzenalmente, ocorrem reuniões de matriciamento com profissionais que compõem o Núcleo de Apoio da Família (Nasf) – Saúde Mental. Integram o processo de trabalho dessa USF, profissionais vinculados a um Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família.

Utilizou-se a amostragem intencional2626 Ritchie J, Lewis J, Nicholls CM, Ormston R. Qualitative research practice: a guide for social science students and researchers. 2a ed. London: SAGE Publications; 2014. para seleção dos participantes, elencando os seguintes critérios de inclusão: 1) residir na área de abrangência por pelo menos cinco anos; 2) utilizar antidepressivo, benzodiazepínico, ou ambos, por ao menos cinco anos e prescrito pelo médico generalista da USF; 3) não realizar, durante o período de coleta de dados, acompanhamento psiquiátrico no âmbito público ou particular; 4) não possuir diagnóstico psiquiátrico; e 5) não possuir repercussões cognitivas que inviabilizem a participação na coleta de dados. Foram considerados critérios de exclusão: idade menor de dezoito anos e utilização de psicotrópicos devido a causas orgânicas.

Pretendeu-se com tais critérios garantir vínculo entre os participantes, a USF e seu território, e ratificar a prescrição medicamentosa com base em uma queixa inespecífica que não estivesse relacionada a transtornos mentais graves e persistentes. Foram utilizados prontuários individuais que continham informações sobre os usuários e o histórico de uso de psicotrópicos para identificar aqueles que poderiam ser convidados a compor a amostra.

O convite foi realizado individualmente por meio de ligação telefônica e foi possível observar o interesse em colaborar, dadas a disponibilidade e a não ocorrência de recusas. Ao aceitar o convite, uma data era agendada para realização das entrevistas que ocorreram entre setembro e outubro de 2019. A coleta de dados foi feita pela primeira autora, então residente em SF, em um consultório da USF. Ressalta-se que não havia relação prévia com os participantes. O procedimento era iniciado por uma explicação sobre a pesquisa e as etapas inerentes ao processo investigativo, solicitando a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Utilizou-se a entrevista semiestruturada tendo como base um roteiro para coleta de dados composto de duas partes: um questionário sociodemográfico e clínico com questões fechadas, com o objetivo de levantar informações para caracterização da amostra, e em seguida uma questão norteadora: “Como tem sido sua experiência de vida a partir do momento em que iniciou seu tratamento com uso de medicações psicotrópicas/ansiolíticas?” As entrevistas tiveram duração média de trinta minutos, foram gravadas em áudio para posterior transcrição integral de seu conteúdo e constituíram o material qualitativo para a análise. Não foram realizadas repetições, retorno das descrições e anotações durante a coleta.

Importa ressaltar que o roteiro e a questão norteadora foram submetidos a um pré-teste no mesmo cenário onde a pesquisa foi conduzida. Fundamentou-se no referencial autobiográfico e na narrativa do sujeito permitindo ao participante expor sua experiência em torno do objeto de estudo estabelecido2323 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14a ed. Rio de Janeiro: Hucitec; 2014.. Essa etapa favoreceu também o procedimento de coleta uma vez que a pesquisadora pôde aprimorar sua abordagem.

A análise se deu concomitantemente à coleta de dados; a interrupção e a quantidade dos participantes foram estabelecidas pois nenhum novo dado surgiu das entrevistas concluídas. A coleta foi encerrada com 14 participantes, possibilitando profundidade e abrangência entre as interconexões do problema investigado2727 Minayo MCS. Amostragem e saturação em pesquisa qualitativa: consensos e controvérsias. Rev Pesqui Qual. 2017; 5(7):1-12.. Desses, 11 eram do sexo feminino e com média etária de 60 anos. O tempo de uso de psicotrópicos variou entre cinco e 53 anos. Quanto ao estado civil, 64% declararam-se casados. Acerca da escolaridade, 35% não completaram o ensino fundamental, 28,5% completaram o ensino médio e 14,28% não tinham escolaridade. No quesito cor/raça, 64% autorreferiram-se brancos; 29%, pardos; e 7%, pretos. No que se refere à ocupação, 45% declararam-se como donas de casa, sem trabalho remunerado, e a totalidade era do sexo feminino.

