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Notas para uma história da exploração madeireira na Mata Atlântica do sul-sudeste

Notes for a history of timber exploitation in the south-southeastern Brazilian Atlantic forest

Resumos

O artigo apresenta uma revisão das contribuições ao tema da história da indústria madeireira na Mata Atlântica. Após uma breve exposição conceitual, na qual delineamos a noção de Mata Atlântica brasileira, passamos em revista aos trabalhos, organizados em dois grandes períodos: o colonial, estendendo-se, para além da época do domínio português, até fins do século XIX; e o contemporâneo, compreendendo, basicamente, a primeira metade do século XX. Detemo-nos, então, nos pormenores do caso do Alto Vale do rio Uruguai, oeste do Estado de Santa Catarina, estudado através de pesquisa arquivística e métodos de história oral. Por fim, fazemos algumas considerações buscando apontar possíveis caminhos futuros de investigação.

Exploração madeireira; Mata Atlântica; Região sul-sudeste; História ambiental


The paper reviews contributions to the subject of the history of the timber industry in the Atlantic Forest. After a brief explanation of the general concepts and a more detailed one of the Brazilian Atlantic Forest, we have a closer look at previous works, which we organized in two major epochs, the so-called colonial epoch, which is characterized by the Portuguese dominion until the end of the 19th century, and the contemporary one, basically including the first half of the 20th century. In this context we analysed in detail the case of Alto Vale, a high valley of the Uruguay River, situated in the west of the state of Santa Catarina, Brazil, which has been studied by one of the authors, using the methods of archivist research and historic oral tradition. We conclude our work by giving ideas for future investigation.

Timber exploitation; Brazilian Atlantic forest; South-eastern region; Environmental history


ARTIGOS

Notas para uma história da exploração madeireira na Mata Atlântica do sul-sudeste

Notes for a history of timber exploitation in the south-southeastern Brazilian Atlantic forest

Diogo de Carvalho CabralI; Susana CescoII

INúcleo de Pesquisas em Geografia Histórica - NPGH, Departamento de Geografia, Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ

IIPrograma de Pós-Graduação em História Social - PPGHIS, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Email: susanacesco@yahoo.com.br

Autor para correspondência Autor para correspondência: Diogo de Carvalho Cabral Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ Cidade Universitária, Ilha do Fundão CP 68537, CEP 21941-972, Rio de Janeiro, RJ, Brasil Email: diogocabral@superig.com.br

RESUMO

O artigo apresenta uma revisão das contribuições ao tema da história da indústria madeireira na Mata Atlântica. Após uma breve exposição conceitual, na qual delineamos a noção de Mata Atlântica brasileira, passamos em revista aos trabalhos, organizados em dois grandes períodos: o colonial, estendendo-se, para além da época do domínio português, até fins do século XIX; e o contemporâneo, compreendendo, basicamente, a primeira metade do século XX. Detemo-nos, então, nos pormenores do caso do Alto Vale do rio Uruguai, oeste do Estado de Santa Catarina, estudado através de pesquisa arquivística e métodos de história oral. Por fim, fazemos algumas considerações buscando apontar possíveis caminhos futuros de investigação.

Palavras-chave: Exploração madeireira. Mata Atlântica. Região sul-sudeste. História ambiental.

ABSTRACT

The paper reviews contributions to the subject of the history of the timber industry in the Atlantic Forest. After a brief explanation of the general concepts and a more detailed one of the Brazilian Atlantic Forest, we have a closer look at previous works, which we organized in two major epochs, the so-called colonial epoch, which is characterized by the Portuguese dominion until the end of the 19th century, and the contemporary one, basically including the first half of the 20th century. In this context we analysed in detail the case of Alto Vale, a high valley of the Uruguay River, situated in the west of the state of Santa Catarina, Brazil, which has been studied by one of the authors, using the methods of archivist research and historic oral tradition. We conclude our work by giving ideas for future investigation.

Keywords: Timber exploitation. Brazilian Atlantic forest. South-eastern region. Environmental history.

1 Introdução

Desde o início da década de 1980, as discussões em torno dos danos ecológicos ocasionados pela ação antrópica motivam a realização de numerosos estudos técnico-científicos cujos objetivos são, geralmente, identificar e aperfeiçoar as normas e critérios utilizados na exploração dos recursos naturais. Na maioria das vezes, esses estudos enfatizam a questão das formas de exploração dessas riquezas, procurando adequá-las a métodos considerados de maior viabilidade econômica e menor impacto ambiental.

O desafio contemporâneo da sustentabilidade socioambiental demonstra, contudo, que tanto o estudo sistemático quanto o enfrentamento político-prático dos problemas ecológicos requerem uma abordagem interdisciplinar (PENA-VEGA, 2003, p. 20-2). No âmbito específico das ciências físico-naturais e engenharias, talvez o maior desafio seja incorporar em suas filosofias a perspectiva histórica, própria das ciências humanas e sociais.

Dentro desse novo contexto epistemológico, as paisagens florestais, um dos principais objetos das atuais preocupações conservacionistas, são cada vez mais concebidas como o resultado de sucessivos ajustamentos sistêmicos em face das condições impostas pela dinâmica da sociedade humana (OLIVEIRA, 1998, p. 124; FOSTER, 2002a, p. 1269). Despojados de antigas noções como equilíbrio e estabilidade, tributárias do velho paradigma do chamado balanço da natureza, vários cientistas naturais demonstraram que a estrutura e a composição dessas comunidades vegetais fazem pleno sentido apenas quando interpretadas à luz da história de suas relações com o homem (FOSTER, 2002b; COGBILL et al., 2002; HALL et al., 2002; FOSTER et al., 2002; BELLEMARE et al., 2002). É a análise desta história que nos possibilitará, enfim, compreender e aprender com os erros do passado para, deste modo, romper com o ciclo vicioso de desmatamento e degradação dos sistemas florestais (LEÃO, 2000, p. 117).

