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Inclusão, deliberação e controle: três dimensões dedemocracia nos comitês e consórcios de bacias hidrográficas no Brasil

Inclusion, deliberation and control: the three dimensions of democracy in committees and consortia of Brazilian river basins

Resumos

Este trabalho avalia o efeito democratizante da governança participativa na gestão das águas, a partir de uma pesquisa junto a 626 membros de 14 comitês e 4 consórcios de bacias hidrográficas. A noção de democracia é examinada segundo três noções: a) as arenas participativas devem promover a inclusão e combater a dominação das elites; b) a participação deve promover um processo dinâmico capaz de modificar a compreensão dos participantes; e c) as arenas participativas devem garantir maior controle social do Estado. Sugere-se que comitês e consórcios são mais bem sucedidos como espaços deliberativos. Desigualdades sociais afetam, mas não impedem um processo deliberativo.

Organismos de bacia hidrográfica; Democratização; Gestão das águas; Brasil


Based on a survey of 626 committee and consortium members in 18 river basins, this study evaluates the democratizing effect of stakeholder governance in water resources management in Brazil. The term democracy is examined according to three ideas: a) participatory arenas should promote political inclusion and combat elite domination; b) participation must involve a dynamic process of interaction that transforms the understandings of those who participate; c) participatory arenas should guarantee a greater control over the state by the society. The paper suggests that the committees and consortia work better as deliberative spaces. Social inequalities among members affect but do not hinder the deliberative process.

River basin organisms; Democratization; Water resources management; Brazil


ARTIGOS

Inclusão, deliberação e controle: três dimensões dedemocracia nos comitês e consórcios de bacias hidrográficas no Brasil

Inclusion, deliberation and control: the three dimensions of democracy in committees and consortia of brazilian river basins

Rebecca Neaera AbersI; Rosa Maria Formiga-JohnssonII; Beate FrankIII; Margaret Elizabeth KeckIV; Maria Carmen LemosV

IInstituto de Ciência Política, Universidade de Brasília, Brasília - DF, Brasil

IIDepartamento de Engenharia Sanitária e do Meio Ambiente, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, CEP 22421-020, Rio de Janeiro - RJ, Brasil

IIIInstituto de Pesquisas Ambientais, Fundação Universidade Regional de Blumenau, Blumenau - SC, Brasil

IVDepartment of Political Science, Johns Hopkins University, Baltimore, Estados Unidos

VSchool of Natural Resources and Environment, University of Michigan, Ann Arbor, Estados Unidos

Autor para correspondência Autor para correspondência: Rosa Maria Formiga-Johnsson Departamento de Engenharia Sanitária e do Meio Ambiente, Universidade do Estado do Rio de Janeiro CEP 22421-020, Rio de Janeiro - RJ, Brasil aformiga@terra.com.br

RESUMO

Este trabalho avalia o efeito democratizante da governança participativa na gestão das águas, a partir de uma pesquisa junto a 626 membros de 14 comitês e 4 consórcios de bacias hidrográficas. A noção de democracia é examinada segundo três noções: a) as arenas participativas devem promover a inclusão e combater a dominação das elites; b) a participação deve promover um processo dinâmico capaz de modificar a compreensão dos participantes; e c) as arenas participativas devem garantir maior controle social do Estado. Sugere-se que comitês e consórcios são mais bem sucedidos como espaços deliberativos. Desigualdades sociais afetam, mas não impedem um processo deliberativo.

Palavras-chave: Organismos de bacia hidrográfica. Democratização. Gestão das águas. Brasil.

ABSTRACT

Based on a survey of 626 committee and consortium members in 18 river basins, this study evaluates the democratizing effect of stakeholder governance in water resources management in Brazil. The term democracy is examined according to three ideas: a) participatory arenas should promote political inclusion and combat elite domination; b) participation must involve a dynamic process of interaction that transforms the understandings of those who participate; c) participatory arenas should guarantee a greater control over the state by the society. The paper suggests that the committees and consortia work better as deliberative spaces. Social inequalities among members affect but do not hinder the deliberative process.

Keywords: River basin organisms. Democratization. Water resources management. Brazil.

1 Introdução

Arenas deliberativas com poder formal, e com a participação de órgãos públicos, setor privado e sociedade civil, freqüentemente denominadas conselhos gestores, vêm sendo criadas em diversas áreas de políticas públicas no Brasil, inclusive no setor de gestão dos recursos hídricos. Neste setor, os conselhos gestores predominantes são os comitês de bacias hidrográficas, criados em níveis estaduais e federal, desde o início dos anos 1990, no âmbito da nova organização político-institucional de gestão das águas. Os comitês de bacias traduzem os ideais de gestão participativa das novas políticas das águas, por reunir representantes dos governos federal, estadual e municipal, da sociedade civil e dos usuários de água bruta, tais como empresas de saneamento básico, indústrias, agricultores e outros. As suas competências são amplas e variadas e incluem, dentre outras, as seguintes: negociar conflitos de uso da água; aprovar planos de bacias hidrográficas; e definir valores da cobrança pelo uso da água bruta, um novo instrumento de gestão ainda não implementado na maioria dos estados. Por iniciativa local/regional, consórcios intermunicipais e associações de usuários de águas estão sendo igualmente criados para a gestão de bacias hidrográficas, desde final dos anos 1980.