A análise dos dados foi pautada no pensamento hermenêutico-dialético, concepção adotada pela reflexão interpretativa que se funda na práxis e na busca pela compreensão crítica da realidade2828 Minayo MCS. Hermenêutica-dialética como o caminho do pensamento social. In: Minayo MCS, Deslandes SF. Caminhos do pensamento: epistemologia e método. 3a ed. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2008. p. 83-107.. Para análise das informações foram realizadas leituras flutuantes e exaustivas do conteúdo das narrativas, seguindo três etapas: ordenação, classificação e análise final dos dados2727 Minayo MCS. Amostragem e saturação em pesquisa qualitativa: consensos e controvérsias. Rev Pesqui Qual. 2017; 5(7):1-12.

28 Minayo MCS. Hermenêutica-dialética como o caminho do pensamento social. In: Minayo MCS, Deslandes SF. Caminhos do pensamento: epistemologia e método. 3a ed. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2008. p. 83-107.
-2929 Assis MAA, Jorge MSB. Métodos de análise em pesquisa qualitativa. In: Santana JSS, Nascimento MAA. Pesquisa: métodos e técnicas de conhecimento da realidade social. Feira de Santana: UEFS; 2010. p. 138-59.. A análise incluiu classificação das falas dos entrevistados, componentes das categorias empíricas, sínteses horizontal e vertical, e confronto entre as informações, agrupando ideias convergentes, divergentes e complementares. A organização dos dados foi orientada pela análise temática de conteúdo, consistindo em isolar temas de um texto e extrair as partes utilizáveis para permitir comparação com outros textos escolhidos da mesma maneira2323 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14a ed. Rio de Janeiro: Hucitec; 2014.,2828 Minayo MCS. Hermenêutica-dialética como o caminho do pensamento social. In: Minayo MCS, Deslandes SF. Caminhos do pensamento: epistemologia e método. 3a ed. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2008. p. 83-107.,3030 Minayo MCS, Deslandes SF, Gomes R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes; 2016..

A identificação dos participantes foi preservada pela criação de um código alfanumérico, em que a letra “E” significa entrevistado, seguido de um algarismo que representa a ordem em que a entrevista foi realizada (E1, E2...)2626 Ritchie J, Lewis J, Nicholls CM, Ormston R. Qualitative research practice: a guide for social science students and researchers. 2a ed. London: SAGE Publications; 2014.. A pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (057408/2019), conforme preconiza a Resolução Conep n. 466/123131 Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de Dezembro de 2012 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2012 [citado 23 Ago 2020]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/ resolucoes/2012/Reso466.pdf
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Resultados e discussão

Os resultados suscitaram dados que, relacionados à temática da medicalização, possibilitaram a organização de duas categorias de análise: 1) concepção dos usuários acerca do uso do psicotrópicos – sinais e efeitos da medica(menta)lização; 2) a produção de cuidado na APS – a relação com o trabalhador e a redução do cardápio de ofertas. As temáticas apontam a emergência da incorporação da medicamentalização nas concepções dos usuários quanto à utilização do psicotrópico no contexto da APS que sustentam a manutenção do uso em longo prazo.

Concepções dos usuários acerca do uso de psicotrópicos: sinais e efeitos da medica(menta)lização

Uma elaboração discursiva reducionista, que caracterizou a justificativa do uso do psicotrópico, começou centrada no corpo, com ênfase para dor ou necessidade fisiológica. Os dados conotam um posicionamento para a dimensão biológica sem sentido clínico, e os sintomas relatados pelos participantes foram: choro, nervosismo, impossibilidade de fazer coisas que antes fazia, pensamentos ruins, preocupações, dificuldade/impossibilidade de dormir, dores no corpo, isolamento, angústia e dores de cabeça. Nos relatos dos participantes identifica-se que faziam uso de psicotrópico, que mantiveram o uso por meio de renovações de receita e que eram atendidos em um serviço no centro da cidade, anterior à construção da USF. Usam termos psiquiátricos para relatar sofrimentos psíquicos, como a depressão, e também a noção de corpo máquina, possível de ser “consertado”. O problema com o sono e o nervosismo foram os mais citados:

  • O problema meu é que eu sou assim, eu se preocupo com muito. Eu pego muita coisa, eu não sei se controlar. Fico nervosa, daí faz mal pra mim porque eu tenho problema, aí ataca tudo, um monte de dor no corpo meu, sabe? Eu tenho problema de coluna, me dá dor em tudo, sabe? Ataca tudo. Ele falou que é problema do nervo, é nervoso. Que eu sou muito nervosa. Aí eu só, quando assim, nessa época eu tava assim eu só queria chorar, eu chorava muito. (E4)

  • Muita tristeza, chorava muito. Aí eu fui consertando no psiquiatra, lá no postão. Consertei lá, consertei tempo lá com o Dr. J, eu pegava remédio lá. (E6)

  • Porque eu tive uma depressão, agora acho que na páscoa faz um ano, dois anos... vai fazer dois anos já. (E7)

  • Não tinha sono mesmo, não tinha sono pra dormir. A gente passa muito nervo depois a gente fica com problema de doença no corpo, com dor no corpo que fica né, o nervo sempre pega tudo quanto é problema pra gente, né? (E9)

Essas práticas discursivas sobre o corpo e os sintomas correspondem ao processo da medicalização social e estão relacionadas a pesquisas anteriores que apontam a importância de fatores biológicos, psicológicos e sociais no diagnóstico e no tratamento do sofrimento psíquico, mas o que ocorre na prática é a prevalência e a dominação de fatores biológicos. Essa lógica contribui para a medicalização de situações e emoções cotidianas, e aumenta o número de prescrições de psicotrópicos com eficácia questionável3232 Doblytė S. Under- or overtreatment of mental distress? Practices, consequences, and resistance in the field of mental health care. Qual Health Res. 2020; 30(10):1503-16. Doi: https://doi.org/10.1177/1049732320918531.
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,3333 Rose N. Our psychiatric future: the politics of mental health. Cambridge: Polity Press; 2019..

Falta de sono, dores citadas como problemas nos nervos e outras fragilidades foram colocadas pelos participantes como defeitos que precisavam ser consertados. O conserto dessa máquina, representada como corpo, foi colocado como primordial e imediato na manutenção de suas responsabilidades cotidianas, suas atividades laborais e funções sociais, estabelecidas em detrimento da implicação simbólica das formas subjetivas de viver e de sofrer88 Foucault M. O nascimento da medicina social. In: Machado R, organizador. Microfísica do poder. 25a ed. São Paulo: Graal; 2012. p. 143-70.,99 Nogueira C. A sociological view on the epistemic privilege of biomedicine: deconstructing the metanarrative. Saude Soc. 2018; 27(4):1019-32. Doi: https://doi.org/10.1590/s0104-12902018180590.
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Além das queixas físicas, apareceram também as psicossociais, relatadas com pouca ou sem relação sintomática citada inicialmente. Os dados apontam uma primeira causa biológica, que parece concreta, mas o que motivou o uso foram aspectos psicossociais e subjetivos como: luto; excesso de responsabilidade e preocupação com a criação dos filhos; preocupações financeiras e com trabalho; desamparo familiar; problemas conjugais; violência doméstica; e dificuldade na adaptação de mudança de cidade. A morte de algum filho, excesso de responsabilidade na criação dos filhos e problemas conjugais foram relatados com maior frequência.

