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Validade do autorrelato de hipertensão arterial em trabalhadores

Validity of workers self-reports of hypertension

Resumo

Introdução

O monitoramento da hipertensão arterial sistêmica (HAS) é realizado no Brasil, fundamentado no autorrelato, por meio do sistema VIGITEL. Tendo em vista lacunas acerca desse agravo em populações de trabalhadores, estas devem ser alvo da ação ampliada para o seu diagnóstico epidemiológico.

Objetivo

Testar a validade de critério do autorrelato de HAS, comparando-o com medidas aferidas de pressão arterial (PA).

Método

Realizou-se estudo de corte transversal com amostra aleatória do universo de 1.561 trabalhadores de um serviço judiciário na Bahia. Calcularam-se sensibilidade, especificidade, valores preditivos e razões de probabilidade para o autorrelato de HAS, comparando-os com a aferição direta da PA, medida de referência. O diagnóstico de HAS foi a média de duas aferições com PA sistólica ≥ 140 mmHg, e/ou PA diastólica ≥ 90 mmHg, e/ou uso regular de anti-hipertensivos.

Resultados

Em amostra de 391 trabalhadores, verificou-se sensibilidade de 66,4% (57,1-74,6%), especificidade de 87,9% (83,2-91,4%), valor preditivo positivo de 70,5% (61,1-78,6%), valor preditivo negativo de 85,7% (80,9-89,4%), razões de probabilidade positiva e negativa de 5,5 (3,88-7,72) e de 0,4 (0,30-0,49), respectivamente.

Conclusão

Este estudo evidenciou o autorrelato como medida válida para o diagnóstico epidemiológico da HAS entre trabalhadores, recomendando seu uso. No entanto, esta validade depende do diagnóstico prévio do agravo.

Palavras-chave:
hipertensão; autorrelato; sensibilidade e especificidade; valor preditivo dos testes; validade (epidemiologia)

Abstract

Background

Monitoring of hypertension, based on self-report, has been performed in Brazil through VIGITEL. In view of the gaps about this problem in worker populations, these should be the targets of the expanded action of epidemiological diagnosis of hypertension.

Objective

To test the validity of hypertension self-report in comparison to blood pressure (BP) measurements.

Method

A cross-sectional study was conducted on a random sample of 1561 workers from a Judicial Service in Bahia. Sensitivity, specificity, positive and negative predictive values, and positive and negative likelihood ratios were calculated for the hypertension self-report in comparison with direct BP measurement (reference). Hypertensive cases presented the mean of two BP measurements, with systolic BP ≥ 140 mmHg, and/or diastolic BP ≥ 90 mmHg and/or regular use of antihypertensive drugs.

Results

In a sample of 391 workers, there was a sensitivity of 66.4% (57.1-74.6%), a specificity of 87.9% (83.2-91.4%), a positive predictive value of 70.5% (61.1- 78.6%), a negative predictive value of 85.7% (80.9-89.4%), a positive and negative likelihood ratio of 5.5 (3.88-7.72) and 0.4 (0.30-0.49) respectively.

Conclusion

This study showed self-report as a valid measure to implement the epidemiological diagnosis of hypertension among workers, recommending its use. However, its validity depends on the previous diagnosis.

Keywords:
hypertension; self report; sensitivity and specificity; predictive value of tests; reproducibility of results

INTRODUÇÃO

A hipertensão arterial sistêmica (HAS) se caracteriza como um dos maiores problemas de saúde pública no país e está associada às doenças cardiovasculares, principais causas de morte no Brasil e no mundo11 Mozaffarian D, Benjamin EJ, Go AS, Arnett DK, Blaha MJ, Cushman M, et al. Heart disease and Stroke Statistics -2016 Update. A report from the American Heart Association. Circulation. 2016;133(4):38-360. PMid:26673558.,22 Malachias MVB. 7th Brazilian Guideline of Arterial Hypertension: presentation. Arq Bras Cardiol. 2016;107(3 Suppl 3):1-83. PMid:27819379.. Essas doenças acarretam prejuízos decorrentes de redução ou perda da capacidade laborativa e morte prematura22 Malachias MVB. 7th Brazilian Guideline of Arterial Hypertension: presentation. Arq Bras Cardiol. 2016;107(3 Suppl 3):1-83. PMid:27819379. e impõem custos elevados ao Sistema Único de Saúde33 Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS - Sistema Informações Hospitalares - Morbidade Hospitalar [Internet]. 2019 [citado em 2019 Abr 12]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sih/cnv/niuf.def
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi....
.

