Perfil clínico-epidemiológico e sobrevida hospitalar dos casos de leucemia aguda em um hospital de referência em Rio Branco, Acre, 2007-2014

Clinical epidemiological profile and survival of hospital cases of acute leukemia in a reference hospital in Rio Branco – Acre, 2007-2014

Resumo

Introdução

A Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (UNACON) permite o tratamento de leucemias agudas no Acre.

Objetivo

Determinar o perfil clínico-epidemiológico e a sobrevida hospitalar de leucemias agudas tratadas na UNACON/Acre entre 2007 e 2014.

Método

É um estudo longitudinal e retrospectivo de pacientes com leucemias agudas entre 15/06/2007 e 31/12/2014, cujos prontuários médicos forneceram dados para a análise descritiva das variáveis e posterior análise de sobrevida acumulada em 1 ano e 2 anos (método Kaplan-Meier) e comparação das curvas de sobrevida (teste de log-rank).

Resultados

A sobrevida para leucemias mieloides agudas (LMA) foi de 30% e 32% em 1 e 2 anos, respectivamente, com pior sobrevida para pacientes masculinos, brancos, ≥ 20 anos de idade, leucometria < 20.000 células/mm³, desidrogenase lática ≥ 600 U/dl e subtipo diferente do M3. Para leucemias linfoides agudas (LLA), a sobrevida foi de 59% e 45% em 1 e 2 anos, respectivamente, com pior sobrevida para sexo feminino, ≥ 20 anos de idade e leucometria elevada. Em pacientes abaixo de 20 anos de idade com LLA, a melhor sobrevida foi observada na faixa etária de 2 a 9 anos.

Conclusão

Trata-se do primeiro estudo epidemiológico de sobrevida realizado no Acre para leucemias agudas com resultados coerentes com a literatura. Contudo, novas pesquisas deverão ser realizadas.

Palavras-chave:
leucemias agudas; sobrevida hospitalar; Kaplan-Meier; Acre

Abstract

Background

The High Complexity Oncology Unit (Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia - UNACON/Acre) allowed the treatment of acute leukemias in Acre.

Objective

To determine the clinical-epidemiological profile and hospital survival of acute leukemias treated at UNACON/Acre between 2007 and 2014.

Method

This is a longitudinal, retrospective study of patients with acute leukemias between 06/15/2007 and 12/31/2014 whose medical records provided data for descriptive analysis of the variables, and subsequent analysis of 1-year and 2-year cumulative survival (Kaplan Meier method) and comparison of survival curves (log-rank test).

Results

The survival for acute myeloid leukemia (AML) was 30 and 32% at 1 and 2 years, respectively, with a worse survival rate for males, white, age ≥20 years, leukometry <20,000 cells/mm³, lactic dehydrogenase ≥600 U/dl and subtype different from M3. For acute lymphoid leukemias (ALL), survival was 59 and 45% at 1 and 2 years, respectively. Female gender, age ≥20 years, and high leukometry had worse survival. For patients <20 years with ALL, better survival was observed in the age group of 2-9 years.

Conclusion

This is the first epidemiological study of survival in Acre for acute leukemias with results consistent with the literature. However, new studies should be performed.

Keywords:
acute leukemias; hospital survival; Kaplan-Meier; Acre

INTRODUÇÃO

Leucemias agudas são neoplasias malignas hematológicas decorrentes de alterações citogenéticas adquiridas, levando a um bloqueio da hematopoese, com repercussões sistêmicas importantes. São doenças de distribuição mundial, porém a epidemiologia pode sofrer variações relacionadas às características pertinentes ao subtipo de neoplasia. Elas se dividem em dois grandes grupos: as leucemias mieloides agudas (LMA) e as leucemias linfoides agudas (LLA), com características próprias e sobrevida e prognósticos distintos^1-6. Daí a importância dos estudos de sobrevida, que mostram como é o comportamento da doença à luz dos tratamentos empregados^2,6-9. Assim, as pesquisas de sobrevida hospitalar acabam por apresentar uma melhor seleção dos casos e de suas características, já que a população estudada é mais uniforme em comparação às pesquisas de sobrevida populacional.