  • Que morreu minha menininha pequena, de cinco meses. Aí eu entrei em depressão e não saí mais do remédio. Era aquela dor no corpo, era tristeza. Ficava olhando pra lá e pra cá, nervosa né? Mas não tinha aquela disposição de ir em uma festa, de ter uma igreja, essas coisas. Aí fiquei só com essa filha. Sei lá meu marido bebia, não tinha juízo, né? Recebia o pagamento, dava um pouco pra mim, tinha que trabalhar, não tinha tempo de ir no médico. (E6)

  • É certo que deve ser da vida da gente porque eu tive uma vida muito tributada porque eu fiquei viúva com três crianças pequenas. Criei a menina, emprego não arrumava porque não tinha estudo, então o que que eu fui ser... lavadeira, passadeira e faxineira. Poder fazer serviço em casa pra tomar conta das crianças, porque na minha época não tinha creche. Três crianças, e cuidei das três e lutava, passei fome, passava tudo porque o dinheiro da Fepasa tinha mês que vinha, tinha mês que não vinha, então tinha que trabalhar. Nunca fiz coisa errada, trabalhando e lutando, comecei a lavar roupa e passava, eu levantava quatro horas da madrugada pra passar roupa, lavava durante o dia, de noite passava roupa, fui levando. Depois tive problema nas costas, dor de cabeça, não conseguia trabalhar de tanta dor de cabeça. (E8)

A dicotomia corpo e mente e o corpo como máquina, passíveis de serem medicados e consertados88 Foucault M. O nascimento da medicina social. In: Machado R, organizador. Microfísica do poder. 25a ed. São Paulo: Graal; 2012. p. 143-70.,99 Nogueira C. A sociological view on the epistemic privilege of biomedicine: deconstructing the metanarrative. Saude Soc. 2018; 27(4):1019-32. Doi: https://doi.org/10.1590/s0104-12902018180590.
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, aparecem nos resultados caracterizados sob dois aspectos: 1) tudo ser reduzido ao biológico e 2) a medicamentalização de questões psicossociais, principalmente do corpo feminino, e as queixas ligadas a papéis de gênero. Questões exemplificadas nos discursos como tristeza pela morte de um filho e a falta de juízo do marido ou da vida atribulada, sem estudo, sem emprego e com crianças pequenas para cuidar.

Estudos realizados no contexto da APS corroboram a prevalência do uso de psicotrópicos em mulheres com baixa renda e escolaridade, que desempenham atividades laborais em casa, e portadoras de doenças crônicas. O alto índice do uso de psicotrópicos entre mulheres ocorre por diferentes motivos, entre os quais: maior preocupação com a saúde, facilidade em descrever os sintomas e procura por assistência médica. Aponta-se também que alguns médicos observam maior vulnerabilidade em mulheres, posicionando-as como frágeis, mais suscetíveis a transtornos afetivos, mais ansiosas e com melhor relação médico-paciente3434 Medeiros Filho JSA, Azevedo DM, Pinto TR, Silva GWS. Uso de psicofármacos na atenção primária à saúde. Rev Bras Promoç Saude. 2018; 31(3):1-12. Doi: https://doi.org/10.5020/18061230.2018.7670.
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,3535 Moura DCN, Pinto JR, Martins P, Pedrosa KA, Carneiro MGD. Uso abusivo de psicotrópicos pela demanda da estratégia saúde da família: revisão integrativa da literatura. Sanare (Sobral). 2017; 15(2):136-44..

As queixas psicossociais relatadas pelas participantes como consequência dos cuidados e das responsabilidades domésticas restritas a elas, somadas ao desamparo político e social – como falta de creche para os filhos e o trabalho não remunerado –, apareceram como fundamento para o uso de psicotrópicos, que teve na relação com o médico o silenciamento desse contexto e a explicação reduzida aos sintomas biológicos.

O determinismo biológico e a consequente falta de escuta das questões psicossociais têm interferência direta na relação com o médico, que é de poder e controle3434 Medeiros Filho JSA, Azevedo DM, Pinto TR, Silva GWS. Uso de psicofármacos na atenção primária à saúde. Rev Bras Promoç Saude. 2018; 31(3):1-12. Doi: https://doi.org/10.5020/18061230.2018.7670.
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. A influência do poder sobre a relação médico-paciente é evidenciada por meio da falta de explicação sobre efeitos colaterais e funcionamento da medicação, da insistência para fazer uso com ameaça dos sintomas voltarem, do foco na eliminação sintomática, da negação da possibilidade de dependência, do controle na decisão de diminuir ou parar o uso, da dificuldade do usuário de questionar a conduta mesmo desconcordando e do receio de enfrentar desafios na renovação de receita, caso mude a medicação por conta própria.

