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Comunicação de risco e os discursos da imprensa sergipana na transposição do rio São Francisco

Resumos

O presente artigo tem como objetivo analisar o discurso da imprensa sergipana sobre os possíveis riscos socioambientais causados pela transposição das águas do rio São Francisco/Brasil. A fim de garantir o escopo inicial, a argumentação teórica será estruturada em três momentos distintos: primeiro, conceituando o risco e suas dimensões socioambientais; segundo, apresentando a comunicação de risco como uma etapa fundamental na gestão de riscos socioambientais, conforme propõe a ISO 31000:2009; terceiro, discorrendo sobre os resultados obtidos nos discursos da imprensa sergipana sobre a transposição. Este trabalho utiliza-se da Análise do Discurso para a pesquisa documental nos jornais Correio de Sergipe, Jornal da Cidade e Cinform, no período de 2004 a 2007. Os discursos jornalísticos foram selecionados a partir de seus enunciados, no intuito de realizar o "estudo dos sentidos" e o "mapeamento das vozes". Em seguida, identificam-se as "formações discursivas", relacionadas aos riscos socioambientais da transposição, que confirmam a ideia de uma não neutralidade discursiva.

Comunicação de risco; Riscos socioambientais; Transposição; Imprensa sergipana; Discursos jornalísticos


Este artículo tiene como objetivo analizar el discurso de la prensa de Sergipe sobre los posibles riesgos socioambientales causados por la transposición del río São Francisco/Brasil. Para garantizar tal objetivo, la argumentación teórica será estructurada en tres momentos distintos: primero, conceptualizando el riesgo y sus dimensiones socioambientales; segundo, presentando la Comunicación de Riesgo como una etapa fundamental en la gestión de riesgos socioambientales, tal como propone la ISO 31000:2009, tercero, discutiendo sobre los resultados obtenidos en los discursos de la prensa sergipana sobre la transposición. En este trabajo se utiliza el Análisis del Discurso para documentar los trabajos de investigación en los periódicos Correio de Sergipe, Jornal da Cidade y Cinform, en el período 2004-2007. Los discursos periodísticos fueron seleccionados a partir de sus declaraciones, a fin de alcanzar el "estudio de los sentidos" y el "mapeamiento de las voces." A continuación, se identifican las "formaciones discursivas", relacionadas con los riesgos socioambientales de la transposición, que confirman la idea de una no-neutralidad discursiva.

Comunicación de riesgo; Riesgos socioambientales; Transposición; Prensa sergipana; Discursos periodísticos


This paper aims at analyzing the discourse from the press in Sergipe concerning possible socio-environmental risks caused by the transposition the waters of the River São Francisco/Brazil. To ensure the initial scope, the theoretical argumentation will be structured in three distinct moments: the first one introduces a concept of risk and its socio-environmental dimensions, the second presents risk communication as a fundamental step in the management of socio-environmental risks, according to ISO 31000:2009; the third concerns the results obtained from discourses in the press in Sergipe that deal with the transposition. This work employs discourse analysis in a documental research of the papers Correio de Sergipe, Jornal da Cidade and Cinform, in the period 2004-2007. The journalistic discourses were selected by means of their headlines, in an attempt to effect a "study of meanings" and a "mapping of voices". Afterwards, we identified"discoursive formations" related to socio-environmental risks of the transposition, thereby confirming the idea of a non-neutrality of discourse.

Risk communication; Socio-environmental risk; Transposition; Press in Sergipe; Journalistic discourses


Comunicação de risco e os discursos da imprensa sergipana na transposição do rio São Francisco1 1 . Este artigo integra os resultados obtidos na dissertação "Ética e comunicação de risco na transposição das águas do rio São Francisco", financiada pela CAPES, bem como do projeto de pesquisa "Ética socioambiental nas comunidades tradicionais do Baixo São Francisco em Sergipe", financiado pelo CNPq.

Michele Amorim BeckerI; Antônio Carlos dos SantosII

IJornalista. Doutoranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente pela Universidade Federal de Sergipe (PRODEMA/UFS) com estágio doutoral em Comunicação Social pela Université du Quebéc à Trois-Rivières (UQTR), Canadá

IIDoutor em Filosofia pela Université de Paris X-Nanterre em cotutela com a Universidade de São Paulo. Professor do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de Sergipe (DFL/PRODEMA/UFS). Líder do Grupo de Pesquisa Filosofia e Natureza (UFS/CNPq). Email: acsantos12@uol.com.br

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo analisar o discurso da imprensa sergipana sobre os possíveis riscos socioambientais causados pela transposição das águas do rio São Francisco/Brasil. A fim de garantir o escopo inicial, a argumentação teórica será estruturada em três momentos distintos: primeiro, conceituando o risco e suas dimensões socioambientais; segundo, apresentando a comunicação de risco como uma etapa fundamental na gestão de riscos socioambientais, conforme propõe a ISO 31000:2009; terceiro, discorrendo sobre os resultados obtidos nos discursos da imprensa sergipana sobre a transposição. Este trabalho utiliza-se da Análise do Discurso para a pesquisa documental nos jornais Correio de Sergipe, Jornal da Cidade e Cinform, no período de 2004 a 2007. Os discursos jornalísticos foram selecionados a partir de seus enunciados, no intuito de realizar o "estudo dos sentidos" e o "mapeamento das vozes". Em seguida, identificam-se as "formações discursivas", relacionadas aos riscos socioambientais da transposição, que confirmam a ideia de uma não neutralidade discursiva.