Os estudos de sobrevida para LLA realizados em diferentes países mostram estatísticas bem parecidas. Pesquisas de sobrevida populacional indicam uma sobrevida infantil em torno de 80%^5-7,10, evidenciando uma mudança do curso natural dessa doença na população mais jovem. Por sua vez, trabalhos de sobrevida hospitalar mostram valores de sobrevida semelhantes e identificam subgrupos com melhor evolução, particularmente crianças menores de 10 anos, além de fatores prognósticos, como idade, leucometria e alterações citogenéticas^1,5,7. Já os estudos de sobrevida populacional para LLA em adultos apresentam probabilidades de sobrevida distintas^10-12. Valores de sobrevida em torno de 40 a 50% são comuns em adultos e com valores similares em sobrevida hospitalar, mostrando que esse grupo etário possui evolução mais reservada^6,7,13. Nesse sentido, estudos brasileiros têm relatado valores de sobrevida hospitalar e populacional em indivíduos jovens (< 20 anos) com LLA que variam entre 60 a 70%, enquanto em indivíduos adultos (> 20 anos) a sobrevida está em torno de 40 a 50%^1,5.

No que se refere à LMA, a probabilidade de sobrevida continua desafiadora. Pesquisas de sobrevida populacional mostram probabilidades de sobrevida inferiores a 30%, salvo alguns subtipos, como a leucemia promielocítica aguda (LPA ou LMA-M3) e a LMA CBF (core binding factor) positivas^14-17. Estudos brasileiros demonstraram sobrevida hospitalar ruim para LMA^1,2,8,18, com sobrevida similar à descrita nos trabalhos internacionais^4,12,19,20. Callera et al.⁹, em São Paulo, observaram sobrevida hospitalar de 5 anos em 11,7% dos casos de LMA; Bittencourt et al.²¹, no Rio Grande do Sul, relataram uma sobrevida hospitalar de 56 meses em 37% dos casos; e Souto et al.²², no Rio de Janeiro, em uma série de casos no período de 2000 a 2008, relataram uma sobrevida hospitalar de 5 anos em 26% dos casos. No entanto, pesquisas de sobrevida hospitalar também evidenciaram que as alterações citogenéticas que ocorrem nesses casos são o principal fator prognóstico na sobrevida, como observado na LPA e na LMA tipo CBF positiva^23,24.

Na região Norte do Brasil, em especial no estado do Acre, não há relatos acerca da epidemiologia dessas doenças e avaliação de sobrevida, mesmo que populacional. A descrição de casos de leucemias agudas na região, trazendo à tona suas características clínicas e epidemiológicas, além da possibilidade de se observar sua evolução e os fatores relacionados a ela, contribuem para melhorar a sobrevida dos pacientes com essas patologias. No Acre, a Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (UNACON), inaugurada em 2007, é referência no atendimento e tratamento dos pacientes com doenças oncológicas e onco-hematológicas em todo o estado. Nesse contexto, este estudo tem como objetivo estimar a sobrevida global dos casos de leucemias agudas tratados na UNACON/Acre, diagnosticados entre 2007 e 2014, e os possíveis fatores associados à sobrevida.

MÉTODO

População de estudo

Foi realizado um estudo longitudinal, com coleta de dados retrospectiva, que avaliou a sobrevida global da coorte hospitalar dos pacientes de leucemia aguda, adultos e crianças, tratados integralmente na UNACON/Acre entre junho de 2007 – quando a unidade iniciou suas atividades – e dezembro de 2014. Pacientes que receberam tratamento prévio em outros centros foram excluídos da análise.

Coleta de dados e variáveis de estudo

Foi realizada a revisão dos prontuários hospitalares dos pacientes que foram matriculados e tratados integralmente na UNACON no período de 15 de junho de 2007 a 31 de dezembro de 2014. Dados também foram coletados do sistema de informatização HOSPUB, que possibilita a armazenagem das informações dos pacientes e sua verificação. Foram coletadas informações sociodemográficas, do subtipo de leucemia e valores dos parâmetros laboratoriais no diagnóstico.