Este artigo tem como objetivo constituir um primeiro esforço no sentido da construção de um panorama sócio-histórico da atividade madeireira no bioma da Mata Atlântica, com ênfase nos seus domínios sulinos, revisando a ainda parca literatura sobre o tema. Incluem-se, aqui, é claro, além dos estudos feitos por historiadores, também aqueles realizados por sociólogos, geógrafos e economistas. Demos ênfase ao período ao longo do qual a exploração madeireira ainda estava apoiada numa atividade meramente extrativista, isto é, não estava associada à silvicultura, pelo menos não de maneira sistemática.

Para a presente revisão, consideramos os estudos que se ativeram ao bioma da Mata Atlântica brasileira, tal como expresso e delimitado por Warren Dean (1996, p. 24-5). Ao início da colonização portuguesa, estima o historiador norte-americano, este complexo de tipos de florestas englobava, além da Floresta Ombrófila Densa (Mata Atlântica stricto sensu), a Floresta Ombrófila Mista (mata de araucária), a Floresta Estacional Semi-Decídua (matas do interior) e os ecossistemas associados (manguezal, vegetação de restinga e campos de altitude); estendia-se, de forma quase contínua, entre 8° e 28° de latitude sul; e se expandia ao interior cerca de cem quilômetros da costa no norte e se alargava a mais de quinhentos quilômetros no sul. No total, o bioma cobria cerca de um milhão de quilômetros quadrados.

Nosso itinerário será o seguinte: em primeiro lugar, passaremos em revista aos dois grandes períodos para os quais há uma literatura histórico-sociológica: o colonial, estendendo-se, para além da época do domínio português, até fins do século XIX; e o contemporâneo, compreendendo, basicamente, a primeira metade do século XX. Deter-nos-emos, então, nos pormenores do caso do Alto Vale do rio Uruguai, oeste do Estado de Santa Catarina, estudado pela segunda autora, Susana Cesco, através de pesquisa arquivística e de história oral (a última realizada entre janeiro e dezembro de 2002). Por fim, faremos algumas considerações finais, buscando apontar possíveis futuros caminhos de investigação.

2 Brasil colonial

O tema da economia madeireira colonial foi, até muito pouco tempo atrás, amplamente negligenciado pela historiografia brasileira. Os trabalhos de Miller (2000) e Cabral (2004; 2005; 2007a, 2007b) constituem um primeiro esforço de sistematização da pesquisa nessa área. Esta imensa lacuna, entretanto, já havia sido notada, de certa maneira, em uma ou outra ocasião. Gilberto Freyre, com sua conhecida clarividência, parece ter sido o primeiro:

O que Portugal retirou de madeira do Nordeste do Brasil - madeira gorda e de lei, que a outra lhe dava até repugnância - para levantar ou reparar seus conventos, suas igrejas, seus palácios, toda a sua arquitetura voluptuosa, para construir seus barcos e seus navios, forma um capítulo da história da exploração econômica do Brasil pela Metrópole [...] que um dia precisa ser escrito com vagar e minúcia (FREYRE, 2004, p. 87).

Na mesma toada vai J. R. do Amaral Lapa. Ao esboçar o estado da arte de nossa história econômica colonial, o historiador paulista afirma que "ainda esperam estudos atentos produtos tropicais como a madeira" (LAPA, 1973, p. 12); em escrito posterior, clama por "estudos sistemáticos que possam passar-nos uma visão de conjunto" da economia madeireira, isto é, que dê conta dos "longos e penosos roteiros desde os centros produtores até os consumidores" (LAPA, 2002, p. 167).

Miller (2000, p. 259) nota que "a madeira recebeu apenas comentários passageiros, embora usuais, por parte dos historiadores. É de conhecimento geral a existência de um setor madeireiro, mas nós ainda não começamos a colocar o tema em suas perspectivas históricas, econômicas e sociais"1 1 Este trecho, originalmente em inglês, foi traduzido livremente pelos autores para fins de maior fluência do texto. .

Subjacente a isso há, decerto, um quê de "princípio de frei Vicente", expressão cunhada por Jorge Caldeira para designar essa concepção, outrora bastante difundida em nossa historiografia econômica, que dicotomiza noções como: litoral e sertão, setor de exportação e setor de subsistência, economia mercantil e economia natural; privilegiando, em nome da explicação da exploração colonial ou da reprodução do modo de produção escravista, sempre o primeiro termo do binômio, deixando de lado tudo o que não seja produção majoritariamente exportável (CALDEIRA, 1999, p. 173-81). Na falta de necessidade de maior atenção, devido à sua naturalização, ficam de fora da análise certas ações fundamentais para sustentar e organizar a produção exportável e, dentre essas, o fornecimento de madeira. Celso Furtado (1976, p. 44), por exemplo, reconheceu que "o engenho realizava um certo monte de gastos monetários, principalmente na compra de gado (para tração) e de lenha (para as fornalhas). Essas compras constituíam o principal vínculo entre a economia açucareira e os demais núcleos de povoamento existentes no país" [grifo nosso]. Da mesma forma, Vera Lúcia Ferlini (1987, p. 29-30) identifica a produção açucareira a um imenso complexo agroindustrial que impulsionava e articulava, ao seu redor, inúmeras atividades subsidiárias: "Tabaco, pecuária, lavoura de subsistência, olarias produtoras de telhas, tijolos e formas, o abastecimento de lenha para as fornalhas e de madeira para as construções interligavam-se no processo produtivo em que o centro e unidade eram o engenho" [grifo nosso].