Palavras-chaves: Comunicação de risco. Riscos socioambientais. Transposição. Imprensa sergipana. Discursos jornalísticos.

RESUMEN

Este artículo tiene como objetivo analizar el discurso de la prensa de Sergipe sobre los posibles riesgos socioambientales causados por la transposición del río São Francisco/Brasil. Para garantizar tal objetivo, la argumentación teórica será estructurada en tres momentos distintos: primero, conceptualizando el riesgo y sus dimensiones socioambientales; segundo, presentando la Comunicación de Riesgo como una etapa fundamental en la gestión de riesgos socioambientales, tal como propone la ISO 31000:2009, tercero, discutiendo sobre los resultados obtenidos en los discursos de la prensa sergipana sobre la transposición. En este trabajo se utiliza el Análisis del Discurso para documentar los trabajos de investigación en los periódicos Correio de Sergipe, Jornal da Cidade y Cinform, en el período 2004-2007. Los discursos periodísticos fueron seleccionados a partir de sus declaraciones, a fin de alcanzar el "estudio de los sentidos" y el "mapeamiento de las voces." A continuación, se identifican las "formaciones discursivas", relacionadas con los riesgos socioambientales de la transposición, que confirman la idea de una no-neutralidad discursiva.

Palabras clave: Comunicación de riesgo. Riesgos socioambientales. Transposición. Prensa sergipana. Discursos periodísticos.

Introdução

Desde os tempos do Império discute-se a possibilidade de transpor as águas do rio São Francisco para o chamado Polígono da Seca como forma de solucionar o problema da escassez de água no semiárido Nordestino, região que sofre constantemente com o fenômeno de estiagem das chuvas. Este assunto, entretanto, voltou com força total às manchetes dos jornais brasileiros, na primeira década do século XXI, em virtude da execução do projeto de Integração do rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrionali i Este marco temporal é determinado pela publicação do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) em consonância com o período em que ocorreram às audiências públicas para apresentação e discussão do projeto de transposição. No final de 2007, após uma série de liminares, o governo federal inicia a execução da obra. . No caso da imprensa sergipana, não seria diferente. Além de o estado ser banhado pelas águas do "Velho Chico", historicamente verifica-se uma posição contrária à transposição e em defesa da revitalização do rio.

Tendo em vista a importância desse empreendimento hídrico e seus possíveis impactos para o meio ambiente, o presente artigo tem como objetivo analisar os discursos da imprensa sergipana sobre os riscos socioambientais que podem vir a ser causados pela transposição. Para tanto, a argumentação teórica será estruturada em três momentos distintos: primeiro, conceituando o risco e suas dimensões socioambientais, passível das mais diversas formas de percepção e interpretação; segundo, apresentando a Comunicação de Risco como uma etapa fundamental na Gestão de Risco, conforme propõe a ISO 31000:2009, pois além de alertar e orientar pessoas numa situação de acidente ou desastres, também promove a participação da sociedade nos processos de tomada de decisão; e terceiro, discorrendo sobre os discursos da imprensa de Sergipe sobre este empreendimento hídrico.

Este trabalho utiliza-se do método estruturalista, tendo ainda um caráter descritivo, com análise de documentos secundários. Seu estudo consiste de pesquisa bibliográfica sobre os fundamentos teóricos acerca do risco (BECK, 2010), da construção social do risco (HANNIGAN, 2009), e da comunicação de risco (OPAS, 2009), (ALMEIDA, 2011), assim como de uma pesquisa documental nos jornais Correio de Sergipe, Jornal da Cidade e Cinform, no período de 2004 a 2007i. Os discursos jornalísticos foram selecionados a partir de seus enunciados, sendo que numa primeira seleção identificou-se o universo de notícias e reportagens que tratavam da transposição e ainda o contexto histórico no qual esses discursos se apresentavam. Pois, somente desta forma poder-se-ia realizar o "estudo dos sentidos" e o "mapeamento das vozes" presentes nesses discursos.

A segunda seleção objetivou identificar as "formações discursivas", sobretudo no que tange os riscos e impactos socioambientais relacionados ao empreendimento hídrico. Isso porque, são as formações discursivas - aquilo que se repete incessantemente - que confirmam a ideia de uma não neutralidade no discurso. A Análise do Discurso (AD) foi o método utilizado nesta etapa do trabalho, pois entende-se que as notícias publicadas trazem na sua constituição textual traços histórico-sociais, que exigem do analista mais do que a compreensão do conteúdo explícito, mas do contexto histórico e de seus enquadramentos sociais e culturais (BENETTI, 2007).

