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Fatores associados ao custo das internações hospitalares por doenças infecciosas em idosos em hospital de referência na cidade do Natal, Rio Grande do Norte

Associated factors with costs of hospital admissions for infectious diseases in the elderly in a hospital in Natal, Rio Grande do Norte

Resumos

Este estudo analisou os fatores associados ao custo direto das internações por doenças infecciosas em idosos. Realizou-se um estudo de caso dos custos de internações em idosos com 60 ou mais anos, internados em um hospital de referência no município de Natal, estado do Rio Grande do Norte, durante o período de janeiro de 2005 a dezembro de 2009. O modelo de Regressão Linear Múltipla (log-linear) foi aplicado para analisar os fatores associados aos custos de internação. Os resultados do modelo de regressão mostraram que cada dia adicional de internação determinou um acréscimo de 3% na média dos gastos e internações que evoluíram para óbito produziram um aumento de 71,6% nos custos em relação às internações dos pacientes que receberam alta.

idosos; custos hospitalares; doenças transmissíveis


This study examined the factors associated with direct cost of hospitalizations for infectious diseases in the elderly. We conducted a case study of the costs of hospitalization in elderly patients with 60 or more years admitted in a reference hospital in the city of Natal, state of Rio Grande do Norte, during the period from January 2005 to December 2009. The Multiple Linear Regression model (log-linear) was applied to analyze the factors associated with hospitalization costs. The results of the regression model showed that each additional day of hospitalization determined a 3% increase in average spending and admissions of elderly who died produced a 71.6% increase in costs relative to admissions of patients discharged.

aged; hospital costs; communicable diseases


INTRODUÇÃO

O envelhecimento populacional é um fenômeno mundial, que ocorre em países com vários níveis de desenvolvimento, sendo caracterizado por um aumento no contingente da população idosa (pessoas de 60 anos e mais) em relação à população de jovens (menores de 15 anos). Essa mudança na estrutura etária populacional é um fenômeno decorrente principalmente da redução da taxa de fecundidade e do aumento da expectativa de vida da população, elementos fundamentais na compreensão do processo de transição demográfica1Wong LRR, Carvalho JAM. O rápido processo de envelhecimento populacional do Brasil: sérios desafios para as políticas públicas. Rev Bras Estud Popul. 2006;23(1):5-26..

Paralelamente à transição demográfica, ocorre a transição epidemiológica, caracterizada pela diminuição da incidência das doenças infecto-parasitárias e pelo aumento das doenças crônico-degenerativas2Prata PR. The epidemiologic transition in Brazil. Cad Saúde Pública. 1992;8(2):168-75.. Não obstante, no Brasil, verifica-se uma sobreposição desses dois grupos de enfermidades, evidenciando-se uma tendência inversa à verificada para os indicadores de mortalidade. Nesse sentido, o comportamento de queda acentuada nas taxas de mortalidade por doenças infecciosas e parasitárias não é seguido por redução, na mesma magnitude, na morbidade por esse grupo de patologias3Nunes A. O envelhecimento populacional e as despesas do Sistema Único de Saúde. In: Camarano AA. Os novos idosos brasileiros: muito além dos 60? Rio de Janeiro: IPEA; 2004. p.1-24..

No Brasil, segundo dados do Departamento de Informática do SUS (DataSUS)*, as doenças do aparelho circulatório, com 34,4% dos óbitos, e neoplasias, com 17,2%, foram as principais causas de mortalidade entre a população com 60 anos ou mais no ano de 2012. Por outro lado, em termos de morbidade, observou-se no mesmo período que as doenças relacionadas a "algumas doenças infecciosas e parasitárias" (capítulo I da CID-10 - Classificação Internacional de Doenças) representavam a segunda causa de internação no SUS (15,3%) entre os idosos, sendo as doenças do aparelho circulatório a principal causa de internação (18,4%). Esse cenário faz com que os indicadores de mortalidade reflitam apenas parcialmente o perfil epidemiológico da população.