Se existia, de fato, um fluxo mercantil que satisfazia as demandas de lenha e madeiras de construção dos engenhos açucareiros - mas não somente deles - e, com efeito, criava alguns dos laços de um mercado endógeno, existia também, subseqüentemente, trabalho humano produzindo essas mercadorias, bem como capital para as fazer circular. Análises mais amplas sobre esse setor são necessárias para a inteligibilidade da economia interna que se desenvolvia a passos largos desde meados dos setecentos (MONTEIRO, 2003, p. 25).

Os poucos historiadores que se interessaram sobre o tema conceberam a economia madeireira como um mero apêndice da indústria naval, principalmente aquela de caráter estatal. É esta orientação geral que guiou as descrições do fenômeno feitas por J. R. do Amaral Lapa (1968), Morton (1978) e Lucy M. Hutter (1986). Os dois primeiros trabalhos, baseados em documentação relativa à capitania baiana, focam sua atenção nos mecanismos institucionais usados pela Coroa portuguesa para o abastecimento madeireiro de seus estaleiros; o último fornece um panorama geral do uso da madeira brasileira na construção e reparo de embarcações luso-brasileiras e estrangeiras, ao longo de todo o período colonial, oferecendo ainda uma lista das espécies vegetais mais utilizadas.

Em seu livro Fruitless Trees, uma pioneira incursão de larga escala no tema da indústria madeireira colonial, S. W. Miller constrói uma teoria que procura associar as políticas florestais portuguesas e o desenvolvimento do setor madeireiro. Basicamente, ela estabelece uma relação de causalidade direta entre a estratégia de conservação representada pela instituição das madeiras de lei, que objetivava proteger e salvaguardar as melhores árvores brasileiras para a construção e manutenção da Real Armada, e um desflorestamento que não se aproveitou do valor de troca da biomassa não-carbonizada para a geração e acumulação de capital. Para Miller, o conservacionismo luso acabou por atuar no sentido contrário, isto é, incentivou os desmatamentos, na medida em que dificultou o aproveitamento comercial das madeiras pelos próprios fazendeiros, estimulando com isso a queima pura e simples das matas:

[...] colonial forest policy declared that Brazil's best trees, whether rooted on public or private land, held neither present nor future value for the colonists, for they were exclusive property of the king. Hence, the opportunity cost of slashing and burning the forest was almost nonexistent: one could expect no immediate returns while waiting for exhausted soils to recover, and there was no legal opportunity to turn the forest's trees to personal profit. Hence there are no examples of private conservation. One lost nothing and gained much by the destruction of the forest. The abundance of forested soils am timber's declared value of zero to the populace were the real incentives to cut it down and set it afire - of not just deforesting it, but destroying it. Due to the crown's unparalleled monopolization of timber resources, which it justified as conservation policy, timber trees remained obstacles to the pursuit of prosperity in Brazil, rather than serving as vehicles to that end, as they had in North America and elsewhere. (MILLER, 2000, p. 9).

Essa tese generalizante foi recebida com reservas, até mesmo pelos comentadores favoráveis. Drummond (2000), por exemplo, adjetivou a teoria como polêmica por duas grandes razões, ambas relacionadas, direta ou indiretamente, ao raciocínio de tipo contra-factual utilizado pelo autor: a primeira seria a validade mesma desse tipo de exercício intelectual, em se tratando de um texto monográfico; a segunda teria que ver com a agressão à noção, amplamente enraizada, de que as proibições e punições governamentais são sempre o melhor modo de proteger as florestas.

Os comentadores desfavoráveis procuraram enfatizar mais a questão propriamente historiográfica. Christian Brannstrom (2003, p. 210) listou uma série de argumentos utilizados por Miller que careceriam de maior endossamento empírico: 1) a madeira brasileira era valiosa para a indústria naval; 2) as madeiras passaram a ser exportadas quando as políticas mudaram, em meados dos setecentos; 3) os obstáculos físicos à produção eram transponíveis; 4) os colonos realmente acreditavam que o monopólio metropolitano impedia o corte privado; 5) áreas substanciais de floresta ainda existiam no final do período colonial; e 6) os altos impostos reduziram a eficiência da navegação de cabotagem e das serrarias privadas.

Mais incisivo, Pádua (2004, p. 101) afirmou que a tese de Miller "apenas indica que a madeira das florestas brasileiras poderia ter sido mais e melhor aproveitada no mercado, não demonstrando que esse aproveitamento teria impedido a destruição florestal, no contexto de uma fronteira aberta".

Cabral (2004) questionou mesmo se não houve, no quadro das possibilidades reais de uma fronteira agrária abrindo-se num ambiente de floresta pluvial de terras baixas e sub-montanas, um aproveitamento comercial das madeiras por parte dos agricultores. Analisando dados empíricos relativos ao distrito fluminense de Santo Antônio de Sá de fins do século XVIII, o referido autor demonstrou que havia, sim, um conjunto de agentes particulares engajados na fabricação de peças de madeiras de construção, como vigas, caibros e frechais. Indo mais além, foi-lhe possível identificar quais eram os atores responsáveis por essa atividade, chegando à conclusão de que se tratava, predominantemente, dos pequenos produtores de gêneros alimentícios, os chamados lavradores e fabricantes de farinha. O autor embasou-se na análise de indicadores quantitativos, como a participação das classes agrárias no montante de agentes madeireiros, tanto o número total como o interno à classe, e as suas produções médias, e em indícios textuais, como o da troca de madeira por mantimentos nas tavernas. Esses resultados mais pontuais corroboraram o que já havia sido mostrado, em linhas gerais, por Larissa V. Brown (1986), vinte anos atrás: que um dos principais produtos formadores de uma vasta hinterlândia comercial da cidade do Rio de Janeiro, no período colonial tardio, era a madeira.

