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Avaliação da implantação da atenção à pessoa com fissura labiopalatina em um centro de reabilitação brasileiro

Evaluation of the implantation of attention to the person with cleft lip and palate in a Brazilian rehabilitation center

Resumo

Introdução

A fissura labiopalatina é a anomalia craniofacial mais prevalente na população. Apesar das iniciativas de tratamento e reabilitação pelo SUS existirem desde 1993, há poucos estudos sobre a realidade dos centros brasileiros.

Objetivo

Avaliar a implantação da atenção à pessoa com fissura labiopalatina em um centro de reabilitação brasileiro.

Método

Pesquisa avaliativa do tipo avaliação do grau de implantação utilizando um estudo de caso. Inicialmente foi construída uma modelização da atenção com base na literatura internacional e nacional. Foi elaborada uma matriz com critérios, indicadores e padrões, validada pela técnica de consenso Delphi. Visitas com observação in loco e entrevistas semiestruturadas com informantes-chave foram realizadas.

Resultados

Observou-se grau avançado de implantação na dimensão Gestão (89,2%) e sua subdimensão Organização (94,7%), bem como na dimensão Reabilitação (84,9%). A subdimensão Gerência encontra-se incipiente (48,8%) com fragilidades na realização de reuniões, apoio à educação permanente, monitoramento dos resultados, avaliação da percepção dos usuários, educação em saúde, realização de busca ativa e relação com associação de apoio.

Conclusão

O centro avaliado apresentou implantação avançada, cumprindo em mais de 80% os critérios estabelecidos. Recomenda-se maior interação entre gestão e profissionais para intervir sobre os pontos para melhoria identificados. O instrumento desenvolvido pode contribuir para avaliação e implantação de outros centros.

Palavras-chave:
fissura labial; fissura palatina; avaliação em saúde; serviços de saúde; políticas de saúde

Abstract

Background

Cleft lip and palate is the most prevalent craniofacial anomaly. Although treatment and rehabilitation initiatives by SUS have existed since 1993, there are few studies on the reality of Brazilian centers.

Objective

This study evaluated the implantation of attention to the person with cleft lip and palate in a Brazilian rehabilitation center.

Method

Case study evaluation research to assess the degree of implantation in a rehabilitation center. In the first stage, we formulated a logic model of the attention to the person with cleft lip and palate based on international and national literature. The matrix was elaborated with the criteria, indicators and expected standards of care, which was validated by specialists through the Delphi consensus technique. Visits with on-site observation and semi-structured interviews were also carried out with key-informants of the center.

Results

We observed advanced level of implementation in Management (89.2%) and its subdimension, Organization (94.7%), as well as in Rehabilitation (84.9%). The A subdimension shows weaknesses (48.8%), mainly due to the lack of meetings, training and support to permanent education, monitoring of results and evaluation of users' perceptions, health education spaces, accomplishment of active search of the missing cases and support.

Conclusion

The evaluated center presented advanced implementation, fulfilling more than 80% of the evaluation. We recommend greater interaction between management and professionals to intervene on the identified points of improvement. The developed instrument contributes to the evaluation and implementation of other centers of reference in Brazil.

Keywords:
cleft lip; cleft palate; health assessment; health services; health policies

INTRODUÇÃO

A fissura labiopalatina (FLP) constitui a anomalia craniofacial mais prevalente na população 11 Martelli DR, Machado RA, Swerts MS, Rodrigues LA, Aquino SN, Martelli H Jr. Non sindromic cleft lip and palate: relationship between sex and clinical extension. Rev Bras Otorrinolaringol. 2012;78(5):116-20. http://dx.doi.org/10.5935/1808-8694.20120018. PMid:23108830.
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. A primeira iniciativa para tratamento e reabilitação no Sistema Único de Saúde (SUS) foi no ano de 1993, com a introdução de procedimentos para correção de FLP e realização de implante dentário osseointegrado na tabela do Sistema de Informações Hospitalares do SUS 22 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria SAS/MS nº 126, de 17 de setembro de 1993. Cria grupos e procedimentos para tratamento de lesões labiopalatais na tabela SIH/SUS, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 21 de setembro de 1993; . Em 1994, foi publicada a Portaria no 62, a qual estabeleceu as normas para o cadastramento de serviços de reabilitação da FLP 33 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria SAS/MS nº 62, de 19 de abril de 1994. Normaliza cadastramento de hospitais que realizem procedimentos integrados para reabilitação estético funcional dos portadores de má-formação lábio-palatal para o Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União, vol. 3, n. 74, p. 73. Brasília, 1994. .

O Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC-USP), apelidado de “Centrinho” desde a sua criação, foi o primeiro hospital universitário de São Paulo conveniado com o sistema público de saúde, e é uma instituição de referência na área no Brasil e em toda a América do Sul 44 Wellichan, DSP. Comportamento informacional de profissionais no domínioda saúde: um estudo junto ao Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo [dissertação]. Marilia: Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosofia e Ciências; 2015. 128 p. . Atualmente são 28 centros de atenção à pessoa com FLP no SUS, sendo quatro na região Nordeste 55 Brasil. Secretaria de Atenção à Saúde. Relatório de Gestão 2015 [Internet]. Brasília; Secretaria de Atenção à Saúde; 2015 [citado em 2016 abril 5]. Disponível em http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/relatorios-de-gestao.
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. Já existem, no âmbito internacional, diretrizes e padrões estabelecidos por consensos para a atenção à FLP, com destaque para as recomendações da American Cleft Palate Craniofacial Association66 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Parameters for evaluation and treatment of patients whit cleft lip/palate or other craniofacial anomalies. Chapel Hill: American Cleft Palate-Craniofacial Association; 2009. 34 p. e da Organização Mundial de Saúde 77 World Health Organization. Global strategies to reduce the health-care burden of craniofacial anomalies. Geneva: WHO; 2002. 161 p. . No SUS, a implantação está orientada apenas pela Portaria de credenciamento 33 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria SAS/MS nº 62, de 19 de abril de 1994. Normaliza cadastramento de hospitais que realizem procedimentos integrados para reabilitação estético funcional dos portadores de má-formação lábio-palatal para o Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União, vol. 3, n. 74, p. 73. Brasília, 1994. .