No presente estudo, as variáveis foram divididas em características epidemiológicas, como sexo, idade, cor da pele e naturalidade, e clínicas, como subtipo de leucemia e valores de leucometria, plaquetometria, hemoglobina, desidrogenase lática (LDH), transaminase glutâmico-oxalacética (TGO) e transaminase glutâmico-pirúvica (TGP). Como a idade é fator prognóstico clássico nos estudos de sobrevida de leucemias agudas, ela foi dividida em três faixas etárias: de 0 a 9 anos, de 10 a 19 anos e ≥ 20 anos. Para mostrar o impacto da idade na sobrevida para LLA, pacientes com idade inferior a 20 anos foram também subdivididos em três subgrupos: < 2 anos, de 2 a 9 anos e de 10 a 19 anos. A variável naturalidade foi categorizada em: capital Rio Branco e municípios do interior do estado. A cor da pele foi dicotomizada em: branca e outras (parda, indígena ou amarela). Os subtipos de leucemia aguda foram agrupados em LLA e LMA, por se tratarem de doenças diferentes. A partir da informação de imunofenotipagem, os casos de LMA foram classificados no subtipo LMA-M3 e outros subtipos, e os casos de LLA, nos subtipos T e B. Com relação aos parâmetros laboratoriais, na análise de sobrevida foram utilizadas a leucometria, categorizada de acordo com o valor aproximado da mediana na amostra de casos estudada (20.000 células/mm³), e a dosagem de LDH, categorizada também de acordo com a mediana observada (600 U/dL).

Análise estatística dos dados

A descrição das variáveis de estudo deu-se por meio de frequências relativas e absolutas, além de medidas de tendência central (média e mediana). O teste de qui-quadrado (χ²) avaliou as diferenças na distribuição de frequências das variáveis de estudo. A probabilidade acumulada de sobrevida global foi estimada pelo método de Kaplan-Meier e pelo teste de log-rank, sendo comparadas as curvas de sobrevida em função do sexo, cor da pele, faixa etária, subtipo de leucemia, leucometria e LDH no diagnóstico. A escolha dessas variáveis ocorreu por serem condições que se relacionam com a sobrevida de leucemias e por já terem sido empregadas em vários estudos de sobrevida^2-6,8,10,25. Na análise de sobrevida, a data do diagnóstico foi considerada como o início do seguimento; os óbitos decorrentes de leucemia aguda ou qualquer outra causa foram considerados como falhas; e a censura foi a data do último contato (perda de seguimento) ou a data final do seguimento para os pacientes vivos ao final do período de estudo. Foi estimada a sobrevida acumulada após 1 ano para os pacientes diagnosticados entre 15/06/2007 e 31/12/2014, e a sobrevida acumulada após 1 e 2 anos para os pacientes diagnosticados entre 15/06/2007 e 31/12/2013.

Foi adotado nível de significância igual a 0,05 em todas as comparações. A construção do banco de dados e a análise estatística foram realizadas pelo programa SPSS Statistic Data 20.0 (Statistical Package for the Social Sciences, Chicago, IL, EUA, 2008).

RESULTADOS

Durante o período de 15/06/2007 a 31/12/2014, foram tratados na UNACON 100 casos de leucemia aguda, sendo 65 com diagnóstico de LLA, 34 de LMA e 1 de leucemia bifenotípica. Do total, 11 pacientes receberam tratamento prévio em outros centros, restando 89 casos, 30 de LMA e 59 de LLA, para a análise da sobrevida.

A maioria dos casos de LMA tinha 20 anos ou mais, predominando o sexo feminino (Tabela 1). Em contrapartida, a maioria dos pacientes com LLA tinha idade inferior a 10 anos (χ² p-valor < 0,001 em relação à LMA), com predomínio do sexo masculino (χ² p-valor = 0,50 em relação à LMA). Tanto para LMA quanto para LLA, mais da metade dos pacientes era proveniente de municípios do interior do estado. Quanto à cor da pele, embora o número de informações ausentes fosse relativamente elevado, foi observada maior frequência de pacientes brancos entre os casos de LMA. Ainda para LMA, 11 pacientes (37%) eram casos de LMA-M3, enquanto o subtipo B foi o mais comum entre os pacientes com LLA (31%). Contudo, 61% dos casos de LLA não tiveram seu subtipo qualificado por meio de imunofenotipagem, pois houve indisponibilidade do exame ocasionalmente.