No que tange às grandes fazendas escravistas exportadoras, a grande demanda interna provavelmente não permitia que se produzissem madeiras para fora, sob pena de esgotamento desses recursos. Estudando minuciosamente o caso do engenho açucareiro do Camorim, Carlos Engemann e colaboradores (2005, p. 124-36) mostraram que as cinco principais demandas de produtos florestais eram: a) instalação de cercas; b) reformas dos madeiramentos das construções; c) fabrico e manutenção dos carros de bois; d) construção de caixas para embalagem do açúcar; e e) fornecimento de lenha para as caldeiras. Ou seja, todas elas se destinavam ao consumo interno da unidade produtiva. O valor dado a certas madeiras (a sucupira e o vinhático, por exemplo), de importância fundamental para o bom funcionamento dos engenhos, justifica que houvesse preocupação com a manutenção de seu estoque nas matas da propriedade. Práticas predatórias que tornassem esses indivíduos ainda mais afastados e escassos eram combatidas pelos proprietários dos engenhos e rejeitadas pelos carpinteiros encarregados de produzir os equipamentos necessários à indústria do açúcar (CASTRO, 2002, p. 101).

Cabral e Cesco (2007) analisaram os aspectos político-administrativos da instituição das madeiras de lei, utilizando vasta documentação administrativa relativa ao Rio de Janeiro e à Santa Catarina de fins do século XVIII e começos do XIX. Inspirando-se, então, nos insights de E. P. Thompson, os autores procuraram descrever a referida instituição como uma prática florestal que emergia como resultado dinâmico das relações sócio-políticas estabelecidas entre a burocracia florestal, concebida como um grupo de indivíduos dotados de interesses pessoais e plenamente conscientes das peculiaridades sociais e ecológicas do ambiente no qual atuavam, e os produtores rurais, para os quais o acesso contínuo à madeira era fundamental.

3 Brasil contemporâneo

Da independência política, em 1822, até meados do século XX, as principais transformações da indústria madeireira nacional parecem ter ocorrido na esfera da tecnologia de processamento. Equipamentos de serraria tornaram-se comuns na década de 1820; em 1838, havia 53 serrarias em São Paulo. Nos anos 1850, a siderúrgica de Monlevade, em Minas Gerais, estava fabricando lâminas para serrarias. As serras operadas mecanicamente tornavam mais comerciais as espécies de valor inferior no mercado interno; reduziam, até pela metade, os custos de construção e estimulavam a indústria naval (DEAN, 1996, p. 180).

No tocante ao domínio da oferta de matéria-prima, contudo, não ocorreram grandes mudanças. A plantação de árvores com fins comerciais ainda era um pensamento que passava ao largo das iniciativas e estratégias econômicas dos agentes agrários. Para Carlos Augusto Taunay, que escrevia na década de 1830,

[...] estes vegetais, que hoje nascem espontaneamente em sobeja abundância talvez algum dia, ou porque a população e cultura tenham invadido seus campos natalícios, ou porque as exigências do comércio despertem a indústria, virão talvez a serem adotados pela agricultura, e cultivados metodicamente com grande melhoramento das suas virtudes e préstimos (TAUNAY, 2001, p. 212-13).

A domesticação das árvores madeireiras, isto é, a silvicultura, "a história de todas as mais plantas que, em cuja educação, o lavrador se emprega" (TAUNAY, 2001, p. 213), ainda estava longe de se tornar uma realidade. O fornecimento de madeira em tora ainda se vinculava ao desbravamento das florestas virgens dos chamados sertões, no bojo do processo de expansão da fronteira agrícola. Tal é o quadro que vamos observar naquelas porções do território em vias de incorporação à formação sócio-econômica nacional, como o oeste paulista, o norte do Paraná e as demais províncias sulinas, a partir do último quartel do século XIX. Comecemos com o estudo clássico de Pierre Monbeig (1984).

Entre o final do século XIX e começos do XX, quando não havia estradas, nem caminhões para o transporte das árvores avantajadas, nem serrarias com capacidade para as transformar em pranchas, não existia outra solução a não ser a queima pura a simples da mata, sem nenhum aproveitamento madeireiro. Somente a partir de 1920, com a instalação de melhores equipamentos industriais e meios de transporte, é que a indústria madeireira toma impulso. Para essa nova atividade, concorreu também o desenvolvimento de grandes centros urbanos como São Paulo, Rio de Janeiro e mesmo Belo Horizonte, que abriam um mercado até então bastante modesto. As florestas dos planaltos paulistas passam, então, a fornecer madeiras como a peroba (Aspidosperma polyneuron), o ipê (Tocona chrysostrica Mart., Tocona impetiginosa Mart. e Macrobolium hymenacoides Wild. I.), o jacarandá (Machoerium cillosum Vog.), o faveiro (Platypodium elegans Vog.), o angico (Piptadenia rigida Benth.) e muitas outras, às quais se juntaria a araucária (Araucaria angustifolia) do norte do Paraná.

Monbeig (1984, p. 243-7) identifica dois tipos de empreendimento madeireiro: as serrarias pesadas e as serrarias leves. As primeiras eram os maiores centros de exploração das madeiras de lei. As mais importantes eram construídas junto às estações ferroviárias, nos espaços urbanos, como em Tupã, ou em pontos de convergência de estradas, como em Presidente Prudente, Presidente Venceslau, Londrina e Andradina. Tratava-se de serrarias pesadas, frutos de grandes investimentos; não podiam ser facilmente deslocadas por causa da importância da maquinaria. No entanto, era preciso acompanhar a retração progressiva do tecido florestal, que seguia aceleradamente: pode-se estimar que, no intervalo de um mês, atingisse 300 alqueires. O problema da distância era atenuado com o uso de caminhões e, assim, as serrarias conseguiam sobreviver por uma dezena de anos. Quando a floresta se encontrava em terra privada, era costume comprar dos proprietários as árvores em pé, sendo atribuição da empresa cortar e transportar os troncos.