  • Aí o médico receitou e falou a senhora não pode parar com esses remédios porque a senhora vai entrar em depressão se a senhora parar. (E2)

  • Ele já falou pra mim que se eu não conseguir ficar sem eu vou ter que tomar o resto da vida. (E4)

  • Já até comentei com ele sobre isso, ah não, mas tem que tomar ele disse. Então vou falar o que? Falam que deixa mais calmo, mais tranquilo, a dor de cabeça também. Eu vou responder? Quem sou eu pra chegar no médico e falar pra ele: Oh, o senhor tá errado, as vezes até... mas vai falar o que? Entendeu? Então... É a mesma coisa eu tô conversando com a doutora aqui eu vou chegar e falar: não, a senhora tá errada? Quem sou eu né? Então é isso que eu digo: se eu ficar sem tomar esse remédio eu fico sem dormir, porque o organismo já acostumou né? O outro que é pra dor de cabeça... ultimamente tô tendo dor de cabeça... Não tá servindo pra nada. Esse amarelinho nem sei pra que serve. E essa dor de cabeça assim, já fiz eletro, não tem nada. Mas não posso mexer por conta própria, né? Depois eles não liberam mais. (E11)

Os dados apontam a justificativa médica para a prescrição do psicotrópico resumida à demanda sintomática fisiológica e à centralização no fármaco como prescrição, diminuindo a eficácia de outras alternativas.

Em função da concepção mercadológica, no aspecto da medicina, há um esvaziamento da relação médico-paciente. Com a prática médica assumindo sua versão profundamente técnica, com consultas rápidas e diagnósticos apressados visando o maior número de atendimentos, há uma impossibilidade de escuta qualificada no acolhimento, que gera uma prescrição massiva de psicotrópicos e a medicamentalização dos sintomas33 Birman J. Mal-estar na atualidade. A psicanálise e as novas formas de subjetivação. 3a ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2000.,3434 Medeiros Filho JSA, Azevedo DM, Pinto TR, Silva GWS. Uso de psicofármacos na atenção primária à saúde. Rev Bras Promoç Saude. 2018; 31(3):1-12. Doi: https://doi.org/10.5020/18061230.2018.7670.
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Os resultados indicam como principal motivação para o uso o “não se importar”, ou se importar menos, com situações que antes geravam incômodo, como uma adaptação aos sofrimentos diários, ou por estarem “mais calmos”, ou por conseguirem dormir à noite e acordarem mais dispostos.

A medicação foi colocada como bem de consumo e observa-se uma reconfiguração de sua finalidade: se até então era usada apenas para remissão sintomática, agora é vista como mediadora de conflitos, como válvula de escape ou como adaptativa de um modo de vida sem sofrimento. Essa vida, aparentemente com os sofrimentos suavizados, também foi colocada de forma discursiva como “apática” e vivida sem intensidade.

O uso pelo “resto da vida” foi colocado como termo túrgido de simbolismo por reduzir toda a potência de vida a ser vivida, justificada pelo organismo ter se acostumado com a medicação, por isso sua impossibilidade de retirada, gerando uma cronificação do consumo de psicotrópicos. A relação com o discurso médico, sintetizado em: “não poder parar” e “se parar vai fazer mal”, é uma prática discursiva que naturaliza a alegação para “o resto da vida” e está fundamentada no uso que o médico faz da autoridade de seu papel profissional para silenciar ou minimizar a autonomia do sujeito.