Grande parte da literatura sobre conselhos gestores no Brasil os vê como espaços de democratização das políticas públicas, como, por exemplo, Gohn (2004), Santos Jr. (2003) e Tatagiba (2002). No entanto, o conceito de democracia é bastante complexo, pois envolve diversos aspectos que freqüentemente conflitam entre si. Na verdade, sob o ponto de vista teórico, é impossível alcançar uma democracia plena, pois maximizar um dos seus aspectos implica, necessariamente, contrariar outro; o conflito entre liberdade e igualdade política é uma contradição clássica nesse sentido. Este trabalho propõe analisar, sob a perspectiva da democracia, discutida adiante, um survey realizado, em 2004, pelo Projeto Marca d'Água1, de 626 membros de 14 comitês de bacias e 4 consórcios intermunicipais de bacias hidrográficas. Esta análise compreende atributos, opiniões e práticas dos membros, segundo as suas próprias percepções, e é baseada em conceitos derivados de uma extensa literatura, nacional e internacional, sobre democracia participativa.

Nas décadas de 70 e 80, alguns cientistas políticos começaram a argumentar que a representação política através das instituições parlamentares não seria suficiente para promover uma cidadania ativa que fosse capaz de atender ao requisito democrático de controle do Estado por parte da sociedade. Macpherson (1977) propôs que a incorporação de mecanismos participativos dentro dos partidos políticos poderia ampliar a influência de grupos sociais mais fracos nas decisões tomadas. Já Pateman (1970) e Barber (1984) defenderam a criação de arenas participativas, que, mesmo pequenas, serviriam como "escolas de democracia", onde pessoas se desenvolveriam como cidadãs, adquiririam habilidades políticas, ganhariam confiança e tomariam consciência dos seus próprios interesses. A consciência cívica cresceria através da interação entre pessoas que vivenciam o mesmo processo. Nesse sentido, os defensores da democracia participativa deram destaque a três questões gerais: Como contrabalançar o controle da elite sobre o Estado? Como incluir novos atores sociais no processo deliberativo? Como desfrutar dos benefícios do próprio processo interativo de participação?

Nos anos 1980, a abordagem de democracia deliberativa é associada aos trabalhos de Habermas (1983, 1984, 1999) e aos trabalhos críticos de autores como Dryzek (2000), Cohen e Rogers (2003). Por vezes contrapostos aos autores da abordagem de democracia participativa, a escola deliberativa compartilha o enfoque sobre as três questões acima mencionadas, embora o processo decisório assuma nitidamente um papel mais central. Insatisfeitos com a abordagem que reduzia a participação democrática às ações individuais atomizadas, como, por exemplo, votar, os democratas deliberativos argumentavam que a multiplicação de espaços, nos quais indivíduos e grupos possam "ouvir a posição de uns aos outros e fazer escolhas coletivas depois de considerações devidas" (FUNG; WRIGHT, 2003, p. 17), democratizaria a tomada de decisão pública e iria além do simples foco de inclusão no processo. Essas idéias estão em sintonia com aquelas expressas por Pateman (1970) e Barber (1984) de que, através do processo interativo, as pessoas mudam a concepção dos seus próprios interesses e passam a reconhecer os interesses dos outros.

A noção de democracia deliberativa também dá muita ênfase à necessidade de inclusão política. Para a maioria de autores dessa escola, a deliberação somente será efetiva se desigualdades econômicas e de poder não desvirtuarem o processo decisório. Não somente o processo decisório deve ser aberto a todos os grupos sociais, mas deve também superar a tendência de predomínio da influência de atores sociais mais poderosos na tomada de decisão. Em princípio, "...o único poder que prevalece... é a força do melhor argumento; e este é uma força que é igualmente disponível a todos" (COHEN; ROGERS, 2003, p. 42).

No entanto, a literatura sobre deliberação aborda a questão de controle do Estado apenas indiretamente. Na visão de Habermas (1983, 1984), arenas deliberativas devem existir necessariamente fora do Estado, na "esfera pública" (1999). Mas outros, como Avritzer (2002), sugerem que essas novas arenas participativas constituem precisamente os meios através dos quais a esfera pública tenta influenciar o Estado.

Assim, a literatura que defende novas arenas deliberativas tende a enxergar que a participação tem três funções: i) promover a inclusão política; ii) estimular processos deliberativos interativos; e iii) aumentar o controle da sociedade sobre o Estado. Contudo, a operacionalização dessas funções leva a intensos debates quanto aos indicadores adequados à pesquisa quantitativa. Como medir o nível de inclusão de um sistema decisório? Faz-se necessário criar mecanismos em que toda a sociedade participe diretamente? O papel de representantes nos organismos colegiados é repercutir as posições articuladas pelas suas bases ou se engajar em processos deliberativos e, ao fazer o engajamento, possivelmente mudar de idéia? O controle das políticas públicas envolve apenas a tomada de decisão estatal ou a influência sobre atores mais amplos na sociedade?

Este trabalho não tem a ambição de responder a todas essas questões. Busca-se, sobretudo, explorar vários aspectos do processo participativo no âmbito dos comitês e consórcios intermunicipais de bacias hidrográficas, de modo a refletir sobre como essas arenas contribuem para cada uma das três dimensões da democratização aqui ressaltadas, dentro das limitações próprias à pesquisa efetuada, que apenas coleta opiniões e percepções dos próprios participantes do processo deliberativo. Na próxima seção, descreveremos brevemente o sistema de gestão de recursos hídricos e os mecanismos institucionais participativos que foram criados ao longo da década de 1990. A seguir, analisaremos dados da Pesquisa Marca d'Água (survey), sob a perspectiva dos três temas aqui discutidos: inclusão dos atores tradicionalmente excluídos, deliberação, e controle da sociedade sobre o Estado.

