A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde e sua relação com a odontologia

The National Policy for Permanent Education in Health and its correlation with dentistry

Resumo

Introdução

O Sistema Único de Saúde tem passado por diversas mudanças, assim, diante do desafio de formação dos profissionais da saúde, o Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS), e a Educação Permanente em Saúde (EPS) passou a ser uma estratégia de transformação.

Objetivo

Analisar a percepção dos cirurgiões-dentistas (CD) sobre a PNEPS.

Método

Trata-se de um estudo epidemiológico, transversal e qualitativo, realizado no município de Fortaleza-CE. A população-alvo foram os CDs da Estratégia Saúde da Família (n = 173). Os dados foram coletados por meio de um questionário. A caracterização dos sujeitos da pesquisa foi realizada através do cálculo de frequência absoluta e percentual. Para avaliar as questões discursivas utilizou-se a análise de conteúdo de Bardin.

Resultados

A idade média da amostragem foi de 38.8 anos (±8.6), e o tempo de formação de 16.0 anos (±7.4). A maioria dos entrevistados eram do gênero feminino (74,6%) e casados (72,8%). As categorias encontradas foram: necessidade de atividades de EPS, aprendizagem significativa, trabalho em equipe, e Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs).

Conclusão

A EPS deve ser significativa, discutindo as dificuldades referentes ao trabalho em equipe. Dessa forma, sugere-se a utilização das TDICs para o desenvolvimento das atividades.

Palavras-chave:
educação; estratégia saúde da família; saúde bucal

Abstract

Background

The Brazilian Unified Health System has undergone several changes, and accordingly, when confronted with the challenge of training health professionals, the Brazilian Ministry of Health instituted the National Policy for Permanent Education in Health (PNEPS, Portuguese acronym for Política Nacional de Educação Permanente em Saúde), hence, the Permanent Education in Health (EPS) became a transformational strategy.

Objective

To analyze the perception of dental surgeons (DS) regarding the PNEPS.

Method

This is an epidemiological, cross-sectional and qualitative study, carried out in the city of Fortaleza-Ce. The target population were the DSs of the Family Health Strategy (n=173). The data were collected by means of a questionnaire. The characterization of the research subjects was performed through absolute and relative frequency. To assess the discursive questions, Bardin’s content analysis was used. Results: The average age was 38.8 years (±8.6), and the average years of schooling was 16.0 years (±7.4). Most respondents were female (74.6%) and married (72.8%). The categories found were: demand for EPS activities, meaningful learning, teamwork, and Digital Information and Communication Technologies (DICTs).

Conclusion

The EPS should be substantial, discussing the difficulties related to teamwork. Therefore, the use of the DICTs is recommended for the development of activities.

Keywords:
education; family health strategy; oral health

O Sistema Único de Saúde (SUS) tem passado por diversas mudanças e enfrentado grandes dificuldades, um dos grandes desafios encontrados sendo a formação dos recursos humanos. Tal fato tem chamado a atenção dos gestores e pesquisadores, devendo ser ressaltado como primordial para o desenvolvimento de uma atenção à saúde de qualidade^1-4.

Estratégias como o Programa Nacional de Reorientação da Formação do Profissional em Saúde - Pró-Saúde, o Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde - Pet-Saúde, o Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica - PROVAB e o Mais Médicos têm tentado instituir uma política de formação profissional, buscando integrar práticas de educação, saúde e traballho^2,5,6.

Destaca-se o fato do Ministério da Saúde (MS) ter instituído em fevereiro de 2004 a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) através da portaria n^o 198 GM-MS, apresentado como estratégia de transformação das práticas e da formação dos profissionais de saúde⁷.

As diretrizes dessa política foram estabelecidas em 2007, com a Portaria n^o 1996 GM-MS⁸, mas somente em 2011 foram definidos os recursos financeiros repassados pelo MS para essa Política, através da portaria n^o 2200 GM-MS^{9, o} que garantiu um novo incentivo para a implementação da PNEPS. Ressalta-se que em 28 de novembro de 2017 foi lançada a Portaria n^o 3.194, o PRO EPS-SUS, que objetiva estimular e melhorar a qualificação profissional dos trabalhadores da área da saúde, utilizando as diretrizes da Política Nacional de Educação Permanente em saúde¹⁰.