Em decorrência dessas alterações, tem-se observado um aumento da demanda dos serviços de saúde. Em geral, os idosos são portadores de múltiplas patologias crônicas, consomem mais serviços de saúde por necessitarem de cuidados prolongados, passam por internações hospitalares com mais frequência, sendo o tempo de ocupação do leito maior do que o de outras faixas etárias3Nunes A. O envelhecimento populacional e as despesas do Sistema Único de Saúde. In: Camarano AA. Os novos idosos brasileiros: muito além dos 60? Rio de Janeiro: IPEA; 2004. p.1-24., além de intervenções contínuas e maior demanda por leitos de unidades de terapia intensiva (UTI)4Diament D, Salomão R, Rigatto O, Gomes B, Silva E, Carvalho NB, Machado FR. Diretrizes para tratamento da sepse grave/choque séptico - abordagem do agente infeccioso - diagnóstico. Rev Bras Ter Intensiva. 2011;23(2):134-44.. Nesse sentido, verifica-se que, entre os pacientes admitidos em UTI, os idosos são responsáveis por 42 a 52% das admissões e consomem cerca de 60% das diárias disponíveis. Ressalta-se ainda que nas UTI as doenças infecciosas destacam-se entre as mais prevalentes, estando associadas ao maior tempo e alto custo de internação, e a maiores taxas de morbidade e mortalidade5Lisboa T, Faria M, Hoher JA, Borges LAA, Gómes J, Schifelbain L, Dias FS, Lisboa J, Friedman G. Prevalência de Infecção Nosocomial em Unidades de Terapia Intensiva do Rio Grande do Sul. Rev Bras Ter Intensiva. 2007;19(4):414-20..

O aumento dessa demanda por serviços de saúde, aliado ao desenvolvimento médico-tecnológico, tem refletido um aumento nos gastos financeiros em saúde pública. Analisando-se os custos por internação de acordo com o perfil etário da população, observa-se uma forte inclinação da curva de gastos à direita do perfil etário, com crescimento mais acelerado dos custos entre os grupos de idades mais avançadas do que entre os grupos mais jovens6Buchner F, Wasem J. Steeping of Health Expenditure. The Geneva Papers on Risk and Insurance - Issues and Practice, Palgrave Macmillan. 2006;31(4):581-99. , 7Meyer GS, Denham CR, Battles J, Carayon P, Cohen MR, Darley MR. Safe Practices for Better Healthcare. Update: A Consensus Report. National Quality Forum. 2010..

Assim, o debate sobre os gastos em saúde e a busca pela eficiência na alocação dos recursos escassos têm ocupado papel importante na pauta das discussões de políticas públicas sobre o financiamento dos serviços de saúde8Vianna CMM, Caetano R. Avaliações econômicas como um instrumento no processo de incorporaçãotecnológica em saúde. Cad Saúde Col. 2005;13(3):747-66.. Nesse ponto, em qualquer análise econômica, é importante ter claro alguns conceitos referentes a gastos, despesas e custos.

Os gastos são sacrifícios econômicos ou compromissos financeiros assumidos para obtenção de um produto ou serviço qualquer, não importando a origem dos recursos, representado por entrega ou promessa de ativos, independentemente de se ter efetuado o pagamento. Despesas são gastos necessários para a obtenção de receitas. Os custos implicam o valor de todos os recursos utilizados na produção de serviços e atividades de saúde, podendo ser considerados sob o aspecto econômico ou contábil9Iunes RF. A concepção econômica de custos. In: Piola SF, Vianna SM (orgs). Economia da saúde: conceitos e contribuições para a gestão da saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 1995. p. 227-48.

O custo econômico remete à noção de custo de oportunidade (implícitos), refletindo o valor da melhor alternativa não concretizada em consequência de se utilizarem recursos escassos na produção de um dado bem e/ou serviço de saúde. Já o custo contábil enfatiza informações dos custos reais que envolvem desembolso monetário (explícito), no sentido de gastos no processo produtivo9Iunes RF. A concepção econômica de custos. In: Piola SF, Vianna SM (orgs). Economia da saúde: conceitos e contribuições para a gestão da saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 1995. p. 227-48.

Os custos em saúde podem ser classificados nas seguintes categorias: custos diretos (médicos e não médicos) e custos indiretos9Iunes RF. A concepção econômica de custos. In: Piola SF, Vianna SM (orgs). Economia da saúde: conceitos e contribuições para a gestão da saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 1995. p. 227-48

10 Miravitles M. Avaliação econômica da doença pulmonar obstrutiva crônica e de suas agudizações. Aplicação na América Latina. J Bras Pneumol. 2004;30(3):274-85.
- 1111 Melione LP, Mello-Jorge MH. Gastos do Sistema Único de Saúde com internações por causas externas em São José dos Campos, São Paulo, Brasil. Cad Saúde Pública. 2008;24(8):1814-24.. Os custos diretos médicos decorrem da utilização dos recursos clínicos para a produção de qualquer atividade clínica, como: medicamentos, dispositivos médicos, meios complementares de diagnóstico e tratamento, consultas e internamentos. Na categoria dos custos não médicos incluem-se as despesas dos doentes e familiares em deslocamentos às unidades prestadoras de cuidados de saúde para a realização de consultas, exames, tratamentos ou internamentos.