Dada a relevância deste agravo, o Brasil realiza seu monitoramento por meio de inquérito nas capitais brasileiras e no Distrito Federal, desde 2006, com a Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL)44 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância à Saúde. Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico - VIGITEL 2006 [Internet]. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2007 [citado em 2019 Abr 12]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/relatorio_vigitel_2006_marco_2007.pdf.
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, fundamentado no autorrelato de HAS. Em 2018, a prevalência de HAS no Brasil correspondeu a 24,7% e, em faixas etárias mais elevadas, atingiu 60%55 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico - VIGITEL 2018 [Internet]. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2019 [citado em 2019 Abr 12]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/svsa/vigitel/vigitel-brasil-2018.pdf/view
https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-...
. O diagnóstico epidemiológico da HAS e seu acompanhamento pelo sistema VIGITEL subsidiam, no Brasil, o Plano de Prevenção das Doenças Crônicas, da Organização Mundial da Saúde, do qual o Brasil é signatário, com meta de redução relativa de 25% na prevalência de HAS até 202566 World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases country profiles 2014. Geneva: WHO; 2014; 176 p.,77 World Health Organization. Non Communicable Diseases Progress Monitor [Internet]. 2017 [citado em 2019 Abr 12]. Disponível em: https://reliefweb.int/report/world/noncommunicable-diseases-progress-monitor-2017?gclid=CjwKCAjwyqWkBhBMEiwAp2yUFo2uiOTSmQM1a0dAC8n9zT-QJljGylbsJa2JVwV_Nstk5g6MSKh3ShoCbXIQAvD_BwE
https://reliefweb.int/report/world/nonco...
.

A HAS pode ser mensurada de forma objetiva a partir de, no mínimo, duas aferições da pressão arterial (PA), que é estratégia reconhecida como padrão de referência para o mapeamento da HAS. Em situações epidemiológicas, o autorrelato de HAS tem sido empregado, pois se caracteriza pela simplicidade operacional, exigindo menor custo e tempo. Ademais, o autorrelato baseia a anamnese clínica, sendo informação relevante do interrogatório sistemático em serviço de saúde.

Tendo em vista lacunas acerca da HAS no mundo do trabalho88 Andrade RCV, Fernandes RCP. Hipertensão arterial e trabalho: fatores de risco. Rev Bras Med Trab. 2016;14(3):252-61. http://dx.doi.org/10.5327/Z1679-443520164015
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, populações de trabalhadores devem ser alvo da ação ampliada de seu diagnóstico epidemiológico. Fatores ocupacionais, como trabalho em turnos, exposição a ruídos e estresse no ambiente de trabalho, entre outros, podem estar associados à HAS88 Andrade RCV, Fernandes RCP. Hipertensão arterial e trabalho: fatores de risco. Rev Bras Med Trab. 2016;14(3):252-61. http://dx.doi.org/10.5327/Z1679-443520164015
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; ademais, fatores não ocupacionais associados a esse agravo na população geral podem ter larga presença entre os trabalhadores, contribuindo para uma situação epidemiológica ainda a ser evidenciada.

Considerando o uso habitual do autorrelato da HAS no mapeamento do agravo em populações de trabalhadores e no contexto da clínica, este estudo testou a validade de critério do autorrelato de HAS em comparação com medidas aferidas de PA em trabalhadores.

MÉTODOS

Este estudo foi realizado com dados obtidos em 2014 do serviço de saúde de um tribunal do judiciário na Bahia, que, por atribuição legal, havia realizado inquérito epidemiológico entre as ações de vigilância em saúde.

A população total do referido serviço judiciário constava de 1.561 indivíduos à época, que ocupavam diferentes cargos, como analistas e técnicos judiciários, oficiais de justiça, auxiliares de serviços gerais, ascensoristas, carregadores, eletricistas, garçons, marceneiros, motoristas, vigilantes, médicos, dentistas, estagiários, juízes e desembargadores.

A população de estudo para o inquérito de morbidade realizado pelo serviço de saúde da instituição foi selecionada aleatoriamente. O cálculo para o tamanho mínimo da amostra utilizado no inquérito considerou uma precisão de 4%, nível de confiança de 95% e prevalência esperada de 30%. Prevendo possíveis perdas ou recusas, o tamanho mínimo calculado (366 indivíduos) foi ampliado em 20%.

O questionário para a coleta de dados constava de informações sobre características sociodemográficas, ocupacionais e informações sobre morbidade para hipertensão arterial. Nesta seção, constava a pergunta para investigação da validade de critério do autorrelato com relação às medidas diretas de PA: “Alguma vez lhe disseram que tem pressão alta?”. Além do questionário, foram obtidos os registros de duas medidas de PA realizadas pelo serviço de saúde com esfigmomanômetro calibrado, mecânico, do tipo aneroide, no começo e ao final das entrevistas, com intervalo mínimo de 20 minutos entre elas, em ambiente adequado e seguindo as instruções indicadas pela diretriz brasileira de HAS vigente à época99 Sociedade Brasileira de Cardiologia. V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial. Arq Bras Cardiol. 2007 Sep;89(3):e24-79. e reiteradas pela diretriz atual22 Malachias MVB. 7th Brazilian Guideline of Arterial Hypertension: presentation. Arq Bras Cardiol. 2016;107(3 Suppl 3):1-83. PMid:27819379. a respeito do preparo e posicionamento do paciente. Os entrevistadores eram profissionais de saúde de nível superior, como médicos, dentistas, enfermeiros e assistentes sociais, devidamente treinados para atuar de forma padronizada.

