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Olhares sobre o "Mar de Minas": percepções dos moradores de Alfenas e Fama relativas ao lago de Furnas (1963-1999)

Perspectives on the "Minas Gerais Sea": perceptions of Alfenas and Fama residents on the Lake Furnas (1963-1999)

Resumos

Este trabalho analisa percepções das populações de Alfenas e fama referentes ao lago de furnas, de 1963 a 1999. utilizam-se memorialistas, jornais e testemunhos de moradores. Conclui-se que a trajetória destas percepções dependeu do aparecimento de diferentes formas de apropriação e relacionamento com o lago, indo de imagem negativa a outra positiva. A represa foi "naturalizada" e incorporada ao cotidiano regional.

Percepções ambientais; Hidrelétrica; Lago de Furnas; Sul de Minas


This paper analyses the perceptions of Alfenas and Fama populations concerning the lake Furnas. Memoirists, newspapers and residents' testimonies are used. It concludes that the trajectory of these perceptions is related to different forms of appropriation and relationship with the lake, going from a negative image to a positive one. The dam was "naturalized" and incorporated in the regional daily life.

Environmental perceptions; Hydroelectric mill; Furnas' lake; South of Minas


ARTIGOS

Olhares sobre o "Mar de Minas": percepções dos moradores de Alfenas e Fama relativas ao lago de Furnas (1963-1999)

Perspectives on the "Minas Gerais Sea": perceptions of Alfenas and Fama residents on the Lake Furnas (1963-1999)

Marcos Lobato Martins

Instituto de Ciências Humanas e Letras da Universidade Federal de Alfenas - UNIFAL-MG

Autor para correspondência Autor para correspondência: Marcos Lobato Martins Instituto de Ciências Humanas e Letras, Universidade Federal de Alfenas - UNIFAL-MG CEP 37130-000, Alfenas, MG, Brasil E-mail: lobatohistoria@hotmail.com

RESUMO

Este trabalho analisa percepções das populações de Alfenas e fama referentes ao lago de furnas, de 1963 a 1999. utilizam-se memorialistas, jornais e testemunhos de moradores. Conclui-se que a trajetória destas percepções dependeu do aparecimento de diferentes formas de apropriação e relacionamento com o lago, indo de imagem negativa a outra positiva. A represa foi "naturalizada" e incorporada ao cotidiano regional.

Palavras-chave: Percepções ambientais. Hidrelétrica. Lago de Furnas. Sul de Minas.

ABSTRACT

This paper analyses the perceptions of Alfenas and Fama populations concerning the lake Furnas. Memoirists, newspapers and residents' testimonies are used. It concludes that the trajectory of these perceptions is related to different forms of appropriation and relationship with the lake, going from a negative image to a positive one. The dam was "naturalized" and incorporated in the regional daily life.

Keywords: Environmental perceptions. Hydroelectric mill. Furnas' lake. South of Minas.

1 Introdução

Na história, os corpos d'água desempenharam múltiplos papéis: mataram a sede de aldeias e cidades, de homens, rebanhos e lavouras, serviram como fronteiras de províncias, impérios e estados nacionais, ofereceram orientação geográfica para viajantes e colonos, canais de transporte e comunicação para regiões interioranas, dotaram de força hidráulica fazendas, indústrias e núcleos urbanos. Isto requereu construir diversos tipos de "objetos técnicos". Conforme assinalou Milton Santos (1997, p. 186):

A história das chamadas relações entre sociedade e natureza é, em todos os lugares habitados, a da substituição de um meio natural, dado a uma determinada sociedade, por um meio cada vez mais artificializado, isto é, sucessivamente instrumentalizado por essa mesma sociedade. Em cada fração da superfície da Terra, [...] a parte do "natural" e do "artificial" também varia, assim como mudam as modalidades do seu arranjo.

No Brasil, os corpos d'água primeiro foram vistos e apropriados como meios de penetração colonial e vias de transporte de mercadorias e passageiros, especialmente nos séculos XVIII e XIX. A propósito, é bastante conhecida a obra de Sérgio Buarque de Holanda (1976) a respeito da rota fluvial que, no século XVIII, interligava São Paulo com as minas de Cuiabá. Em Minas Gerais, nos Oitocentos, diversos planos governamentais propuseram articular a navegação fluvial a vapor com ferrovias e estradas carroçáveis (GODOY; BARBOSA, 2007; MARTINS, 2010). Entre as décadas de 1870 e 1920, os rios passaram a representar vetores privilegiados para projetos ferroviários, mas também obstáculos que interrompiam as linhas de trem e as estradas carroçáveis, exigindo a construção de pontes. A partir dos anos 1930, o que chamou a atenção dos governos, técnicos e empresários foi o potencial de energia elétrica que os rios poderiam fornecer (ARRUDA, 2008). As barragens das usinas hidrelétricas transformaram drasticamente as paisagens dos rios, na medida em que promoveram grande "reorganização do natural", fruto de intervenções humanas de enorme monta (WORSTER, 2003). Elas modificaram a gestão do território em função de planos de eletrificação e geraram conflitos envolvendo governos, empresas, populações tradicionais e organizações ambientalistas.

A primeira grande usina hidrelétrica brasileira surgiu no início da década de 1960, aproveitando o potencial energético do Rio Grande. Trata-se da Usina de Furnas, situada no Sudoeste de Minas Gerais. Seu imenso reservatório tem 23 bilhões de metros cúbicos de água, superfície de 1.457 km2, perímetro de 3,7 mil km (equivalente a quase metade da extensão da costa brasileira) e profundidade média de 13 m. Esse lago artificial é o objeto deste trabalho. Pretende-se examinar as variações nas percepções relativas ao lago de Furnas dos moradores das cidades de Alfenas e Fama, dois dos municípios mais afetados pela barragem, desde o início do enchimento do reservatório, em 1963, até os anos 1990. A abordagem é eminentemente qualitativa.