2 A reforma do sistema de gestão das águas no Brasil

O Brasil adotou novas leis das águas, em todos os estados e em nível federal, sendo São Paulo o pioneiro desse processo ao aprovar a sua lei em 1991. A lei federal foi aprovada em 1997, quando 11 estados brasileiros já dispunham de suas leis das águas respectivas. Entre as mudanças propostas, destaca-se a criação de organismos colegiados de tomada de decisões, como os conselhos nacional e estaduais de recursos hídricos e os comitês de bacias, compostos por representantes do setor público, dos usuários públicos e privados e da sociedade civil organizada. Além disso, a legislação introduziu o conceito de água como um bem comum de valor econômico, adotou a bacia hidrográfica como unidade de planejamento e gestão, reforçou a utilização de instrumentos pré-existentes (outorga de direitos de uso, enquadramento dos corpos d'água, sistemas de informação dos recursos hídricos), e introduziu a cobrança pelo uso da água como novo instrumento de gestão que deveria, em princípio, também financiar o funcionamento do novo sistema de gestão.

Vários fatores impulsionaram a reforma dos modos de gestão das águas no Brasil. Técnicos brasileiros de gestão da água adotaram modelos amplamente aceitos em nível internacional (FORMIGA-JOHNSSON et al., 2007; ABERS; KECK, 2005; FORMIGA-JOHNSSON, 1998). Ao mesmo tempo, novas abordagens de gestão pública em geral estavam sendo adotadas, defendendo uma burocracia mais flexível, através de parcerias com o setor privado e organizações civis, e a maior utilização de incentivos econômicos (OSBORNE; GAEBLER, 1992). Ainda, para aqueles que pressionavam pela democratização da agenda política no final do regime militar, abordagens participativas e descentralizadas de deliberação pública pareciam ser o caminho mais promissor para evitar (ou neutralizar) interesses clientelistas ou corporativistas. No final dos anos 1980, a crença de que os atores diretamente envolvidos por uma determinada política pública deveriam ter mais acesso aos processos decisórios já estava bem disseminada, o que explica porque legislações em setores tão distintos haviam incorporado a participação como principio de base. Nesse contexto, conselhos gestores representavam um passo adiante no processo de democratização do país, e não simplesmente um mecanismo de um "bom" (efetivo) governo (CARVALHO; TEIXEIRA, 2000).

A implementação dos novos sistemas de gestão tem conhecido ritmos fortemente diferenciados no cenário nacional, sendo, de modo geral, lentos e descontínuos. De modo geral, são os organismos colegiados de tomada de decisões os elementos privilegiados na construção de novos modos de gestão. Mais de 150 comitês foram criados no âmbito de diversos sistemas estaduais de gestão, estando, portanto, sob jurisdição de legislação estadual; somente 6 deles compreendiam bacias compartilhadas entre a União e os estados, e, logo, formaram comitês sob jurisdição federal1 1 O Projeto Marca d'Água ( www.marcadagua.org.br) foi criado em 2001 com o objetivo de analisar o desenvolvimento do novo sistema de gestão das águas, sobretudo os organismos de bacias hidrográficas. Ele tem como premissa a crença de que fatores sócio-políticos, além daqueles estritamente técnicos, têm um impacto decisivo no processo de transformação político-institucional e podem variar regional e temporalmente. Concebido como um projeto multidisciplinar, comparativo (entre bacias hidrográficas) e longitudinal (10 ou mais anos), o Marca d'Água é uma pesquisa-ação que envolve acadêmicos e profissionais envolvidos na gestão dos recursos hídricos. A coordenação do projeto é atualmente assegurada por um grupo de acadêmicos da Universidade de Brasília (UnB), Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Universidade Regional de Blumenau (FURB), Johns Hopkins University e University of Michigan. Mais de 35 pesquisadores e colaboradores, oriundos de áreas bastante diversificadas, já se envolveram com o projeto. O survey foi concebido e aplicado com o apoio do Centro de Pesquisas Quantitativas - CEPEQ da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). . Algumas bacias experimentaram outras formas de gestão participativa (em alguns casos, antes da aprovação da nova lei de águas), sobretudo através da criação de consórcios de municípios e da adesão espontânea de usuários de água e, por vezes, de organizações civis, que se uniram para proteger e recuperar as águas e o meio ambiente de bacias hidrográficas, de forma colaborativa. Cada consórcio tem a sua própria estrutura e os seus objetivos, definidos entre os seus membros, não estando, portanto, sujeitos a nenhuma definição legal pelas leis das águas.

Diante de tamanha diversidade, tem sido difícil generalizar sobre as razões de sucesso ou fracasso desses conselhos gestores, e até mesmo definir critérios de sucesso. Ao invés de entrar nesse debate, preferimos limitar-nos à seguinte investigação: comitês e consórcios tornam o processo decisório mais democrático, ou, pelo menos, mais aberto à participação, nos seus processos de tomada de decisões?

3 A pesquisa

A pesquisa aqui apresentada foi realizada pelo Projeto Marca d'Água, em 2004, junto a 626 membros de 14 comitês de bacia e 4 consórcios intermunicipais, de várias partes do Brasil (Tabela 1).

O survey buscou testar hipóteses levantadas em estudos qualitativos preliminares de 23 bacias hidrográficas, efetuados em 2001 e 2002 pelos participantes do Projeto Marca d'Água2 2 Esses estudos encontram-se resumidos em Formiga-Johnsson e Lopes (2003). , e, também, reunir informações sobre os membros desses organismos, a sua relação com os setores que representam e com os demais membros, bem como sobre os modos de funcionamento desses organismos.