Abordagem dos dados e definição de caso

Neste estudo, o indivíduo foi considerado hipertenso, a partir da medida objetiva, se a média aritmética das duas aferições de pressão arterial sistólica (PAS) fosse ≥ 140 mmHg ou se a média de suas duas medidas de pressão arterial diastólica (PAD) fosse ≥ 90 mmHg e/ou quando estivesse em uso regular de medicações anti-hipertensivas, mesmo com aferições normais. Além disso, levando em conta o autorrelato, o indivíduo que respondeu positivamente à pergunta “Alguma vez lhe disseram que tem pressão alta?” também foi considerado caso de HAS.

Na primeira etapa de abordagem dos dados, foram descritas as frequências absoluta e relativa para as variáveis sociodemográficas e apresentada a prevalência de HAS por meio do autorrelato e pelo padrão de referência, segundo os estratos das variáveis sociodemográficas.

Na segunda etapa de análise dos dados, foram calculados indicadores de validade de critério reconhecidos na literatura: sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e valor preditivo negativo, além das razões de probabilidade positiva e negativa.

Foram utilizados para análise dos dados os programas Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 21.0, Epi-Info, V. 6, e Microsoft Excel 2010.

Aspectos de Ética em Pesquisa

Ressalta-se que os dados secundários utilizados neste estudo, obtidos previamente pelo serviço de saúde da instituição em inquérito epidemiológico realizado com fins de vigilância em saúde do trabalhador, foram coletados de acordo com as exigências da ética em pesquisa com seres humanos, durante a jornada de trabalho, em local apropriado, sem interferências externas, de forma a garantir o entendimento do questionário e a participação voluntária dos indivíduos, além de sua privacidade. O rigor metodológico empregado pelo referido serviço de saúde favoreceu a qualidade dos dados que foram cedidos aos autores deste manuscrito. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, parecer 708.763, de 3 de julho de 2014.

RESULTADOS

Foram estudados 404 indivíduos, sendo 176 homens e 227 mulheres, com uma perda com relação à variável sexo. A maior parte dos indivíduos possuía nível universitário (70,4%), e a mediana de idade foi 42 anos.

Desta amostra, houve 115 indivíduos que autorrelataram HAS, ou 28,7%. E 121 indivíduos, ou 30,8%, foram classificados como hipertensos, segundo medida aferida de PA e/ou uso regular de medicamentos anti-hipertensivos (Figura 1).

Figura 1
Fluxograma do estudo (Fonte: elaborada pelos autores)

Na Tabela 1, são apresentados os resultados gerais que caracterizam os indivíduos estudados quanto a sexo, escolaridade e idade, além da prevalência de hipertensão, segundo o autorrelato e padrão de referência.

Tabela 1
Características sociodemográficas e prevalência de hipertensão arterial em trabalhadores de serviço judiciário na Bahia em 2007

A variável idade foi dicotomizada a partir da mediana, com dois estratos: até 42 anos e mais de 42 anos. A partir da medida de referência, foi encontrada prevalência de 21,8% e prevalência de autorrelato de 18,4% nos indivíduos com até 42 anos. Para pessoas com mais de 42 anos, a prevalência de hipertensão arterial foi de 43,3% com o padrão ouro e de 43,1% pelo autorrelato (Tabela 1).

Para a análise de validade, cujos resultados são mostrados na Tabela 2, foram excluídos 13 indivíduos, porque não possuíam dados sobre o autorrelato de HAS ou sobre o uso regular de medicação anti-hipertensiva e/ou medidas objetivas de PA. Com isso, a análise da validade foi conduzida com 391 indivíduos (quantitativo superior ao tamanho mínimo da amostra calculada, de 366 indivíduos) (Tabela 2).

Tabela 2
Resultado dos testes diagnósticos para validade do autorrelato de HAS comparado ao padrão de referência, estratificados por sexo, escolaridade e idade, em 391 trabalhadores do serviço judiciário na Bahia em 2007

Foi encontrada sensibilidade de 66,4% para a estratégia do autorrelato, além de especificidade de 87,9%. Os números descritos ainda permitiram chegar ao valor preditivo positivo (VPP) de 70,5%, valor preditivo negativo (VPN) de 85,7%, razão de probabilidade positiva (RPP) de 5,5 e razão de probabilidade negativa (RPN) de 0,4 para o autorrelato de hipertensão arterial.

A sumarização dos resultados dos testes diagnósticos para a população de estudo e segundo os estratos de sexo, escolaridade e idade encontra-se na Tabela 2.

DISCUSSÃO

Evidenciou-se que o autorrelato de HAS pode ser uma medida válida para o diagnóstico situacional e monitoramento do agravo entre trabalhadores. E este autorrelato demonstrou desempenho compatível com estudos nacionais e de fora do Brasil, com especificidade mais alta, em geral, do que a sensibilidade.