Yi-Fu Tuan (1980, p. 4) define percepção como "[...] a resposta dos sentidos aos estímulos externos, atividade proposital na qual certos fenômenos são claramente registrados enquanto outros são bloqueados [...]". Uma pessoa, ao percorrer e vivenciar um determinado espaço atribui a este um valor, que pode evoluir para um sentimento no qual o espaço, diferenciado, torna-se um lugar. Percepções ambientais remetem a relações mais afetivas com o espaço, carregando marcas das trajetórias, valores, atitudes, visões de mundo e interesses dos indivíduos e grupos sociais (TUAN, 1980). P. Rodaway (1995) refere-se a percepções como sensação, influenciadas pelos órgãos dos sentidos, e a percepções como cognição, resultantes de concepções mentais. Dessa forma, ideias sobre o ambiente envolvem tanto respostas a impressões, estímulos e sentimentos, mediados pelos sentidos, como também processos mentais relacionados a experiências, associações conceituais e condicionamentos culturais. Por isso, as percepções ambientais atuam como guias para a ação, orientando práticas e relações sociais de sujeitos que lutam para dar sentido ao mundo e nele encontrar seu lugar. Como escreveu T. Ingold (2000), as ações humanas sobre o ambiente, os usos e as atividades produtivas que ocorrem em dado local, bem como sua trajetória intertemporal, são determinadas por distintas formas de perceber o mundo natural e as paisagens.

Simon Schama (1996), ao realçar as dimensões simbólicas das paisagens e sua produção social, considera que as visões do ambiente comportam lembranças, mitos e significados complexos, de modo que ambiente e percepção são inseparáveis. Nas palavras do autor, deve-se "[...] reconhecer que é nossa percepção transformadora que estabelece a diferença entre matéria bruta e paisagem [...]" (SCHAMA, 1996, p. 20). A paisagem, portanto, é obra da mente e está relacionada com "persistentes e inelutáveis obsessões" socioculturais, que conformam "tradições paisagísticas" capazes de moldar instituições e expressar as virtudes de comunidades políticas ou sociais. Assim, por exemplo, "[...] a identidade nacional [...] perderia muito de seu fascínio feroz sem a mística de uma tradição paisagística particular: sua topografia mapeada, elaborada e enriquecida como terra natal [...]" (SCHAMA, 1996, p. 26).

Nessa perspectiva, pretende-se analisar a trajetória das percepções relativas ao lago de Furnas, cuja historicidade revela algo a respeito das formas de relacionamento e de apropriação da represa por parte dos moradores das localidades lindeiras. As fontes empregadas neste trabalho são textos de memorialistas, notícias de jornais locais e testemunhos de moradores de Alfenas e Fama. Os memorialistas e as páginas dos jornais possibilitam abordar, sobretudo, as representações produzidas e difundidas pelas camadas letradas da população regional, cuja influência na formação da "opinião pública" e nas políticas municipais não se pode subestimar. As entrevistas permitiram recolher posicionamentos de outros tipos de sujeitos, pessoas desalojadas pela represa e gente simples que, na infância ou no início da vida adulta, se deparou com o lago de Furnas na condição de elemento definitivo do espaço regional. Algumas entrevistas foram realizadas no âmbito desta pesquisa, enquanto outras foram publicadas em número especial do Jornal dos Lagos, por ocasião dos 50 anos de Furnas. São depoimentos de pequenos proprietários e comerciantes, trabalhadores rurais e donas de casa, servidores públicos e indivíduos reconhecidos por suas comunidades como "guardiães da história" local.1 1 O emprego de depoimentos publicados em jornal se justifica porque o roteiro das entrevistas feitas pelo repórter, apreensível na leitura das matérias, tem similaridade com o roteiro usado nas entrevistas realizadas diretamente pelo pesquisador.

2 A população, os rios e as várzeas na bacia do Sapucaí

O Rio Sapucaí percorre terras de São Paulo e Minas Gerais. Suas nascentes estão situadas na Serra da Mantiqueira, próximas a Campos do Jordão. O rio, após fluir no território de Minas Gerais por mais de 400 km, deságua no Rio Grande. No povoado de Pontalete, em Três Pontas, o Rio Sapucaí recebe as águas do Rio Verde. A área drenada pela bacia do Sapucaí abrange 40 municípios do Sul de Minas, alcançando cerca de 8.800 km2. Os principais afluentes do Sapucaí, além do Rio Verde, são os Rios Cervo, Dourado, Lourenço Velho, Mandu, Sapucaí Mirim, Turvo, Vargem Grande, Machado, Peixe e Cabo Verde (MAGALHÃES JUNIOR; DINIZ, 1997). Os rios da bacia possuem leitos sinuosos e bom volume de água, e neles há muitas cachoeiras e corredeiras. A partir da Serra da Mantiqueira, na direção noroeste, as terras drenadas pela bacia do Sapucaí compõem planaltos sucessivos escalonados em "degraus". A topografia predominante é íngreme, o que não favorece a agricultura. A vegetação original era de mata atlântica e araucária (porção leste da bacia) e cerrado (porção oeste), mas foi substituída em grande parte por pastagens. Durante o ano, dominam temperaturas amenas, com valores médios entre 18 e 22 ºC. A precipitação média anual é inferior a 1500 mm, podendo ocorrer um ou dois meses sem chuva (INSTITUTO..., 1977).

Desde o século XIX, a zona do Sapucaí adquiriu destaque na produção de abastecimento interno, dedicando-se à criação de gado e de porcos, às lavouras de milho, feijão, arroz, fumo, algodão, e à produção de queijos, toucinho, doces, rapadura, açúcar, aguardente e panos. Os mercados do Rio de Janeiro e São Paulo absorveram a maior parte das exportações regionais (LENHARO, 1979; LIBBY, 1988). Estas atividades aproveitavam as áreas de várzeas, de modo que as "baixadas" ribeirinhas eram os terrenos mais valorizados. No final do século XIX, o café começou a ocupar terrenos de encostas em diversos pontos do Sul de Minas (FILLETO; ALENCAR, 2001).

Uma indicação da importância das várzeas na bacia do Sapucaí é fornecida pelo memorialista Murilo Lambert (1977, p. 8-9):

O sítio do meu avô era banhado pelo Rio das Antas [afluente do Sapucaí Mirim] na parte das vargens, onde todo ano se plantavam arrozais. O rio derramava suas águas na época das chuvas, alagando as vargens de todas as propriedades do município. [...] Quando a enchente acabava, os arrozais viçavam e amadureciam. Depois vinha a safra do arroz, carros de bois subindo e descendo os vargedos, transportando o arroz com casca para a cidade.