Diante do crescimento da rede e da complexidade de fatores que podem interferir na gestão e operacionalização das intervenções de saúde, a avaliação desses serviços pode revelar como estão sendo implantados nos diversos estados brasileiros 88 Contandriopoulos, AP. Avaliando a institucionalização da avaliação. Ciênc saúde coletiva; 2006;11(3):705-711. . A avaliação em saúde trata-se de um julgamento que se faz sobre intervenções, formalizadas ou não em políticas, planos e programas, voltadas para a resolução de problemas de saúde, com o objetivo de auxiliar na tomada de decisões 88 Contandriopoulos, AP. Avaliando a institucionalização da avaliação. Ciênc saúde coletiva; 2006;11(3):705-711. ,99 Vieira-da-Silva LM. Avaliação de políticas e programas de saúde. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz; 2014. 110 p. http://dx.doi.org/10.7476/9788575415467.
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. É um dos componentes do processo de gestão, com amplo espectro, o qual vai desde um julgamento de valor baseado em percepções primeiras até pesquisas avaliativas, com uso de metodologias científicas 99 Vieira-da-Silva LM. Avaliação de políticas e programas de saúde. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz; 2014. 110 p. http://dx.doi.org/10.7476/9788575415467.
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. O grau de implantação é um dos atributos das intervenções de saúde que pode ser objeto de uma pesquisa avaliativa, a qual fará a apreciação da operacionalização adequada de uma intervenção como esta foi ‘planejada’, também compreendida como avaliação de processo 1010 Vieira-da-Silva LM. Conceitos, abordagens e estratégias para a avaliação em saúde. In: Hartz ZMA, Vieira-da-Silva LM organizadores. Avaliação em Saúde: dos modelos teóricos às práticas na avaliação de programas e sistemas de saúde. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005. p. 15-39. .

A criação de um Grupo de Trabalho na área de FLP em 2013 e a definição de metas para 2014 de instituir critérios para organização, planejamento e monitoramento da atenção foram iniciativas identificadas por parte do Ministério da Saúde (MS) 1111 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Relatório de Gestão 2013 [Internet]. Brasília; 2015 [citado em 2016 abril 20]. Disponível em http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/relatorios-de-gestao
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. Todavia, os desdobramentos desse grupo não foram publicados, e essas metas foram repetidas nos Relatórios de Gestão para os anos de 2015 e 2016 55 Brasil. Secretaria de Atenção à Saúde. Relatório de Gestão 2015 [Internet]. Brasília; Secretaria de Atenção à Saúde; 2015 [citado em 2016 abril 5]. Disponível em http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/relatorios-de-gestao.
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,1212 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Relatório de Gestão 2014 [Internet]. Brasília; 2015. Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2015/maio/04/Relat--rio-de-Gest--o-da-SAS-2014-Final.pdf [citado em 2016 fev 20].
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, evidenciando que a lacuna na avaliação e aprimoramento dessa política na agenda do governo ainda permanece.

Somado a isso, há poucos estudos sobre a realidade dos centros brasileiros, e ainda que alguns tragam elementos do seu funcionamento como a presença de equipe multidisciplinar, uso de protocolos e vinculação a instituições de ensino superior 1313 Monlleó, IL; Gil-da-Silva-Lopes, VL. Anomalias craniofaciais: descrição e avaliação das características gerais da atenção no Sistema Único de Saúde. Cad Saúde Pública. 2006;22(5):913-922.

14 Maggi, A; Scopel, JB. Atendimento aos portadores de fissuras labiais e/ou palatais: características de um serviço. Aletheia. 2011(34):175-186.

15 Souza-Freitas, JA. et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies/USP (HRAC/USP) - Part 1: overall aspects. J Appl Oral Sci 2012a;20(1):9-15.
-1616 Queirós FC, Wehby GL, Vila-Nova C, Silva LPA. Standards of care for patients with orofacial clefts in Brazil: Starting a necessary debate. J Cranio Max Dis. 2013;2(2):122-9. , o conteúdo mais explorado são os aspectos clínicos do tratamento 1717 Freitas JA, Garib DG, Oliveira M, Lauris RC, Almeida AL, Neves LT, et al Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies - USP (HRAC-USP) - Part 2: Pediatric Dentistry and Orthodontics. J Appl Oral Sci. 2012b;20(2):268-81. http://dx.doi.org/10.1590/S1678-77572012000200024. PMid:22666849.
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18 Souza-Freitas, JA et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies - USP (HRAC-USP) - Part 3: Oral and Maxillofacial Surgery. J Appl Oral Sci 2012c;20(6):673-679.

19 Souza-Freitas, JA et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies/USP (HRAC/USP) Part 4: Oral Rehabilitation. J Appl Oral Sci 2013;21(3):284-292.
-2020 Tuji, FM.; Bragança, TA; Rodrigues, CF; Pinto, DPS. Tratamento multidisciplinar na reabilitação de pacientes portadores de fissuras de lábio e/ou palato em hospital de atendimento público. Rev Para Med 2009;23(2). . Destacam-se quatro artigos publicados pelos pesquisadores do HRAC/USP 1515 Souza-Freitas, JA. et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies/USP (HRAC/USP) - Part 1: overall aspects. J Appl Oral Sci 2012a;20(1):9-15. ,1717 Freitas JA, Garib DG, Oliveira M, Lauris RC, Almeida AL, Neves LT, et al Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies - USP (HRAC-USP) - Part 2: Pediatric Dentistry and Orthodontics. J Appl Oral Sci. 2012b;20(2):268-81. http://dx.doi.org/10.1590/S1678-77572012000200024. PMid:22666849.
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18 Souza-Freitas, JA et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies - USP (HRAC-USP) - Part 3: Oral and Maxillofacial Surgery. J Appl Oral Sci 2012c;20(6):673-679.
-1919 Souza-Freitas, JA et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies/USP (HRAC/USP) Part 4: Oral Rehabilitation. J Appl Oral Sci 2013;21(3):284-292. , entretanto nenhum dos trabalhos encontrados emite “julgamento de valor” sobre a implantação dos serviços. Nesse sentido, o presente estudo avaliou o grau de implantação da atenção à pessoa com FLP em um centro de reabilitação brasileiro, além de apresentar o instrumento avaliativo desenvolvido, o qual poderá ser utilizado para avaliar outros centros de referência, bem como auxiliar o processo de implantação de novos serviços.

MÉTODO

Foi realizada uma pesquisa avaliativa do tipo avaliação do grau de implantação utilizando como estudo de caso um Centro de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais, localizado na região nordeste do Brasil, e que faz parte da rede do Ministério da Saúde (MS) 55 Brasil. Secretaria de Atenção à Saúde. Relatório de Gestão 2015 [Internet]. Brasília; Secretaria de Atenção à Saúde; 2015 [citado em 2016 abril 5]. Disponível em http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/relatorios-de-gestao.
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. Esse tipo de estudo visa estabelecer em que medida uma intervenção está sendo implantada conforme foi concebida, e deve ser conduzido em cinco passos: (1) análise da situação inicial, (2) elaboração do modelo lógico da intervenção, (3) seleção de dimensões e critérios a partir do modelo lógico e elaboração de matriz para a avaliação do grau de implantação, (4) atribuição de pontos para cada critério e cálculo da percentagem referente ao valor máximo possível para cada critério, (5) classificação do grau da implantação 99 Vieira-da-Silva LM. Avaliação de políticas e programas de saúde. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz; 2014. 110 p. http://dx.doi.org/10.7476/9788575415467.
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.