As mulheres apresentaram maior sensibilidade e VPN quando comparadas com homens, assim como os indivíduos mais velhos (com idade acima de 42 anos) em relação aos mais jovens. No entanto, não se verificou o mesmo impacto da escolaridade sobre a capacidade de fornecer uma resposta válida sobre a presença de HAS, mas chama atenção que os indivíduos com maior escolaridade apresentaram sensibilidade um pouco mais baixa.

Os indicadores descritos por alguns autores revelam sensibilidade variando de 63,5% a 73%, e especificidade, de 86,4% a 98,5%1010 Tormo MJ, Navarro C, Chirlaque MD, Barber X. Validation of self diagnosis of high blood pressure in a sample of the Spanish EPIC cohort: Overall agreement and predictive values. J Epidemiol Community Health. 2000;54(3):221-6. http://dx.doi.org/10.1136/jech.54.3.221. PMid:10746117.
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11 Lima-Costa MF, Peixoto SV, Firmo JOA. Validade da hipertensão arterial auto-referida e seus determinantes (projeto Bambuí). Rev Saude Publica. 2004;38(5):637-42. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102004000500004. PMid:15499433.
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12 Vargas CM, Burt VL, Gillum RF, Pamuk ER. Validity of self-reported hypertension in the National Health and Nutrition Examination Survey. Prev Med (Baltim). 1997;26(5):678-85. http://dx.doi.org/10.1006/pmed.1997.0190.
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-1313 Chun H, Kim IH, Min KD. Accuracy of self-reported hypertension, diabetes, and hypercholesterolemia: analysis of a representative sample of korean older adults. Osong Public Heal Res Perspect. 2016;7(2):108-15. http://dx.doi.org/10.1016/j.phrp.2015.12.002. PMid:27169009.
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. Já Martin et al.1414 Martin LM, Leff M, Calonge N, Garrett C, Nelson DE. Validation of self-reported chronic conditions and health services in a managed care population. Am J Prev Med. 2000;18(3):215-8. http://dx.doi.org/10.1016/S0749-3797(99)00158-0. PMid:10722987.
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descreveram uma sensibilidade geral mais alta, de 83,2%, para o autorrelato de HAS e especificidade de 81,4%, mas com uma diferença metodológica, já que compararam os dados coletados de autorrelato com os registros médicos dos indivíduos participantes. Estudo conduzido na cidade de Pelotas/RS1515 Chrestani MAD, Santos IS, Matijasevich AM. Hipertensão arterial sistêmica auto-referida: validação diagnóstica em estudo de base populacional. Cad Saude Publica. 2009;25(11):2395-406. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2009001100010. PMid:19936478.
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revelou sensibilidade de 84,3% e especificidade de 87,5%, valores, mais uma vez e em sua maioria, próximos aos encontrados na presente amostra de trabalhadores do setor de serviços, mas apresentando uma sensibilidade mais elevada em comparação a esse estudo.

Por outro lado, alguns autores obtiveram valores de sensibilidade bastante inferiores aos encontrados no presente estudo. Dave et al.1616 Dave GJ, Bibeau DL, Schulz MR, Aronson RE, Ivanov LL, Black A, et al. Predictors of congruency between self-reported hypertension status and measured blood pressure in the stroke belt. J Am Soc Hypertens. 2013;7(5):370-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jash.2013.04.007. PMid:23706250.
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encontraram sensibilidade de 49,6%, e na coorte conduzida por Alonso et al.1717 Alonso A, Beunza JJ, Delgado-Rodríguez M, Martínez-González MA. Validation of self reported diagnosis of hypertension in a cohort of university graduates in Spain. BMC Public Health. 2005;5:94. http://dx.doi.org/10.1186/1471-2458-5-94. PMid:16156889.
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evidenciou-se sensibilidade ainda menor, de 23%. Estes últimos autores atribuíram os achados à inclusão de participantes com idade a partir dos 18 anos.

A maior sensibilidade do autorrelato entre mulheres e indivíduos mais velhos indica que entre estes últimos houve maior proporção de hipertensos que relataram ter a doença. Para além da capacidade de informar corretamente a presença do agravo, uma explicação que se impõe, no entanto, para a maior sensibilidade é o fato de as mulheres buscarem mais os serviços de saúde em razão dos papéis sociais que lhes foram atribuídos e de crenças relacionadas à oposição entre masculinidade e cuidado1818 Gomes R, Nascimento EF, Araújo FC. Por que os homens buscam menos os serviços de saúde do que as mulheres? As explicações de homens com baixa escolaridade e homens com ensino superior. Cad Saude Publica. 2007;23(3):565-74. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2007000300015. PMid:17334571.
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,1919 Travassos C, Viacava F, Pinheiro R, Brito A. Utilização dos serviços de saúde no Brasil: gênero, características familiares e condição social. Rev Panam Salud Publica. 2002;11(5-6):365-73. http://dx.doi.org/10.1590/S1020-49892002000500011. PMid:12162833.
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. Desta forma, o conhecimento prévio do estado hipertensivo detectado nos serviços de saúde deve ter favorecido o autorrelato entre elas.