Na mesma direção vão os testemunhos de Normando Trindade de Moraes e de Antônio Camilo da Silva Sobrinho:

Eu vim para Alfenas em 1951 para fazer um serviço de estudo de retificação do Rio Cabo Verde. No período das cheias, o rio invadia aquelas várzeas todas e causava muito prejuízo para as lavouras de arroz. O povo vivia numa dependência grande do rio, porque plantava nas várzeas. As pessoas também pescavam muito. Nadava-se pouco, pois o rio era perigoso (Depoimento de Normando Trindade de Moraes, topógrafo, engenheiro, ex-funcionário de Furnas, 78 anos de idade. Depoimento colhido pelo autor em 05 de julho de 2010. 1 fita cassete. 90 minutos).

Meus pais eram pequenos proprietários em Tomé [Alfenas]. No Cabo Verde a gente pescava. Havia também exploração de areia. Os areeiros tiravam areia de dentro do rio com canoa e traziam para a cidade, onde era usada principalmente no calçamento das ruas. Naquela época [anos 1950], usava plantar nas várzeas e fazer pasto nas encostas. Não tinha plantação no seco. Arroz, milho, feijão, tudo era na beira do rio. Quando as pastagens secavam, o gado era trazido para as várzeas (Depoimento de Antônio Camilo da Silva Sobrinho, contabilista, jornalista, vereador em Alfenas na década de 1970, 65 anos de idade. Depoimento colhido pelo autor em 07 de maio de 2010. 1 fita cassete. 60 minutos).

Numerosos bairros rurais ficavam situados nas proximidades do Rio Sapucaí, movimentados pela produção agrícola e pelo trânsito de boiadas que rumavam para as estações da Rede Mineira de Viação e para o entroncamento ferroviário de Três Corações (ROSA; SAES, 2010). Este era o caso de Barranco Alto, distrito de Alfenas, de Rochas, povoado próximo de Fama, e de Itaci, distrito de Carmo do Rio Claro, onde havia grande e afamado laticínio. Até a década de 1950, ainda transitavam no Sapucaí vapores transportando mercadorias e passageiros, em percurso de 105 km entre os portos de Fama e Carrito, em Carmo do Rio Claro (HORVÁTH, 2008).

3 A construção de Furnas: apreensões e resistências

Nos anos 1950, em função do avanço da industrialização e da urbanização no país, a escassez de eletricidade tornou-se evidente. Indústrias e domicílios sofriam constantemente com interrupções do fornecimento e prolongados períodos de racionamento. Em Minas Gerais, o tema da energia elétrica adquiriu centralidade nos governos Milton Campos (1946-1950) e Juscelino Kubitschek (1951-1955). O planejamento do setor elétrico mineiro, definido em 1951, enfatizava três pontos: a) a intervenção do governo na indústria de energia; b) a preferência por grandes sistemas de usinas interligadas; c) projetos estrategicamente orientados para a demanda industrial (DULCI, 1999, p. 93-105). Essa política energética, executada pela CEMIG (Centrais Elétricas de Minas Gerais, criada em 1952), foi levada para o plano federal durante a presidência de JK (1956-1960).

Em São Paulo, a imobilidade das empresas Light e American Force and Power levou o governo estadual a investir, em 1953, em um Plano Estadual de Eletrificação. A intenção era aproveitar o potencial energético dos Rios Tietê e Paranapanema, para o que inicialmente se constituiu a hidrelétrica de Salto Grande por meio da empresa estadual USELPA (Usinas Elétricas do Paranapanema), no período 1951-1958 (CENTRAIS..., 1989).

Nesse contexto, elaborou-se o projeto de construção da Usina de Furnas. Em fevereiro de 1957, o Decreto 41.066 criou a Central Elétrica de Furnas, com sede em Passos (MG). A construção da Usina de Furnas estendeu-se de 1958 a 1962. A usina, com capacidade de 1,216 milhão de kW, começou a funcionar em 1963. O reservatório de Furnas desapropriou aproximadamente 5 mil propriedades e inundou cerca de 500 mil ha agricultáveis (Jornal dos Lagos, n. 2269, 5 de maio de 2007, p. 2-3). Carmo do Rio Claro foi o município que mais perdeu terras; Campo do Meio, Fama, Guapé e Boa Esperança perderam área urbana, bem como os distritos de São José da Barra (pertencente a Alpinópolis, emancipado em 1994), Santo Hilário (Pimenta) e Itaci.

Logo que surgiram as primeiras notícias sobre o projeto, as cidades da área ficaram sobressaltadas. Carmo do Rio Claro, Guapé e Fama vivenciaram a construção de Furnas como uma catástrofe. Depoimentos de antigos moradores dessas cidades indicam o sofrimento causado por Furnas:

As águas alagaram as várzeas em que o povo plantava alho, arroz, feijão e cobriram as árvores que davam lenha para os fogões. Alguns acharam muito ruim perder as terras, mas reclamar de que jeito? As boiadas que passavam diariamente pelos Rochas indo para Três Corações sumiram. Ir para Fama ficou muito difícil. As festas minguaram. A jardineira que ligava Alfenas a Paraguaçu, passando pelos Rochas, parou de circular. Acabou tudo. (Depoimento de Sebastião Teodoro Rocha, morador de Fama, 89 anos de idade, Jornal dos Lagos, n. 2269, 5 de maio de 2007, p. 5).

A cidade [Carmo do Rio Claro] só tinha lavoura de milho e arroz. Os fazendeiros entraram na Justiça contra Furnas e alguns chegaram a armar os empregados. Houve quem quisesse apossar dos fuzis do Tiro de Guerra. Vieram 50 soldados do Exército de Pouso Alegre para retirar os que não queriam sair de suas terras. Com a represa pronta, Carmo morreu, o povo passou fome, muitos foram embora para Boa Esperança, Areado e Alfenas (Depoimento de Pedro Ricardo de Carvalho, morador de Carmo do Rio Claro, 66 anos de idade, Jornal dos Lagos, n. 2269, 5 de maio de 2007,p. 4).