O centro de reabilitação avaliado existe desde 1997, vinculado a uma instituição de caráter filantrópico e com todos os atendimentos realizados pelo SUS. Oferece serviços integrados de assistência social, psicologia, cirurgia, anestesia, especialidades odontológicas, enfermaria, fonoaudiologia, clínica médica, otorrinolaringologia e audiometria aos pacientes 2121 Obras Sociais Irmã Dulce. A OSID hoje [Internet]. Salvador; 2015. [citado em 2016 fev 12]. Disponível em: https://www.irmadulce.org.br/portugues/institucional/a-osid-hoje
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. Segundo informações do próprio serviço, possui cerca de três mil pacientes cadastrados, com uma média de atendimento de 240 casos novos por ano, realiza de 25 a 30 cirurgias (cirurgias plásticas, de enxerto ósseo e cirurgias ortognáticas) e de 6000 a 8000 atendimentos ambulatoriais mensais, a depender do mês do ano. Mais de 60% dos pacientes são do interior do estado e 94,6% em condição socioeconômica vulnerável 2222 Santos LB. As experiências com a fissura labiopalatal e os processos de estigmatização. [dissertação]. Bahia: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2016. [citado em 2016 maio 20]. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/21660.
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.

Para a seleção das dimensões e critérios para a avaliação, foi utilizado o modelo lógico da atenção à pessoa com fissura labiopalatina 2323 Almeida, AMFL; Chaves, SCL; Santos, CML; Santana, SF. Atenção à pessoa com fissura labiopalatina: proposta de modelização para avaliação de centros especializados, no Brasil. Rev Saúde Debate. 2017;41(N. esp.) ( Figura 1 ), correspondente a uma “imagem-objetivo” nas dimensões da gestão da atenção e da reabilitação . A gestão se refere à condução político-administrativa do serviço, que nesse estudo foi dividida em duas subdimensões: a organização – requisitos administrativos e de infraestrutura requeridos para o credenciamento junto ao MS3, e o gerenciamento das ações – atividades de coordenação da equipe, da atenção integral ao usuário, valorização profissional e instituição de práticas de avaliação. Na segunda parte do modelo, estão os objetivos da reabilitação do paciente, a qual envolve diagnóstico, intervenção precoce, atenção contínua com vistas à redução da perda da funcionalidade, à melhoria da qualidade de vida e à inclusão social.

Figura 1
Modelo lógico da atenção à pessoa com Fissura Labiopalatina (FLP) segundo as diretrizes da OMS (2002), da ACPA (2009; 2015), publicações do HRAC/USP e Portaria SAS/MS 62 de 19 de abril de 1994.

A matriz com critérios, indicadores e padrões construída a partir dessa modelização foi validada por cinco especialistas na área através da técnica de consenso Delphi2424 Souza LEPF, Vieira-da-Silva LM, Hartz ZM. Conferência de consenso sobre a imagem-objetivo da descentralização da atenção à saúde no Brasil. In: Hartz ZM, Vieira-da-Silva LM. organizadores. Avaliação em saúde: dos modelos teóricos às práticas na avaliação de programas e sistemas de saúde. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005. p. 65-91. . Os especialistas participantes do consenso foram das áreas de fonoaudiologia, cirurgia bucomaxilofacial, odontopediatria, psicologia e serviço social, todos com pós-graduação em reabilitação das anomalias craniofaciais, e experiência no serviço e/ou ensino, pesquisa e gestão ( Quadro 1 ). Apesar do número relativamente restrito de participantes, não há um número mínimo estabelecido pela técnica de consenso utilizada, e pode-se considerar uma amostra representativa levando-se em consideração as qualidades específicas do grupo 2424 Souza LEPF, Vieira-da-Silva LM, Hartz ZM. Conferência de consenso sobre a imagem-objetivo da descentralização da atenção à saúde no Brasil. In: Hartz ZM, Vieira-da-Silva LM. organizadores. Avaliação em saúde: dos modelos teóricos às práticas na avaliação de programas e sistemas de saúde. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005. p. 65-91. .

Quadro 1
Perfil profissional dos participantes do Comitê de Especialistas em atenção à pessoa com fissura labiopalatina, Brasil, 2017

A primeira versão da matriz foi enviada por e-mail a 14 especialistas, no qual constava o link em formato de questionário eletrônico, juntamente com uma carta-convite. O convite foi reenviado mais duas vezes com intervalo de 7 e 15 dias, respectivamente. Ao final, 6 especialistas aceitaram participar e cada um avaliou todos os critérios da matriz. Os participantes atribuíram pontos aos critérios elencados numa escala de 0 a 10, sendo a nota 0 (zero) referente à exclusão do critério, e nota 10 (dez) a nota máxima de importância e permanência. As respostas foram submetidas a um tratamento estatístico por meio do cálculo de tendência central e de dispersão. Os oito critérios com baixo grau de consenso e em dissenso foram enviados para uma nova apreciação pelos especialistas. O arquivo completo com as respostas da primeira rodada após o tratamento estatístico também foi enviado em anexo ao e-mail para conhecimento dos participantes, e havia possibilidade de modificá-las, caso desejassem. Nessa segunda e última rodada, cinco dos seis participantes responderam, e não houve sugestões dos especialistas para modificações ou criação de novos critérios. Os critérios foram considerados quanto à importância e grau de consenso.

A primeira versão da matriz apresentava um total de 82 critérios, sendo 26 para a dimensão de Gestão, 52 para dimensão de Reabilitação e quatro critérios de Resultados . A versão final da matriz utilizada apresentou 70 critérios considerados importantes e muito importantes, e com médio e alto grau de consenso ( Tabela 1 ). Foi estabelecida uma pontuação máxima que cada critério poderia atingir, considerando a nota recebida pelos especialistas e o grau de consenso. Os critérios considerados muito importante e com alto grau, muito importante e com médio grau, importante e com alto grau, importante e com médio grau receberam respectivamente as pontuações máximas de 8, 6, 4 e 2 pontos ( Tabela 1 ). A pontuação máxima que o serviço poderia atingir ficou em 406 pontos, divididos entre as dimensões de Gestão (150 pontos), Reabilitação (248 pontos) e Resultados (8 pontos) ( Tabelas 1 e 2 ). Para classificar o grau de implantação da atenção à pessoa com FLP considerando a matriz de critérios elaborada, foi estabelecida uma divisão em quartis: não implantado (0 - ≤ 25% do total de pontos máximos); incipiente (> 25% - ≤ 50%); intermediário (>50% - ≤ 75%); e avançado (>75%).

Tabela 1
Matriz com pontuação dos níveis, dimensões e critérios de avaliação do grau de implantação da atenção à pessoa com fissura labiopalatina em um centro do Nordeste, Brasil, 2017
Tabela 2
Grau de implantação da atenção à pessoa com fissura labiopalatina em um centro de referência da Região Nordeste, Brasil (2017)

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição avaliada sob parecer de número 990.341/2015, e a coleta de dados para avaliação do centro abrangeu análise dos relatórios da instituição 2121 Obras Sociais Irmã Dulce. A OSID hoje [Internet]. Salvador; 2015. [citado em 2016 fev 12]. Disponível em: https://www.irmadulce.org.br/portugues/institucional/a-osid-hoje
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,2525 Obras Sociais Irmã Dulce. Balanço Social 2014. Salvador; 2014. [citado em 2016 fev 12] Disponível em: <https://www.irmadulce.org.br/files/BalancoSocial/14/osid_balanco_social_2014.pdf.
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; entrevistas semiestruturadas com vinte e quatro informantes-chave do centro (gestão (1), profissionais (15) e usuários (8)); e diários de campo, com registro das observações e impressões das entrevistas.