A seleção dos 14 comitês foi feita a partir de uma pesquisa exaustiva do universo de comitês de bacias em funcionamento no Brasil há pelo menos dois anos, conduzida pelo Projeto Marca d'Água em 2003. Os 64 comitês assim identificados foram estratificados segundo quatro características, a saber: i) região do país (Nordeste, Centro Oeste, Sudeste e Sul); ii) principal problema relacionado às águas (escassez, qualidade, inundação); iii) tipo de bacia hidrográfica (rural, urbana, costeira ou combinação de rural/urbana); e iv) tamanho da bacia (em km2). Em seguida, comitês anteriormente estudados no Projeto Marca D'Água foram selecionados no âmbito de cada estrato. Somente o Comitê Sapucai-Mirim/Grande, SP, não havia sido estudado pelo projeto até então3 3 Informações sobre a amostra do estudo e as tabelas básicas do universo de comitês de bacia estão disponíveis em www.marcadagua.org.br/cadastro-comites.pdf. .

Na impossibilidade de realizar uma lista similar para os consórcios intermunicipais, foram selecionados 4 deles, a partir de pesquisas anteriores do Projeto Marca d'Água e do conhecimento de campo de seus membros. A inclusão dos consórcios pareceu-nos essencial, pois permitiria compreender modelos organizacionais distintos voltados para o mesmo objetivo global dos comitês, o de cuidar de bacias hidrográficas, e, também, situavam-se em diferentes regiões do país.

Em cada colegiado de estudo, todos os membros titulares foram selecionados para as entrevistas, sendo substituídos pelos seus suplentes quando não disponíveis. Dessa forma, realizou-se efetivamente um censo de membros em quase todos os organismos selecionados: 87% dos membros ou os seus suplentes foram entrevistados, no total. Somente três organismos de bacias tiveram critérios de escolha distintos dessa regra do censo. No Comitê do rio Pará, onde membros titulares e suplentes têm, na prática, o mesmo status, optou-se por uma amostra randômica que privilegiou a categoria de membro (sociedade civil, municípios, usuários, Estado) e a distribuição territorial dos 40 membros (titulares e suplentes). No Consórcio Piracicaba-Capivari-Jundiaí, todos os 21 membros da diretoria foram selecionados, além de uma amostra aleatória de 29 dos 75 membros restantes. No Consórcio Itapecuru, com 250 membros, todos os 8 membros da diretoria e mais 22 membros de 10 municípios foram selecionados segundo critérios populacionais e territoriais. Finalmente, em dois comitês, os de Itajaí e CEIVAP, foram igualmente entrevistados todos os membros das Câmaras Técnicas e/ou dos Grupos de Trabalho.

Contudo, não podemos considerar a seleção de comitês como sendo uma amostra representativa do conjunto de comitês de bacias hidrográficas no Brasil, pois ela somente se assemelha a esse universo. No entanto, o alto índice de retorno das entrevistas reforça a confiança nos dados enquanto reflexo do universo entrevistado. Por outro lado, a análise estatística comparativa dos comitês é limitada: o universo e o número de organismos selecionados são pequenos. Os resultados aqui apresentados devem ser, portanto, utilizados com a devida precaução e não refletem, necessariamente, a realidade do conjunto de comitês no Brasil. Essas ressalvas são ainda mais importantes em relação aos consórcios intermunicipais. Assim, o nosso objetivo limita-se a estabelecer algumas conclusões preliminares que subsidiarão pesquisas futuras sobre comitês e consórcios de bacias no Brasil, e o alcance (ou não) de alguns aspectos da democracia no seu funcionamento.

4 Inclusão de grupos tradicionalmente excluídos

Conforme discutido anteriormente, a idéia de espaços participativos como promotores da inclusão de grupos tradicionalmente marginalizados na política é quase unânime nas análises sobre conselhos gestores. Contudo, avaliar se a inclusão foi alcançada, ou não, não é uma tarefa fácil.

Quem deveria ser incluído no processo decisório? Na maior parte dos conselhos, os membros são referidos como representantes, sugerindo, portanto, que eles falam em nome de outros. Por trás dessa idéia, freqüentemente reside a suposição da existência de grupos sociais cujos interesses são claramente definidos. A realidade é menos evidente. Na maior parte dos comitês de bacias, por exemplo, membros não governamentais são escolhidos em assembléias onde todas as organizações da "sociedade civil" ou dos "usuários" são convidadas. Quem exatamente representa os indivíduos que são membros de organizações civis e foram escolhidos em tais assembléias? Um segmento mais abrangente da sociedade? Ou somente as associações que os escolheram? Qual é a sua composição sócio-econômica? Alguns teóricos sobre democracia sugerem que confiança e comunicação são mais facilmente construídas quando os representantes têm o mesmo perfil social de suas bases (MANSBRIDGE, 2000, p. 99-100); mais ainda, isso facilitaria a inclusão, na agenda decisória, de questões que um participante externo talvez não reconhecesse como relevantes. Contudo, em relação aos conselhos gestores observa-se que grupos populares enviam justamente os seus membros com maior nível de educação e socialmente mais privilegiados para participar de conselhos, porque acreditam que são essas pessoas que poderão melhor representá-los em fóruns técnicos (SANTOS Jr., AZEVEDO; RIBEIRO, 2004, p. 28)4 4 Para uma discussão teórica sobre o problema de representação da sociedade civil em organizações e conselhos, ver: Abers e Keck (2007), e Gurza Lavalle, Houtzager e Castello (2006). . Tais dúvidas sugerem que a simples observação da composição dos membros de um colegiado não é suficiente para avaliar plenamente se uma arena promove ou não inclusão política e social.