A referida PNEPS considera a responsabilidade constitucional do MS de ordenar a formação de recursos humanos para a área de saúde e de incrementar, na sua área de atuação, o desenvolvimento científico e tecnológico; destacando também a importância da integração entre o ensino da saúde, o exercício das ações e serviços, a condução da gestão e da gerência e a efetivação do controle da sociedade sobre o sistema de saúde, como dispositivo de qualificação das práticas de saúde e da educação dos profissionais da área⁷.

A Educação Permanente em Saúde (EPS) passa, desta forma, a ser uma estratégia de transformação do SUS, sendo considerada um conceito pedagógico no setor da saúde, efetuando relações orgânicas entre a docência e atenção à saúde^7,11.

Contudo, para que a EPS aconteça, é preciso inovar os processos de formação dos trabalhadores, rompendo com os modelos tradicionais de capacitação que tratam os processos de trabalho de forma fragmentada e descontextualizada, baseada apenas na transmissão de conhecimentos^2,12. A EPS é, portanto, uma ferramenta que prioriza o diálogo, a cooperação e a integralidade entre os espaços de gestão, assistência, formação e controle social, buscando ampliar a capacidade do sistema de resolver um problema com eficácia⁸.

A EPS objetiva a transformação dos processos de trabalho e dos profissionais de saúde, o principal foco sendo a melhoria no serviço prestado à população. Em outras palavras, não se trata exclusivamente de um processo pedagógico, mas de um processo político-pedagógico, que tem a capacidade de modificar os processos de trabalho na saúde, tornando os profissionais, os gestores e os usuários atores ativos no processo de aprendizagem^13-15.

Diante disso, Ceccim¹⁶ afirma que a EPS foi adotada pelo MS com o objetivo de transformar a saúde pública em uma rede de ensino-aprendizagem, destacando a ampla intimidade entre formação, gestão, atenção e participação popular nessa área de saberes, através de atividades realizadas por intermédio da educação na saúde.

Na graduação em odontologia, desde a implantação das novas diretrizes curriculares nacionais em 2002, busca-se a formação de um profissional capaz de aprender continuamente, na sua formação e na sua prática¹⁷. Associado a isto, é evidente a importância da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) como um agente transformador do Sistema Único de Saúde, e entender como essa proposta é implementada nas capitais brasileiras torna-se uma importante ferramenta de gestão, justificando a realização de pesquisas voltadas para uma melhor compreensão e aprimoramento da PNPES. O presente estudo tem como objetivo analisar a percepção dos cirurgiões-dentistas quanto à Estratégia Saúde da Família (ESF) sobre a referida política.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo epidemiológico, transversal e qualitativo, realizado no Município de Fortaleza-CE, nas Unidades de Atenção Primária em Saúde (UAPS) distribuídas pelas seis Secretarias Regionais (SR) onde atuam as equipes da ESF. Fortaleza é capital do Estado do Ceará, localizado na região Nordeste do Brasil, possuindo 130 UAPS até outubro de 2020.

A população-alvo desta pesquisa foram os cirurgiões-dentistas (CD) da ESF do Município de Fortaleza-CE. Em fevereiro de 2014, a população (N) era de 284, de acordo com o Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB). A amostra foi por conveniência e, para a definição desta, foi utilizado um erro amostral de 5%, um nível de confiança de 95% e considerado um percentual de observação (p) de 50%, ápice de confiança estatística para cálculos amostrais de dados binários quando a frequência da variável do estudo é desconhecida. Prevendo, por fim, uma amostra (n) de 164. Os dados foram coletados com n de 173, com o objetivo de prevenir possíveis perdas de dados. Não houve recusas por parte dos entrevistados em participar da pesquisa.

