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Avaliando a Educação Ambiental no Brasil: materiais audiovisuais

RESENHAS BOOK REVIEWS

Kellen Junqueira

Mestranda no Multimeios, Instituto de Artes (IA) da Unicamp

Avaliando a Educação Ambiental no Brasil: materiais audiovisuais

Rachel Trajber & Larissa Costa, (org.).

São Paulo, Peirópolis, Ecoar, 160 p., 2001.

O Instituto ECOAR para a cidadania, dando continuidade à discussão e análise do material impresso sobre Educação Ambiental publicado em 1996, lança em 2001 um livro sobre a produção audiovisual que retrata a temática ambiental.

A organização da publicação se deu em um longo processo que aconteceu desde o levantamento do material e a análise do mesmo por um grupo de estudiosos e profissionais do meio audiovisual e da educação ambiental, até a realização de um evento de exibição dos vídeos e filmes selecionados e debates abertos com estes profissionais e outros, que aconteceram no Museu de Imagem e do Som (MIS/SP) na semana do Meio Ambiente de 2000. Estas etapas indicam uma postura bastante democrática, considerando-se que possibilitaram o enriquecimento da discussão e, ainda, uma publicação que foi distribuída e divulgada junto às instituições de ensino e de educação ambiental, principalmente àquelas que forneceram subsídios e os materiais que foram analisados.

Para diferenciar o conjunto de escritores que contribuíram para esta publicação, estarei tratando-os conforme o que julguei serem suas atribuições dentro do conjunto da obra: as organizadoras e os consultores – Eda Tassara, Marcello Tassara, Marcos Sorrentino e Rachel Trajber – que redigiram "Propostas para a instrumentalização de uma educação ambiental transformadora", e os estudiosos – Lúcia Santaella, Gregório Bacic e José Manuel Morán – que redigiram um capítulo cada um.

O livro Avaliando a Educação Ambiental no Brasil enfoca a questão pedagógica e aponta a necessidade da "educação para os meios" (p.15)1 1 Todas as citações feitas são do livro em resenha. . As organizadoras e demais consultores tratam o educador como sendo fundamental no uso dos materiais audiovisuais: "sem a presença do educador que os aprofunde e contextualize de maneira crítica, todos tornam-se informação vazia" (p. 24).

A educação se estabeleceu e se institucionalizou pelo uso de metodologias que reproduzem a ideologia dominante e dificultam a formação de cidadãos atuantes em nossa sociedade. Opondo-se a essa tendência, há uma outra postura pedagógica, como a concebida por Paulo Freire que é tomado como referência pelas organizadoras da publicação e é citado com destaque na introdução do livro, propondo uma "educação democrática através do exercício de pensar ‘o quê das coisas, o para quê, o como, o em favor de quê, de quem’, exigências fundamentais aos desafios de nosso tempo" (p.13). Essa postura é reforçada pelos consultores do livro quando estes reivindicam mudanças sociais através da participação e emancipação dos cidadãos (p. 32), o que eles consideram fundamental para a construção de uma nova política e para a melhoria da qualidade de vida.

Os estudiosos, cada um em sua especialidade, analisaram o material e sugeriram metodologias que podem ser utilizadas de forma a proporcionar uma postura crítica nos alunos. A profa. Santaella, em uma linguagem bastante simplificada e traduzida em alguns tópicos, abordou uma complexa metodologia, a semiótica, uma interessante ferramenta que favorece o educador e o leitor na realização das suas próprias análises dos audiovisuais. Bacic e Morán ressaltaram a importância da dedicação do educador e da sua sensibilidade no uso dos meios de comunicação em suas atividades. Segundo Morán, o simples uso da internet poderia estimular a participação dos alunos, favorecendo a "interação presencial-virtual de todos", onde o educador tem o "papel de animação e coordenação ... o que exige muita atenção, sensibilidade ... e domínio tecnológico" (p.103).

O poder de representação dos meios de comunicação é, ao mesmo tempo, a sua magia e a sua falácia, uma característica difícil de se perceber e que tem se tornado um agravante devido ao fato das informações veiculadas e dos acontecimentos referenciados, principalmente os retratados na produção documental e nos noticiários, serem tomados como reais e verdadeiros, o que é reafirmado na rotina da maioria dos cidadãos que consomem desavisados este espetáculo existente na mídia.

As questões de linguagem e de representação têm, assim, cada vez maior importância para os estudiosos e pensadores da questão ambiental e social quando se referem às necessidades e possibilidades de transformação e emancipação dos cidadãos, pois são nestas dimensões que estão estruturadas as concepções políticas e de meio ambiente, que são formuladas de acordo com as referências culturais de cada civilização. Assim tratadas, estas concepções perdem cada vez mais sua aura de naturalidade, mostrando-se construções históricas e, portanto, mutáveis.

Para que os projetos de Educação Ambiental sejam transformadores, assim como sugerem as organizadoras deste livro, também os meios utilizados para a divulgação destes, para subsídio de discussões ou para atividades pedagógicas, podem ser instigadores e proporcionarem uma visão crítica e uma postura participativa por parte do leitor e do espectador.

Os consultores alertam os realizadores quanto à responsabilidade destes ao produzirem materiais audiovisuais, os quais devem "estimular o desejo de emancipação, de liberação e de autonomia"e não devem ser feitos pela "mera sedução", senão não conduziriam "ao desejado esclarecimento intelectual, necessário para a emergência de uma cultura emancipatória" (p. 47). Indicaram também importantes princípios para se refletir sobre o assunto, como a possibilidade de se realizar uma "obra aberta" que ofereça uma "mensagem aberta a diferentes interpretações" e que provoque "uma relação dialética entre ela mesma e a comunidade de intérpretes", assim como pensado por Umberto Eco (p. 43). Apontaram ainda a necessidade de uma dimensão histórica que contextualize os fatos, favorecendo "a convicção de que podemos construir histórias" (p. 41). A profa. Santaella chama a atenção para a qualidade das produções que, em geral, são bastante informativas e utilizam muito texto em sua formulação: "falta à quase totalidade dos vídeos a ousadia da experimentação e da invenção de novas possibilidades na relação entre fala e imagem" (p. 70).

Uma das necessidades apontadas pelas organizadoras é a de "ampliar o acesso e refinar a seleção" (p. 17), o que vem se realizando através do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (FICA) que já acontece em sua terceira edição na cidade de Goiás/GO. Incentivando a produção sobre a temática, com a seleção e mostra competitiva de vários filmes e vídeos, o festival mobiliza a classe artística para retratar a questão da sociedade brasileira ter sempre se caracterizado por tratar a política deste país com uma postura bastante crítica e, através de muita criatividade, proporciona novas dimensões de mundo e outras formas de percebê-lo. É proposta da organização do festival divulgar os filmes, democratizando o acesso ao material que é mantido em cópia em seu acervo, o que poderia ser estimulado reivindicando-se meios de distribuição de tão rico material.

Por fim, é preciso ressaltar a importância que tem a simples reflexão sobre as formas de expressão, o que possibilita ao indivíduo que ele pense o seu próprio ser, favorecendo a formação de cidadãos conscientes de sua inserção no meio e a criação de uma postura autodidática, o que é apontado como fundamental por Morin, citado pelas organizadoras: "o único conhecimento verdadeiro é aquele que adquirimos por nós mesmos" (p. 24), o que será bastante estimulado com a divulgação desta publicação, ainda mais pela seriedade e respeito que goza o Instituto ECOAR, responsável por esta iniciativa.

NOTA

  • 1
    Todas as citações feitas são do livro em resenha.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Dez 2004
    • Data do Fascículo
      Jun 2001
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