Tabela 1
Características sociodemográficas e subtipo dos casos de leucemias mieloides agudas (LMA) e leucemias linfoides agudas (LLA) tratados na Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (UNACON), Acre, 2007-2014 (N = 89)

	LMA (N = 30)	LLA (N = 59)	p-valor *
Variáveis	N (%)	N (%)
Sexo
Masculino	14 (47)	33 (56)	0,50
Feminino	16 (53)	26 (44)
Idade
0-9 anos	3 (10)	29 (49)	<0,001
10-19 anos	4 (13)	18 (31)
≥ 20 anos	23 (77)	12 (20)
Cor da pele
Branca	14 (47)	12 (20)	0,04
Outras	12 (41)	30 (51)
Naturalidade
Rio Branco	9 (30)	19 (32)	0,99
Outros municípios	16 (53)	33 (56)
Subtipos
LMA – M3	11 (37)
Outras	19 (63)
LLA-B		18 (31)
LLA-T		5 (8)

• ^*
  Qui-quadrado para comparação das distribuições entre LMA e LLA.

A mediana da leucometria mostrou o valor de 18.600 células/mm³ para LMA e de 15.150 células/mm³ para LLA. A mediana de hemoglobina para LMA e LLA foi de 6,39 e 6,5 g/dL, respectivamente, enquanto a mediana da plaquetometria foi de 24.000 células/mm³ para LMA e 34.100 células/mm³ para LLA. A dosagem da LDH alterou-se nos dois subgrupos, mas com valores mais elevados para LLA (mediana: 789 U/dL) do que para LMA (mediana: 523 U/dL). As dosagens de TGO e de TGP apresentaram médias elevadas, especialmente para LLA (TGO: 204 U/dL; TGP: 220 U/dL).

Para LMA, a probabilidade de sobrevida acumulada após 1 ano do diagnóstico foi de 30%, com uma mediana de 45 dias (Tabela 2 e Figura 1), e nenhum dos fatores estudados teve impacto significativo na sobrevida. Para LLA, a mediana de sobrevida foi maior que 365 dias, com uma probabilidade de sobrevida ao final de 1 ano de 61%, sendo a idade o único fator que mostrou impacto significativo na sobrevida, com os pacientes abaixo de 20 anos com sobrevida de 70% (log-rank p-valor < 0,001) (Tabela 2 e Figura 2). A sobrevida de 1 ano para ambos os subgrupos de LLA (B e T) foi similar (Tabela 2 e Figura 3). Analisando os casos jovens de LLA, foi observada melhor sobrevida de 1 ano para a faixa etária de 2 a 9 anos quando comparada com a de 10-19 anos de idade (p-valor = 0,02) e a com menos de 2 anos (p-valor = 0,01) (Figura 4).

Tabela 2
Probabilidade de sobrevida acumulada após 1 ano do diagnóstico para os casos de leucemias mieloides agudas (LMA) e leucemias linfoides agudas (LLA) diagnosticados no período de 2007 a 2014, de acordo com as características sociodemográficas e clínicas

	LMA						LLA
	N (%)	Óbitos N (%)	Mediana da sobrevida (dias)	Sobrevida 1 ano (%)	Log-rank p-valor		N (%)	Óbitos N (%)	Mediana da sobrevida (dias)	Sobrevida 1 ano (%)	Log-rank p-valor
Sobrevida global	30	21 (70)	45	30	-		59	23 (39)	>365	61	-
Sexo											0,19
Masculino	14 (47)	11 (79)	35	21	0,50		33 (56)	11 (33)	>365	67
Feminino	16 (53)	10 (63)	47	38			26 (44)	12 (46)	>365	53
Cor da pele											0,38
Branca	14 (54)	10 (71)	45	29	0,43		12 (29)	4 (33)	>365	67
Outras	12 (46)	7 (58)	210	42			30 (71)	14 (46)	>365	53
Idade											<0,001
< 20 anos	7 (25)	4 (57)	210	43	0,41		47 (80)	14 (30)	>365	70
≥ 20 anos	21 (75)	17 (81)	45	29			12 (20)	9 (75)	32	25
Leucometria (células/mm3)											0,41
< 20.000	14 (50)	11 (79)	60	29	0,92		28 (54)	8 (29)	>365	71
≥ 20.000	14 (50)	10 (71)	39	36			24 (46)	10 (42)	>365	58
LDH (U/dL)											0,42
< 600	11 (61)	6 (54)	326	45	0,21		14 (36)	7 (50)	358	50
≥ 600	7 (39)	5 (71)	18	29			25 (64)	8 (32)	>365	68
Subtipo
M3	11 (37)	8 (73)	35	36	0,97	B	18 (79)	7 (39)	>365	61	0,84
Outras	19 (63)	15 (79)	47	26		T	5 (21)	2 (40)	>365	60