As serrarias leves, por sua vez, acompanhavam a marcha do povoamento. Esses lavradores de madeira correspondiam a um segundo nível da exploração florestal, sucedendo as grandes serrarias. Não procuravam mais as boas madeiras de lei, contentando-se com árvores de dimensões e qualidade inferiores, destinadas, principalmente, à fabricação de dormentes para estradas de ferro. Suas instalações localizavam-se não ao lado dos trilhos ou dentro das maiores aglomerações urbanas, mas nos pequenos centros locais e nos novos loteamentos. Essas serrarias leves tinham menor estabilidade e não permaneciam no mesmo local por mais do que uns poucos anos.

Já a partir do norte do Paraná - e, quanto mais para o sul, mais pronunciada é a sua presença - temos um elemento paisagístico que parece condicionar toda uma sorte de indústria madeireira: a mata de araucária ou Floresta Ombrófila Mista. Esta formação vegetacional está circunscrita a uma região de clima pluvial subtropical, ocorrendo abaixo do trópico de Capricórnio, limitada entre as latitudes 19° e 31° sul e entre as longitudes 41° e 54° oeste. Ocorre em altitudes que vão dos 500 aos 1.200 m, nos estados do sul do Brasil (GUERRA et al., 2002). De acordo com Dora Romariz (1970, p. 429), é a existência deste tipo de floresta mais uniforme que condicionou um maior desenvolvimento da indústria madeireira no sul do país, pois permitiu uma exploração mais regular dos seus elementos.

Em artigo sobre o Paraná Provincial, Leandro (1999, p. 93-105) aponta a carência de estudos que enfoquem as relações de trabalho escravo e nacional livre. Nesse ponto, o autor chama a atenção para a inverdade das afirmações da historiografia tradicional que associam o desmatamento e o nascimento de uma indústria madeireira na região ao século XX e à estrada de ferro. Desde o século XIX, a derrubada comercial de certas espécies da Mata Atlântica era uma atividade corriqueira e de forte impacto na região. Para comprovar isso, as correspondências aos Presidentes de províncias e aos Ministros da Marinha dão conta da relevância do tema. Acrescem-se a isso as leis e os decretos sobre preservação de matas em áreas devolutas e multas aos infratores. Outra questão importante, e ligada à exploração madeireira local, relaciona-se à agricultura. A derrubada da floresta foi apontada como prejudicial também por desviar braços da lavoura. Por fim, o autor deixa claro que havia, de acordo com a documentação analisada, "relações sociais no litoral do Paraná, pautadas pelo contínuo e sistemático desrespeito às matas" e que o estudo do papel desses proprietários de terra, autoridades policiais e pequenos sitiantes locais em relação à devastação da Mata Atlântica é o desafio que se impõe.

Para o Rio Grande do Sul, temos o estudo de Vanessa Barcellos (1988). A autora concentra sua atenção na análise da indústria madeireira que nasce da interação entre os colonos italianos e a mata de araucária, na porção nordeste do território sul-rio-grandense. Se, por um lado, os pinheirais representaram obstáculos à implantação das lavouras, por outro, tornaram-se aliados dos colonos como fornecedores de matéria-prima para a construção de suas habitações e para a confecção dos utensílios necessários à lida cotidiana. Com o passar do tempo, a araucária passou, também, a ser beneficiada em serrarias primitivas, sendo o produto comercializado nos próprios núcleos coloniais. "É aqui que se inicia a história da indústria madeireira no Rio Grande do Sul, sendo Caxias do Sul o ponto de partida, pois ali foram implantados os primeiros núcleos coloniais e, em conseqüência, as primeiras serrarias" (BARCELLOS, 1988, p. 3).

Como a madeira de pinho fosse, nesse momento, matéria-prima abundante na região, era comum encontrarem-se toras e mesmo pinheiros inteiros abatidos, apodrecendo por falta de utilização. Isso se explica pelo fato de que a derrubada de pinheiros, naquele momento, tinha como finalidade primeira o desembaraçar da floresta para o início do cultivo. Aliou-se a essa necessidade a utilização da madeira para diversos fins. Mesmo com a instalação de algumas primitivas serrarias, o beneficiamento da madeira visava somente o mercado interno aos núcleos coloniais, já que o transporte do produto entre esses núcleos e os maiores centros era impraticável.

De acordo com Barcellos (1988, p. 50), "os colonos enfrentaram a serra inóspita e a densa floresta, onde abriam clareiras para a construção de suas casas e o início de suas roças. Portanto, a derrubada de pinheiros e sua utilização para as necessidades mais prementes, foi uma das primeiras atividades dos colonos". A partir disso, a autora faz uma análise da passagem do aproveitamento e beneficiamento rústico da floresta, na região noroeste do Rio Grande do Sul, para uma indústria madeireira efetiva e consolidada, tudo tendo como fio condutor a política desenvolvimentista do governo Borges de Medeiros.

As primeiras serrarias da região surgem pela necessidade de tábuas para a construção de casa e para fins domésticos, além de limparem os terrenos para a agricultura. O beneficiamento da madeira dava-se em um regime de domesticidade e não visava a exportação ou a venda para outros núcleos coloniais. A mercantilização da atividade era entravada pela precariedade ou até inexistência de estradas para o escoamento dessa possível produção, questão, aliás, que movimentou fortemente o cenário político e industrial rio-grandense até as primeiras décadas do século XX.