  • Mas ajuda bastante, fico mais calma, mais tolerante, né? Tem coisas que seriam a gota d’água, agora com o remédio eu consigo controlar mais um pouquinho. Vamos supor, que nem em casa, o esposo chega reclama de tudo. Antes a gente brigava até umas horas, agora ele chega, tá falando, paciência, não tá feliz amanhã eu faço e vai levando. Quer dizer ela não resolve, mas me ajuda um pouquinho a não levar tudo no ferro, né? Antes o nervosismo eu levava... eu era muito agressiva, a gente brigava direto. Agora continua do mesmo jeito, ele reclama de tudo, eu só não esquento a cabeça. Então, tanto fez a água subir quanto a água descer, nós estamos indo. (E13)

  • Eu já estava assim, né? É muito sono, prazer sexual nenhum. Por mim eu durmo dia e noite, quer fazer alguma coisa fica à vontade, deixa eu dormir. O remédio ajudou em algumas coisas e piorou em outras. Então, dá uma balançada, né? E esse sono que eu não entendo, porque tanto sono desse jeito. Então, tem hora que eu fico: e agora? Ou eu fico briguenta e esperta ou eu fico calma e durmo à vontade, ninguém me amola, não sei. Tem hora que eu penso: ai, desde que me deixe dormir fia que derrube a casa, eu quero dormir. (E13)

  • Não posso nem pensar em nada, se tiver alguma coisa na cabeça bebe o remédio pra conseguir dormir. Se começar a pensar, alguma coisa, né? Que a gente não quer pensar, sabe? A gente sabe como é que é, as coisas todas vem e a gente não fica com eles na cabeça. O que não presta nós “guarda”, né? Problema mesmo. (E9)

  • Nunca pensei, ainda não pensei. É que nem eu falei, não sei se vou tomar pro resto da minha vida até eu morrer ou alguma coisa. (E9)

Os psicotrópicos, na empresarização da vida e na cultura da ansiedade, são os recursos mais rápidos exigidos na busca pela felicidade plena e na eliminação imediata do sofrimento. Possibilitando que o sujeito se estimule ou se acalme para se manter competitivo, independente e em dia com suas obrigações sociais, as medicações são transformadas em vias de adaptação a um modo de vida no qual o bem-estar é uma norma que abrange tanto a saúde quanto o conforto. Medicaliza-se, então, a violência, a pobreza e a falta de oportunidades que, desconectadas da exclusão social e de uma vida sem perspectivas, reduzem sujeitos a seres estritamente biológicos, sem contexto, sem cultura e atemporais. A medicalização acaba cumprindo uma tarefa fundamental para a manutenção do que está posto na sociedade3636 Moysés M, Collares C. Medicalização: elemento de desconstrução dos direitos humanos. In: Silva ACSS, Coimbra CMB, Monteiro HR, Ruffeil N, Barker SL, organizadores. Direitos Humanos: o que temos a ver com isso? Rio de Janeiro: CRP-RJ; 2007. p. 153-68..

Ao biologizar e ao medicalizar um problema social como algo natural, inevitável e deslocando sua responsabilidade para fatores individuais, são isentadas as instâncias envolvidas nesse processo. Na medicalização e na consequente desresponsabilização social e política, o sofrimento não é visto como uma possibilidade de transformação nas formas de viver e de se relacionar. Nesse contexto, os profissionais da saúde continuarão desempenhando seu papel fundamental, podendo concretizar e operar o autoritarismo da Ciência, perdendo o estranhamento perante as desigualdades3636 Moysés M, Collares C. Medicalização: elemento de desconstrução dos direitos humanos. In: Silva ACSS, Coimbra CMB, Monteiro HR, Ruffeil N, Barker SL, organizadores. Direitos Humanos: o que temos a ver com isso? Rio de Janeiro: CRP-RJ; 2007. p. 153-68.,3737 Lobo AO, Bernstein J. Excesos y alternativas de la salud mental en atención primaria. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2015; 10(35):1-9. Doi: https://doi.org/10.5712/rbmfc10(35)1055.
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A produção de cuidado na APS: a relação com o trabalhador e a redução do cardápio de ofertas

Os dados possibilitam afirmar a medicação como resposta a priori e praticamente exclusiva aos diferentes impasses subjetivos e ao sofrimento psíquico, sem alternativas anteriores à prescrição do psicotrópico. Em alguns casos foram oferecidos grupos terapêuticos ou psicólogos, mas colocados como um auxílio ao remédio e não como outra possibilidade.