Na cidade de Guapé, liderados pelo vigário João Coining (que, de acordo com matéria publicada no Jornal dos Lagos (n. 2269, 5 de maio de 2007, p. 8) dizia nas pregações não ser pecado matar um "furneiro"), políticos locais e proprietários entraram na Justiça, achincalharam os "furneiros", ameaçaram-nos de morte, numa resistência que durou anos, mas que se configurou ineficaz. Para acalmar parcialmente os ânimos, Furnas construiu a nova Guapé (Jornal dos Lagos, n. 2269, 5 de maio de 2007, p. 8). Em Barranco Alto, houve movimento contra Furnas liderado pelo pároco de Conceição da Aparecida, cujas reivindicações eram: a) construção de nova igreja longe da orla da represa; b) instalação de balsa para evitar que o lugar ficasse isolado; c) aumento das indenizações pagas aos moradores que perderam terras e benfeitorias (cf. depoimento de Antônio Camilo da Silva Sobrinho ). Apenas a reivindicação da balsa foi atendida prontamente. A construção da nova igreja só ocorreu nos anos 1970 (cf. depoimento de Normando Trindade de Moraes).

Em 24 de fevereiro de 1957, o jornal O Alfenense noticiava a agitação na cidade por causa do decreto de criação de Furnas:

Aqui em Alfenas são realizadas reuniões e concentrações para discutir os problemas que advirão com a construção da represa. Há um clima de incertezas, de exaltação, quase de revolta. Até aos palcos a discussão chegará em breve. O grupo de teatro "Carvalho Júnior" começou a ensaiar a peça "Na boca das furnas", um fiel retrato da vida interiorana que, subitamente, se vê em face da técnica e do gigantismo industrial.

2 2 O Alfenense, 24 de fevereiro de 1957, p. 1. A peça citada é de autoria de Waldir de Luna Carneiro e foi encenada pela primeira vez em junho de 1957, no Centro Católico de Alfenas. Em agosto do mesmo ano, a peça foi apresentada no VI Festival Universitário de Arte, no auditório do Colégio Izabela Hendrix, em Belo Horizonte, alcançando grande sucesso (O Diário, 13 de setembro de 1957). A peça pode ser encontrada em CARNEIRO (2008, p. 53-85).

Os depoimentos seguintes mostram que as opiniões na cidade ficaram divididas entre "interesses urbanos" e "interesses rurais", os primeiros mais preocupados com os efeitos de modernização do comércio e dos serviços e os segundos com a continuidade da rotina nas unidades agropecuárias:

Quando chegaram a Alfenas as primeiras notícias sobre a construção de Furnas, ficou todo mundo apavorado, vendendo terra. A maioria do povo era contra, ninguém queria saber da represa. Os fazendeiros eram contra. Mas os comerciantes esperavam lucrar com o movimento de Furnas. Eu mesmo trabalhava na firma Engel & Irmãos, de material de construção, que ganhou muito dinheiro (Depoimento de Antônio Camilo da Silva Sobrinho).

Com Furnas, Alfenas mudou completamente. Ela tinha no máximo 20 mil habitantes e, então, começou a crescer. Aqui tiveram dois escritórios de Furnas, um para estudos e outro para obras. Havia pelo menos 10 engenheiros, fora os topógrafos, técnicos, encarregados. O movimento de Furnas revolucionou a vida da cidade (Depoimento de Normando Trindade de Moraes).

Os políticos não ficaram alheios às alterações provocadas por Furnas. Os do PSD, partido de JK, apoiaram Furnas desde a primeira hora. O discurso por eles empregado era, conforme Normando Trindade de Moraes, o do "progresso":

Para aplacar a raiva do povo, dizia-se que o Brasil estava parando por falta de energia elétrica. Basta dizer que em Alfenas, naquela época, a gente não podia usar chuveiro elétrico porque a luz caía. A gente também dizia que iam ser feitas estradas para compensar a estrada de ferro (Depoimento de Normando Trindade de Moraes).

A UDN opunha-se ao projeto. Na região, a principal voz contrária a Furnas foi o deputado federal Geraldo Freire, de Boa Esperança. Ele dizia que a usina era um absurdo, um esbulho. Os discursos de Geraldo Freire, alguns pronunciados no Clube XV, em Alfenas, reiteravam o mesmo argumento: "[...] onde já se viu inundar terras altamente férteis para gerar eletricidade que de nada valerá para o bem-estar dos moradores da região? [...]" A oposição udenista também dizia que a região ficaria isolada por causa da extinção do ramal Varginha-Juréia (VIEIRA, 2002, p. 38-47). Porém, quando houve a mudança de governo, com a chegada de Jânio Quadros à Presidência - que nomeou gente da UDN para a Central Elétrica de Furnas - as críticas dos políticos udenistas da região cessaram.3 3 Em sua campanha presidencial, Jânio Quadros esteve em Alfenas. Jânio prometeu a construção de estradas asfaltadas para suprir a extinção dos ramais da Rede Mineira de Viação. Essas estradas - atuais BR-369 e BR-491 - só foram precariamente concluídas na década de 1970. A cidade de Fama, vinte anos após o lago, tinha apenas um telefone, a energia vinha de um motor, as estradas não tinham asfalto (VIEIRA, 2002, p. 45).

Um dos fatores que mais contribui para indispor Furnas a grandes parcelas das populações da bacia do Sapucaí foi o problema das indenizações. Os afetados pelo enchimento do lago receberam apenas o valor venal das terras alagadas. E os que "entraram em demanda" tiveram depositado em juízo as indenizações calculadas pelas equipes do Departamento de Patrimônio de Furnas, corroídas pela inflação crescente. A respeito das indenizações, dois testemunhos são esclarecedores:

O pessoal de Furnas chegava e dava três alternativas: você podia aceitar um valor com direito a desmanchar seu imóvel e pegar o material, você podia deixar tudo para Furnas ou podia ir para a Justiça. Meu pai resolveu amigavelmente, mas o dinheiro que recebeu por tudo nem deu para construir outra casa (Depoimento de Ângelo Saksida, Jornal dos Lagos, n. 2269, 5 de maio de 2007, p. 5).

A indenização não era o valor real da terra. Mas o dono recebia um preço e podia usufruir da terra até a chegada da água. Aqueles que pegaram logo o dinheiro se deram bem, mas aqueles que caíram na conversa de advogado tiveram prejuízo (Depoimento de Marcos Coelho, proprietário rural e oficial do Cartório de Registro Civil e Notas de Córrego do Ouro, 58 anos de idade, colhido pelo autor em 19 de abril de 2010. 1 fita cassete. 60 minutos).