Os custos indiretos estão associados com a perda de função e produtividade em decorrência do problema de saúde. Isso demonstra a verdadeira complexidade que envolve a mudança etária de um país, já que, além do crescente investimento em custos diretos, há a perda econômica pelos indiretos.

Nos estudos de análise econômica em saúde, o conceito de custo econômico deixa mais evidente a importância de evitar os desperdícios e a má alocação de recursos9Iunes RF. A concepção econômica de custos. In: Piola SF, Vianna SM (orgs). Economia da saúde: conceitos e contribuições para a gestão da saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 1995. p. 227-48. Entretanto, é muito complexo obter as informações dos recursos considerados em uma análise de custo econômico. Para muitos recursos, o custo econômico é equivalente ao custo contábil, sendo o valor pago utilizado como substituto à mensuração do custo de oportunidade de utilizar aquele recurso.

No decorrer deste trabalho, não estamos diferenciando custos de despesas e gastos. Portanto, os custos são as despesas e os gastos relacionados com a produção de bens ou serviços de saúde.

Considerando-se a importância das doenças infecciosas para a saúde do idoso, o objetivo deste estudo foi, a partir de um estudo de caso, realizar uma análise dos fatores associados ao custo das internações hospitalares por doenças infecciosas em idosos internados em um hospital público de nível terciário.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo transversal, realizado no Hospital Giselda Trigueiro (HGT). O HGT é um hospital de referência em doenças infecciosas do Estado do Rio Grande do Norte, Brasil, localizado na cidade de Natal. Conta com 120 leitos para internação, 7 dos quais de Unidade de Terapia Intensiva para os usuários do Sistema Único de Saúde. Consideraram-se como fonte de dados os registros dos prontuários de todos os idosos, com idade igual ou acima de 60 anos, internados no período de janeiro de 2005 a dezembro de 2009. Assim, os valores referentes aos custos de internação foram obtidos mediante os valores faturados apresentados nesses prontuários.

A variável dependente foi o custo direto das internações, com valores atualizados para o ano de 2009, de acordo com o Índice Nacional de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA). As variáveis independentes (explicativas) foram do tipo indicadora (dummy) para: sexo, óbito, diagnóstico final (infecção pulmonar, infecção de pele e partes moles, tuberculose (pulmonar e extrapulmonar), hipertensão arterial sistêmica (HAS), ou diabetes mellitus (DM) e sepse), e do tipo contínua: idade (em anos) e tempo de internação (em dias).

O teste de Shapiro-Wilks foi empregado para avaliar a suposição de distribuição normal nas variáveis contínuas. Aplicou-se o teste t de Student para comparação das médias do custo de internação, segundo as variáveis categóricas independentes. O coeficiente de correlação de Pearson foi utilizado na análise bivariada entre as variáveis contínuas.

O modelo de regressão linear múltipla (log-lin)1212 Gujarati D, Porter D. Econometria Básica. Porto Alegre: AMGH; 2011., com o método de seleção de variáveis stepwise, foi utilizado para identificar as variáveis associadas ao custo direto de internação. O percentual de mudança nos custos foi calculado a partir das seguintes fórmulas, para as variáveis dummy (1) e para as variáveis contínuas (2), em que "B" é o coeficiente não padronizado estimado pelo modelo de regressão:

[100*(exp(B)-1)]% (1)

100*(B)% (2)

Inicialmente, as variáveis independentes incluídas no modelo foram aquelas que, na análise bivariada, apresentaram valor de p≤0,2. O nível de significância estatística adotado foi de 5% (a=0,05). Para análise dos dados, utilizou-se o software IBM SPSS Statistics (versão 17.0; IBM Company, Chicago, Illinois, USA)1313 SPSS Inc. Released 2008. SPSS Statistics for Windows, Version 17.0. Chicago: SPSS Inc. .

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes (CEP-HUOL) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), cujo número do protocolo CEP/HUOL é 627/11.