Em suma, a AD visa à compreensão de como um objeto simbólico produz sentidos, como ele está investido de significâncias para e por seus sujeitos (ORLANDI, 1999). Essa compreensão, por sua vez, implica em explicitar como o texto organiza os gestos de interpretação que relacionam sujeito e sentido.

O risco e sua construção social

O risco é um conceito publicamente reconhecido como sendo relevante em processos de apreciação e decisão nos mais variados domínios de atuação. Contudo, não existe uma definição rigorosa, simples e unânime sobre este conceito. O vocábulo português "risco" está associado ao termo latino "risicum" ou "risiscus", definido como perigo, ventura ou crise, e ao termo italiano "risicare", donde teriam derivado os termos contemporâneos do risco, nas línguas latinas e inglesa (ALMEIDA, 2011).

Diversos fatores justificam a importância deste conceito na sociedade contemporânea, a qual já foi designada por Ulrich Beck como "Sociedade do Risco", devido sua perspectiva cultural e política e sua função significativa na estruturação do comportamento social face às incertezas e ameaças. Ao conceituar o termo "risco", o sociólogo alemão, deixa claro que os riscos não são uma invenção moderna. O que diferencia, contudo, os riscos de outrora dos riscos atuais é a sua dimensão. Isto é, os riscos assumidos por Colombo ao desbravar novas terras e continentes eram riscos pessoais e continham um tom de ousadia e de aventura. Enquanto que os riscos civilizatórios atuais escapam à percepção e provocam situações de ameaça global ou de possível autodestruição da vida na Terra, tornando-se riscos coletivos. Sobre isto, ele escreve:

Os riscos e ameaças atuais diferenciam-se, portanto, de seus equivalentes medievais, com frequência semelhantes por fora, fundamentalmente por conta da globalidade de seu alcance (ser humano, fauna, flora) e de suas causas modernas. São riscos da modernização. São um produto de série do maquinário industrial do progresso, sendo sistematicamente agravados com seu desenvolvimento ulterior. (BECK, 2010, p. 26).

Para Beck, o que se verifica nas sociedades contemporâneas é uma dependência cognitiva dos riscos da modernização. Neste sentido, os riscos, assim como as riquezas, tornam-se objeto de distribuição e, por conseguinte, constituem-se igualmente por posições, seja de ameaça ou de classe. No caso dos riscos sociais, tratam-se de bens de consumo, renda, oportunidades educacionais, propriedade, como bens escassos e cobiçados. Por outro lado, aquilo que prejudica a saúde e destrói a natureza, que também deveria ser tratado como risco social, é frequentemente indiscernível à sensibilidade e aos olhos de cada um, pois exige, segundo a configuração social contemporânea, o juízo comprovado de um especialista para sua asserção "objetiva". Os riscos, nessa perspectiva, não rompem com a lógica capitalista de desenvolvimento, ao contrário, tornam-se big business. Em outras palavras, para lucrar e aumentar o seu potencial político-econômico a sociedade industrial produz cada vez mais situações de ameaça que acabam por alimentar uma classe crescente de profissionais do risco.

Atinge-se, por assim dizer, uma superprodução de riscos, que em parte se relativizam, em parte se complementam, em parte invadem o terreno uns dos outros. Cada ponto de vista interessado procura armar-se com definições de risco, para poder dessa maneira rechaçar os riscos que ameaçam seu bolso. Ameaças ao solo, à flora, ao ar, a água e à fauna ocupam uma posição especial nessa luta de todos contra todos em torno das definições de risco mais lucrativas, na medida em que dão espaço ao bem comum e às vozes daqueles que não têm voz própria (BECK, 2010, p. 36-37).

Na perspectiva do engenheiro português António Almeida, em seu livro Gestão da Água, o risco pode ser considerado como um conceito simultaneamente abrangente e ambíguo com múltiplas dimensões e uma capacidade especial para: incentivar e justificar medidas de proteção ambiental e de segurança relativo às pessoas e bens; valorar ocorrências incertas; hierarquizar alternativas em processos de decisão; e justificar opções e ações de gestão ou governança. A evolução histórica e as diferentes perspectivas de aplicação e de análise evidenciam múltiplas dimensões do conceito de risco. Dentre elas, Almeida (2011, p. 34), destaca:

Técnica: dimensão que permite uma caracterização quantitativa e objetiva do risco. Esta dimensão está diretamente ligada às áreas da engenharia, dos cálculos técnicos e da gestão;

Subjetiva: dimensão associada à percepção individual do risco e ao comportamento psicológico de cada indivíduo na resposta a situações de perigo ou ameaça em ambientes de incerteza. Esta dimensão está relacionada às áreas da psicologia, da economia e da gestão.