Com o avançar da idade, observa-se que a busca aos serviços é semelhante em ambos os sexos, visto que, com o surgimento de outras patologias, como as doenças crônicas não transmissíveis e comorbidades, os sinais e sintomas que as caracterizam motivam as pessoas a buscarem assistência à saúde2020 Assis MMA, de Jesus WLA. Access to health services: approaches, concepts, policies and analysis model. Cienc Saude Coletiva. 2012;17(11):2865-75. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012001100002. PMid:23175292.
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. Huerta et al.2121 Huerta JM, José Tormo M, Egea-Caparrós JM, Ortolá-Devesa JB, Navarro C. Accuracy of Self-Reported Diabetes, Hypertension, and Hyperlipidemia in the Adult Spanish Population. DINO Study Findings. Rev Esp Cardiol. 2009;62(2):143-52. http://dx.doi.org/10.1016/S0300-8932(09)70156-3.
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, por exemplo, verificaram que o autorrelato positivo de HAS foi maior entre pessoas mais velhas e com maior índice de massa corpórea, bem como entre aqueles que se submeteram à aferição da PA, mas também a procedimentos diagnósticos para diabetes e hiperlipidemia no ano anterior.

Em ambos os grupos, mulheres e idosos, então, a ampliação da procura por esses serviços aumenta as possibilidades de receber um diagnóstico de HAS e, consequentemente, relatá-lo ao ser indagado em um inquérito. Portanto, é possível admitir que a mais baixa sensibilidade em homens e indivíduos mais jovens pode, ao menos em parte, decorrer da falta de acesso a um diagnóstico médico em vez de baixa acurácia do seu autorrelato.

Essas mesmas tendências puderam ser observadas na literatura: sensibilidade variando de 69% a 92,2% entre as mulheres e de 35,7% a 80,7% entre os homens1010 Tormo MJ, Navarro C, Chirlaque MD, Barber X. Validation of self diagnosis of high blood pressure in a sample of the Spanish EPIC cohort: Overall agreement and predictive values. J Epidemiol Community Health. 2000;54(3):221-6. http://dx.doi.org/10.1136/jech.54.3.221. PMid:10746117.
http://dx.doi.org/10.1136/jech.54.3.221...
,1111 Lima-Costa MF, Peixoto SV, Firmo JOA. Validade da hipertensão arterial auto-referida e seus determinantes (projeto Bambuí). Rev Saude Publica. 2004;38(5):637-42. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102004000500004. PMid:15499433.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102004...
,1414 Martin LM, Leff M, Calonge N, Garrett C, Nelson DE. Validation of self-reported chronic conditions and health services in a managed care population. Am J Prev Med. 2000;18(3):215-8. http://dx.doi.org/10.1016/S0749-3797(99)00158-0. PMid:10722987.
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15 Chrestani MAD, Santos IS, Matijasevich AM. Hipertensão arterial sistêmica auto-referida: validação diagnóstica em estudo de base populacional. Cad Saude Publica. 2009;25(11):2395-406. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2009001100010. PMid:19936478.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2009...
-1616 Dave GJ, Bibeau DL, Schulz MR, Aronson RE, Ivanov LL, Black A, et al. Predictors of congruency between self-reported hypertension status and measured blood pressure in the stroke belt. J Am Soc Hypertens. 2013;7(5):370-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jash.2013.04.007. PMid:23706250.
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. Além disso, demonstrou-se sensibilidade crescente do autorrelato com o avançar da idade e maior entre os indivíduos com menor grau de escolaridade ou nos extremos de escolaridade.

Os valores de especificidade do autorrelato de HAS encontrados globalmente e conforme estratificações por sexo, idade e escolaridade no presente estudo foram similares e maiores que 82% em todos os estratos, achado que foi compatível com a especificidade global acima de 80% descrita na literatura1010 Tormo MJ, Navarro C, Chirlaque MD, Barber X. Validation of self diagnosis of high blood pressure in a sample of the Spanish EPIC cohort: Overall agreement and predictive values. J Epidemiol Community Health. 2000;54(3):221-6. http://dx.doi.org/10.1136/jech.54.3.221. PMid:10746117.
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11 Lima-Costa MF, Peixoto SV, Firmo JOA. Validade da hipertensão arterial auto-referida e seus determinantes (projeto Bambuí). Rev Saude Publica. 2004;38(5):637-42. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102004000500004. PMid:15499433.
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12 Vargas CM, Burt VL, Gillum RF, Pamuk ER. Validity of self-reported hypertension in the National Health and Nutrition Examination Survey. Prev Med (Baltim). 1997;26(5):678-85. http://dx.doi.org/10.1006/pmed.1997.0190.
http://dx.doi.org/10.1006/pmed.1997.0190...