RESULTADOS

Foram incluídos no estudo os registros de 901 internações do HGT no período de janeiro de 2005 a dezembro de 2009. A média de idade dos pacientes foi 72,2 (DP =9,0) anos, variando de 60 a 102 anos, sendo 40,9% de mulheres. O tempo médio de internação foi 17,6 (DP=15,8) dias, e o gasto médio foi R$ 929,70 (DP=R$ 932,90). Entre os principais diagnósticos de morbidade notificados, 29% dos idosos apresentavam doenças pulmonares, 13% tuberculose, 18,5% problemas de pele, 49% hipertensão arterial e 30,5% diabetes mellitus.

Nas análises bivariadas, obteve-se coeficiente de correlação estatisticamente significante (p<0,05) entre o custo financeiro e os dias de internação (r=0,48), não apresentando relação significante com a idade (p>0,05). A Tabela 1 apresenta um comparativo dos valores médios do custo de internação em relação às variáveis explicativas categóricas. Nessa análise, as variáveis: sexo, infecção pulmonar, hipertensão arterial e diabetes mellitus apresentaram valor de p>0,20 (Tabela 1) e não foram incluídas no modelo inicial de regressão múltipla.

Tabela 1.
Análise bivariada dos custos de internação em idosos internados no Hospital Giselda Trigueiro

A Tabela 2 apresenta os resultados obtidos pelo modelo de regressão linear múltiplo. Ao nível de 5% de significância estatística, o modelo final incluiu cinco variáveis explicativas para a variabilidade dos custos de internação: dias de internação, óbito, sepse, doença da pele e tuberculose. O coeficiente de determinação (R2Prata PR. The epidemiologic transition in Brazil. Cad Saúde Pública. 1992;8(2):168-75.) para o ajuste do modelo foi de 0,53. As estimativas do coeficiente beta padronizado evidenciaram que o número de dias de internação foi o fator com maior impacto (0,56) sobre os custos de internação, seguido por internações que evoluíram para óbito do paciente (0,27) e diagnóstico de sepse (0,19).

Tabela 2.
Resultados do modelo de regressão linear múltipla dos custos de internação

Cada dia de internação produziu um incremento de 3% nos custos; internações com óbito dos pacientes, em média, aumentaram os custos em 71,6% em relação às internações que resultaram em alta; e internações com diagnóstico de sepse elevaram os custos em 69,9%.

Análises residuais (gráficos dos valores preditos versus residuais e teste de normalidade dos resíduos) apresentaram resultados satisfatórios, obedecendo aos pressupostos do modelo de regressão linear por mínimos quadrados.

DISCUSSÃO

A análise dos custos no presente estudo direcionou-se aos custos diretos médicos, ou seja, não foi considerado o custo econômico das internações, mas o custo contábil referente à internação hospitalar de cada indivíduo. Difere da análise dos custos indiretos, que requer maior profundidade no aspecto econômico, o que não era o objetivo da presente investigação.

O paciente idoso demanda maior tempo de internação para obter um desfecho, seja ele a alta ou o óbito, o que gera consequentemente maiores custos hospitalares. Estudos mostram que os valores pagos pelas internações são maiores entre a população adulta, reflexo do maior número de usuários do SUS em idade economicamente ativa, e a razão custo por habitante é expressivamente maior na população idosa, indicando que as internações nessa população são mais onerosas do que as ocorridas entre pessoas de 20 a 59 anos1414 Santos JR, Barros MD. Idosos do Município do Recife, Estado de Pernambuco, Brasil: uma análise da morbimortalidade hospitalar. Epidemiol Serv Saúde. 2008;17(3):177-86. , 1515 Silveira RE, Santos AS, Sousa MC, Monteiro TS. Gastos relacionados a hospitalizações de idosos no Brasil: perspectivas de uma década. Einstein. 2013;11(4):514-20..

A literatura enfatiza que esse maior gasto com hospitalização da população idosa é uma tendência mundial e que se justifica por haver maior consumo de recursos1616 Ministério da Saúde. Política Nacional de Saúde do Idoso: Portaria nº 1395. Brasília: MS; 1999.

17 Lima-Costa CMFF, Guerra HL, Barreto SM, Guimarães RM. Diagnóstico da situação de saúde da população idosa brasileira: um estudo da mortalidade e das internações hospitalares publicas. Informe Epidemiológico do SUS. 2000;9:23-41.