O serviço conta com uma liderança, que assume o papel de gestão, profissionais administrativos, equipe de especialistas de nível superior e profissionais técnicos auxiliares, o que representaria uma amostra de trinta participantes. Desse total, vinte e cinco foram convidados pessoalmente pela entrevistadora a participar, dos quais dezesseis aceitaram e concederam entrevistas. Apesar de esse estudo não ter como foco avaliar a percepção dos usuários, foram realizadas oito entrevistas de usuários que concordaram participar da pesquisa enquanto aguardavam atendimento na sala de espera. Ainda que com limitações de representatividade, as respostas dos usuários auxiliaram no processo de triangulação dos dados.

Foram elaborados três roteiros para as entrevistas com profissionais da gestão, profissionais da equipe e usuário, com base nos critérios, indicadores e padrões derivados na versão final da matriz ( Tabela 1 ), os quais continham aspectos sobre organização da atenção, infraestrutura adequada, gerência, atenção e reabilitação, e indicadores de resultados. Maiores detalhamentos sobre os tópicos contemplados nos roteiros de entrevistas realizadas com a gestão, profissionais e usuários estão no Quadro 2 .

Quadro 2
Tópicos abordados nos roteiros de entrevistas semiestruturadas realizadas com gestor, profissionais e usuários de um centro de referência do Nordeste, Brasil, 2017

As entrevistas foram realizadas no próprio serviço, por uma única entrevistadora externa. Apenas um profissional da equipe optou por ser entrevistado em outro local por conveniência de agenda. Foi utilizada gravação com autorização prévia, e posterior transcrição pela entrevistadora. Três informantes-chave não concordaram com a gravação, e as informações foram registradas por escrito. As entrevistas tiveram duração média de 30 minutos cada.

As entrevistas foram analisadas a partir do seu conteúdo, e a atribuição de pontos para cada critério foi realizada por dois avaliadores externos separadamente, seguida por um encontro de consenso entre ambos, e foi baseada na triangulação das evidências encontradas das entrevistas com os informantes-chave, da observação in loco e da análise documental. O grau de implantação foi obtido a partir da porcentagem (%) de pontos obtidos em cada dimensão a partir da pontuação máxima proposta ( Tabelas 1 e 2 ).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O grau de implantação da atenção à pessoa com FLP no centro de reabilitação avaliado foi considerado avançado, atendendo em mais de 80% aos critérios estabelecidos com base na literatura nacional e internacional 66 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Parameters for evaluation and treatment of patients whit cleft lip/palate or other craniofacial anomalies. Chapel Hill: American Cleft Palate-Craniofacial Association; 2009. 34 p. ,77 World Health Organization. Global strategies to reduce the health-care burden of craniofacial anomalies. Geneva: WHO; 2002. 161 p. ,1515 Souza-Freitas, JA. et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies/USP (HRAC/USP) - Part 1: overall aspects. J Appl Oral Sci 2012a;20(1):9-15. ,1717 Freitas JA, Garib DG, Oliveira M, Lauris RC, Almeida AL, Neves LT, et al Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies - USP (HRAC-USP) - Part 2: Pediatric Dentistry and Orthodontics. J Appl Oral Sci. 2012b;20(2):268-81. http://dx.doi.org/10.1590/S1678-77572012000200024. PMid:22666849.
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,1818 Souza-Freitas, JA et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies - USP (HRAC-USP) - Part 3: Oral and Maxillofacial Surgery. J Appl Oral Sci 2012c;20(6):673-679. ,2323 Almeida, AMFL; Chaves, SCL; Santos, CML; Santana, SF. Atenção à pessoa com fissura labiopalatina: proposta de modelização para avaliação de centros especializados, no Brasil. Rev Saúde Debate. 2017;41(N. esp.) ,2626 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Standards for Approval of Cleft Palate and Craniofacial Teams. Commission on Approval of Teams. Chapel Hill: American Cleft Palate-Craniofacial Association; 2015. ,2727 Trindade IEK, Silva-Filho OG. Fissuras labiopalatinas: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo: Editora Santos; 2007. 337 p. ( Tabela 2 ). Na dimensão da Gestão, a partir do escore total das duas subdimensões (Organização e Gerência ), o grau de implantação também foi avançado, sendo os critérios de Organização os maiores pontuadores ( Tabela 2 ). Cabe destacar que este centro é resultado concreto da criação de novas instituições pelo crescimento da rede de serviços de atenção à pessoa com FLP no SUS a partir da década de 1990, revelando processo de consolidação dessa política de saúde, enquanto resposta do estado brasileiro a este flagelo social 2828 Paim JS, Almeida-Filho N. Análise de situação de saúde: o que são necessidade e problemas de saúde? In: Paim JS, Almeida-Filho N. Saúde Coletiva: Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Ed. Medbook; 2014. p. 29-39. ,2929 Pinell P. Análise sociológica das políticas de saúde. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2010. 252 p. .

Na subdimensão Gerência, o grau de implantação foi incipiente. Esse resultado ocorreu devido a alguns problemas evidenciados nos seguintes critérios: realização de reuniões regulares (C18), realização de treinamentos internos e apoio à educação permanente (C20), sistema de monitoramento dos resultados do tratamento (C21), sistema de avaliação da percepção dos usuários sobre o serviço (C22), espaços de educação em saúde para o paciente/família (C23), realização de busca ativa dos casos faltosos (C25) e contato/parceira com associação de apoio (C26), avaliados como incipientes ou não implantados ( Tabela 1 ).

Sobre a realização de reuniões regulares (C18), observou-se que estas acontecem em média duas vezes ao ano, e não agrega todos os profissionais da equipe:

Não está sendo muito (regular) não, a dos profissionais fixos é mais fácil ter, como cada um tem um horário, as pessoas jurídicas geralmente só pode ser dia de sábado, então a gente tenta a cada três meses , [...] as vezes fazemos algumas reuniões no dia de um grupo que está...vai fazendo isso, mas para a equipe geral... faz muita falta por sinal (Gestão).

Sim, com todos os profissionais tem duas vezes ao ano. Eu sempre venho, mas tem profissional que às vezes não vem (Profissional).

A ausência dessa regularidade de encontros e outros dados que emergiram das entrevistas, como as diferentes formas de contratação e cargas horárias dos membros da equipe e dificuldades de diálogo com a gestão, revelaram pouca aproximação desses profissionais entre si e, sobretudo, com a gestão do serviço.

[...] as decisões administrativas são passadas para a gente através de CI (comunicação interna). Os assuntos relacionados ao funcionamento mesmo são discutidos nessas reuniões maiores, mas aquilo que é mais técnico, [...] as questões administrativas a gente tem uma coordenação que faz essa parte de administração e nos passa as decisões (Profissional).