O critério de inclusão na pesquisa foi a atuação do CD na ESF há pelo menos dois anos. Foram excluídos os profissionais afastados das suas funções na ESF devido à atuação na gestão ou na atenção secundária, além daqueles de férias ou de licença no momento da coleta dos dados.

Os dados foram coletados através de um questionário semiestruturado. Este instrumento passou por uma validação de face, na qual foi apresentado inicialmente a uma equipe de especialistas no assunto, que verificaram a elaboração e aplicabilidade de cada pergunta. Em um segundo momento, foi realizado um estudo piloto do instrumento de coleta de dados com o objetivo de verificar possíveis alterações necessárias. Ressalta-se que esses questionários não foram contabilizados nos resultados finais da pesquisa. As entrevistas foram conduzidas nas UAPS onde os especialistas trabalhavam, ou em reuniões de equipes realizadas pela Secretaria Municipal de Saúde. A coleta de dados ocorreu de agosto de 2014 a agosto de 2015.

A caracterização dos sujeitos da pesquisa foi realizada através do cálculo de frequência absoluta e percentual. Para a avaliação das questões discursivas, utilizou-se a análise de conteúdo de Bardin, que tornam replicáveis e válidas as inferências sobre dados de um contexto, através de procedimentos especializados e científicos¹⁸.

Os itens trabalhados questionavam quais as principais dificuldades para a implementação das ações de EPS, e quais as sugestões para melhorar as referidas atividades. A técnica de análise foi dividida em três fases: a primeira sendo a pré-análise, a segunda, a exploração do material e a terceira, o tratamento dos resultados, inferência e interpretação.

Após diversas leituras do material coletado, atingiu-se um nível mais profundo de interpretação, ultrapassando os sentidos manifestos do material e construindo, dessa maneira, as categorias estabelecidas através das falas dos participantes. De forma que as ideias semelhantes foram agrupadas, definindo as categorias de acordo com as opiniões dos entrevistados e com o referencial teórico do estudo.

Para a preservação da identidade dos participantes utilizou-se o codinome CD, e todos os questionários foram numerados. O número identificador foi associado ao codinome CD de forma aleatória.

O estudo foi realizado conforme as exigências da resolução Nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, com aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará sob o parecer Nº 526.915, (CAAE: 25677613.8.0000.5054).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A amostra final do estudo foi composta por 173 cirurgiões-dentistas da ESF, com idade média de 38,8 anos (±8,6) e média de tempo de formação de 16,0 anos (±7,4). A maioria dos entrevistados eram do gênero feminino (74,6%), casados (72,8%), e com renda média de 7-10 salários-mínimos (50,6%).

Em relação aos dados qualitativos, buscou-se organizar as respostas observando as semelhanças conceituais dos discursos, agrupando-as em categorias, conforme delineado no Quadro 1.

Quadro 1
Descrição das categorias originadas da percepção dos cirurgiões- dentistas e seus significados, Fortaleza-2015

CATEGORIAS	SIGNIFICADOS
Categoria 1: Necessidade de atividades de Educação Permanente em Saúde	Contribuição da Educação Permanente em Saúde para a formação profissional.
Categoria 2: Aprendizagem significativa	Importância de uma educação interligada às atividades práticas do serviço de saúde.
Categoria 3: Trabalho em equipe	Compreensão dos profissionais sobre a importância do trabalho em equipe.
Categoria 4: Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs)	Importância da utilização das TDICs no desenvolvimento das atividades de Educação Permanente em Saúde.

• Fonte: Autor, 2016

Necessidade de atividades de Educação Permanente em Saúde

A Categoria 1 apresenta a necessidade das atividades de Educação Permanente em Saúde, sendo salientada nas respostas da maioria dos entrevistados, o que deixa claro a percepção dos trabalhadores quanto à contribuição da EPS para a formação profissional. Diante dos relatos, destacou-se a importância da atualização profissional, bem como as trocas de experiências entre os profissionais do serviço:

Promove constante atualização, troca de experiências com outros profissionais e motivação. (CD 51).