O caso de Furnas permite relativizar o ponto de vista de Warren Dean (1996, p. 281), para quem a "[...] ideia de desenvolvimento econômico penetrava a consciência da cidadania, justificando cada ato do governo e de extinção da natureza [...]". Os "caipiras" de Alfenas, Areado, Carmo do Rio Claro e Fama não se deixaram seduzir pelo canto de sereia do progresso. Neste aspecto, há contraste com a paulista Salto Grande. No Paranapanema, segundo Eduardo Giavara (2007, p. 249), "[...] muitos acreditavam, veementemente, que a cidade poderia, em poucos anos, se tornar um pólo industrial e gerar milhares de empregos [...]". No caso de Furnas, a formação do reservatório despertou inicialmente raiva e ressentimento na maioria dos moradores. Sua imagem era de mar artificial funesto, evocando tristeza e perplexidade, como mostra o testemunho de um deslocado pela represa:

Deus quando fez a terra colocou tudo no lugar certo, mar, montanha, rio, vargem... Isto o homem não podia alterar. Nós não acreditávamos na construção da represa, porque era um abismo cercar um rio como aquele. Se estancasse o rio, ele ia embrabar, cobrir os baixos, os vargedos, emporcalhar e criar mosquito. Quando vi aquele mar de água, foi só recordação e mau humorismo. No Itaci, ficou tudo muito desusado (Depoimento de Benedito Fialho, 79 anos de idade, natural de Itaci, onde foi pequeno agricultor. Depoimento colhido pelo autor em 30 de junho de 2010. 1 fita cassete. 90 minutos).

Observe-se que, conforme o antigo agricultor, o lago de Furnas teria trazido a "água pesada e grossa", água "parada", de má qualidade, que junta sujeira, taboa e lodo amarelo. A água de Furnas contrastaria, portanto, com a "água pequena" (que corre entre árvores e junta lodo verde), oriunda de nascentes e córregos, tradicionalmente tida como boa para beber (GALIZONI, 2010).

Para muitos que vivenciaram o processo de construção de Furnas, as atitudes da estatal até os anos 1980 reforçaram esta percepção negativa. Afinal, a postura de Furnas foi pautada, de um lado, pela indiferença diante das reivindicações dos municípios lindeiros e postergação do atendimento a demandas específicas; de outro lado, a estatal procurou conter investimentos na região não associados à geração e transmissão de energia. A política da empresa era, por assim dizer, de "negligência salutar": o que não atrapalhasse a operação da usina podia ser feito tanto na orla da represa, quanto com as águas do reservatório.

4 A incorporação do lago de Furnas à paisagem regional

Dissipado o choque inicial gerado pela hidrelétrica, lentamente surgiram mecanismos de convivência com o lago de Furnas e estratégias de apropriação da orla e das águas. Papel destacado coube às mulheres, aos jovens e às crianças, como bem ilustra o caso de Fama. O testemunho de Ilma Luiza Generosa Alexandre sintetiza o que ocorreu:

Mudei para Fama em 1968. Praticamente todo dia eu descia para a praça da Matriz e ia para a beira do lago lavar roupa. Lá na água eu encontrava muitas outras mulheres. A gente conversava, cantava, trabalhava horas e horas. A beira da represa em Fama virou ponto de encontro (Depoimento de Ilda Alexandre, 67 anos de idade, ex-funcionária da Prefeitura de Alfenas, colhido pelo autor em 8 de abril de 2010. 1 fita cassete. 60 minutos).

O depoimento revela a incorporação espontânea do lago de Furnas ao cotidiano dos moradores de Fama, Harmonia, Barranco Alto, Pontalete, Campo do Meio e Itaci, tanto como local de atividades domésticas quanto como espaço cotidiano de sociabilidade. Ainda conforme Ilma Alexandre, nessa época os moradores de Fama iniciaram o costume de receber parentes e amigos, nos períodos de férias escolares, para nadar na represa.

A partir dos anos 1970, mais e mais pessoas da região passaram a frequentar diversos pontos do lago em busca de lazer. Os jovens preferiram a cidade de Fama, os bairros rurais dos Rochas e Harmonia, a Ponte das Amoras e os aterros na direção de Areado. Proliferaram bares e restaurantes, sob a olímpica indiferença de Furnas. A prática da pescaria de lazer também aproximou muitas pessoas da represa. Dois testemunhos ilustram essa forma comum de utilização das águas de Furnas:

Nossa região é privilegiada pela natureza. Tem o lago de Furnas. Eu desde rapazinho vou pescar com os amigos em Harmonia e Barranco Alto. O lago é ideal para ir com a família, para ver muitos tipos de passarinhos e a beleza da paisagem. Isso alivia a gente (Depoimento de Davi Hipólito da Silva, trabalhador rural, morador de Areado, 53 anos de idade, cujo pai foi deslocado pela represa de Furnas. Depoimento colhido pelo autor em 16 de maio de 2010. 1 fita cassete. 60 minutos).

Na minha infância era comum a família toda sair para pescar, minha avó à frente. Quase todo domingo a gente passava no Porto, fazia arroz com peixe e salada, duas, três famílias juntas. O lago de Furnas me dá saudade da infância (Depoimento de Daniel de Castro Barbosa, morador de Alfenas, comerciante, 35 anos de idade, colhido pelo autor em 1ºde julho de 2010. 1 fita cassete. 60 minutos).

Estas lembranças indicam que, ao contrário de muitas pessoas mais velhas, os jovens começaram a se aproximar do lago de Furnas na medida em que ele se tornou espaço privilegiado de lazer - lugar de nadar, namorar, fazer piqueniques, pescar, brincar carnaval. As águas de Furnas e as paisagens da orla transformaram-se em reserva de beleza e vida saudável. Espaço valorizado pelos turistas como retiro temporário da grande cidade, necessário à restauração das pessoas desgastadas pelos excessos da vida moderna (THOMAS, 1989; URRY, 2002).

Outro elemento deste processo de apropriação do lago de Furnas é a religiosidade popular. As festas religiosas tradicionais foram reelaboradas tendo em vista as novas paisagens regionais. Uma dessas festas, cujas origens são de 1950, é a Festa de São Pedro, em Fama. Festa de pescadores do Rio Sapucaí que incluía uma procissão fluvial, realizada algumas vezes antes da formação do lago. A partir de então, o centro da Festa de São Pedro tornou-se a procissão fluvial noturna. Veja-se notícia publicada em Alfenas:

A cada ano a festa fica melhor e atrai mais gente a Fama. O fluxo de visitantes nos dias de festa só pode ser comparado ao do Carnaval. Há quem diga até que a Festa de São Pedro recebe mais turistas do que a festa profana. O momento mais esperado é a procissão fluvial, com participação de dezenas de embarcações enfeitadas e iluminadas com luzes coloridas. Há também a queima de fogos de artifício (Jornal dos Lagos, 28 de junho de 2008, p. 16).