O aumento da população local, ainda no século XIX, provoca a necessidade de novas terras para o consumo e mais madeira para a construção das colônias. Essa visibilidade que a insipiente indústria madeireira local passa a ter intensifica-se quando, "em 1900, pelo decreto-lei nº 313, de quatro de julho, o governo dispõe sobre o regime colonial e florestal do Estado, regularizando a conservação e exploração das matas, bem como do replantio" (BARCELLOS, 1988, p. 54). A floresta, então, passa a ser vista explicitamente pelo governo como uma reserva de recursos comercializável e potencialmente renovável.

O crescimento da exploração madeireira no Estado só enfatiza o maior dos problemas enfrentados pelos madeireiros e colonos em geral: a precariedade do sistema de transporte e escoamento da produção do interior. Estradas, ferrovias e portos eram um problema muito mais do que eram caminhos para o enriquecimento dos produtores. Reclamações e reivindicações acerca do tema eram comuns em jornais, cartas e pedidos dirigidos ao governo local e federal. A partir da década de 1910, industriais ligados diretamente à exploração madeireira passam a se organizar para obter maior apoio e melhorias estruturais no escoamento da produção, além da redução das taxas do transporte pela via férrea. O que, a princípio, era uma atividade de pequeno porte, ligada à necessidade de limpar lotes para a produção agrícola e instalação dos imigrantes, inicia o século XX como indústria de grande porte e responsável por boa parte das exportações do estado do Rio Grande do Sul, especialmente com a Primeira Guerra Mundial e a necessidade de abastecer a Europa com madeiras de construção.

À medida que se intensifica a exportação de madeira, a questão do desmatamento vem à tona. Leis e decretos são instaurados para regularizar o corte, transporte, exportação e reflorestamento no Rio Grande do Sul, fato que se reproduz em todos os estados com uma indústria madeireira representativa. A primeira metade do século XX testemunha o auge da indústria madeireira, especialmente daquela baseada na exploração da araucária, nos estados do sul do Brasil. Institutos e associações são criados por produtores e pelo governo, ordenando e, na medida do possível, controlando a exploração desse importante recurso nacional.

Não há dúvida de que a indústria madeireira foi forte e muito presente no sul do Brasil, gerando, até meados do século passado, um grau considerável de crescimento econômico. Esse desenvolvimento, contudo, solapou rapidamente sua própria base natural de sustentação. Pode-se argumentar que faltou uma política mais forte e efetiva de reflorestamento que pudesse ter minorado o grau de devastação das florestas locais - que é superior a 90%, segundo Balduíno Rambo (1994, p. 164) e Miguel Guerra e colaboradores (2002, p. 85-102) -, e dotasse a economia madeireira sulista de um mecanismo de auto-sustentabilidade econômico-ecológica (ANDRADE, 2003).

4 O caso do alto Uruguai Catarinense

Os migrantes descendentes de europeus que habitavam as colônias velhas do Rio Grande do Sul já conviviam há algumas gerações com uma mata modificada e adaptada ao seu modo de vida. Referimo-nos aqui às seguintes colônias: São Sebastião do Caí, Montenegro, Lageado, Estrela, Taquara e Santa Cruz do Sul, colônias alemãs; e Caxias do Sul, Bento Gonçalves, Garibaldi e Antônio Prado, colônias italianas. Quando de sua mudança para o oeste catarinense, depararam com uma área que, apesar de povoada por populações indígenas e caboclas, era coberta por uma densa floresta, semelhante à encontrada no Rio Grande do Sul nos primeiros anos da imigração européia. Essa semelhança e a forma como se deu a instalação dos colonos na nova terra constituíram fatores determinantes no delineamento do mapa da devastação florestal do alto vale do rio Uruguai, no estado de Santa Catarina.

Analisaremos, aqui, este processo de desflorestamento, ao longo da primeira metade do século XX. O foco será centrado nos processos de aproveitamento primário dos produtos do desflorestamento, bem como na posição dos colonos no que diz respeito à necessidade - conforme propagandeada pelas empresas colonizadoras - de desmatar para que se procedesse a instalação dos núcleos coloniais. Examinar-se-á, também, o beneficiamento da madeira extraída e a construção de serrarias na região.

A paisagem do alto vale do rio Uruguai é composta de terras montanhosas que eram, na primeira metade do século XX, cobertas por uma densa floresta composta de angicos, açoita-cavalos, cabriúvas, camboatás, canafístulas, canelas, cedros, imbúias e louros, característicos do que os ecólogos e biogeógrafos chamam de Floresta Estacional Decidual (FED). Esta formação é conhecida pelos colonizadores como a Mata Branca, em oposição à Mata Preta (Floresta Ombrófila Mista). Nela, há a ocorrência de pinhais, compreendendo uma superfície aproximada de 47.000 km², que se estende ao longo dos cursos médio e superior do rio Uruguai, em altitude mínima de 200 m, e sobe seus múltiplos afluentes, até uma altitude de 600 a 800 m (NODARI, 2003, p. 164).

A floresta, tão valorizada nas propagandas como lucro certo após a derrubada, foi, na verdade, o primeiro problema dos migrantes. Em um local de matas, isolado dos centros de comércio da região, sem as estradas prometidas pelos agentes de venda de terras, a mata era um problema, algo que precisava ser eliminado, pois, como conta Aquilino Suzin, "não havia quem comprasse, pois todos tinham em suas terras" (SUZIN, 2002). A madeira só passa a ser importante alguns anos depois, quando surgem os compradores com contatos na Argentina e com a construção de casas comerciais e as primeiras indústrias (moinhos e frigoríficos), criando, então, um mercado para o referido produto. Outro problema era a dificuldade de derrubar as árvores e, especialmente, o destoque de suas profundas raízes, trabalho feito com ganchos puxados por bois, medida essencial para a futura plantação (CHIUCHETTA, 1990).