É sempre importante nos atualizarmos (obrigatório para quem trabalha na saúde), e importante também para o sistema trabalhar afinado. (CD 92).

Acho que sempre poderemos aprender, nos atualizarmos. E com isso, poderemos transformar nossas ações, buscando a melhoria e fortalecimento do SUS. (CD13).

A Educação Permanente é de suma importância para o profissional renovar seus conhecimentos na sua área de atuação e trocar experiências com os colegas de trabalho. (CD170).

Analisando as falas e comparando com o descrito na literatura, é possível verificar que a EPS promove uma visão geral, filosófica e política para a formação dos profissionais de saúde, fundamental para a aprendizagem transformadora e significativa, sendo esta fonte de conhecimento centrada no exercício cotidiano do trabalho. Assim, a PNEPS deve contribuir para aprimorar o conhecimento e análise da realidade social, assim como para o processo de empowerment comunitário citado na promoção da saúde¹¹.

Ressalta-se que a EPS se constitui em um processo educativo que possibilita o surgimento de um espaço para refletir e fazer no trabalho, sendo o trabalhador um ser que constrói, norteado por valores políticos, culturais e éticos. Para Amestoy et al¹⁹, esta é uma estratégia que constrói um novo estilo de administração, na qual os pactos para reorganizar a gestão, a assistência e a promoção da saúde são construídas coletivamente, a partir do diálogo e reflexão sobre a prática. Com isso, promover atividades de EPS de acordo com a percepção dos cirurgiões-dentistas torna-se um aspecto importante para o desenvolvimento de um serviço odontológico de melhor qualidade para a população do município.

Os profissionais compreendem que a Educação Permanente em Saúde é essencial para a formação dos profissionais, e acreditam ser dever dos gestores promovê-la: O profissional necessita de atualização constante. E acredito ser um dever do município colaborar para que esse aperfeiçoamento ocorra (CD12).

A criação da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde pelo Ministério da Saúde enfatiza que a EPS deve ser uma prioridade dentro dos processos de gestão dos serviços. A conscientização dos gestores, profissionais e comunidade diante desta perspectiva é fundamental para a elaboração e execução de ações de EPS efetivas e constantes no SUS.

De acordo com a fala dos participantes, foi verificado que no município de Fortaleza existe uma política específica voltada para a EPS, na qual os servidores médicos, cirurgiões-dentistas e enfermeiros que compõem as equipes de Saúde da Família têm uma carga horária de 40 horas semanais, das quais 8 horas devem ser destinadas a realização de atividades de EPS. Tal política tem possibilitado um maior aperfeiçoamento dos profissionais, construindo um serviço de saúde com mais qualidade através de discussões reflexivas elaboradas nos espaços de trabalho.

A aprendizagem significativa

A aprendizagem significativa pressupõe que as experiências e os conhecimentos prévios dos educandos sejam considerados como partes integradas e articuladas com os conteúdos educacionais^20,21. Nesse sentido, evidencia-se a importância de uma educação interligada às atividades práticas do serviço de saúde. O conceito de aprendizagem significativa permeou o discurso dos cirurgiões-dentistas que conseguiram identificar a importância desse tipo de educação para o desenvolvimento do seu trabalho diário, como pode ser observado nas respostas abaixo:

Discussões acerca dos problemas que permeiam o dia a dia do Programa de Saúde da Família e suas possíveis soluções são atividades importantes para que a Educação Permanente trabalhe. (CD 1).

As atividades devem ser voltadas para a prática cotidiana dos centros de saúde. (CD 29).

Deve haver formações em metodologias ativas, visando a elaboração de projetos aplicativos transformadores da realidade. (CD 37).