Mais recente é a Festa de São João em Barranco Alto e envolve os moradores de Harmonia e Areado. Sobre a última edição dessa festa, o Portal Alfenas noticiou o seguinte:

Será realizada no dia 27 de junho uma barqueata em louvor ao padroeiro do bairro rural do Barranco Alto - São João. A saída está prevista para as 8 horas do porto da balsa da Harmonia com destino a Barranco Alto. Cerca de 20 barcos devem participar da travessia. A chegada no bairro está programada para as 12 horas, quando irá começar a missa (Portal Alfenas, 17 de junho de 2010. Disponível em

www.portalalfenas.com.br.

Acesso em 10 de julho de 2010).

Tudo isto significa que, gradativamente, os moradores da região reelaboraram suas referências simbólicas e redes de relações sociais em torno do "Mar de Minas", superando os sentimentos de perda e sofrimento tão característicos da década de 1960.4 4 Conforme Ilda Alexandre, no início dos anos 1970, "na Fama os mais velhos só xingavam a represa, falavam 'essa porcaria'". Os moradores mais jovens passaram a se orgulhar das belezas paisagísticas do lago de Furnas, da simplicidade, tranquilidade e hospitalidade dos núcleos urbanos lindeiros, aprenderam a valorizar a combinação de sol, água e verde. Para eles, a geografia lacustre de Furnas, soberba, delicada e variada, evoca imagens românticas, repletas de atrativos pictóricos e de sonhos - é um "cartão postal", que não difere das concepções modernas das arcádias (SCHAMA, 1996).5 5 Vale lembrar que, "[...] quando uma determinada ideia de paisagem, um mito, uma visão, se forma num lugar concreto, ela mistura categorias, torna-as metáforas mais reais que seus referentes, torna-se de fato parte do cenário [...]" (SCHAMA, 1996). A imagem da represa passou a ser de uma natureza aprazível e muitos acreditaram, então, no slogan publicitário: "a vida passa pelo lago de Furnas".6 6 Este foi o slogan da campanha de lançamento, em meados dos anos 1980, do Balneário Furnastur, localizado em Formiga, uns dos primeiros grandes empreendimentos turísticos na orla da represa. Assim, para os valores de amenidade associados ao "Mar de Minas" a unidade social foi-se transferindo.7 7 Por "valores de amenidade" pode-se entender conjunto de bens não-materiais que refletem a qualidade de vida, relacionados a características naturais e atributos gerados pela própria sociedade que afetam positiva ou negativamente a satisfação dos indivíduos (MAY et al., 2003). Este processo - sobreposto aos impactos fortes e duradouros da represa de Furnas sobre o meio regional, que tenderiam por si sós a metamorfoseá-la em "paisagem natural" - reorganizou o imaginário geográfico e as referências culturais dos grupos sociais que vivem na região. A tal ponto que as percepções se inverteram: hoje, sofrimento é ver o lago de Furnas com baixos níveis de água. É o que mostram as duas matérias jornalísticas seguintes:

Onde antes só se avistava água, agora há uma paisagem verde e, em alguns lugares, terra seca. Apenas os antigos cursos d'água persistem. Por um lado, diante da atual paisagem, é possível deslumbrar o passado, quando a região não tinha o lago. Por outro, todos sofrem com a imagem da água secando (Jornal dos Lagos, n. 1525, 9 de outubro de 1992, p. 12).

A imagem do lago cheio é ainda mais bela num dia claro, o azul da água contrasta com o verde das margens, é possível até mesmo ver Fama ao fundo, além de outros encantos da natureza. Olhar o lago de Furnas em qualquer época é bom. Sem ameaça de seca, então, é ainda melhor (Jornal dos Lagos, n. 1994, 21 de julho de 2004, p. 1).

Não se trata, porém, de uma simples harmonização das dinâmicas sociais, territoriais e ambientais. Ao contrário, novos conflitos continuam a surgir em torno da represa. Para Acserald (2004), conflitos socioambientais se estabelecem tanto pelo controle material de um recurso, quanto por sua forma de uso, e envolvem grupos sociais com modos diferenciados de apropriação e significação do território. A trajetória do turismo na região demonstra a complexidade da situação.8 8 A expansão do capital, seja por meio da mineração, das indústrias intensivas em recursos naturais ou do turismo, aprofunda a apropriação assimétrica da natureza, implicando em restrições de vida para os grupos que se encontram em posições mais vulneráveis (MASSEY, 2000). Até os anos 1980, poucas pousadas existiam na orla do lago de Furnas. Também não eram comuns lanchas, escunas, chalanas e jet-skis. Esta situação, no entanto, mudaria na década de 1990. A privatização da orla da represa ganhou ímpeto graças ao crescimento do número de casas de veraneio, condomínios à beira da água, marinas e pousadas. Hoje, segundo dados da ALAGO (Associação dos Municípios do Lago de Furnas), existem 260 empreendimentos turísticos, entre hotéis, pousadas, clubes náuticos e pesqueiros. Deste avanço do turismo dá indicação a matéria publicada em revista especializada:

Furnas se tornou uma espécie de Angra dos Reis de Minas Gerais (...). O cenário [de Capitólio] é de arrancar exclamações de todo mundo que chega lá (...). Nos dias mais movimentados, as lanchas chegam a fazer fila no cânion, à espera da vez de entrar debaixo da queda d'água. Lembra as concentrações de verão na Praia do Dentista, em Angra (Revista Náutica,n. 256, dezembro de 2009, p. 47).

O depoimento de Ilma Luiza Generosa Alexandre oferece denúncia contundente do processo recente de privatização da orla do lago:

Ainda gosto [de Fama], mas não como antes. Porque antes a gente andava em qualquer parte da beirada da lagoa, ia a todo lugar, nadava onde quisesse. Não tinha cerca nem casa encostada na água. Hoje a beirada tem dono, sobrou só um pedacinho na frente da igreja. E quem vai nadar ainda tem que tomar cuidado com as lanchas (Depoimento de Ilma Luiza Generosa Alexandre).