Outros pontos que reforçam essa distância é o desconhecimento dos indicadores e metas do serviço pelos profissionais, inclusive da sua própria especialidade, e o monitoramento dos casos mais concentrados nos profissionais da enfermagem e do serviço social, relacionados aos critérios C21 e C22.

A enfermeira tem um controle maior da evolução do paciente, porque são consultas periódicas, ela monitora se tem muito tempo que o paciente não passa em alguma especialidade, aí ela sempre encaminha (Profissional).

A cada três meses tem uma avaliação pela superintendência, toda a equipe do hospital faz. É uma avaliação com base em indicadores. Forneço essas informações a cada três meses (Gestão).

Não tenho conhecimento de como funcionam esses indicadores, sei que eles existem (Profissional).

[...] Eu não sei quais são as dificuldades enfrentadas, porque eu tenho o meu olhar muito voltado para o paciente, eu não tenho um olhar para fora, para a captação de recursos, isso eu não sei te dizer [...] (Profissional).

[...] Não participo (da gestão), fico na minha especialidade mesmo (Profissional).

Com relação ao critério C20, sobre a presença de treinamentos internos e apoio à educação permanente, destaca-se que os profissionais ligados à implantação do centro passaram por um processo de treinamento específico, à época em parceria com o Centrinho do HRAC/USP. Já aqueles mais novos na instituição não vêm recebendo essa formação.

[...] Vieram os módulos, Bauru fazia isso antigamente, mandava os módulos aí depois fazia a descentralização, participei dos módulos, treinava, mostrava como era o serviço e tal [...] (Profissional).

Não, nenhum treinamento. Eu lembro que o primeiro paciente que atendi tinha fissura palatina, fiquei com medo do paciente ter algum problema, a falta de experiência mesmo, fui aprendendo no dia a dia a lidar com eles (Profissional).

Precisa melhorar isso. Tem alguns profissionais que vão para congresso, apresentam alguns projetos, mas não são muitos não (Profissional).

[...] para o profissional CLT a instituição fornece (apoio), a gente faz um planejamento no começo do ano, manda para o RH, avaliam, e verificam dentro do possível financeiramente. [...] então ficamos mais presos à questão financeira (Gestão).

O modelo proposto para a gestão do SUS é apoiado na ideia do trabalho em equipe e em colegiados que garantam que o poder seja de fato compartilhado por meio de diagnósticos, análises, avaliações e decisões construídas coletivamente pelos gestores, trabalhadores da saúde e usuários 3030 Cunha PF, Magajewski F. Gestão Participativa e Valorização dos Trabalhadores: avanços no âmbito do SUS. Saúde Soc. 2012;21(1 Supl):71-9. . Assim, ainda que o serviço tenha um modelo próprio de gestão, o maior envolvimento dos profissionais, a incorporação mais efetiva da percepção dos usuários sobre o serviço e a ampliação de espaços de educação em saúde são estratégias para potencializar uma gestão mais democrática e participativa. A concepção de uma gestão mais participativa no SUS também caminha em paralelo com uma política de valorização dos trabalhadores 3030 Cunha PF, Magajewski F. Gestão Participativa e Valorização dos Trabalhadores: avanços no âmbito do SUS. Saúde Soc. 2012;21(1 Supl):71-9. .

A questão dos treinamentos e apoio à educação permanente se mostrou incipiente no caso estudado, e merece ser problematizada sobre dois aspectos: a importância da educação continuada para transformação das práticas e motivação profissional 3030 Cunha PF, Magajewski F. Gestão Participativa e Valorização dos Trabalhadores: avanços no âmbito do SUS. Saúde Soc. 2012;21(1 Supl):71-9. , e, no caso particular da fissura labiopalatina, para viabilizar processos de atualização da expertise do profissional, refletindo na manutenção da excelência dessa atenção 66 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Parameters for evaluation and treatment of patients whit cleft lip/palate or other craniofacial anomalies. Chapel Hill: American Cleft Palate-Craniofacial Association; 2009. 34 p. ,77 World Health Organization. Global strategies to reduce the health-care burden of craniofacial anomalies. Geneva: WHO; 2002. 161 p. ,2626 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Standards for Approval of Cleft Palate and Craniofacial Teams. Commission on Approval of Teams. Chapel Hill: American Cleft Palate-Craniofacial Association; 2015. . A questão financeira é um argumento frequentemente trazido pelos gestores dos serviços de saúde, mas não deve ser o único fator a ser considerado. A resposta aos desafios postos à gestão de recursos humanos vai depender de cada instituição, e há diferenças entre hospitais administrados segundo as regras públicas e privadas 3131 Morici MC, Barbosa ACQ. A Gestão de Recursos Humanos em hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) e sua relação ao modelo de assistência: um estudo em hospitais de Belo Horizonte, Minas Gerais. Rev Adm Pública. 2013;47(1):205-25. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-76122013000100009.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-7612201...
. Estudo em Belo Horizonte verificou que os serviços com administração pública possuem planos definidos e progressões baseadas em tempo de serviço e avaliações de desempenho, enquanto que nas instituições regidas por regras privadas não há definição formalizada de carreira e os aumentos salariais são isolados ou resultados de negociações sindicais 3131 Morici MC, Barbosa ACQ. A Gestão de Recursos Humanos em hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) e sua relação ao modelo de assistência: um estudo em hospitais de Belo Horizonte, Minas Gerais. Rev Adm Pública. 2013;47(1):205-25. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-76122013000100009.
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.

Quanto ao sistema de avaliação da percepção do paciente/família sobre os serviços, este também foi avaliado como não implantado. Os entrevistados reconhecem a existência de mecanismos como “Caixa de sugestões e reclamações” e “Ouvidoria”, porém não têm contato com o conteúdo desse material.

Sei que tem ouvidoria do Hospital, mas não tenho contato com essa parte, é mais a gestão e o serviço social (Profissional).

Abrantes et al. 3232 Abrantes CM, Tavres CMM, Flach DMAM, Andrade M. Acolhimento aos usuários e às suas demandas pelas Ouvidorias em saúde – Uma revisão integrativa. Revista Pró-univerSUS. 2017;08(1):31-7. destacam que as ouvidorias são um instrumento de participação, de poder e de avaliação dos serviços públicos, e permitem ao usuário exercer seu direito de cidadania. Através das ouvidorias, o usuário pode manifestar sua percepção 3333 Esperidião MA, Trad LAB. Avaliação de satisfação de usuários: considerações teórico-conceituais. Cad Saúde Pública. 2006;22(6):1267-1276,. sobre o acolhimento e atenção recebidos pelo serviço. Apesar de servir de base aos profissionais e gestores para educação continuada, planejamento de estratégias e ações para melhoria contínua da qualidade, verifica-se dificuldade de acesso às ouvidorias 3232 Abrantes CM, Tavres CMM, Flach DMAM, Andrade M. Acolhimento aos usuários e às suas demandas pelas Ouvidorias em saúde – Uma revisão integrativa. Revista Pró-univerSUS. 2017;08(1):31-7. .