Figura 1
Sobrevida de 1 ano para os casos de leucemia mieloide aguda (LMA) (2007-2014)

Figura 2
Sobrevida de 1 ano para os casos de leucemia linfoide aguda (LLA) de acordo com a idade (2007-2014)

Figura 3
Sobrevida de 1 ano para os casos de leucemia linfoide aguda (LLA) de acordo com o subtipo B e T (2007-2014)

Figura 4
Sobrevida de 1 anos para os casos de leucemia linfoide aguda (LLA) em crianças e adolescentes de acordo com a idade (2007-2014)

Entre 2007 e 2013, foram diagnosticados 69 casos de leucemia aguda, 25 de LMA e 44 de LLA. A distribuição das características sociodemográficas e do subtipo desses casos foi similar à descrita na Tabela 1. A sobrevida de 1 e 2 anos para esses 25 casos de LMA mostrou resultados semelhantes aos observados na coorte de casos diagnosticados entre 2007 e 2014, com probabilidade de sobrevida acumulada de 32% e mediana de 47 dias (Tabela 3 e Figura 5). Nessa coorte, pacientes que tinham níveis menores de LDH tiveram uma maior sobrevida, porém sem alcançar significância estatística (p-valor = 0,07).

Tabela 3
Probabilidade de sobrevida acumulada após 2 anos do diagnóstico para os casos de leucemias mieloides agudas (LMA) e leucemias linfoides agudas (LLA) diagnosticados no período de 2007 a 2013, de acordo com as características sociodemográficas e clínicas

Leucemia mieloide aguda (LMA)
		N (%)		Óbitos N (%)		Mediana da sobrevida (dias)		Sobrevida 2 anos (%)			Log-rank p-valor
Sobrevida global		25		17 (70)		47		32			-
Sexo											0,44
Masculino		10 (40)		8 (80)		39		20
Feminino		15 (60)		9 (60)		47		40
Cor da pele											0,30
Branca		11 (50)		8 (73)		47		27
Outras		11 (50)		6 (55)		250		46
Idade											0,29
< 20 anos		6 (26)		3 (50)		210		50
≥ 20 anos		17 (74)		12 (70)		47		29
Leucometria (células/mm3)											0,87
< 20.000		13 (54)		9 (70)		65		31
≥ 20.000		11 (46)		7 (64)		47		36
LDH (U/dL)											0,07
< 600		10 (67)		5 (50)		326		50
≥ 600		5 (33)		4 (80)		16		20
Subtipo											0,92
M3		10 (40)		6 (60)		35		40
Outros		15 (60)		11 (75)		60		27
Leucemia linfoide aguda (LLA)
	N (%)	1 ano					2 anos
		Óbitos N (%)	Mediana (dias)		SBV * (%)	Log-rank p-valor	Óbitos N (%)		Mediana (dias)	SBV (%)		Log-rank p-valor
Sobrevida global	44	18 (41)	>365		59	-	24 (55)		528	45		-
Sexo						0,15						0,09
Masculino	27 (61)	9 (33)	>365		67		12 (44)		>730	55
Feminino	17 (39)	9 (53)	327		47		12 (71)		677	28
Cor da pele						0,63						0,88
Branca	10 (34)	4 (40)	>365		60		6 (60)		438	36
Outras	19 (66)	9 (47)	>365		53		10 (53)		511	47
Idade						0,004						0,002
< 20 anos	34 (77)	11 (32)	>365		68		16 (65)		>730	53
≥ 20 anos	10 (33)	7 (70)	39		30		8 (90)		39	15
Leucometria (células/mm3)						0,04						0,08
< 20.000	20 (78)	4 (20)	>365		80		8 (72)		730	58
≥ 20.000	17 (22)	9 (53)	260		47		11 (63)		260	35
LDH (U/dL)						0,99						0,37
< 600	11 (38)	4 (36)	>365		64		4 (36)		>730	64
≥ 600	18 (62)	6 (33)	>365		67		10 (56)		579	44
Subtipo						0,44						0,73
B	12 (80)	7 (58)	327		42		8 (67)		327	31
T	3 (20)	1 (33)	260		68		2 (67)		260	33