Feita essa ressalva, propomos examinar, neste item, a composição dos membros de comitês e consórcios em dois sentidos: i) tipos de organizações que participam de conselhos; e ii) condições sócio-econômicas de seus membros. Já que o survey almejava fazer um censo dos membros dos organismos selecionados, e conseguiu entrevistar mais de 85% dos membros, em média, consideramos que os dados refletem bem a composição social e organizacional dos comitês e consórcios. Entretanto, é importante advertir, com base nas discussões levantadas anteriormente, que a análise do survey deve ser limitada às características dos grupos que são incluídos nos colegiados; ela, portanto, não alcança questões sobre quem esses grupos representam. Uma discussão aprofundada sobre o último assunto foi feita por Abers e Keck (2007).

Além das considerações teóricas acima, existem também desafios práticos, pois a distribuição de vagas entre os diferentes segmentos é freqüentemente contestada. A divisão básica de assentos entre segmentos ou categorias, ou seja, entre poderes público federal, estadual e municipal, usuários de água e sociedade civil, é definida no texto das leis das águas ou regulamentações. Contudo, as definições variam de estado para estado e, muitas vezes, entre estes e a regulamentação federal. Um exemplo: uma associação de pequenos agricultores pode ser usuário em um comitê e sociedade civil em outro; usuários públicos são representantes do segmento Estado, em um colegiado estadual, ou do segmento usuário, em um comitê federal, etc. Tamanha variação torna difícil, senão impossível, a comparação direta entre segmentos ou categorias dos comitês de bacias no Brasil. Para resolver o problema, codificamos as entidades-membro dos comitês em um conjunto menor de categorias; a classificação assim procedida está apresentada na Tabela 2. De modo geral, foi possível evidenciar que a composição dos comitês, considerando a média do seu conjunto, desvia-se substancialmente das diretrizes da legislação federal, que estipula: i) exatamente 40% dos assentos para usuários de água, definidos legalmente como aqueles necessitando de outorgas de direitos de uso de recursos hídricos; ii) pelo menos 20% à sociedade civil, que inclui associações de pequenos produtores que, geralmente, não necessitam de outorga; e iii) no máximo 40% para todas as esferas do poder público, federal, estadual e municipal. Na Tabela 2, adiante, observamos que menos de 20% dos membros dos organismos estudados representam os usuários de água de grande e médio portes, enquanto quase 40% representam a sociedade civil e os pequenos usuários; o poder público, nas três esferas do poder, ocupa mais de 40% do total de assentos. Essa variação em relação à legislação federal deve-se, sobretudo, ao fato de a maioria dos comitês estudados ser regida por leis estaduais aprovadas antes da lei federal.

O percentual maior que o esperado de assentos para a sociedade civil e usuários de pequeno porte parece favorecer grupos que são geralmente excluídos do processo decisório de gestão das águas. Cabe ressaltar que a categoria sociedade civil é bastante variada, incluindo desde universidades e associações técnicas até associações de moradores. Um percentual pequeno de usuários de grande e médio porte, no âmbito dos comitês, parece desafiar a crítica freqüente de que o processo decisório é dominado por elites econômicas. Contudo, evidências empíricas de estudos qualitativos aprofundados mostram o predomínio das elites em negociações específicas no âmbito de comitês de bacias, mesmo na ausência de maioria na representação (LEMOS, 2008; FORMIGA-JOHNSSON et al., 2007; TADDEI, 2005). Além disso, dados demográficos da pesquisa indicam claramente que as características sócio-econômicas dos membros não espelham a sociedade brasileira (Tabela 3).

Os membros de comitês e consórcios são predominantemente homens (80% do total), têm alta escolaridade (quase a metade tem especialização, mestrado ou doutorado) e são economicamente privilegiados para os padrões brasileiros.

5 Criação de processos deliberativos

As teorias sobre democracia deliberativa sugerem que a criação de arenas para a livre troca de argumentos é positiva para a democracia. Desse modo, para que a deliberação ocorra no processo decisório, fazem-se necessários pelo menos dois aspectos: i) a ocorrência de argumentação e debates no âmbito das arenas participativas; e ii) a ausência de limites no decorrer do livre debate, que possam ser eventualmente produzidos por diferenças de poder ou outras forças coercitivas. Neste sentido, nossa pesquisa procurou verificar como os membros de comitês e consórcios compreendem o processo de engajamento com os demais membros. Existem argumentação e livre discussão? Nesse processo, os participantes chegam de fato a modificar a percepção dos seus interesses, dos problemas que enfrentam e das soluções disponíveis? As desigualdades ou os conflitos entre membros dificultam a deliberação? Qual é o grau dessa dificuldade?

Embora existam limitações óbvias em usar os resultados de um survey com membros de comitês e consórcios para explorar o processo de deliberação dentro de um determinado organismo colegiado, a pesquisa Marca d'Água permite examinar alguns aspectos acerca dos organismos como espaços deliberativos (ver Tabela 4, adiante, com a consolidação dessas informações).

Primeiro, examinamos a percepção dos membros sobre como as atividades do organismo são definidas: i) por todos os membros conjuntamente; ii) por um pequeno grupo aberto às preocupações de um grupo maior; ou iii) por um pequeno grupo fechado à opinião do resto. Do total, 38% dos membros entrevistados escolheram a primeira opção, 44%, a segunda, e somente 17% escolheram a terceira opção. Na maior parte dos organismos estudados, os membros se dividiam em relação à sua percepção de quem controlava a agenda.

Também perguntamos aos membros com que freqüência eles compareciam às reuniões, se manifestavam e apresentavam propostas nesses encontros (Tabela 4). Setenta e cinco por cento dos membros afirmaram participar da maioria das reuniões, 54% disseram se manifestar e falar na maioria desses encontros e 42% relataram apresentar propostas na maioria das reuniões de comitês ou consórcios. Somente 2% responderam nunca participar de nenhum encontro, 4% disseram nunca se manifestar sobre nenhum assunto em reuniões e 9% afirmaram nunca ter apresentado propostas nesses encontros.