A necessidade de construir igrejas, escolas, vendas, moinhos, atafonas e outros elementos infra-estruturais para atender a uma população crescente criou um novo ramo de negócios: as serrarias. Inicialmente não registradas, elas se instalaram por toda a região, como é o caso da serraria do senhor Domingos Magarinos, na década de 1920, em Barra do Veado, atual município de Entre Rios (Figura 1). Essas serrarias inicialmente usavam a técnica conhecida como de centro: movidas por uma roda d'água, as toras eram presas por ganchos nas pontas e a serra cortava a parte central, não chegando às extremidades, e o corte era finalizado manualmente. Depois, usou-se a serraria a tição, pela qual as toras eram cortadas totalmente, embora a técnica fosse muito lenta. Posteriormente, inseriu-se o uso das conhecidas serras-fita (SUZIN, 2002).


Durante essa transição nos métodos de corte, alguns equipamentos mais modernos eram comprados por quem tivesse mais condições financeiras, como o caso de Guilherme Ficher, que montou a primeira serraria de Alto Bela Vista, a qual era acionada pela locomotiva Lauz. A máquina foi comprada em Porto Alegre e veio, por trem, até Marcelino Ramos:

Para atravessar o rio Uruguai, fixaram três tonéis às laterais da barca, visando maior segurança e não correr o risco de afundar e tudo que ela suspendia. Alcançada a margem oposta, ferramentas tiveram que ser postas em ação para abrir os 6 km de estrada por onde a máquina seria puxada com duas ou três juntas de boi até o local onde foi instalada (BÜCHELE, 1995, p. 43).

A madeira geralmente era comprada em pé, na propriedade do colono, e se dava da seguinte forma: o patrão fazia a escolha das árvores que eram de seu interesse em uma determinada propriedade rural; depois de determinar quantidades e custos, os peões, que eram homens contratados para a derrubada e transporte, acampavam durante dias em meio à floresta para promover a derrubada das árvores com machados e serras manuais (GUEDES, 2002). A dificuldade de promover essa derrubada estava, especialmente, na proximidade das árvores:

Os pinheiros nativos, naquela época, davam de dois, três metros de grossura e eles eram tão perto que quando embarrigava um pinheiro, que fazia aquele corte para depois virar para não cair em cima das pessoas, então eles caiam em cima dos outros pinheiros e não caiam no chão porque não tinha onde cair, então eles (os homens) sofriam muito (informação verbal).2 2 Entrevista concedida, por Biavatti, 2002.

Eram derrubadas de 10 a 12 árvores por dia, a um custo de seis mil réis a árvore em pé. Essas árvores chegavam a 15 m lineares só de tora e, dependendo do local de derrubada, precisava-se de cinco juntas de boi para as arrastar até o rio, demorando em média meio dia por tora (GUEDES, 2002).

As madeiras eram destinadas à construção civil nas novas vilas e distritos do alto Uruguai catarinense e, principalmente, nas décadas de 1930, 40 e 50, para a exportação, sendo a Argentina o principal mercado consumidor. Esse é um dos aspectos mais interessantes da colonização do oeste Catarinense.

Essas toras, depois de transportadas até o rio Uruguai, eram amarradas com cipós e formavam grandes balsas que chegavam a 80 ou 100 m (Figura 2). "Pronta a balsa, sobre ela construíam-se dois abrigos, um para cozinha e outro para dormir. Esses abrigos eram cobertos com folhas de taquara e guaricanga", duas árvores da região (BELLANI, 1991, p. 89). Essas balsas ficavam montadas nas margens do rio até a época das chuvas que provocavam as conhecidas enchentes do rio Uruguai. Essas enchentes representavam um aumento de até seis metros no nível das águas, ficando assim, em "ponto de balsa" - expressão usada pelos balseiros para designar o momento ideal para o início da viagem. Quando isso acontecia, o patrão, nome dado ao dono da balsa, contratava um grupo de homens para fazer a descida, além de ser o responsável pela manutenção deles. Para tanto, matava alguns animais para fazer charque, providenciava feijão, arroz, batatas e, para os primeiros dias, pão (CALVI, 2002).


Os homens permaneciam por volta de um mês sobre uma instável armação de madeira e cipós, deixando para trás suas famílias, na esperança de lucrar com a venda da madeira, com o intuito de investir o dinheiro em suas próprias terras. Eles dividiam suas funções por cargos determinados pelo patrão: havia o cozinheiro, responsável pela alimentação dos homens, que variavam de 20 a 30, de acordo com o tamanho da balsa; o prático, peão mais experiente que guiava os remos e indicava a direção e os desvios de ilhas e remansos a serem feitos; e, finalmente, os peões braçais, que montavam e controlavam a balsa (CALVI, 2002).

A descida do rio é descrita por Mhor (2002): "essa descida era interrompida raramente. Algumas vezes havia uma parada para descanso em algum remanso do rio, isso quando não havia outra balsa atracada no local". Quando da chegada à Argentina, o patrão já conhecia um comprador que, geralmente, era o mesmo de outras descidas e mantinha o contato. A entrega da madeira era feita no momento da chegada e o pagamento feito em moeda brasileira: cobrava-se 40 mil réis a vara de madeira (18 varas = 1 m³) (GUEDES, 2002). Com o dinheiro em mãos, o patrão pagava seus balseiros e os dispensava para voltarem para casa por conta própria.