• ^*
  SBV : sobrevida

Figura 5
Sobrevida em 2 anos para os casos de leucemia mieloide aguda (LMA) (2007-2013)

Para os casos de LLA diagnosticados entre 2007 e 2013, a sobrevida de 1 ano foi de 59%, maior que a sobrevida de 2 anos, com mediana maior que 365 dias. Para sobrevida de 2 anos, a probabilidade acumulada foi de 45% e a mediana foi de 528 dias (Tabela 3). Novamente, a idade mostrou impacto significativo na sobrevida para os casos de LLA, com pacientes acima de 20 anos apresentando menor sobrevida do que pacientes jovens, tanto na análise de sobrevida de 1 ano (p-valor = 0,004) quanto na de 2 anos (p-valor = 0,002), assim como houve impacto estatístico em crianças e adolescentes (Tabela 3, Figuras 6, Figura 7). Todavia, a sobrevida de 1 ano foi pior para os pacientes com leucometria elevada do que aqueles com valores mais baixos (p-valor = 0,04) (Tabela 3, Figura 8).

Figura 6
Sobrevida de 2 anos para os casos de leucemia linfoide aguda (LLA) de acordo com a idade (2007-2013)

Figura 7
Sobrevida de 2 ano para os casos de leucemia linfoide aguda (LLA) em crianças abaixo e acima de 2 anos e em adolescentes (2007-2013)

Figura 8
Sobrevida de 2 ano para os casos de leucemia linfoide aguda (LLA) de acordo com a leucometria (2007-2013)

DISCUSSÃO

Neste estudo, que avaliou a sobrevida hospitalar dos pacientes com leucemia aguda tratados em um hospital de referência no Acre, no período de 2007 a 2014, foi observada uma probabilidade de sobrevida similar aos estudos de sobrevida disponíveis na literatura: nos casos de LMA, a sobrevida de 1 e 2 anos foi de 30% e 32%, respectivamente; nos casos de LLA, a sobrevida de 1 e 2 anos foi de 61% e 45% respectivamente; e os pacientes abaixo de 20 anos tiveram melhor sobrevida de 1 ano do que os pacientes acima de 20 anos (70% e 25%, respectivamente) e também em 2 anos (53% e 15%, respectivamente). A leucometria mostrou influência sobre a evolução. Nas características epidemiológicas, foi constatada a importância da idade na distribuição dos casos de leucemias agudas, bem como o predomínio dos subtipos LMA-M3 e LLA-B, características compartilhadas com os dados já descritos em outros estudos^1,5,8,21-23.

A sobrevida dos casos de LMA não diferiu muito dos dados encontrados na literatura brasileira e estrangeira^9,19,26. Nenhum dos fatores analisados teve impacto significativo na sobrevida de LMA, apesar de algumas observações. Níveis de LDH elevados estiveram relacionados com pior sobrevida, particularmente na sobrevida de 2 anos. Essa variável é clássica na avaliação de fatores prognósticos na sobrevida de pacientes com leucemia aguda, e valores elevados significam que há alta atividade de doença, interferindo negativamente na evolução dos pacientes²⁵. O subtipo LMA-M3 apresentou melhor sobrevida ao final de 1 ano, porém o tempo de sobrevida foi inferior ao encontrado em estudo brasileiro de sobrevida hospitalar²³ e em estudos internacionais de sobrevida populacional^15,19,26. Fatores como infraestrutura hospitalar e acesso limitado a serviços de saúde podem ter influenciado o desfecho desses pacientes. Outro fator relacionado à sobrevida dos casos de LMA é o valor da leucometria inicial. Leucometrias elevadas se relacionam com pior prognóstico, mas, neste estudo, leucometrias mais altas se mostraram com melhor probabilidade de sobrevida, tanto em 1 ano quanto em 2 anos. Leucometria elevada, principalmente valores acima de 100.000 células/mm³, é descrita como fator relacionado à pior sobrevida^8,27. Contudo, o valor de leucometria no diagnóstico deve ser analisado também sob outras condições, como idade e subtipos^8,25,27,28