Uma terceira questão analisada dizia respeito à percepção dos membros quanto à sua liberdade de expressão em reuniões dos organismos. As avaliações foram, novamente, positivas: 81% dos membros entrevistados declararam poder expressar livremente suas preocupações e propostas nos encontros do comitê. A variação das respostas entre os organismos estudados foi muito pequena, variando de 74 a 96%, com exceção de um comitê onde apenas 53% afirmaram sentir-se livres para expressar as suas opiniões.

Uma quarta questão indagava os membros sobre o seu envolvimento na elaboração e na negociação de propostas e, principalmente, se essa participação afetava ou influenciava as decisões tomadas. De forma semelhante aos dados anteriores, a ampla maioria dos membros entrevistados (84%) declarou participar de negociações em torno das decisões do organismo. A variação aqui observada foi também muito pequena, indo de 70 a 100% para o conjunto de organismos.

As teorias deliberativas concordam que a decisão eficaz depende da ausência da desigualdade. Para estimar o impacto das desigualdades sobre o processo deliberativo, perguntamos aos entrevistados sobre três tipos de desigualdades que podem distorcer o debate no âmbito dos colegiados5 5 Pergunta aplicada: "Em alguns comitês, existem algumas desigualdades entre membros, as quais podem dificultar a democratização do processo decisório (tomada de decisões). Na sua opinião, quais destes tipos de desigualdade têm dificultado a democracia no seu comitê?". : conhecimento técnico, poder econômico e poder político. As respostas indicam haver uma percepção geral sobre a existência de desigualdades nos organismos e que estas afetam de fato a decisão democrática. É interessante observar, entretanto, que as diferenças de conhecimento técnico foram percebidas como fator que dificulta o processo democrático por uma parcela maior de membros, 67%, do que desigualdades de poder político, 51%, e econômico, 31%.

Este resultado é duplamente interessante sob a perspectiva da teoria deliberativa. Em primeiro lugar, notamos que, apesar da avaliação geral positiva acerca da deliberação livre, há um reconhecimento amplo de que desigualdades existem e que de elas afetam a tomada de decisão. Em segundo lugar, nossos entrevistados acreditam que a distribuição desigual de conhecimento técnico traz mais danos à decisão democrática do que outros tipos de desigualdade, como as decorrentes de poder econômico e poder político. Na teoria deliberativa, isto se relaciona diretamente à condição de igualdade entre os participantes nas discussões coletivas; se houver desigualdade substancial no nível de conhecimento técnico, então, alguns terão mais recursos para argumentar do que outros, sugerindo uma persistente tecnocratizacão da tomada de decisões no âmbito dos órgãos colegiados. Para uma discussão mais aprofundada desta fonte de desigualdade, ver Lemos (2008), Lemos, Nelson e Formiga-Johnsson (2007).

6 Ampliação do controle da sociedade sobre as políticas públicas

A maior parte dos propositores de fóruns participativos os vê como espaços de acesso à tomada de decisões por parte de uma larga diversidade de grupos sociais. Visto que os membros deveriam representar grupos mais abrangentes de indivíduos, medir o controle destes sobre o Estado parece requerer duas etapas.

Em primeiro lugar, é preciso medir o nível de controle, ou pelo menos de influência, das bases sobre os membros de conselhos. Isso, evidentemente, levanta questionamentos sobre a composição dessas bases, cujas respostas estão além do escopo desta pesquisa, pois a sociedade em geral não foi objeto do survey Marca d'Água. Nós nos limitamos a examinar o nível de influência que as bases e os seus pares, as outras organizações do mesmo segmento, exercem sobre os membros de colegiados, e investigar se eles se relacionam com freqüência.

Em segundo lugar, deve-se medir o nível de influência que esses membros têm sobre o processo de definição e implementação de políticas públicas. Tal objeto também não é sem controvérsias: Quem é responsável pela implementação das decisões? Em áreas como gestão de recursos hídricos, a ação do Estado é somente uma face da moeda; para que a política das águas seja bem-sucedida, faz-se necessário a cooperação de usuários de água e dos atores sociais em geral. Por essa razão, analisaremos a seguir não somente a influência que comitês e consórcios exercem sobre o Estado mas, também, a sua influência sobre os usuários das águas e a população em geral.

Ressaltamos mais uma vez, que a nossa capacidade de análise sobre a influência desses organismos é limitada pelo tipo de dados disponíveis: não dispomos de dados comparativos globais acerca da implementação de decisões tomadas pelos comitês e consórcios de bacias hidrográficas. Nem é claro que tal comparação seja possível, dada a grande variedade de tipos de decisão que esses organismos tomam nos seus processos decisórios (ABERS; DINO, 2005; ABERS; KECK, 2006). A análise que segue irá, portanto, basear-se somente na percepção dos próprios membros de comitês e consórcios sobre a sua capacidade/habilidade de influenciar o Estado, os usuários de água e a população em geral.

6.1 A influência de organizações sobre membros de organismos de bacias hidrográficas

Identificamos dois tipos de laços considerados desejáveis pela literatura. Primeiro, "a prestação de contas de fora para dentro" (input accountability) relaciona-se ao nível de controle das decisões dos representantes pelas suas bases: Como os membros dos comitês e consórcios definem as suas preferências no processo decisório? Eles consultam previamente a sua entidade ou a sua categoria antes das reuniões dos comitês? Como eles conseguem subsidiar as suas decisões? O segundo aspecto que define a relação entre representantes e representados é a "prestação de contas de dentro para fora" (output accountability), pois ela relaciona a forma e a freqüência com que os membros reportam à sua entidade sobre as atividades do comitê. O survey reuniu dados que subsidiam indicadores quanto a esses dois tipos de responsabilização.