Social: dimensão associada à percepção social do risco e ao comportamento coletivo das sociedades, nomeadamente no que se refere à participação pública e à interação com a comunicação social em assuntos envolvendo o risco. Esta dimensão insere-se na psicologia social e na sociologia social.

Jurídica: associada ao direito e à forma como o risco é considerado na aplicação de leis e na resolução de conflitos e definição de responsabilidades. Dimensão predominante do Direito e da Justiça.

Cultural: dimensão associada à evolução da Humanidade e da forma como esta tem encarado as ameaças, em nível coletivo e individual, e desenvolvido medidas de proteção julgadas adequadas. Envolve a identificação e o estudo de crenças, mitos, ritos e costumes culturais de sociedades organizadas em diferentes locais e épocas. Esta dimensão relaciona-se com a antropologia e a história, mas pode ainda incluir a dimensão religiosa associada aos riscos.

Filosófica: dimensão associada a três vertentes: 1) o conhecimento (epistemologia) e as metodologias associadas à caracterização científica dos fenômenos; 2) o significado e a realidade do risco; 3) a ética face aos dilemas morais e questões colocadas pelo risco. Dimensão predominante da filosofia, nomeadamente da ética e das filosofias da ciência e das probabilidades.

Econômica: dimensão associada aos comportamentos face aos mercados e às consequências econômicas, aos impactos na criação de serviços e produtos, na gestão comercial e empresarial e ao suporte econômico de medidas mitigadoras. Esta dimensão refere-se às áreas de economia e gestão empresarial.

Política: dimensão associada ao poder político e à governança, no planejamento de ações e na gestão de recursos e de medidas de proteção contra riscos públicos. Dimensão atrelada à ciência política e às relações internacionais.

O conjunto de dimensões apresentado evidencia a complexidade da gestão do risco, sobretudo em temas que estão relacionados à problemática ambiental contemporânea. Além disso, nunca é demais lembrar que cada pessoa enfrenta diferentes tipos de riscos aos quais atribui valor de acordo com a percepção que se tem de cada um deles. Em alguns casos, a familiarização com os riscos é tão intensa que chega-se a subestimá-los. Esquece-se, por vezes, que a percepção de cada pessoa ou grupo social e sua escala de valores estão diretamente ligadas ao contexto social no qual as percepções humanas são formadas. Isto é, a percepção individual ou coletiva é fortemente afetada por um leque de influências primárias (amigos, família, colegas) e influências secundárias (figuras públicas, mídia) que, funcionam como filtros na difusão de informação na comunidade e reafirmam o risco enquanto uma construção sociocultural determinada pelas forças estruturais na sociedade, a exemplo da organização das estruturas políticas e administrativas, além das crenças históricas tradicionais e culturais (HANNIGAN, 2009).

Na perspectiva de uma construção social do risco, Hannigan afirma que dentre as várias possibilidades de estudos desta temática, alguns sociólogos ocupam-se em descobrir como as percepções do risco diferem através de populações que encaram chances diferentes de vida e se a moldura das escolhas se origina primariamente das diferenças de poder entre os atores sociais. Outra corrente de sociólogos, entretanto, defende que os debates políticos sobre as questões de risco são invariavelmente conduzidos dentro de molduras de "arenas sociais", isto é, no interior da "organização política na qual os atores dirigem seus argumentos para formulação de políticas públicas esperando influenciar o processo de formulação" (HANNIGAN, 2009, p. 169). Neste artigo, em específico, optou-se por adotar como parâmetro teórico a segunda corrente sociológica, por entender que o modelo de "arenas sociais" se aproxima mais daquilo que se pretende denominar Comunicação de Risco, ou seja, um processo dialógico entre os atores envolvidos no processo e que busca o entendimento sobre quais os riscos serão assumidos ou refutados pela sociedade.

Desta forma, a arena social seria dividida por vários "palcos": o legislativo, o administrativo, o jurídico, o científico, a mídia e a sociedade civil. Dentro da arena social do risco, o processo de definição do que é aceitável ou não, sempre será originado de negociações entre várias ou múltiplas organizações, numa tentativa de estruturar as relações entre elas próprias. A avaliação institucional do risco, neste caso, é basicamente uma atividade de formulação de argumentos, na qual as organizações competem e negociam para estabelecer uma definição do risco aceitável.

Do ponto de vista teatral, as arenas sociais de risco são preenchidas por uma variedade de grupos de atores. Palmlund (1992), em seu artigo Social drama and risk evaluation propõe a existência de seis "papéis genéricos" na avaliação social do risco, sendo que cada um deles carrega sua dramaticidade:

Os portadores do risco são as vítimas que carregam o custo direto de viver e trabalhar em lugares perigosos. [...] Os defensores dos portadores do risco sobem ao palco público para lutar pelos direitos das vítimas. [...] Os geradores do risco – prestadores de serviços, companhias madeireiras, multinacionais da química e companhias farmacêuticas, etc. – são rotulados como antagonistas ou vilões, já que eles são tidos pelos defensores como a fonte primária do risco. Os pesquisadores do risco, notadamente cientistas e universidades, laboratórios governamentais e agências financiadas pelo público são retratados como "ajudantes" tentando juntar evidências sobre o porquê, como e sob que circunstâncias um objeto ou atividade é carregado de risco, quem está exposto ao risco e quando o risco pode ser considerado como "aceitável". [...] Os árbitros do risco (os mediadores, os tribunais, o congresso/parlamento, as agências reguladoras) que geralmente ficam fora do palco procurando determinar numa maneira neutra a extensão na qual o risco deve ser aceito ou como ele pode ser limitado ou evitado, e que compensação deve ser dada àqueles que sofreram o mal de uma situação julgada perigosa, [...] E, finalmente, os informantes do risco, primariamente a mídia de massa desempenha o papel de um "coro" ou de mensageiro, colocando as questões na agenda pública e examinando a ação. (PALMLUND apud HANNIGAN, 2009, p. 170 e 171).

Ainda que as correntes teóricas utilizadas pela sociologia ambiental sejam múltiplas para compreender e explicar os riscos socioambientais, a maioria dos estudiosos em risco, sobretudo aqueles das áreas mais técnicas, começa a admitir, a partir da segunda metade do século XX, a necessidade de conciliar tais análises técnicas ao conjunto de conhecimentos sobre a sociedade. Trata-se, portanto, de uma inovação na Gestão de Risco, cuja novidade encontra-se no "domínio interdisciplinar envolvendo, entre outras, a sociologia, a psicologia, as ciências cognitivas, a estatística e a economia" (ALMEIDA, 2010, p. 60).

Da gestão à comunicação de risco

Esse discurso dialógico, de aliar os estudos sociais aos estudos mais técnicos sobre o risco, tem repercutido positivamente nos últimos anos junto aos governos, gestores de projetos socioambientais e a sociedade civil. Sobretudo, após a assinatura do Marco de Ação de Hyogo, em 2005, quando os governos de 168 países membros das Nações Unidas se comprometeram em adotar medidas para reduzir o risco de desastres e as perdas ocasionadas por estes, a exemplo de vidas humanas, bens sociais, econômicos e ambientais. Sobre isso, destaca a Secretaria Nacional de Defesa Civilii que somente após o documento de Hyogo os países signatários passaram "a fomentar o conhecimento sobre as causas de desastres (efeitos de perigos naturais, ambientais e tecnológicos) e adequar a ações de prevenção, preparação e resposta às diretrizes internacionais para a redução dos impactos de desastres" (BRASIL, 2010).

Para reduzir os desastres, portanto, é preciso identificar e avaliar os riscos existentes e atuar em duas frentes: diminuindo a probabilidade e a intensidade da ameaça (prenúncio ou indícios de um evento desastroso) e reduzindo as vulnerabilidades (condições determinadas por fatores ou processos físicos, sociais, econômicos e ambientais que aumentam a suscetibilidade e exposição de uma comunidade ao impacto de ameaças) por meio de informação qualificada.

Durante a elaboração de um projeto socioambiental, a Gestão de Risco, enquanto um conjunto de atividades que estão associadas à operacionalização do conceito de risco (Figura 1), deve incluir algumas etapas no processo geral proposto na Norma Internacional ISO (ISO 31000:2009).


No que concerne especificamente à etapa de comunicação e consulta, entende-se que uma adequada Comunicação do Risco é fundamental à percepção individual ou social do mesmo, na mobilização e participação de terceiros e/ou do público para a implementação de medidas. Em função das características específicas do processo ou do tipo de risco, o estabelecimento de consultas e de um sistema de participação ativo das partes interessadas é também eticamente desejável.

A elaboração de um plano de comunicação é indispensável na tentativa de reduzir os ruídos comunicacionais, minimizar o processo de pânico ou medos desnecessários, bem como na avaliação de meios e mídias adequadas para cada caso e tipo de público.

Uma das primeiras instituições a estabelecer uma definição sobre a Comunicação de Risco foi o Conselho Nacional de Pesquisas dos Estados Unidos que, em 1989, definiu-a como:

Um processo interativo de intercâmbio de informação e de opiniões entre os indivíduos, grupos e instituições. É um diálogo onde se discutem múltiplas mensagens que expressam preocupações, opiniões ou reações às próprias mensagens ou acordos legais e institucionais do gerenciamento de risco (OPAS, 2009, p. 3).

A Comunicação de Risco surgia, naquela época, como uma área importante e crescente na América Latina e no Caribe, especialmente para contribuir com a difusão de informações, sobretudo na área da saúde pública. Os próprios profissionais de saúde deveriam conhecer as realidades das comunidades assistidas para facilitar o diálogo com relação aos assuntos técnicos do risco.

De lá para cá, diversos riscos ambientais, tais como a contaminação do ar, da água e do solo, têm acrescentado novas preocupações à sociedade em geral. Paralelamente a esses novos perigos, a humanidade encontra-se em um novo momento e sem precedentes, em termos de disponibilidade e acesso à informação. Pois, quando se descobre algo novo e que pode ser considerado nocivo, como epidemias ou desastres naturais, a sociedade tem a oportunidade de obter informações sobre o assunto muito rapidamente.