Para LLA, a idade foi um fator com impacto significativo na sobrevida, com melhor evolução dos pacientes jovens, particularmente na faixa etária de 2 a 9 anos (sobrevida de 88%), e sobrevida bem inferior (25%) em pacientes com idade igual ou superior a 20 anos, o que está de acordo com a literatura^5,29,30. Pacientes com LLA em faixas etárias mais altas apresentaram alterações citogenéticas de mau prognóstico, o que explicaria a sobrevida mais reservada nesse grupo. Os casos abaixo de 2 anos representaram 11% dos pacientes com LLA menores de 20 anos, e sua probabilidade de sobrevida de 1 ano foi de 40%. Alterações genéticas de mau prognóstico, por exemplo, rearranjo do gene MLL, além de outros fatores, como infiltração do sistema nervoso central e hiperleucocitose, relacionam-se com a evolução ruim de pacientes com LLA abaixo de 2 anos^1,10,16,31. A leucometria dos pacientes com LLA também esteve relacionada à sobrevida desses casos, com valores inferiores a 20.000 células/mm³, com melhor evolução em 1 ano. Corroborando os achados desta pesquisa, estudos anteriores demonstraram que a leucometria inicial se apresenta como fator prognóstico de sobrevida, sendo utilizada, inclusive, como critério de estratificação de risco para LLA^5,13,32,33.

Os resultados encontrados no presente estudo mostram algumas características dos pacientes portadores de leucemias agudas no Acre. Até o momento, nenhum trabalho analisou a epidemiologia dessas doenças no estado, a não ser por análises de tendência de mortalidade para neoplasias malignas sólidas e incidência de câncer em Rio Branco³⁴. Com a inauguração da UNACON em 2007, essa condição mudou, e os pacientes puderam ser tratados no Acre. Contudo, algumas limitações são encontradas. Em primeiro lugar, não foi possível incluir a totalidade de casos incidentes de leucemias agudas do estado. Nos primeiros anos de funcionamento da UNACON, muitos pacientes foram encaminhados para tratamento fora do Acre, principalmente adultos, pois pacientes pediátricos contam, desde 2007, com profissionais nessa área. Só a partir do final do ano de 2009 que as leucemias agudas começaram a ser tratadas na unidade. Assim, alguns casos não tinham sequer o registro do diagnóstico na UNACON antes de sua transferência. Esses casos eram de pacientes que foram tratados exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), e pacientes com maior nível socioeconômico podem ter utilizado serviços privados locais ou em outros estados. Contudo, o Acre é um estado com baixa renda per capita, em que a grande maioria da população utiliza o SUS para diagnóstico e tratamento. A UNACON é uma unidade pública de atendimento oncológico e referência para doenças oncológicas e onco-hematológicas no estado. Portanto, apesar de algumas condições impedirem o acesso a 100% dos casos incidentes, acredita-se que a maioria deles foi atendida nessa unidade.

Outras limitações foram a baixa qualidade dos registros e a falta de registro de alguns pacientes na UNACON, gerando uma procura pelos registros dos pacientes em outras clínicas e unidades para a coleta adequada dos dados e a regularização do registro na unidade. A presença de valores ausentes em algumas das variáveis analisadas pode ter influenciado alguns dos resultados, mas o fato de os achados terem se mostrado consistentes com a literatura sugere que vieses importantes não ocorreram.

O presente estudo avaliou as características e a evolução dos casos incidentes de leucemias agudas em uma região escassa de estudos epidemiológicos de neoplasias hematológicas e que, historicamente, apresenta restrições na área da saúde pública. Os estudos de sobrevida hospitalar, como este em questão, são o reflexo das estratégias terapêuticas empregadas contra as doenças. Não obstante, há a necessidade de que outras pesquisas sejam feitas, com intuito de aprofundar o comportamento pertinente a esses casos e seus desdobramentos em novas abordagens de conduta e tratamento no estado do Acre.

• Trabalho realizado na Unidade de Atendimento de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) – Rio Branco (AC), Brasil.
• Fonte de financiamento: nenhuma.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  17 Dez 2021
• Data do Fascículo
  Jul-Sep 2021

Histórico

• Recebido
  27 Nov 2018
• Aceito
  20 Jul 2020