A aprendizagem significativa ocorre quando o objeto de aprendizagem se relaciona de forma substancial com aquilo que a pessoa já sabe, o que leva a uma educação baseada na reflexão sobre a ação, sendo o espaço de trabalho o principal cenário de aprendizagem. O conhecimento passa a ser reconhecido como uma construção social, levando em consideração as singularidades e contextos de aprendizagem^2,21,22. Portanto, a aprendizagem significativa constitui-se no processo de formação que propicia a construção de saberes a partir dos conhecimentos prévios dos sujeitos articulados aos problemas vivenciados no trabalho²³.

De acordo com Paulo Freire^{22, a} aprendizagem significativa considera que o conhecimento prévio do sujeito deve ser valorizado, sendo através deste o início do processo educativo. Para Peduzzi et al^{20, a} aprendizagem significativa está centrada no cotidiano do processo de trabalho, na valorização do trabalho como uma importante fonte de conhecimento, na articulação entre atenção à saúde, gestão e controle social.

As práticas dos serviços de saúde são definidas por muitos fatores, destacando-se as atividades interdisciplinares. São utilizadas metodologias contextualizadas e participativas, objetivando a qualificação das práticas^24,25. Sendo possível verificar nas respostas dos participantes a compreensão da importância desta abordagem significativa para o sucesso das atividades de EPS.

A EPS reconhece o caráter educativo do trabalho, através de sua produção de resultados e, principalmente, como um espaço de problematização, reflexão e diálogos que buscam mudanças na concepção de uma saúde de qualidade^20,26, favorecendo mudanças nas práticas, atitudes e comportamentos¹². Com base nessa concepção, o Ministério da Saúde recomenda que as atividades educativas dos trabalhadores tenham sua origem e execução próximas à realidade de trabalho, estimulando a problematização de forma contextualizada, promovendo assim o diálogo entre as políticas públicas e as singularidades locais⁷.

As propostas educativas devem ser abrangentes, proporcionando o desenvolvimento integral dos sujeitos envolvidos no processo. Portanto, o sujeito deve aprender a aprender e a construir conhecimentos que estejam correlacionados com o serviço de saúde. É necessária uma contextualização da prática social para uma maior compreensão da realidade. Desta maneira, educadores e educandos constroem juntos o processo de aprendizagem²⁶. A proposta educativa está destinada à instrução incorporada à ação, na qual o aprender e o ensinar estão inseridas na rotina dos serviços. Esta proposta pode ser entendida como aprendizagem-trabalho, pois acontece a partir do cotidiano dos serviços de saúde²⁷.

Logo, com a aprendizagem significativa ocorre a construção de sentidos, utilizando o dia a dia do trabalhador, considerando seu conhecimento prévio e o contexto local, fazendo a vinculação do aprendizado aos elementos que façam sentido para os sujeitos envolvidos²⁷.

O trabalho em equipe

A Categoria 3 refere-se à compreensão dos profissionais sobre a importância do trabalho em equipe, o que pode ser verificado através da necessidade de uma formação que os ajudem a trabalhar de forma interdisciplinar, conforme visto nas seguintes respostas:

Seria importante termos atividades de Educação Permanente em Saúde que abordassem o processo de trabalho (trabalho em equipe, organização do serviço), com práticas integrativas e complementares na atenção básica, saúde mental e intersetorialidade. (CD40).

Temos que trabalhar a interdisciplinaridade, treinamento para a equipe como um todo. (CD53).

O trabalho em saúde é baseado em relações interpessoais que são estabelecidas a cada instante, seja entre profissionais ou com usuários do serviço1^4,24,26,28. Tais relações não devem ser rejeitadas, e sim aperfeiçoadas, para que ocorram de forma efetiva. O trabalho em equipe recompõe as visões especializadas e individualizadas, direcionando-se à integralidade do atendimento^20,24,29. Trabalhar em equipe é algo desafiador, principalmente para profissões com um olhar tecnicista, como é o caso da odontologia, e o multiprofissionalismo deve ser estimulado desde a graduação, preparando os futuros profissionais para o relacionamento interpessoal no trabalho. Destaca-se que uma das propostas da Estratégia Saúde da Família é ofertar um acompanhamento realizado por uma equipe de profissionais, portanto, deve-se estimular de forma contínua que esses servidores tenham um diálogo aberto quanto aos seus processos de trabalho, bem como a atenção que está sendo disponibilizada à população sob sua responsabilidade sanitária.