Além disso, é cada vez mais frequente que a maioria das fontes de informações sejam de propriedade de um pequeno número de corporações que, numa visão desenvolvimentista, buscam maximizar os lucros. Isso faz com que os meios de comunicação magnifiquem os riscos com o propósito de chamar a atenção de um maior número de pessoas.

Em todo o mundo, entretanto, começa a haver um reconhecimento de que os métodos tradicionais para envolver os cidadãos na tomada de decisão nem sempre são efetivos. O enfoque participativo da Comunicação de Risco pode conduzir a um maior consenso, mas não a uma harmonia absoluta. Por isso, quando os riscos são bem entendidos, previsíveis e mensuráveis, a comunicação pode ser mais clara e direta, ocasionando um menor número de conflitos.

De acordo com a Organização Pan Americana de Saúde (OPAS), não existe receita fácil e de sucesso garantido para a Comunicação de Risco. Entretanto, recomenda-se sete regras básicas (The EPA's Seven Cardinal Rules of Risk Communication) que, embora pareçam óbvias na teoria, nem sempre são seguidas na prática: 1) aceitar o público como agente colaborador; 2) escutar o público; 3) ser honesto e flexível ao escutar outras opiniões; 4) coordenar e colaborar com outras agências e grupos que têm credibilidade; 5) satisfazer as necessidades dos meios de comunicação; 6) falar com clareza e com empatia, sem paternalismos; 7) planejar com cuidado e avaliar as ações (COVELLO; SANDMAN, 2001).

Sobre essas sete regras, enfatiza-se também a importância de um bom planejamento para que um programa de gestão de risco tenha sucesso. Pois, "o sucesso ou o fracasso da comunicação de risco pode depender, em grande parte, da definição de metas claras" (OPAS, 2009, p. 05). Estas metas, por conseguinte, podem variar segundo a natureza do risco e pode incluir informações, educação, negociação, garantia e prevenção. As estratégias empregadas para alcançar essas metas devem privilegiar uma discussão interativa entre as partes interessadas, com vistas a mudanças de atitudes.

Assim, para desenvolver um plano de Comunicação de Risco, com o mínimo de ruídos no processo, é necessário considerar quatro elementos principais: 1) a fonte; 2) a mensagem; 3) os meios de comunicação, e 4) o público ou comunidade. Sobre a fonte, foi demonstrado que o êxito das mensagens sobre riscos associa-se fortemente à confiança e credibilidade que o receptor da mensagem atribui à fonte, ou seja, ao comunicador do risco. Em relação à mensagem, também há um consenso de que as informações devem ser transmitidas de maneira simples, objetiva e em termos acessíveis a qualquer cidadão, para que este possa entender o que significa o risco e como pode participar em sua proteção pessoal e coletiva. No que tange os meios de comunicação, sabe-se que estes têm um papel importante na comunicação de risco, pois é o mecanismo por meio do qual a mensagem chega até o público alvo. É importante decidir com objetividade o tipo de meio ou de meios de comunicação que participarão do plano de comunicação de risco. E, finalmente, o público receptor que precisa ser bem conhecido para que a mensagem seja decodificada com sucesso. Além disso, um público comprometido, mediante sensibilização obtida por uma comunicação adequada pode, muitas vezes, ajudar a reunir informações que contribuam na análise técnica do risco.

Não obstante, para que um planejamento cumpra todas as suas etapas é preciso que haja uma avaliação da Comunicação de Risco. Pois, se o processo comunicativo não for sistematicamente avaliado, como será possível concluir que ele foi eficiente e eficaz? De acordo com a OPAS é preciso, portanto, desenvolver uma estratégia de avaliação à medida que as atividades da Comunicação de Risco forem planejadas e executadas. Convém, portanto, elaborar uma avaliação que mescle tanto dados quantitativos quanto qualitativos para que a informação seja a mais completa possível e, desta forma, possa contribuir com as etapas subsequentes.

O discurso da imprensa sergipana

A estrutura geral do processo de Gestão de Risco implica uma série de etapas, como: avaliação, identificação, análise e tratamento do risco, além da comunicação e monitoramento do mesmo. Esse processo tem se mostrado cada vez mais necessário para que a tomada de decisão - sobre quais riscos podem ser assumidos pela sociedade e quais devem ser refutados - esteja respaldada por informações seguras.

O Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), respectivamente, além de serem dispositivos legais da Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) para a solicitação de licenciamento ambiental, a ser emitida pelo órgão público competente, também se configuram como imprescindíveis fontes de informação para o entendimento mútuo sobre os riscos e os impactos ambientais de determinados empreendimentos.