18 Peixoto SV, Giatti L, Afradique ME, Lima-Costa MF. Custo das internações hospitalares entre idosos brasileiros no âmbito do Sistema Único de Saúde. Epidemiol Serv Saúde. 2004;13(4):239-46.
- 1919 Martin GB, Cordoni Junior L, Bastos YGL, Silva PV. Assistência hospitalar a população idosa em cidade do sul do Brasil. Epidemiol Serv Saúde. 2006;15(1):59-65.. A assistência hospitalar ao idoso demanda mais recursos materiais, humanos e financeiros quando comparada à oferecida à população mais jovem e apresenta uma razão de gastos de 0,89 de acordo com os achados de Santos e Barros1414 Santos JR, Barros MD. Idosos do Município do Recife, Estado de Pernambuco, Brasil: uma análise da morbimortalidade hospitalar. Epidemiol Serv Saúde. 2008;17(3):177-86.. Ainda, segundo os autores, essa diferença no consumo dos recursos é verificada tanto nos serviços de saúde dos países desenvolvidos quanto nos dos países em desenvolvimento, haja vista que os idosos apresentam a necessidade de maior complexidade tecnológica e a atenção de especialistas. Além disso, a capacidade reduzida de resistência do organismo do idoso gera maior tempo de permanência, podendo levar, inclusive, a outras complicações de saúde.

Corroborando esses achados, pesquisa realizada na cidade de Londrina, Paraná2020 Berguio MG, Cordoni JL, Lima BYG, Silva PV. Assistência hospitalar à população idosa em cidade do sul do Brasil. Epidemiol Serv Saúde. 2006;15(1):59-65., concluiu que a população idosa, que correspondia a 9,3% da população do município em 2000, utilizou 22,1% do total de dias de permanência e 29,0% dos custos hospitalares do SUS; em contrapartida, a população menor de 15 anos - 26,4% dos habitantes - utilizou 15,0% do tempo de permanência intra-hospitalar e 17,0% dos custos de todas as internações pelo SUS. Isso demonstra o quanto é alta a carga de gastos com a atenção terciária a essa parcela da população.

O gasto médio calculado com as internações dos idosos no HGT no período de janeiro de 2005 a dezembro de 2009 foi de R$ 929,70, valor que se aproxima dos achados por Silveira et al.1515 Silveira RE, Santos AS, Sousa MC, Monteiro TS. Gastos relacionados a hospitalizações de idosos no Brasil: perspectivas de uma década. Einstein. 2013;11(4):514-20., em âmbito nacional, através do cálculo dos valores das Autorizações de Internações Hospitalares (AIH) referente ao Capítulo de Doenças Infecciosas e Parasitárias (CID-10), que foi de R$ 717,00.

Os achados também mostraram uma relação entre os óbitos e o aumento dos gastos financeiros com a internação, ou seja, houve maior custo financeiro (71,6%) quando o desfecho da internação era óbito. Para Berenstein2121 Berenstein CK. Os efeitos de idade e proximidade à morte sobre os gastos com internações no SUS: evidências com base no caso de Minas Gerais, 2004/2005 [tese]. Belo Horizonte (MG): Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional. Faculdade de Ciências Econômicas - UFMG; 2009., a maior parte dos gastos com saúde é despendida nos últimos momentos de vida, com a proximidade da morte. Esse aumento decorre do fato de que o tratamento de pacientes com doença em fase terminal costuma ser mais elevado; se observa que 30% do aumento desses gastos entre as idades 65 e 85 anos deve-se a essa variável.

O efeito da idade sobre os custos de internação não foi observado, fato que está em consonância com a investigação realizada por meio da análise de dados do sistema de informação hospitalar nos municípios de Curitiba (PR) e Belém (PA), que destacou que a curva de gastos para ambas as cidades não apresentou comportamento crescente até o fim da vida, com queda dos valores a partir dos 70 anos2222 Berenstein CK, Wajnman S. Efeitos da estrutura etária nos gastos com internação no Sistema Único de Saúde: uma análise de decomposição para duas áreas metropolitanas brasileiras. Cad Saúde Pública. 2008;24(10):2301-13..

Entretanto, destaca-se um estudo transversal15 15 Silveira RE, Santos AS, Sousa MC, Monteiro TS. Gastos relacionados a hospitalizações de idosos no Brasil: perspectivas de uma década. Einstein. 2013;11(4):514-20.que apresentou resultados opostos, afirmando que a razão entre os valores pagos por internações hospitalares e a população aumenta gradualmente com a idade. Observou-se uma razão de custos oito vezes mais onerosos da população idosa masculina (R$ 1.639,47) com relação à faixa etária de adultos (R$ 193,45), e a proporção chega a ser 2,5 vezes mais cara na internação da mulher idosa com mais de 80 anos (R$ 1.266,99) em relação à mulher adulta (R$ 499,07).