Como em distintas regiões do país onde foram construídas grandes represas, seja para geração de eletricidade ou para o abastecimento de áreas metropolitanas (LEONEL,1998; HOEFFEL et al., 2008), muitos conflitos socioambientais perpassam o espaço regional transformado pela construção da hidrelétrica de Furnas. Conflitos que configuram trade offs para os sujeitos sociais envolvidos e mobilizam disputas concernentes a três variáveis principais, a saber: a) o deplecionamento do reservatório em função das necessidades de geração de eletricidade; b) a qualidade e a disponibilidade da água; c) o retorno econômico para a região de lucros operacionais da Usina de Furnas. A Tabela 1 sintetiza os principais conflitos no decorrer do período 1963-2009:

É, pois, diante da incontornável presença de Furnas e no âmbito de uma dinâmica complexa de conflitos territoriais e ambientais que os moradores de Alfenas e Fama reconstroem as percepções do espaço regional e, simultaneamente, reelaboram a memória coletiva assentada nos lugares, contam e recontam suas experiências vividas.

5 O lago de Furnas nas páginas da imprensa alfenense

As alterações nas percepções do lago de Furnas ocorreram pari passu às mudanças na maneira dos jornais locais produzirem matérias sobre a represa. Em uma interação que engendra certa circularidade dos temas, informações e pontos de vista, os jornais de Alfenas alimentaram (e foram alimentados pelos) novos sentimentos surgidos nas camadas populares e nas elites letradas da região. As páginas do Jornal dos Lagos ilustram esse processo. A Tabela 2 dá ideia da variação intertemporal dos assuntos referentes a Furnas no jornal:

A análise da tabela anterior permite inferências importantes. A primeira delas é que a cobertura do jornal ficou mais densa e diversificada após 1992-1993. A partir desses anos, maior número de temas ganhou as páginas do jornal, anteriormente concentrado em noticiar afogamentos, prisões de pescadores e eventos de lazer no lago. Outra inferência diz respeito ao deslocamento da atenção editorial para as questões do aproveitamento econômico do reservatório de Furnas, bem como para os retornos financeiros da usina para as cidades da região. Permanece a preocupação com o desenvolvimento do turismo e a ela se juntam as matérias sobre royalties, piscicultura e coordenação política das reivindicações endereçadas a Furnas Centrais Elétricas. Finalmente, na década de 1990 desapareceram as matérias sobre impactos negativos da formação da represa. O jornal se volta para as possibilidades criadas pelo surgimento do "Mar de Minas".

Esta mutação é anunciada claramente por matéria publicada em fins de 1989, na qual se lê:

Na formação do lago, as cidades atingidas perderam terras produtivas, muita gente ficou doente, perdeu a vontade de viver e apenas ficou olhando a água tomar tudo. Mas agora, com incremento ao turismo, Furnas parece devolver o que tirou. Por causa da água estas cidades estão sendo procuradas por pessoas interessadas em curtir o sol à beira do lago (Jornal dos Lagos, n. 546, 16 de dezembro de 1989, p. 8B).

Já a matéria seguinte exemplifica a percepção positiva do "Mar de Minas" que caracteriza a linha editorial do jornal na década de 1990, e que se mantém inalterada:

Todos os que estão próximos do lago de Furnas estão preocupados com a possível privatização de Furnas Centrais Elétricas. O lago se transformou numa fonte de renda para muitos os que exploram o turismo com pesqueiros, pousadas, passeios, etc. Uma liminar na Justiça suspendeu temporariamente a privatização de Furnas (Jornal dos Lagos, n. 1493, 12 de junho de 1999, p. 10).

No mesmo diapasão está a notícia sobre a criação de peixes no lago de Furnas:

A central de alevinos de Alfenas está em fase final de construção. Localizada no Barranco Alto, ela possui 21 tanques escavados, laboratório de reprodução artificial de peixes e uma fábrica de ração. Esta é praticamente a primeira iniciativa bem sucedida no sentido de valorização e melhor aproveitamento da represa (Jornal dos Lagos, n. 1416, 22 de agosto de 1998, p. 9).

Examinadas em detalhe, as matérias dos anos 1990 sobre o lago de Furnas no jornal alfenense mesclam referências à beleza da região com considerações sobre o proveito prático dos recursos existentes. O tom geral é o de realçar as virtudes do uso econômico da natureza e das tradições regionais, com o objetivo de promover a integração da região nos circuitos de negócios nacionais e internacionais. Representações associadas ao que Logan e Molotch (1992) chamaram de "máquina de crescimento": a constituição de uma aliança de interesses públicos e privados, com sólida penetração nas mídias, que busca estimular a expansão urbana e atrair pessoas e empreendimentos para determinado local ou região. Tudo em nome da geração de impostos, empregos, renda e lucros, principalmente por meio dos setores turístico, imobiliário e comercial. Entra em cena, dessa forma, a imagem da represa como natureza mercantilizada. Para os homens de imprensa de Alfenas, a aceitação dessa perspectiva seria o coroamento da história das relações entre a população e o lago de Furnas, como sugere a matéria sobre piscicultura:

Até pouco tempo o que a população fazia era reclamar. Afinal muita terra foi inundada pela represa de Furnas. Depois veio a fase de somente aproveitar o lago sem qualquer cuidado para a sua preservação. [...] Agora a realidade é outra, o lago pode se transformar numa imensa fonte de lucro (Jornal dos Lagos, n. 1264, 15 de fevereiro de 1997, p. 13).

Convém frisar que não há descontinuidade absoluta entre as percepções do lago de Furnas como natureza aprazível e natureza mercantilizada. A segunda incorpora a primeira, embora ao custo de um deslocamento: a ênfase no "valor de troca" mais do que no "valor de uso". A natureza aprazível refere-se à paisagem (de beleza mitificada) como campo para o gozo da vida, impregnada de subjetividade e afeita ao cotidiano, vizinhança, co-presença e livre-fruição. A natureza aprazível é para ser apropriada. A beleza da paisagem e seu potencial restaurador não desaparecem da percepção natureza mercantilizada, mas são subordinados ao poder de consumo (que gera segregação do espaço) e à razão instrumental (que rebaixa a importância do vivido na relação com a paisagem). A natureza mercantilizada - com sua beleza, tranquilidade, "ar puro", "verde" - é para virar propriedade.