De modo geral, o EIA/RIMA cumpre o princípio da publicidade, pois permite a participação pública na aprovação de um processo de licenciamento ambiental que contenha este tipo de estudo, por meio de audiências públicas com a comunidade que será afetada pela instalação do projeto. A diferença primordial entre eles, contudo, diz respeito ao fato de que enquanto o primeiro (EIA) é estritamente técnico e possui uma linguagem inacessível para o grande público, o segundo (RIMA) apresenta-se de forma objetiva e adequada à compreensão de todos, além de ser instruído por mapas, quadros, gráficos e outras técnicas de comunicação visual a fim de garantir um entendimento mútuo das vantagens e desvantagens do projeto, bem como das consequências socioambientais relacionadas à sua execução.

Por este motivo, antes de analisar os discursos da imprensa sergipana (Jornal da Cidade, Cinform e Correio de Sergipe) sobre os possíveis riscos a serem causados pela transposição, realizou-se uma análise do RIMAiii para identificar quais os riscos identificados no Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrionaliv e como tais riscos são compreendidos pela imprensa e divulgados à sociedade sergipana.

Conforme os resultados obtidos na pesquisa documentalv v Esta pesquisa foi realizada no decorrer do segundo semestre de 2011 na hemeroteca do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe (IHGSE). , entre os anos de 2004 e 2007, foram possíveis de encontrar aproximadamente 400 notícias que tratavam da transposição, nos seus mais variados contextos. Deste total, 216 notícias foram divulgadas pelo Correio de Sergipe, 122 pertenciam ao Jornal da Cidade e 52 foram noticiadas pelo Cinform (Gráfico 1). A representação gráfica também demonstra uma concentração de notícias produzidas nos anos de 2005 e 2007, devido à onda de liminares e de manifestações populares contrárias à transposição. Já o ano de 2006 apresenta pouca produção de matérias sobre a temática analisada em virtude das eleições para o Governo no Estado.


Essa diferença considerável de notícias produzidas pelo Correio de Sergipe em relação aos outros dois jornais evidencia-se ainda mais quando se analisa a quantidade de "manchete principal" de Capa (Gráfico 2), cujo tema transposição teve destaque. De acordo com o levantamento, enquanto no Cinform são verificadas duas manchetes (4%), no Jornal da Cidade foram sete (14%) e no Correio de Sergipe quarenta manchetes principais de Capa (82%), durante o período de 2004 a 2007.


Esses dados também levam a crer que apesar da relevância do tema para o Estado de Sergipe, o interesse pelo assunto não é o mesmo em todos os jornais, ou seja, para além da importante discussão que ocorria em torno da transposição no período analisado também é possível verificar interesses privados por detrás dessa quantidade de informação repassada ao público. Uma das justificativas possíveis para esta interpretação está relacionada ao fato de o jornal Correio de Sergipe pertencer à família Alves. Não obstante, neste mesmo período, João Alves Filho exercia o cargo de governador de Sergipe e, na qualidade de engenheiro, se auto-intitulava "profundo conhecedor de recursos hídricos" e "defensor do rio São Francisco".

Do universo de aproximadamente 400 matérias encontradas nas páginas dos jornais sergipanos, cerca de um quarto delas faziam algum tipo de referência aos riscos e impactos socioambientais que a transposição das águas do rio São Francisco poderia causar tanto para o meio ambiente quanto para a sobrevivência das comunidades ribeirinhas. É possível verificar (Gráfico 3) que a maioria das matérias foi produzida pelo Correio de Sergipe, sendo 60 notícias ao todo. O Jornal da Cidade aparece na sequência com uma produção de 37 notícias e, por último, está o Cinform com 20 matérias publicadas. Percebe-se ainda que a maioria das matérias com esse teor concentra-se no ano de 2005, exatamente no período em que estavam ocorrendo às audiências públicas para o processo de licenciamento ambiental.


Encerrado o primeiro momento da pesquisa documental, é possível se deter ao objetivo central de análise, isto é, realizar o processo de identificação dos "sentidos dos discursos" e o "mapeamento das vozes", para então chegar às "formações discursivas". De acordo com Benetti (2007), a análise dos sentidos é um dos tipos de análise para a qual a AD se apresenta como um método adequado no jornalismo. É preciso, portanto, visualizar a estrutura do texto, compreendendo que esta estrutura vem "de fora", haja vista que o texto é uma decorrência de forças que lhe é exterior e anterior. Sobre isso, escreve Pêcheux:

O sentido de uma palavra, expressão, proposição não existe em si mesmo (isto é, em sua relação transparente com a literalidade do significante), mas é determinado pelas posições ideológicas colocadas em jogo no processo sócio-histórico em que palavras, expressões, proposições são produzidas e reproduzidas. (PÊCHEUX, 2009, p. 144).