A medicação foi relatada como a única forma de produção de cuidado permanente. Isso indica que a intervenção de Saúde Mental na APS ficou restrita à prescrição medicamentosa, centralizada na figura do médico que se atentou apenas na manutenção da conduta. A necessidade de buscar outras formas de respostas à demanda sintomática foi posta em evidência. As causas psicossociais, experiências de vida e singularidades ficaram em segundo plano, não tiveram relevância ou foram encaminhadas para outros profissionais. Nesse cenário, percebe-se que a resolubilidade do cuidado está restrita à oferta que o serviço disponibiliza para a demanda trazida pelo usuário, no caso: a estabilização de sintomas.

  • Procurei ajuda médica, falei: como é que faço, preciso descansar. Aí, vim no médico e ele receitou esse remédio. (E8)

  • Eu não falei nada pro médico, ele que deu. Porque quando eu vim aqui eu sempre eu reclamava de dor assim, essa parte da cabeça, doía tudo e eu sempre vinha aqui e reclamava da mesma coisa, do mesmo problema aí ele passou um remédio pra mim dormir. Ele não falou nada, mas eu me sinto bem porque durmo bem à noite, outro dia levanto boa, determinada. (E9)

  • Eu já perguntei também pros médicos aqui, até um tempo tratei com homeopatia, ela falou: não dona Maria, a gente não pode tirar o remédio da senhora. A médica falou, esse tipo de medicação tem que ter um acompanhamento por um profissional, tem que ser assistido, não vai fazer essa loucura não, não vou fazer isso com você e você também não vai fazer isso sozinha. (E10)

A ESF, desde sua criação, vem propondo a superação do modelo biomédico hegemônico, substituindo-o por uma nova concepção apoiada na promoção da saúde3838 Fertonani HP, Pires DEP, Biff D, Scherer MDA. Modelo assistencial em saúde: conceitos e desafios para a atenção básica brasileira. Cienc Saude Colet. 2015; 20(6):1869-78. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015206.13272014.
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. Seus atributos e diretrizes fundamentados no conceito ampliado de saúde, na determinação social do processo saúde-doença, na intersetorialidade, na participação popular, entre outros, sugerem uma direção desmedicalizante. A proximidade com o usuário pode ser uma chance para a reorientação da medicalização e a reconstrução da autonomia, mas, por outro lado, também corre o risco de se constituir como medicalizadora. O próprio ato de receber a receita médica e utilizar o psicotrópico pode atuar de maneira a desresponsabilizar e despolitizar o sujeito em relação a seu sofrimento3939 Tesser CD. Medicalização social (I): o excessivo sucesso do epistemicídio moderno na saúde. Interface (Botucatu). 2006; 10(19):61-76. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832006000100005.
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Sobre o sofrimento mental na APS, o fator de destaque na literatura é a sua medicalização e o uso de tratamento farmacológico em situações muitas vezes dispensáveis para a ocasião. Os fatores que podem explicar esse fenômeno se fundamentam na qualificação inadequada da equipe multiprofissional, que se mostrou um dos principais motivos para a alta prescrição, e uma insegurança de profissionais que repassam os casos para outros níveis de atenção ou para outros profissionais. A falta de preparo para uma escuta qualificada é acentuada pela demanda excessiva e pelo curto período para realização da consulta, dificultando a criação de vínculo entre profissionais e usuários e o desenvolvimento da integralidade2020 Oliveira A, Luchini D Jr, Fonseca GS, Biesek LL, Silva JKO, Cordeiro JMSM, et al. Sofrimento mental atenção básica: abordagens da literatura brasileira. In: Ribeiro EAW, Mota AA, Giraldez CG, organozadores. Conexões da saúde mental e território. Blumenau: Instituto Federal Catarinense; 2019. p. 23-9..

Os resultados também indicam uma boa relação com o trabalhador da USF, como “apoio” e respostas para situações de crise, o que aponta a potencialidade que o serviço no território pode proporcionar quando não limitado a prescrições e a renovações.