Para examinar a input accountability, foi perguntado aos membros como eles normalmente tomam decisões. Como indicado na Tabela 5, somente um terço dos membros disse que a sua categoria ou entidade tem algum tipo de influência no seu voto. Tal evidência sugere um controle fraco, "de baixo para cima", entre representados e representantes, embora existam variações substanciais entre os organismos estudados.

Além de controlar o voto de seus representantes, existem outras maneiras para os representados tomarem parte do processo decisório. Na Tabela 6, em uma escala que considera as opções "sempre", "às vezes", "raramente" e "nunca", os dados mostram que 69% dos membros entrevistados declararam que outras pessoas de seu órgão/entidade sugerem, "sempre" ou "às vezes", assuntos para discussão ou soluções de problemas ao comitê/consórcio. Ao mesmo tempo, 57% afirmaram levar, "sempre" ou "às vezes", outras pessoas de seu segmento ou de sua categoria para assistir às reuniões ou participar de atividades do comitê. É interessante notar que o fato de os membros de órgãos/entidades fazerem sugestões parece ter muito pouco impacto sobre o processo decisório: dentre os membros cujas entidades fazem sugestões "sempre" ou "às vezes", 38% ainda tomam decisões por conta própria, comparados aos 39% da amostra total. Assim, enquanto estudiosos freqüentemente atribuem a ausência de prestação de contas à existência de bases pouco organizadas, as informações do survey revelam que, mesmo quando essas bases se mobilizam para participar do processo decisório, isso não repercute em maior controle direto das bases sobre os seus representantes.

Finalmente, perguntamos aos membros de comitês e consórcios de que maneira eles informavam a sua entidade sobre as atividades dos organismos. Constatamos que 77% declararam reportar formalmente a seu órgão ou sua entidade acerca da sua participação em comitês e consórcios, 63%, fazer relatos em reuniões, 31%, elaborar relatórios, e alguns membros, fazer ambos. Somente 5% afirmaram não fazer nenhum tipo de relato. O restante, 23%, disse prestar contas ao seu segmento e à sua organização informalmente; somente 6% afirmaram não repassar nenhuma informação, e o restante, fazer relatos somente através de contatos informais. Esses dados sugerem que a maior parte de membros de comitês e consórcios mantém mais contatos com as suas bases do que o geralmente alegado por seus críticos.

6.2 Influência dos organismos de bacias hidrográficas sobre as decisões tomadas

Para estimar a influência dos comitês e consórcios sobre a tomada de decisões em torno da gestão das águas, perguntamos aos membros sobre a sua percepção acerca da relevância das questões tratadas pelos organismos; foi solicitado, em seguida, que definissem a influência do seu colegiado sobre o Estado, sobre o setor privado e sobre a sociedade em geral, e o nível de influência correspondente, em uma escala de 1 a 10 (Tabela 7).

Os dados revelam um quadro interessante. Enquanto a maioria dos membros pontuou positivamente a primeira questão, sobre o tratamento dos assuntos mais relevantes na bacia, a posição foi, em média, mais pessimista quanto ao sucesso em influenciar os atores sociais. É interessante observar que as notas atribuídas à capacidade de influenciar as empresas privadas e o comportamento da população foram ainda mais baixas do que aquelas relacionadas à influência sobre as decisões governamentais; isso sugere que os organismos são mais bem sucedidos em influenciar as políticas públicas, no sentido tradicional (estadista) da palavra, do que no sentido de liderança de um novo processo de construção de pacto entre atores públicos e privados na gestão de recursos hídricos.

Cabe notar que, em geral, os consórcios intermunicipais foram mais bem avaliados que os comitês, em termos de influência sobre decisões governamentais. Afinal, esses organismos resultam de uma associação espontânea de atores locais que, ao contrário dos comitês de bacias, não têm atribuições legais no sistema de gestão das águas, exceto a possibilidade de vir a exercer a função de agência de bacia. Essa constatação sugere que o poder legal não é indispensável para que um organismo seja capaz de influenciar as decisões dos governos quanto à proteção e à gestão de recursos hídricos.

Em uma correlação feita entre a disponibilidade da informação técnica e a percepção sobre o nível de influência dos organismos, observou-se que organismos mais bem pontuados quanto à sua capacidade de influenciar decisões de governo (federal, estadual e municipal) tendem a ser avaliados mais positivamente em relação à disponibilização de informação técnica. Esta correlação pode ter diversas interpretações: é possível que governos mais colaborativos com os organismos de bacias tendam a disponibilizar mais informações aos mesmos; outra interpretação razoável é que, em bacias onde a informação técnica seja de fácil acesso, os membros tenham maior capacidade de monitorar e fazer implementar as suas decisões por parte dos governos. Finalmente, é possível que a (não) implementação de decisões não dependa apenas da boa vontade ou da capacidade dos organismos de bacias em fazer implementá-las, mas também da capacidade técnica dos governos. Provavelmente, bacias dispondo de governos com maior capacidade técnica de implementar decisões disponham, igualmente, de maior capacidade na produção, no tratamento e na disponibilização de informações técnico-cientificas.

Os dados anteriores sugerem, então, que a influência dos conselhos é relacionada aos recursos de que eles dispõem: em particular, os conselhos com maior disponibilidade de informação teriam maior capacidade de influenciar as políticas públicas. Mas em que medida a influência é relacionada ao tipo de processo decisório? Ou seja, os conselhos caracterizados por maior liberdade deliberativa teriam maior capacidade de influenciar as políticas públicas? Nossos estudos sugerem que não há nenhum sinal de correlação entre o indicador de deliberação e o indicador de influência no governo, o que corrobora a idéia de que as diferentes componentes de democracia "não andam juntas": maior democracia interna (deliberação) não significa necessariamente maior capacidade de influenciar políticas públicas.