Para a odontologia foram poucas as atividades que participei, e para as outras áreas, os dentistas não são convocados a participarem. (CD68).

Alguns cursos são oferecidos com poucas vagas, e muitas vezes dando preferência ao profissional médico e enfermeiro. (CD75).

Geralmente são ações pontuais de curtíssima duração que não contemplam todas as categorias profissionais. (CD81).

Nunes et al.³⁰ acreditam que o trabalho em equipe requer uma mudança de postura, com um novo tipo de aprendizado, em que interagir com o outro e aprender a cooperar tornam-se condições essenciais para a consolidação das práticas.

Ressalta-se que existe uma tendência de os profissionais de cada área trabalharem de forma isolada e independente das demais, expressando uma instrução isolada e voltada para sua área específica de atuação. A fragmentação do processo de trabalho gera uma formação também fragmentada de especialistas, cujo conhecimento técnico individual se sobrepõe ao conhecimento local e de outros saberes¹³. É necessário que o trabalho em equipe seja consolidado dentro dos serviços, devendo ser o foco de atenção durante a formulação das atividades de EPS. A educação interprofissional contribui para a formação de profissionais de saúde mais bem-preparados para uma atuação integrada em equipe, onde a colaboração e o reconhecimento da interdependência das áreas predominem sobre a fragmentação e a competição^20,31.

Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs)

As TDICs emergem como a Categoria 4, sendo mencionadas como importantes facilitadoras no desenvolvimento das atividades de Educação Permanente em Saúde. As novas tecnologias de aprendizagem estão revolucionando a aprendizagem no nível de graduação e pós-graduação. Dentre essas novas modalidades de ensino, a educação a distância tem sido uma das mais destacadas, principalmente devido à abrangência que esta consegue ter, proporcionando assim uma maior inclusão dos educandos.

Os cirurgiões-dentistas pesquisados contribuem com essas afirmações à medida que demonstram compreender a importância da utilização dessas tecnologias para o desenvolvimento das atividades, tornando-as mais efetivas e abrangentes. Diante da atual situação vivenciada mundialmente durante a pandemia da COVID-19, as relações virtuais estabelecidas se fortaleceram, visto que as tecnologias digitais de comunicação estiveram presentes em todos os setores de forma bastante expressiva. Acredita-se que a educação após esta conjuntura será reinventada, incorporando de forma definitiva as TIDCs.

Os cursos à distância poderiam ser utilizados em uma frequência maior. (CD89).

Deveria existir uma plataforma para conteúdo teórico, juntamente com encontros periódicos mensais para discussão dos temas. As exposições deveriam utilizar as metodologias ativas. (CD120).

O Ministério da Saúde, compreendendo a importância da utilização das TDICs no processo de formação do profissional de saúde em nível de graduação, pós-graduação e ensino em serviço, criou, em 2008, a Universidade Aberta do Sistema Único de Saúde (UNA-SUS), programa destinado a atender as necessidades de formação e educação permanente no SUS, utilizando técnicas de educação a distância e entendendo o conhecimento como um bem público para alcançar diferentes contextos³².

A educação a distância (EAD) pode ser entendida como um processo educativo sistemático e organizado que exige múltiplas vias de comunicação entre os participantes, com a instauração de uma grupalidade. Não se resume à eliminação das barreiras geográficas, mas em transmissão de conhecimentos, troca de experiências e estímulo à autonomia do aluno, assim como à administração do seu tempo de estudo, tornando-se uma experiência de aprendizagem protagonista^30,33,34. Para Paulon e Carneiro^{35, a} EAD exige um maior grau de planejamento que o ensino presencial, além de ser necessário um apoio coletivo de assistência mútua, construindo comunidades de aprendizagem.