A realização de busca ativa dos casos faltosos (C25) foi avaliada como incipiente, verificou-se que é uma prática bastante assistemática. Esse aspecto foi evidenciado na análise da subdimensão da Gerência (C25), do Serviço Social (C66) e dos Resultados (C69).

A gente começou a fazer revisão de prontuário para fazer busca ativa [...] uma vez por ano que a gente faz. Mas, no dia a dia a gente observa, aí normalmente quem faz essa triagem é a enfermeira (Gestão).

Hoje por conta dos custos, a gente liga menos para os pacientes, mas liga sim (Profissional).

Infelizmente não fazemos muito, eu gostaria que tivesse [...] (Profissional).

Tem a associação, às vezes algum paciente que não tem onde ficar a gente orienta procurar, mas não tem muita relação (Profissional).

A relação é pouco eficaz, não se comunica muito (Profissional).

A literatura destaca a necessidade de a gestão dos casos ser realizada de forma integrada para garantir qualidade e continuidade da assistência ao paciente e para uma reabilitação mais efetiva 66 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Parameters for evaluation and treatment of patients whit cleft lip/palate or other craniofacial anomalies. Chapel Hill: American Cleft Palate-Craniofacial Association; 2009. 34 p. ,77 World Health Organization. Global strategies to reduce the health-care burden of craniofacial anomalies. Geneva: WHO; 2002. 161 p. . Somado a isso, a busca ativa para continuidade do tratamento converge para o princípio da integralidade do SUS 3434 Brasil. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília. 20 de setembro de 1990 , e para o compromisso do serviço pela inclusão social desses indivíduos 77 World Health Organization. Global strategies to reduce the health-care burden of craniofacial anomalies. Geneva: WHO; 2002. 161 p. .

O contato, parceria e troca de informações entre o serviço e associações de apoio (C26) foi avaliado como não implantado. As dificuldades de relacionamento do serviço com a associação de apoio ao paciente não é uma realidade apenas do centro avaliado. Estudo de Monlleó e Gil-da-Silva-Lopes 1313 Monlleó, IL; Gil-da-Silva-Lopes, VL. Anomalias craniofaciais: descrição e avaliação das características gerais da atenção no Sistema Único de Saúde. Cad Saúde Pública. 2006;22(5):913-922. sobre os centros de reabilitação de anomalias craniofaciais no SUS mostrou que 14 (58,3%) deles não mantêm qualquer contato com as associações de apoio. É preciso avançar nesse debate, visto que mais de 60% dos pacientes atendidos são do interior do estado e estão em situação de vulnerabilidade social 2222 Santos LB. As experiências com a fissura labiopalatal e os processos de estigmatização. [dissertação]. Bahia: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2016. [citado em 2016 maio 20]. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/21660.
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. As associações são consideradas espaços importantes de participação e de criação de serviços de reabilitação no País, além de contribuir para redução dos abandonos 3535 Graciano MIG. Construindo espaços: a história das associações de pais e portadores de lesões lábio-palatais e a contribuição do Serviço Social. Serviço Social & Realidade. 2003;12(1):45-68. .

O modelo lógico que embasou essa avaliação foi construído a partir de uma concepção ampliada de saúde 2323 Almeida, AMFL; Chaves, SCL; Santos, CML; Santana, SF. Atenção à pessoa com fissura labiopalatina: proposta de modelização para avaliação de centros especializados, no Brasil. Rev Saúde Debate. 2017;41(N. esp.) . Assim, os critérios propostos na dimensão da Gestão , sobretudo na subdimensão da Gerência, contemplam elementos da gestão dos serviços que, além de recomendados pela literatura, podem potencializar o cumprimento dos princípios e diretrizes do SUS 77 World Health Organization. Global strategies to reduce the health-care burden of craniofacial anomalies. Geneva: WHO; 2002. 161 p. ,1515 Souza-Freitas, JA. et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies/USP (HRAC/USP) - Part 1: overall aspects. J Appl Oral Sci 2012a;20(1):9-15. ,2727 Trindade IEK, Silva-Filho OG. Fissuras labiopalatinas: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo: Editora Santos; 2007. 337 p. . Nesse sentido, os pontos para melhoria aqui apontados podem contribuir para o serviço avançar no cumprimento desses princípios e diretrizes.

A dimensão da Reabilitação, considerando o escore global, apresentou um grau de implantação avançado, alcançando mais de 84% dos pontos totais. As exceções foram a subdimensão equipe e o serviço social, que obtiveram grau intermediário ( Tabela 2 ).

A atenção à pessoa com FLP demanda profissionais especializados e vinculação do serviço com uma unidade hospitalar para realização dos procedimentos de alta complexidade 77 World Health Organization. Global strategies to reduce the health-care burden of craniofacial anomalies. Geneva: WHO; 2002. 161 p. ,1313 Monlleó, IL; Gil-da-Silva-Lopes, VL. Anomalias craniofaciais: descrição e avaliação das características gerais da atenção no Sistema Único de Saúde. Cad Saúde Pública. 2006;22(5):913-922. . No caso avaliado, o serviço pertence e funciona dentro de uma instituição hospitalar. Considerando a predominância de práticas tradicionais do modelo biomédico nessas unidades hospitalares, Campos e Amaral 3636 Campos GW, Amaral MA. A clínica ampliada e compartilhada, a gestão democrática e redes de atenção como referenciais teórico-operacionais para a reforma do hospital. Cien Saude Colet. 2007;12(4):849-59. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232007000400007. PMid:17680144.
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reforçam a necessidade de trazer para a prática clínica saberes provenientes da Saúde Coletiva, do Planejamento e da Gestão, e das Ciências Sociais e Políticas, com vistas a empreender mudanças estruturais e organizacionais.

Os papeis de cada especialista da Reabilitação e a importância da atuação interdisciplinar estão bem estabelecidos na literatura científica da área 66 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Parameters for evaluation and treatment of patients whit cleft lip/palate or other craniofacial anomalies. Chapel Hill: American Cleft Palate-Craniofacial Association; 2009. 34 p. ,77 World Health Organization. Global strategies to reduce the health-care burden of craniofacial anomalies. Geneva: WHO; 2002. 161 p. ,1515 Souza-Freitas, JA. et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies/USP (HRAC/USP) - Part 1: overall aspects. J Appl Oral Sci 2012a;20(1):9-15.

16 Queirós FC, Wehby GL, Vila-Nova C, Silva LPA. Standards of care for patients with orofacial clefts in Brazil: Starting a necessary debate. J Cranio Max Dis. 2013;2(2):122-9.