7 Conclusão

Grande parte dos debates sobre governança participativa concentra-se na seguinte indagação: os diferentes tipos de arenas participativas são realmente representativos e contribuem, portanto, para a democratização do processo decisório? Ou servem simplesmente para reforçar a dominância da elite sob um novo formato institucional? Em geral, é fácil mostrar que o perfil sócio-econômico de membros de organismos colegiados não reflete o perfil da população que os organismos representam. Entretanto, usar esta observação para concluir que esses organismos são irrelevantes para a democratização não nos parece adequado.

A questão que orienta este trabalho - se os comitês de bacia e consórcios intermunicipais constituem espaços democráticos - não busca respostas determinísticas (sim ou não), mas somente considerações acerca de três aspectos da democracia, que podem, inclusive, conflitar entre si: i) representação descritiva, ou o quanto os colegiados refletem a composição da sociedade; ii) deliberação, ou se organismos constituem fóruns de democracia deliberativa; e iii) influência no processo decisório.

Encontramos indicações de que os organismos de bacias hidrográficas são mais bem sucedidos como fóruns de democracia deliberativa do que como arenas de inclusão social da sociedade ou como espaços de influência das decisões do Estado. Existem desigualdades entre os membros que afetam o processo decisório, mas, aparentemente, elas não impedem o exercício de certa liberdade deliberativa. Portanto, podemos considerar comitês e consórcios como espaços que funcionam melhor enquanto forma de expressão e formação de acordos sobre questões públicas do que como espaços de promoção do controle do Estado e de atores privados pela sociedade em geral.

Embora, à primeira vista, tal resultado de contrastes possa suscitar certo pessimismo acerca da viabilidade da gestão participativa plena, no âmbito de comitês e consórcios, é importante frisar que tal conclusão seria precipitada. Afinal, nossos resultados mostram que os comitês não são tão pouco representativos, como o esperado por muitos estudiosos, e que eles funcionam bem enquanto espaços deliberativos; é verdade que as suas deliberações e atividades não são conhecidas amplamente, mas elas são públicas e devem tornar-se mais importantes à medida que os comitês tornem-se mais operacionais. Isso nos sugere que o maior problema desses organismos, atualmente, não é interno ao seu espaço institucional, mas alcança os sistemas mais amplos de gestão das águas, em níveis federal e estadual. Muitas são as atribuições compartilhadas dos comitês com os órgãos gestores de recursos hídricos, enquanto outras dependem da sua tradução operacional por parte de instituições federais, estaduais e municipais, e por parte dos setores usuários de recursos hídricos. É sabido que órgãos gestores e demais instituições públicas conhecem e, portanto, impõem limites importantes à atuação dos comitês. Talvez, o maior desafio da atualidade, para os organismos de bacias no Brasil, seja justamente ajudar a construir um sistema de gestão, mais efetivo e operacional, que os permita atuar mais plenamente no exercício de suas atribuições.

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Notas

Recebido: 22/11/2007

Aceito: 24/09/2008

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  • TATAGIBA, L. Os Conselhos gestores e a democratização das políticas públicas no Brasil. In: DAGNINO, E. (Org.). Sociedade civil e espaços públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
  • 1
    O Projeto Marca d'Água (
    www.marcadagua.org.br) foi criado em 2001 com o objetivo de analisar o desenvolvimento do novo sistema de gestão das águas, sobretudo os organismos de bacias hidrográficas. Ele tem como premissa a crença de que fatores sócio-políticos, além daqueles estritamente técnicos, têm um impacto decisivo no processo de transformação político-institucional e podem variar regional e temporalmente. Concebido como um projeto multidisciplinar, comparativo (entre bacias hidrográficas) e longitudinal (10 ou mais anos), o Marca d'Água é uma pesquisa-ação que envolve acadêmicos e profissionais envolvidos na gestão dos recursos hídricos. A coordenação do projeto é atualmente assegurada por um grupo de acadêmicos da Universidade de Brasília (UnB), Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Universidade Regional de Blumenau (FURB), Johns Hopkins University e University of Michigan. Mais de 35 pesquisadores e colaboradores, oriundos de áreas bastante diversificadas, já se envolveram com o projeto. O survey foi concebido e aplicado com o apoio do Centro de Pesquisas Quantitativas - CEPEQ da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
  • 2
    Esses estudos encontram-se resumidos em Formiga-Johnsson e Lopes (2003).
  • 3
    Informações sobre a amostra do estudo e as tabelas básicas do universo de comitês de bacia estão disponíveis em
  • 4
    Para uma discussão teórica sobre o problema de representação da sociedade civil em organizações e conselhos, ver: Abers e Keck (2007), e Gurza Lavalle, Houtzager e Castello (2006).
  • 5
    Pergunta aplicada: "Em alguns comitês, existem algumas desigualdades entre membros, as quais podem dificultar a democratização do processo decisório (tomada de decisões). Na sua opinião, quais destes tipos de desigualdade têm dificultado a democracia no seu comitê?".
  • Autor para correspondência:

    Rosa Maria Formiga-Johnsson
    Departamento de Engenharia Sanitária e do Meio Ambiente, Universidade do Estado do Rio de Janeiro
    CEP 22421-020, Rio de Janeiro - RJ, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Aceito
      24 Set 2008
    • Recebido
      22 Nov 2007
    ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
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