A EAD é uma das possibilidades metodológicas que podem ser utilizadas para otimizar a educação em saúde³⁰. Estudos aplicado à médicos e enfermeiros da Estratégia Saúde da Família do Estado do Ceará, observaram que a maioria dos participantes (95,2%) concordou que a combinação de educação a distância com atividades educacionais em seu local de trabalho poderia ser uma importante alternativa para treinar os profissionais da ESF^36,37,38, corroborando com o que foi encontrado na presente pesquisa.

No Estado da Califórnia, nos Estados Unidos da América, um estudo conduzido com profissionais de saúde também demonstrou a importância de utilizar a educação a distância como uma forma de educação permanente, abrangendo os profissionais com maior magnitude e com mais eficiência³⁴.

O uso das TDICs facilita o acesso e a troca de informações, tornando-se um facilitador no desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem. Na formação de um aluno com pensamento crítico e reflexivo é essencial o uso de diversas metodologias e linguagens, inclusive da linguagem eletrônica³⁸.

Junto ao Ministério da Saúde, destaca-se o Sistema Universidade Aberta do SUS - UNA-SUS, criado para atender as necessidades de capacitação e educação permanente dos profissionais de saúde que atuam no SUS.

Em Fortaleza, a Gestão de Educação e Saúde iniciou um processo de utilização das TDICs no desenvolvimento de suas atividades de EPS, criando uma plataforma de aprendizagem própria. No Estado do Ceará, através da plataforma da Escola de Saúde Pública, são realizadas atividades de educação permanente para todos os profissionais da saúde do Estado. Desta forma, as TDICs tornaram-se uma realidade no Brasil.

Este estudo se propôs a avaliar a percepção dos cirurgiões-dentistas da Estratégia Saúde da Família, sendo interessante também avaliar as percepções de outros profissionais que compõem a equipe, como médicos e enfermeiros, ressaltando-se que as concepções sobre a EPS podem ser diferenciadas em outras capitais brasileiras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Educação Permanente em Saúde deve ser significativa, trabalhando as potencialidades que a equipe da estratégia de Saúde da Família pode apresentar, utilizando como principal ferramenta para isso as TDICs.

Destaca-se que as atividades significativas devem adquirir um sentido prático para serem mais bem assimiladas pelos trabalhadores, que conseguirão assim visualizar os benefícios da EPS para sua empregabilidade.

Os profissionais entrevistados reconheceram ter dificuldades com o trabalho em equipe, e destacaram a pouca compreensão dos gestores sobre a importância desse processo. Portanto, é necessário que os gestores responsáveis pela PNEPS repensem e priorizem a EPS e o trabalho em equipes multiprofissionais.

Ademais, o uso das TDICs evidencia-se como ferramenta importante na execução das atividades de EPS, representando um modelo inovador e promissor que deve ser estimulado. O uso das TDICs beneficiará um maior número de pessoas e qualificará cada vez mais os serviços de saúde.

Em conclusão, a importância da EPS é notória, porém, várias fragilidades foram apontadas e merecem ser corrigidas. Sugere-se que esforços sejam direcionados com o objetivo de consolidar essas ações e, com isso, que as atividades de EPS possam se tornar mais efetivas diante da qualificação e fortalecimento do Sistema Único de Saúde.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao CNPq por financiar a pesquisa, e ao Programa Pró-Ensino na Saúde pela bolsa concedida à pesquisadora deste estudo.

• Como citar: Almeida JRS, Bizerril DO, Saldanha KGH, Forte FDS, Almeida MEL. A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde e sua relação com a odontologia. Cad Saúde Colet, 2022; Ahead of Print. https://doi.org/10.1590/1414-462X202230040398
• Trabalho realizado nas Unidades de Atenção Primária à Saúde do município de Fortaleza (CE), Brasil.
• Fonte de financiamento: CNPQ (08/2013).

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  02 Dez 2022
• Data do Fascículo
  Oct-Dec 2022

Histórico

• Recebido
  25 Mar 2018
• Aceito
  03 Fev 2021