13 Chun H, Kim IH, Min KD. Accuracy of self-reported hypertension, diabetes, and hypercholesterolemia: analysis of a representative sample of korean older adults. Osong Public Heal Res Perspect. 2016;7(2):108-15. http://dx.doi.org/10.1016/j.phrp.2015.12.002. PMid:27169009.
http://dx.doi.org/10.1016/j.phrp.2015.12...

14 Martin LM, Leff M, Calonge N, Garrett C, Nelson DE. Validation of self-reported chronic conditions and health services in a managed care population. Am J Prev Med. 2000;18(3):215-8. http://dx.doi.org/10.1016/S0749-3797(99)00158-0. PMid:10722987.
http://dx.doi.org/10.1016/S0749-3797(99)...

15 Chrestani MAD, Santos IS, Matijasevich AM. Hipertensão arterial sistêmica auto-referida: validação diagnóstica em estudo de base populacional. Cad Saude Publica. 2009;25(11):2395-406. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2009001100010. PMid:19936478.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2009...

16 Dave GJ, Bibeau DL, Schulz MR, Aronson RE, Ivanov LL, Black A, et al. Predictors of congruency between self-reported hypertension status and measured blood pressure in the stroke belt. J Am Soc Hypertens. 2013;7(5):370-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jash.2013.04.007. PMid:23706250.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jash.2013.04...
-1717 Alonso A, Beunza JJ, Delgado-Rodríguez M, Martínez-González MA. Validation of self reported diagnosis of hypertension in a cohort of university graduates in Spain. BMC Public Health. 2005;5:94. http://dx.doi.org/10.1186/1471-2458-5-94. PMid:16156889.
http://dx.doi.org/10.1186/1471-2458-5-94...
,2222 Taylor A, Dal Grande E, Gill T, Pickering S, Grant J, Adams R, et al. Comparing self-reported and measured high blood pressure and high cholesterol status using data from a large representative cohort study. Aust N Z J Public Health. 2010;34(4):394-400. http://dx.doi.org/10.1111/j.1753-6405.2010.00572.x. PMid:20649780.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1753-6405.20...
,2323 Goldman N, Lin IF, Weinstein M, Lin YH. Evaluating the quality of self-reports of hypertension and diabetes. J Clin Epidemiol. 2003;56(2):148-54. http://dx.doi.org/10.1016/S0895-4356(02)00580-2. PMid:12654409.
http://dx.doi.org/10.1016/S0895-4356(02)...
. O parâmetro representa a proporção de não hipertensos que relatam não ter a doença (verdadeiros negativos). Este achado pode reforçar o papel da acessibilidade aos serviços de saúde e, portanto, a necessária consideração deste aspecto ao se analisar a acurácia do autorrelato quanto à sensibilidade. Ou seja, a alta concordância entre autorrelato negativo de HAS e ausência da doença pelo padrão de referência indica a boa capacidade dos indivíduos de fornecerem a informação correta, o que faz pensar que a baixa sensibilidade, quando existe, pode indicar que o indivíduo não teve acesso ao serviço e, portanto, não foi informado ser hipertenso, daí sua resposta negativa ao ser indagado no inquérito. Em outras palavras, é relevante considerar que parte da sensibilidade do autorrelato, ao ser comparado com a medida direta da PA, expresse a acessibilidade ao serviço e a garantia de diagnóstico prévio. Não fosse assim, a única explicação para a mais baixa sensibilidade para homens e mais jovens, com alta especificidade entre ambos, seria que, entre eles, os hipertensos relatariam menos sua condição de doença, mas os não hipertensos relatariam mais corretamente seu estado sadio.

Os valores encontrados de VPN no presente estudo, segundo o sexo (74% para homens e 94,4% para mulheres), refletem a diferente sensibilidade do autorrelato entre os sexos neste estudo com trabalhadores do setor de serviços, tendo as mulheres apresentado uma sensibilidade mais alta.

Não foram encontrados estudos sobre a validade do autorrelato para a hipertensão que tenham apresentado as razões de probabilidade (ou de verossimilhança), porém os valores encontrados no presente estudo (RPP de 5,5 e RPN de 0,4) permitem inferir que existe uma associação relevante entre a presença da doença e o resultado do autorrelato.

A escolaridade não influenciou de forma significativa a validade do autorrelato neste estudo, embora a sensibilidade para indivíduos sem nível universitário (71,7%) tenha sido um pouco mais alta do que aquela entre indivíduos graduados (63%). Adicionalmente, o grupo com maior escolaridade apresentou VPP inferior a 70%.