  • Ontem nós fizemos um negócio de bola, essas coisas, sabe? E depois tive que pegar e a última ia fazendo alongamento. Tá sendo bom. Parece que agora tá sendo bom. Porque a gente tá usando a mente pra alguma coisa, a gente fica mais assim... (E5)

  • A terapia ajudou muito, porque a terapia tipo, fez eu entender o porque, fez eu colocar as coisas no lugar, entendeu? Me ajudou a me assentar de novo. (E7)

A USF estudada disponibiliza grupos terapêuticos, de exercício físico, de caminhada, de artesanato, entre outros. Quatro entrevistados passaram por psicólogos na própria unidade e uma entrevistada participou de um grupo de Saúde Mental, relatando boas experiências, mas cessaram pela rotatividade dos profissionais ou porque estar na unidade era inviável. Por exemplo, o grupo de exercícios, proporcionado pela atuação do Núcleo Ampliado de Saúde da Família (Nasf) e por residentes multiprofissionais, também foi citado como positivo para ressignificação do sofrimento.

Para dar conta desse fenômeno, destaca-se a necessidade de realização de práticas inovadoras direcionadas à produção do cuidado integral, a fim de potencializar a transformação de práticas hegemônicas em saúde e o desenvolvimento de outra conformação clínica.

Busca-se criar condições para uma prática clínica capaz de reconhecer as forças externas aos sujeitos em cada situação singular, de forma que propicie um compromisso da clínica com a máxima defesa e a produção da vida, sem abrir mão da ontologia das doenças e suas possibilidades de diagnóstico e intervenção4040 Campos GWS, Figueiredo MD, Pereira N Jr, Castro CP. A aplicação da metodologia Paideia no apoio institucional, no apoio matricial e na clínica ampliada. Interface (Botucatu). 2014; 18 Supl 1:983-95. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622013.0324.
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Ao contrário da compreensão do funcionamento psíquico exclusivamente com processos cerebrais e linguagem neurobioquímica, pretende-se olhar para o sofrimento humano em articulação com o plano da vida, mudando então o objeto, que deixa de ser a doença. Nesse sentido, a ESF torna-se um elemento essencial para a implementação dessa mudança do modelo4141 Yasui S, Luzio C, Amarante P. Atenção psicossocial e atenção básica: a vida como ela é no território. Rev Polis Psique. 2018; 8(1):173-90. Doi: https://doi.org/10.22456/2238-152X.80426.
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Considerações finais

A análise dos discursos possibilitou vislumbrar a incorporação da medicamentalização nas concepções de vida e de sofrimento dos usuários no contexto da ESF, perspectiva que vai ao encontro da medicalização social e tem subsídio no modelo biomédico que subordina o processo de trabalho da APS.

Os resultados apontam, com base na experiência dos usuários em relação ao uso dos psicotrópicos, o “não se importar” com situações que antes geravam incômodo, uma adaptação aos sofrimentos diários apontados inicialmente como uma primeira causa biológica, mas representados como aspectos subjetivo-psicossociais. O uso da medicação psicotrópica apareceu repleto de recaídas, poucos resultados e efeitos colaterais indesejados e, em contrapartida, sem ligação com a sua eficácia e o questionamento do uso, em uma relação ambivalente e evidenciada na relação de poder e controle médico e com poucas possibilidades além do uso. Quanto ao processo de trabalho na APS, os dados indicam uma boa relação do usuário em sofrimento com o trabalhador do serviço. A medicação foi colocada como resposta a priori, única forma de cuidado permanente e, praticamente, exclusiva aos diferentes impasses subjetivos e ao sofrimento psíquico sem alternativas para experimentar antes da prescrição do psicotrópico.

Esses resultados revelam um processo de medicalização da vida vinculado a um modelo de Atenção à Saúde biologicista, centrado na figura do médico, na prescrição medicamentosa e desresponsabilizada de questões políticas e sociais do território, deslocando sua responsabilidade para fatores individuais.

Estudos na área possibilitarão ampliar a compreensão sobre o fenômeno para então ser possível repensar as práticas e o trabalho em saúde no âmbito da APS, visando ao cuidado e à autonomia e não apenas a eliminação sintomática desconectada aos modos de viver e se relacionar.

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Editado por

Editora
Rosana Teresa Onocko Campos
Editor associado
Erotildes Maria Leal

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2020
  • Aceito
    25 Out 2020
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