17 Freitas JA, Garib DG, Oliveira M, Lauris RC, Almeida AL, Neves LT, et al Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies - USP (HRAC-USP) - Part 2: Pediatric Dentistry and Orthodontics. J Appl Oral Sci. 2012b;20(2):268-81. http://dx.doi.org/10.1590/S1678-77572012000200024. PMid:22666849.
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18 Souza-Freitas, JA et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies - USP (HRAC-USP) - Part 3: Oral and Maxillofacial Surgery. J Appl Oral Sci 2012c;20(6):673-679.
-1919 Souza-Freitas, JA et al. Rehabilitative treatment of cleft lip and palate: experience of the Hospital for Rehabilitation of Craniofacial Anomalies/USP (HRAC/USP) Part 4: Oral Rehabilitation. J Appl Oral Sci 2013;21(3):284-292. ,2626 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Standards for Approval of Cleft Palate and Craniofacial Teams. Commission on Approval of Teams. Chapel Hill: American Cleft Palate-Craniofacial Association; 2015. ,2727 Trindade IEK, Silva-Filho OG. Fissuras labiopalatinas: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo: Editora Santos; 2007. 337 p. . Todavia, a pesquisa de campo revelou a existência de disputas entre as especialidades pelo protagonismo no processo de reabilitação, já evidenciadas em estudo anterior sobre o Centro 3737 Chaves SCL, Souza L, Almeida AMFL. Política de enfrentamento da fissura labiopalatina no Brasil: a emergência do Centrinho de Salvador, Bahia. Physis. 2016;26(2):591-610. , as quais podem ser objeto de análises mais aprofundadas a partir de referenciais sociológicos, na tentativa de contemplar ao máximo a sua complexidade.

A discussão de casos em conjunto pela equipe (C27), preconizada pelas diretrizes e recomendações internacionais 66 American Cleft Palate-Craniofacial Association. Parameters for evaluation and treatment of patients whit cleft lip/palate or other craniofacial anomalies. Chapel Hill: American Cleft Palate-Craniofacial Association; 2009. 34 p. ,77 World Health Organization. Global strategies to reduce the health-care burden of craniofacial anomalies. Geneva: WHO; 2002. 161 p. também apresenta dificuldades de implantação:

[...] A gente tem acessibilidade de chegar aos profissionais, mas não tem assim “sessão de discussão de casos”. Seria ótimo, seria fundamental, a gente se comunica muito via prontuário, é todo mundo muito ocupado, a maioria é pessoa jurídica, [...] (Profissional).

[...] fica mesmo a cargo dos profissionais que tomam essa iniciativa entre si [...] (Profissional).

Quanto ao incentivo à participação do paciente e da família no processo de tratamento (C29), verificou-se que a equipe em geral realiza, entretanto, alguns profissionais restringiram essa participação à assiduidade nas consultas, e outras falas revelaram aspectos sobre a forma como essas orientações vêm sendo realizadas, o distanciamento do processo terapêutico em si, permeados pela questão da vulnerabilidade social:

A gente procura conscientizar o paciente que a participação dele é fundamental. Mas às vezes é difícil. Às vezes eles danificam o material, a prótese, muitos não entendem o valor, a importância daquilo (Profissional).

Mesmo tentando conversar, chamar a atenção para a importância de eles perguntarem, esclarecer, da participação da família, às vezes ainda é um pouco distante, afastada. E o próprio serviço em si, não vejo uma preocupação com esse acolhimento total não (Profissional).

Às vezes tenho dificuldade de tirar dúvidas. Um profissional nunca é igual ao outro (Usuário).

O fornecimento de informação e orientação sobre o tratamento ao paciente/família de forma não discriminatória (C30) também apresenta evidências de problemas na implantação, sobretudo no acesso:

Eu acho que a recepção poderia ser melhor, eu acho que os pacientes daqui carregam um pouco o estigma do usuário de serviço público, sinto que falta um acolhimento, não do profissional, quando ele chega no profissional especializado ele é bem acolhido, falo isso por todos, eu sinto que na entrada, não é o recepcionista em si, mas o sistema está o tempo todo dizendo para o paciente ‘olha, se você não se comportar, você será desligado’ [...] (Profissional).

[...] O que a gente vê muito hoje é paciente sendo barrado da cirurgia, porque diz que é estético, claro que envolve a estética, mas que vai interferir na autoestima, na vida daquela pessoa [...] (Profissional).

Martins e Guanaes-Lorenzi 3838 Martins PPS, Guanaes-Lorenzi C. Participação da Família no Tratamento em Saúde Mental. Psic Teor e Pesq. 2016;32(4):1-9. reforçam que a construção de um espaço de cuidado para as famílias vai além da presença deles na instituição, é preciso um investimento cotidiano nas relações entre pacientes, familiares e profissionais, além do entendimento da subjetividade desses indivíduos.

Sobre o Serviço Social, os critérios que reduziram sua classificação foram a articulação dos encaminhamentos para outros serviços da rede conforme necessário (C64); a facilitação do contato do paciente com outras crianças e suas famílias através de grupos de apoio (C65); e a realização de busca ativa dos casos faltosos (C66). Observou-se que a articulação com outros serviços da rede para facilitar o acesso do paciente ao atendimento da sua demanda e o contato do paciente com grupos de apoio, também apresentam necessidade de melhorias:

[...] se é algum profissional que a gente não tem, eles dão o encaminhamento, a requisição, a assistente social indica, já dá o endereço [...] (Profissional).

[...] A documentação ortodôntica mesmo, o paciente já sai daqui direto para um local conveniado, eles não têm custo nenhum. O paciente sempre sai com alguma orientação (Profissional).

Eles não têm uma prioridade por serem fissurados ou por serem nossos pacientes, a gente tem muita dificuldade de encaminhamento para neuro, então dentro do próprio hospital muitas vezes eles não conseguem (Profissional).

[...] acabo não falando muito (da associação de apoio) (Profissional).

Cardoso, Graciano e Custódio 3939 Cardoso, CMF; Graciano, MIG; Custódio, SAM. Reconstruindo a história do serviço social em um hospital de ensino. RIPE 2015;19(36):84-107. , a partir da experiência no principal hospital público especializado na atenção a pessoas com anomalias craniofaciais, apontaram que o eixo condutor de ação do Serviço Social na equipe é a prevenção e/ou intervenção junto aos casos de abandono ou interrupção do tratamento, com os objetivos de viabilizar o acesso dessas pessoas, a continuidade da reabilitação, a inclusão e emancipação social. As autoras destacam ainda que o estímulo à participação dos usuários e familiares em diferentes espaços coletivos, como a associação de apoio, é elemento fundamental nesse processo 3939 Cardoso, CMF; Graciano, MIG; Custódio, SAM. Reconstruindo a história do serviço social em um hospital de ensino. RIPE 2015;19(36):84-107. .

Sobre os encaminhamentos do paciente na rede SUS, entende-se que, para além da orientação e referência, os serviços precisam articular esse encaminhamento para potencializar o acesso e a integralidade da atenção 3434 Brasil. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília. 20 de setembro de 1990 . Cecílio e Merhy 4040 Cecílio LCOP, Merhy EE. A integralidade do cuidado como eixo da gestão hospitalar. In: Pinheiro R, Mattos RA. Construção da Integralidade: cotidiano, saberes e práticas em saúde. Rio de Janeiro: UERJ, IMS, ABRASCO; 2003. p. 197-210. afirmam que a construção da linha do cuidado em função do usuário e de suas necessidades implica a necessidade de comprometimento entre os profissionais e gestores dos diversos pontos de atenção, com vistas a garantir uma coordenação responsável desse cuidado.