Chor et al.2424 Chor D, Ribeiro ALP, Carvalho MS, Duncan BB, Lotufo PA, Nobre AA, et al. Prevalence, awareness, treatment and influence of socioeconomic variables on control of high blood pressure: results of the ELSA-Brasil study. PLoS One. 2015;10(6):e0127382. http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0127382. PMid:26102079.
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pontuaram que a elevada proporção de conhecimento sobre a condição mórbida entre hipertensos (82%) se deu em virtude do alto nível de escolaridade da população de servidores públicos envolvida. Em acordo, Mosca et al.2525 Mosca I, Bhuachalla BN, Kenny RA. Explanning significant diferences in subjective and objective measures of cardiovascular health: evidence for the socioeconomic gradient in a population-based study. BMC Cardiovasc Disord. 2013;13(1):64. http://dx.doi.org/10.1186/1471-2261-13-64.
http://dx.doi.org/10.1186/1471-2261-13-6...
ponderaram que o desconhecimento sobre ser hipertenso está associado a um gradiente socioeconômico influenciado por escolaridade e renda, estando os estratos inferiores mais susceptíveis à subestimação do autorrelato de HAS.

A escolaridade, enquanto marcador de posição socioeconômica, expressa iniquidades que podem repercutir no acesso regular aos recursos de saúde disponíveis e nas experiências de cuidados, fundamentais para o conhecimento sobre hipertensão arterial e posterior autorrelato positivo2424 Chor D, Ribeiro ALP, Carvalho MS, Duncan BB, Lotufo PA, Nobre AA, et al. Prevalence, awareness, treatment and influence of socioeconomic variables on control of high blood pressure: results of the ELSA-Brasil study. PLoS One. 2015;10(6):e0127382. http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0127382. PMid:26102079.
http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0...
,2525 Mosca I, Bhuachalla BN, Kenny RA. Explanning significant diferences in subjective and objective measures of cardiovascular health: evidence for the socioeconomic gradient in a population-based study. BMC Cardiovasc Disord. 2013;13(1):64. http://dx.doi.org/10.1186/1471-2261-13-64.
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. Desta forma, o papel da escolaridade sobre a sensibilidade do autorrelato pode ser o de mediador do acesso aos serviços de saúde e diagnóstico de HAS. Parece menos provável que a escolaridade tenha um papel direto na capacidade de o indivíduo hipertenso relatar sua condição de doença ao ser questionado, mas não se pode descartar a possibilidade de que a compreensão sobre o diagnóstico de HAS esteja comprometida em contextos de muito baixa escolaridade concomitante à assistência irregular.

A expansão da cobertura de serviços de Atenção Primária à Saúde no território brasileiro tende a ampliar as oportunidades de diagnóstico de HAS, principalmente entre populações mais vulnerabilizadas2020 Assis MMA, de Jesus WLA. Access to health services: approaches, concepts, policies and analysis model. Cienc Saude Coletiva. 2012;17(11):2865-75. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012001100002. PMid:23175292.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012...
,2626 Tanaka OY, Drumond M Jr, Gontijo TL, Louvison MCP, Rosa TEC. Hipertensão arterial como condição traçadora para avaliação do acesso na atenção à saúde. Cien Saude Colet. 2019;24(3):963-72. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018243.07312017. PMid:30892517.
http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320182...
,2727 Viacava F, Oliveira RAD, Carvalho CC, Laguardia J, Bellido JG. SUS: oferta, acesso e utilização de serviços de saúde nos últimos 30 anos. Cien Saude Colet. 2018;23(6):1751-62. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018236.06022018.
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. Entretanto, as ocupações nas quais trabalhadores com menor escolaridade estão inseridos, em geral mais precárias, podem apresentar jornada de trabalho incompatível com o acompanhamento regular nessas unidades de saúde. Neste sentido, o mapeamento da hipertensão arterial entre trabalhadores utilizando o autorrelato deve favorecer ações de controle nos ambientes de trabalho. Neste estudo, VPP elevados indicaram alta probabilidade de verdadeiros hipertensos entre aqueles que relataram já ter ouvido que tinham pressão alta. Do ponto de vista da organização da assistência e do planejamento em saúde, esta medida pode balizar a alocação de recursos com foco naqueles que relatam HAS, contribuindo para a eficiência das intervenções.

O autorrelato positivo só é possível se o indivíduo tiver tido no passado acesso a serviço de saúde que tenha realizado seu diagnóstico, para que, então, no futuro ele possa relatar, por exemplo, que “alguma vez lhe disseram que teve pressão alta”. Isso nem sempre é possível em países em desenvolvimento, como o Brasil, onde uma parte da população pode ainda ter dificuldade de acesso aos serviços de saúde, com destaque para as áreas rurais, ou, ainda que tenha acesso, é possível que sua PA não seja aferida o número de vezes necessário para se fechar o diagnóstico de HAS. Desta forma, a acurácia do autorrelato pode corresponder a um indicador de diagnóstico atual de HAS na população1717 Alonso A, Beunza JJ, Delgado-Rodríguez M, Martínez-González MA. Validation of self reported diagnosis of hypertension in a cohort of university graduates in Spain. BMC Public Health. 2005;5:94. http://dx.doi.org/10.1186/1471-2458-5-94. PMid:16156889.
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.