6 Considerações finais

Para a maioria dos antigos moradores da região, especialmente os ligados à agropecuária praticada nas vargens do Sapucaí e seus afluentes, as águas do lago de Furnas inundaram os espaços mais valorizados econômica e socialmente. Para eles, a construção da represa destruiu a "natureza" criada por Deus e o modo de vida tradicional, produziu perdas e sofrimentos, ruínas e deslocamentos forçados, ameaçando os laços sociais e identidades típicas de lugares que giravam em torno das roças e pastos. O lago pareceu-lhes uma obra funesta.

Nem todos, porém, pensaram assim. Houve segmentos da população, vinculados aos setores de comércio e serviços, que aceitaram o projeto hidrelétrico. Os moradores mais jovens, nos anos 1970 e 1980, fizeram do lago de Furnas espaço de lazer, de sociabilidade, de descanso em "contato com a natureza". Estas novas gerações naturalizaram o lago de Furnas, tornando-o parte destacada do seu imaginário geográfico. O espelho d'água de Furnas apresentou-se para elas como natureza aprazível, emblema de pertencimento ao Sul de Minas, "cartão postal" e "patrimônio natural" comum de diversas cidades. Os empresários do turismo souberam reforçar e explorar estas imagens, notadamente a partir da década de 1990.

Estas representações do lago de Furnas convivem, não sem tensões e incongruências, com outro conjunto mais recente de imagens. A partir dos anos 1990, empresários, técnicos governamentais e agentes políticos municipais começaram a enxergar as águas da represa sob a ótica da utilidade econômica. O "Mar de Minas" é, nessa perspectiva, oportunidade para negócios públicos e privados e fonte de recursos oriundos de políticas ambientais de cunho estadual e nacional. Uma natureza mercantilizada, um diferencial regional capaz de propiciar inserção vantajosa para o Sul de Minas na era da "economia verde" e dos "mecanismos de desenvolvimento limpo".

Todos os conjuntos de percepções apontados compartilham o fato de serem simplistas, no sentido de não compreenderem o meio ambiente e as paisagens de maneira abrangente, como interação complexa de configurações sociais, biofísicas, políticas, filosóficas e culturais (REIGOTA, 2002). Por conseguinte, além de ampliar a possibilidade de usos inadequados do reservatório de Furnas e de seu entorno, estas percepções, em função de sua relativa estreiteza, dificultam o diálogo entre os diversos atores envolvidos na construção do espaço regional. Assim, o encaminhamento dos conflitos ambientais, que requer a busca de consensos sobre as maneiras de lidar conjuntamente com as paisagens e de melhor gerenciar o território (ACSERALD, 2004), especialmente no que se refere ao uso da água e do solo,termina obstaculizado.

Evidentemente, a construção da Usina de Furnas deixou, em pessoas que vivenciaram o processo, lembranças inesquecíveis e dolorosas. Hoje anciãs, elas ainda vivem esta dor no presente. Mas, para os mais novos, o espelho d'água é apenas um lugar para curtir ou um campo de negócios. Suas percepções já não abrangem o fato preciso, político e econômico, que gerou o lago e muitos dramas humanos. Seria pertinente recuperar o fato para seguir reelaborando percepções referentes ao "Mar de Minas".

Referências bibliográficas

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Notas

Recebido em: 2/8/2010.

Aceito em: 4/1/2011.

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  • VIEIRA, I. M. Mandassaia Alfenas, MG: Gráfica Atenas, 2002.
  • WORSTER, D. Transformações da terra: para uma perspectiva agroecológica na história. Ambiente & sociedade, v. 5, n. 2, v. 6, n. 1, p. 23-44, 2003.
  • 1
    O emprego de depoimentos publicados em jornal se justifica porque o roteiro das entrevistas feitas pelo repórter, apreensível na leitura das matérias, tem similaridade com o roteiro usado nas entrevistas realizadas diretamente pelo pesquisador.
  • 2
    O Alfenense, 24 de fevereiro de 1957, p. 1. A peça citada é de autoria de Waldir de Luna Carneiro e foi encenada pela primeira vez em junho de 1957, no Centro Católico de Alfenas. Em agosto do mesmo ano, a peça foi apresentada no VI Festival Universitário de Arte, no auditório do Colégio Izabela Hendrix, em Belo Horizonte, alcançando grande sucesso (O Diário, 13 de setembro de 1957). A peça pode ser encontrada em CARNEIRO (2008, p. 53-85).
  • 3
    Em sua campanha presidencial, Jânio Quadros esteve em Alfenas. Jânio prometeu a construção de estradas asfaltadas para suprir a extinção dos ramais da Rede Mineira de Viação. Essas estradas - atuais BR-369 e BR-491 - só foram precariamente concluídas na década de 1970. A cidade de Fama, vinte anos após o lago, tinha apenas um telefone, a energia vinha de um motor, as estradas não tinham asfalto (VIEIRA, 2002, p. 45).
  • 4
    Conforme Ilda Alexandre, no início dos anos 1970, "na Fama os mais velhos só xingavam a represa, falavam 'essa porcaria'".
  • 5
    Vale lembrar que, "[...] quando uma determinada ideia de paisagem, um mito, uma visão, se forma num lugar concreto, ela mistura categorias, torna-as metáforas mais reais que seus referentes, torna-se de fato parte do cenário [...]" (SCHAMA, 1996).
  • 6
    Este foi o slogan da campanha de lançamento, em meados dos anos 1980, do Balneário Furnastur, localizado em Formiga, uns dos primeiros grandes empreendimentos turísticos na orla da represa.
  • 7
    Por "valores de amenidade" pode-se entender conjunto de bens não-materiais que refletem a qualidade de vida, relacionados a características naturais e atributos gerados pela própria sociedade que afetam positiva ou negativamente a satisfação dos indivíduos (MAY et al., 2003).
  • 8
    A expansão do capital, seja por meio da mineração, das indústrias intensivas em recursos naturais ou do turismo, aprofunda a apropriação assimétrica da natureza, implicando em restrições de vida para os grupos que se encontram em posições mais vulneráveis (MASSEY, 2000).
  • Autor para correspondência:
    Marcos Lobato Martins
    Instituto de Ciências Humanas e Letras, Universidade Federal de Alfenas - UNIFAL-MG
    CEP 37130-000, Alfenas, MG, Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Maio 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      02 Ago 2010
    • Aceito
      04 Jan 2011
    ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revistaambienteesociedade@gmail.com