Na dimensão Resultados, a implantação foi considerada intermediária ( Tabela 2 ). Os critérios que obtiveram maior pontuação foram a cobertura cirúrgica conforme prevalência estimada (base nacional - 1,54/1000 nascidos vivos 4141 Nagem H Fo, Morais N, Rocha RGF. Contribuição para o estudo da prevalência das malformações congênitas labiopalatais na população escolar de Bauru. Rev Fac Odontol Univ são Paulo. 1968;6(2):111-128. ) (C67) e a indicação de 90% das crianças identificadas (casos novos) com cirurgia realizada até os 12 meses (padrão ouro/sempre que possível) (C69) ( Tabela 2 ).

A inclusão dos quatro critérios de Resultados na matriz de avaliação objetivou contemplar as sequelas mais marcantes das pessoas com FLP: a deformidade facial, corrigida cirurgicamente, e a alteração de fala, dependente de tratamento fonoaudiológico contínuo. Cabe destacar que a cobertura da reabilitação cirúrgica com base na prevalência nacional (1,54/1000 nascidos vivos 4141 Nagem H Fo, Morais N, Rocha RGF. Contribuição para o estudo da prevalência das malformações congênitas labiopalatais na população escolar de Bauru. Rev Fac Odontol Univ são Paulo. 1968;6(2):111-128. ) foi uma estimativa baseada no cálculo do número de nascidos vivos no estado no ano de 2015 (206.485) e no número de cirurgias realizadas no centro no mesmo ano (281). Haja vista que nem todo procedimento cirúrgico realizado foi de caso novo é, portanto, necessário considerar que, provavelmente a cobertura de caso novo seja menor. Sugere-se, nesse centro em particular, a incorporação de mais um profissional para realizar cirurgias de correção da FLP, no sentido de aumentar a cobertura real. Sugere-se também ampliação da divulgação do centro entre as maternidades e serviços de saúde da região para potencializar a realização de cirurgias de casos novos até os 12 meses de idade.

Com relação ao atendimento fonoaudiológico, considerando que a maioria dos pacientes são do interior do estado e a existência de dificuldades de transporte para assiduidade ao tratamento, é preciso ampliar os pontos de atenção da rede SUS para descentralizar o acesso. Sugere-se que os profissionais da equipe estreitem as relações com os fonoaudiólogos da rede de serviços do interior, para fornecer um apoio especializado. Os critérios propostos no instrumento são apenas uma aproximação dos resultados, estudos específicos de avaliação de resultados são necessários.

A partir dos pontos para melhoria identificados na avaliação, algumas recomendações para o serviço podem ser elencadas: a) realização de reuniões mais regulares entre a equipe; b) utilização de formas de interação e discussão de casos online, a exemplo de uma rede social ou um ambiente virtual como o moodle; c) criação de estratégias de divulgação dos indicadores e metas do serviço para a equipe; d) estabelecimento de um calendário de eventos, sessões científicas e capacitações; e) utilização de estratégias alternativas de menor custo para busca ativa, como os aplicativos de celulares para envio de mensagens de textos; f) potencialização da educação em saúde no espaço da sala de espera; g) qualificação da recepção sobre acolhimento e humanização no SUS; h) estreitamento dos laços com a Associação de Apoio e, assim, implantação em conjunto de estratégias de atenção psicossocial; i) fortalecimento do papel da gestão e do serviço social na articulação dos encaminhamentos pela rede SUS; j) ampliação do serviço de reabilitação cirúrgica; k) estabelecimento de parcerias ensino-serviço.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo produziu evidência importante sobre a atenção à pessoa com fissura labiopalatina no nordeste do Brasil. Aponta que, apesar de esse centro estar com implantação avançada, existe a necessidade de maior interação entre a gestão e profissionais, bem como de educação continuada e busca ativa sistemática dos casos faltantes para garantia da reabilitação pretendida. Embora o atendimento a esse grupo de pessoas tenha se expandido com a descentralização que ocorreu a partir do Centrinho de Bauru, o monitoramento da implantação e dos padrões de qualidade do atendimento nos centros especializados ainda não é uma realidade no País, como ilustra este estudo de caso. Esse trabalho oferece dados para gestores em saúde planejarem mudanças com o objetivo de aperfeiçoar a qualidade do atendimento oferecido pelo SUS às pessoas com FLP.

As reflexões críticas e sugestões refletem o ponto de vista da Saúde Coletiva e visam fomentar o debate, mobilizar profissionais, gestores e usuários para a construção de um serviço que busque superar suas dificuldades. É preciso considerar também que a matriz desenvolvida representa uma imagem-objetivo de um serviço com condições ótimas de gestão e reabilitação, e essa, provavelmente, não seja a realidade da maioria dos centros brasileiros. Além dos 28 serviços cadastrados atualmente no Ministério da Saúde, há outros locais que oferecem a reabilitação, principalmente cirúrgica, da FLP. O estudo avaliativo de outros casos se faz necessário para o aprimoramento do instrumento e estimular o debate sobre a necessidade de rever as diretrizes de credenciamento no SUS, no sentido de garantir a distribuição de recursos para centros com menor grau de implantação e incentivar a ampliação e melhoria da rede a médio e longo prazo.

As principais limitações do presente estudo foram a não inclusão de outras instâncias de gestão da instituição e fora dela, às quais o centro está vinculado, para melhor compreensão de sua atuação. Além disso, o presente estudo não incorporou o ponto de vista dos usuários, pela amostra reduzida, e por ter sido realizado em apenas um serviço. Cabe destacar que esse estudo contempla a aproximação das autoras com a área de avaliação em saúde e, apesar da presença de limitações, se constitui em um caso novo de aplicação da metodologia de avaliação do grau de implantação de uma intervenção em saúde trazida por Vieira-da-Silva e Hartz 99 Vieira-da-Silva LM. Avaliação de políticas e programas de saúde. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz; 2014. 110 p. http://dx.doi.org/10.7476/9788575415467.
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,1010 Vieira-da-Silva LM. Conceitos, abordagens e estratégias para a avaliação em saúde. In: Hartz ZMA, Vieira-da-Silva LM organizadores. Avaliação em Saúde: dos modelos teóricos às práticas na avaliação de programas e sistemas de saúde. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005. p. 15-39. . Pesquisas avaliativas sobre a percepção dos usuários, os resultados, o acesso e a cobertura, e a qualidade técnico-científica são necessários para o serviço. Recomendam-se análises de caso múltiplos para maior generalização desses achados.

  • O estudo foi realizado no Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA) – Salvador (BA), Brasil.
  • Fonte de financiamento: nenhuma.

REFERÊNCIAS

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    » http://dx.doi.org/10.5935/1808-8694.20120018
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2019

Histórico

  • Recebido
    26 Dez 2017
  • Aceito
    18 Out 2018
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