Neste sentido, o sistema VIGITEL denomina a medida obtida por telefone como “frequência de diagnóstico médico prévio de HAS”, assim como outros autores tratam do autorrelato positivo de HAS como “conhecimento ou reconhecimento da história de HAS”4,5,24.

Faerstein et al.2828 Faerstein E, Chor D, Lopes CDS. Confiabilidade da história referida de diagnóstico e tratamento de hipertensão arterial: diferenciais segundo gênero, idade e escolaridade. Estudo Pró-Saúde. 2001;76(4):297-300. ponderam que “estimativas baseadas na medida da pressão arterial e em perguntas sobre história de diagnóstico médico de hipertensão não constituem rigorosamente indicadores do mesmo fenômeno, por existirem casos não diagnosticados”. Neste sentido, é necessário ponderar o papel da acessibilidade ao diagnóstico de HAS frente aos resultados do autorrelato. No entanto, os resultados deste estudo apoiados pela literatura2929 Melo CL, Amaral TLM, Amaral CA, Vasconcellos MTL, Monteiro GTR. Acurácia da hipertensão arterial sistêmica autorreferida em adultos de Rio Branco, Acre. Epidemiol Serv Saude. 2019;28(2):e2017407. http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742019000200018. PMid:31365686.
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evidenciam que o autorrelato é estratégia válida para o diagnóstico situacional da HAS em população de trabalhadores, contribuindo para identificar grupos de maior prevalência, orientando políticas voltadas para o controle do agravo nos locais de trabalho e na rede de serviços de saúde, particularmente na Atenção Primária à Saúde.

A população do presente estudo é composta majoritariamente por servidores públicos federais, aos quais é assegurada assistência médica supletiva. Além disso, a estabilidade característica deste vínculo empregatício pode tornar os trabalhadores mais propensos a comparecer aos serviços de saúde, tendo em vista que a ausência ao trabalho pode ser mais bem tolerada pelas chefias, quando comparados com trabalhadores celetistas e, principalmente, informais ou autônomos, cuja ausência ao trabalho tem impacto direto na renda auferida. Portanto, para a presente população de estudo, comparar a validade do autorrelato com as medidas diretas da PA evidencia-se como estratégia adequada, porque as discordâncias existentes provavelmente não terão resultado da falta de oportunidade de acesso ao serviço de saúde. No entanto, não se pode excluir a possibilidade de homens e indivíduos mais jovens negligenciarem a busca ao serviço e, portanto, não terem o diagnóstico de HAS realizado, mesmo nessas situações.

A definição de caso adotada neste estudo é corroborada pela literatura. Em estudo conduzido por Chrestani et al.1515 Chrestani MAD, Santos IS, Matijasevich AM. Hipertensão arterial sistêmica auto-referida: validação diagnóstica em estudo de base populacional. Cad Saude Publica. 2009;25(11):2395-406. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2009001100010. PMid:19936478.
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, o intervalo mínimo entre as duas medidas de PA foi de 5 minutos, diferentemente do presente estudo, no qual esse intervalo foi de, pelo menos, 20 minutos em repouso, o que pode ser mais adequado. E em Bambuí1111 Lima-Costa MF, Peixoto SV, Firmo JOA. Validade da hipertensão arterial auto-referida e seus determinantes (projeto Bambuí). Rev Saude Publica. 2004;38(5):637-42. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102004000500004. PMid:15499433.
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, foram feitas três aferições da PA, descartando-se a primeira e considerando para a avaliação da PA a média da segunda e terceira aferições.

Por fim, as prevalências de HAS encontradas nos indivíduos no presente estudo, tanto a partir do autorrelato como do padrão de referência, foram bastante similares - 28,7% e 30,8%, respectivamente -, o que é compatível com os indicadores de validade descritos, reforçando a hipótese de que o autorrelato pode ser utilizado para o mapeamento da prevalência de HAS também em uma população de trabalhadores.

CONCLUSÃO

O autorrelato de HAS mostrou-se como estratégia válida para realizar o diagnóstico epidemiológico deste agravo em trabalhadores. Neste sentido, uma vez que o indivíduo tenha tido acesso ao diagnóstico prévio de HAS, seu autorrelato em futura oportunidade mostrou-se válido e deve favorecer intervenções específicas para o controle deste agravo. Ademais, deve-se considerar o potencial facilitador para a adoção de intervenções voltadas para o controle da HAS em locais de trabalho, ou seja, visando a população trabalhadora que se encontra em espaços delimitados e supostamente mais acessível às ações de saúde continuadas.

  • Como citar: Mota RC, Siqueira JS, Fernandes RCP. Validade do autorrelato de hipertensão arterial em trabalhadores. Cad Saúde Colet, 2023; 31 (2):e31020421. https://doi.org/10.1590/1414-462X202331020421
  • Fonte de financiamento: o autor principal foi bolsista de iniciação científica CNPq.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    18 Ago 2020
  • Aceito
    20 Fev 2021
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