De acordo com os resultados censitários publicados em 1945 (Tabela 1), aparecem como principais atividades locais a agricultura, a pecuária e a silvicultura, com 10.762 propriedades rurais praticantes (3,85% do total estadual). Nota-se que as indústrias extrativas inexistem segundo essa fonte. A exclusão da atividade madeireira pode ser entendida pelo fato de que as atividades acima mencionadas foram implantadas na região após o surgimento das vilas e cidades. Outro fator que ajudaria a explicar a ausência de registro de exploração madeireira nesse censo é o fato de que o comércio e a indústria de transformação eram atividades trazidas de fora, diferentemente da madeira, que era nativa, e estava tão imiscuída no imaginário socioambiental local de modo que não mais era notada, ao menos não como atividade produtiva. Financeiramente, os valores atribuídos à atividade extrativa, em 1939, eram de 228 mil-réis, insignificantes quando comparado à agricultura, com 9.021 mil-réis, e à atividade criatória, com 4.021 mil-réis. Valores que, de acordo com os depoimentos de homens que viviam da extração de madeira, mostram não transmitir a realidade.

A diminuição da migração para a região oeste de Santa Catarina, a partir da metade do século XX, devido, principalmente, ao fato de as terras já terem sido quase que totalmente colonizadas, não significou o fim da atividade extrativa. Diferentemente dos primeiros anos de ocupação, as décadas de 1960 e 1970 viram surgir leis de combate ao desmatamento, controle da exploração de determinadas espécies madeireiras e serrarias fiscalizadas. Foi nesse momento que se recordou com pesar a despreocupação de décadas passadas, quando todas as árvores da área eram derrubadas para limpeza dos terrenos. Em meio ao que era derrubado, estavam as pequenas mudas e os galhos frágeis que não sobreviveram para se tornarem novas grandes árvores.

5 Considerações finais

De acordo com os trabalhos existentes, a indústria madeireira praticada no bioma da Mata Atlântica manteve-se bastante semelhante desde o período colonial até meados do século XX. Historicamente, caracterizou-se por seus aspectos migratório e temporário, acompanhando, geralmente, a expansão da fronteira agrícola via extração de madeiras de alto valor comercial e utilização de parte da madeira resultante do arroteamento. Não é à toa que, ao tratar dos projetos experimentais do agrônomo Edmundo Navarro de Andrade com o plantio do eucalipto, na primeira década do século XX, Regina Leão use a expressão indústria florestal: neste momento, de fato, começa a tomar forma uma exploração madeireira auto-sustentável, associada ao conhecimento científico e ao reflorestamento sistemático. Graças a esse avanço, que obteve reconhecimento internacional, o Brasil era citado, no final dos anos 1950, como o país com as mais extensas plantações de eucalipto em todo o mundo (LEÃO, 2000, p. 208, grifo nosso).

Contudo, se, de lá para cá, os eucaliptais só fizeram crescer, não podemos esquecer que aquela modalidade predatória de indústria madeireira que ajudou a selar a sorte da Mata Atlântica não desapareceu, apenas migrou para o bioma ao lado. Com recursos calculados em 70 bilhões de metros cúbicos de madeira comercializável, a Floresta Amazônica é a última grande reserva do produto no mundo, uma vez que as florestas da Ásia e da África já se encontram praticamente esgotadas. Várias madeireiras estrangeiras, principalmente da Indonésia, Malásia, China e Japão, encontram-se instaladas na região. Devido à precária fiscalização governamental na área, é grande o corte clandestino de árvores, que muitas vezes acontece, também, em reservas indígenas. Segundo relatório do Greenpeace, 72% dos pontos críticos de destruição na Amazônia está relacionado à indústria madeireira (IBAMA, 2005).

Para aqueles que, como Dean (1996), estudaram a história da Mata Atlântica e contemplaram a presença de seus arvoredos remanescentes, a Floresta Amazônica provoca especial alarme e presságio. Conforme disse o historiador norte-americano, "[o] último serviço que a Mata Atlântica pode prestar, de modo trágico e desesperado, é demonstrar todas as terríveis conseqüências da destruição de seu imenso vizinho do oeste" (DEAN, 1996, p. 380). Isso aponta para a necessidade urgente de estudarmos a história ambiental do Brasil e de buscarmos compreender a origem e a evolução de algumas dinâmicas predatórias que vem marcando a economia brasileira desde os seus primórdios.

É preciso conhecer tais dinâmicas predatórias em profundidade, para haver alguma esperança de as transformar (PÁDUA, 2005). A indústria madeireira, sem dúvida, é uma delas. A partir da premissa de que "o impacto da exploração [madeireira] não pode ser avaliado apenas pelos efeitos da exploração per se" (CASTRO, 2002, p. 161), é preciso que aprofundemos nosso conhecimento dos sistemas sociais, econômicos e geográficos mais amplos, dentro dos quais ela tinha uma função. Uma das principais características da exploração de espécies madeireiras de alto valor comercial é a de catalisar muitas variáveis sócio-econômicas que levam ao desflorestamento, como o que ocorre quando estradas são abertas e terrenos são desmatados, ou "limpos", como dito em linguagem corrente. Com efeito, para entendermos a história da indústria madeireira na Mata Atlântica, é necessária uma interdisciplinaridade que articule as abordagens econômica, agrário-regional, etnográfica e geográfico-ambiental.

Notas

Recebido: 30/11/2006

Aceito: 14/7/2007

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  • 1
    Este trecho, originalmente em inglês, foi traduzido livremente pelos autores para fins de maior fluência do texto.
  • 2
    Entrevista concedida, por Biavatti, 2002.
  • Autor para correspondência:
    Diogo de Carvalho Cabral
    Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ
    Cidade Universitária, Ilha do Fundão
    CP 68537, CEP 21941-972, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Jan 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2008

    Histórico

    • Recebido
      30 Nov 2006
    • Aceito
      14 Jul 2007
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