Ademais, observou-se que, entre os diagnósticos apresentados dos idosos internados no HGT, a sepse foi a comorbidade com maior impacto sobre os custos, com percentual de mudança de 69%. Esse resultado reflete a gravidade da sepse, considerada atualmente um grave problema de saúde pública por sua elevada incidência, letalidade e mortalidade nas UTI2323 Júnior JALS, David CM, Hatum R, Souza PCSP, Japiassú A, Pinheiro CTS et al. Sepse Brasil: Estudo Epidemiológico da Sepse em Unidades de Terapia Intensiva Brasileiras. Rev Bras Ter Intensiva. 2006;18(1):9-17.. Os pacientes internados com sepse exigem maior tempo de internação na UTI, o que resulta em um maior custo de tratamento comparado a outros pacientes. A sua incidência entre idosos está relacionada a diversas alterações no sistema imunológico, que ocorrem com o avanço da idade e que deixam o idoso vulnerável a infecções2424 Peixoto SV, Giatti L, Afradique ML, Costa MFL. Custo das internações hospitalares entre idosos brasileiros no âmbito do Sistema Único de Saúde. Epidemiol Serv Saúde. 2004;13(4):239-46..

As infecções pulmonares e a tuberculose pulmonar e extrapulmonar também apresentaram relação positiva em relação aos custos, demonstrando que as doenças do sistema respiratório oneram o sistema de saúde. As doenças do aparelho circulatório e respiratório consumiram cerca de metade dos custos com internações hospitalares de idosos brasileiros no ano de 20012424 Peixoto SV, Giatti L, Afradique ML, Costa MFL. Custo das internações hospitalares entre idosos brasileiros no âmbito do Sistema Único de Saúde. Epidemiol Serv Saúde. 2004;13(4):239-46.. Esse quadro é consistente com os resultados publicados anteriormente, nos quais esses dois grupos de causas corresponderam a cerca de 50,0% das internações realizadas entre idosos1717 Lima-Costa CMFF, Guerra HL, Barreto SM, Guimarães RM. Diagnóstico da situação de saúde da população idosa brasileira: um estudo da mortalidade e das internações hospitalares publicas. Informe Epidemiológico do SUS. 2000;9:23-41..

As pneumonias tanto podem estar associadas às comorbidades preexistentes nos idosos como à complicação do uso de ventilação mecânica em Unidade de Terapia Intensiva. Peixoto et al.2424 Peixoto SV, Giatti L, Afradique ML, Costa MFL. Custo das internações hospitalares entre idosos brasileiros no âmbito do Sistema Único de Saúde. Epidemiol Serv Saúde. 2004;13(4):239-46. observaram que na população idosa as doenças pulmonares estão entre as que mais afetam e consequentemente levam a maiores gastos de recursos públicos, principalmente nos idosos mais velhos, acima de 80 anos.

Lima-Costa et al.1717 Lima-Costa CMFF, Guerra HL, Barreto SM, Guimarães RM. Diagnóstico da situação de saúde da população idosa brasileira: um estudo da mortalidade e das internações hospitalares publicas. Informe Epidemiológico do SUS. 2000;9:23-41. apontam a importância de se obter informações sobre as condições de saúde da população idosa e suas demandas por serviços de atenção médica e social, dados fundamentais para o planejamento da atenção e promoção da saúde.

Diante disso, vale ressaltar que há necessidade de ampliar a atenção a esse grupo populacional, com a otimização de medidas preventivas mediante o aumento de investimentos nas rotinas de prevenção, bem como uma melhora global nas condições de vida do idoso, visando evitar o aparecimento de doenças, muitas vezes preveníveis, que implicam gastos onerosos ao SUS. O sistema deve se reestruturar, visando a promoção da saúde, prevenção de doenças, diagnóstico e tratamento precoce das enfermidades crônicas e das incapacidades associadas no adulto em geral e no idoso em particular.

Entre algumas limitações desse trabalho, pode-se considerar a fonte de dados utilizada, ou seja, os custos diretos médicos presentes nos prontuários que contavam apenas o custo total, não sendo possível identificar a informação dos custos por procedimento, o que permitiria uma caracterização mais profunda do perfil desses custos.

REFERÊNCIAS

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  • Trabalho realizado no Hospital Giselda Trigueiro (HGT) - Natal (RN), Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2015

Histórico

  • Recebido
    10 Jan 2015
  • Aceito
    25 Mar 2015
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