Portanto, para analisar o sentido dos discursos é preciso compreender o processo histórico ao qual eles pertencem. Assim, entre o período de 2004 a 2007, foram identificados quatros momentos discursivos distintos:

1) Entre o segundo semestre de 2004 e início de 2005 há um forte movimento político contrário à transposição, a exemplo da matéria publicada na edição 1138, do jornal Cinform:

[...] não importa o partido, não importa a ideologia, não importa as bandeiras que defendam nas ruas ou nos partidos. Quando o assunto é o projeto do Governo Federal para a transposição do rio São Francisco – que virou verdadeira fixação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes – os parlamentares sergipanos, seja na esfera federal, estadual ou municipal, são absolutamente contrários ao projeto (CINFORM, 2005, p.11).

2) No decorrer do ano de 2005, evidencia-se um movimento de crítica ao RIMA, por meio de notícias que enfatizam um discurso mais técnico sobre os riscos da transposição. Uma das matérias publicadas na edição 1207, do jornal Correio de Sergipe, comenta que estudiosos do Ministério Público Federal (MPF), em Brasília, teriam argumentado que a inviabilidade da transposição estaria pautada em informações superficiais do RIMA. "O relatório não é esclarecedor ao público, portanto, não é válido [...] é um texto informativo, recheado de dados e números, mas que não diz o que realmente deveria conter" (CORREIO DE SERGIPE, 2005, p. A8).

Manifestações públicas em defesa do rio São Francisco, a exemplo da primeira greve de fome do Bispo Luiz Flávio Cappio, ajudam a completar o cenário de críticas ao projeto. Numa das várias matérias sobre a greve de Dom Cappio, o Correio de Sergipe, edição 1407, informa que o então governador João Alves Filho comandou uma caravana envolvendo cerca de 1.500 pessoas, com destino à Cabrobó/PE, em solidariedade à Dom Cappio. E que na ocasião, o governador anunciou "a instalação de um Quartel General Ecológico em defesa do rio São Francisco, em Sergipe" (CORREIO DE SERGIPE, 2005, p. A4). O QG Ecológico, como ficou conhecido, contaria com juristas e técnicos conhecedores da real situação do rio para fazer frente à obra de transposição.

3) Em 2006, uma onda de liminares judiciais barra o andamento das obras e a transposição passa a servir de mote para a campanha eleitoral ao governo do Estado de Sergipe. Em entrevista ao Cinform, edição 1211, João Alves Filho (PFL), então candidato à reeleição, afirma que um dos motivos de sua candidatura estaria relacionado à transposição. "Inicialmente, como governador, terei suporte para impedir o projeto da transposição do rio São Francisco, que é tecnicamente errado, ecologicamente desastroso e criminoso em termos socioeconômicos". Ainda de acordo com o candidato, "[...] o São Francisco está literalmente na UTI, não é improvável que o rio morra com a transposição" (CINFORM, 2006, p. 12).

Em outra matéria divulgada pelo Cinform, edição 1223, o presidente Lula, durante um comício em Aracaju, capital de Sergipe, teria deixado claro que não gostou de saber que João Alves Filho teria gravado um programa eleitoral mostrando a baixa vazão do rio e reforçando a ideia de que se a transposição ocorrer poderá faltar água em muitas cidades sergipanas. Para Lula, "ele não deveria ter ido colocar os pés no rio. Deveria ter ido nos esgotos que ele permite (enquanto governador) que sejam jogados no São Francisco" (CINFORM, 2006, p. 04-05).

4) Em 2007 retornam as manifestações contrárias à transposição, sobretudo após a autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (IBAMA) para licença de instalação da obra e o início das atividades do Exército, em Cabrobó/PE. Em matéria publicada na edição 1848, do Correio de Sergipe, o jornal afirma que mesmo com a licença "as manifestações contra o projeto de transposição continuam em toda a bacia". Isso porque, "os movimentos e organizações sociais não pretendem recuar frente à pressão do Governo Federal" (CORREIO DE SERGIPE, 2007, p. B1). Já o Jornal da Cidade, edição 10.426, ao cobrir um ato público proposto pela OAB/SE, enfatiza que "o protesto transformou-se num verdadeiro movimento democrático", reforçando este posicionamento com o título: "População diz não à transposição". (JORNAL DA CIDADE, 2007, p. B1). Contudo, uma questão permanece: a população sergipana foi realmente ouvida nesse processo?

Para responder essa questão, foi realizado um mapeamento de vozes – outro tipo de pesquisa pertinente no campo do jornalismo e que se enquadra muito bem aos preceitos da AD. O discurso jornalístico é, idealmente, polifônico. Isto é, porque meu discurso dialoga com outros discursos, outras vozes nele estão presentes, vozes com as quais concordo ou discordo total ou parcialmente, pois na medida em que "toda palavra é dialógica, todo discurso tem dentro dele outros discursos, e tudo que é dito é um 'já dito'" (BRANDÃO, 2001, p. 67).

Portanto, nenhum discurso é único, singular, mas está em constante interação com os discursos que já foram ou estão sendo produzidos. Nessa relação interdiscursiva (com outros discursos), quer citando, quer comentando, parodiando esses discursos, disputa-se a verdade pela palavra numa relação de aliança, de polêmica ou de oposição. "É nesse sentido que se diz que o discurso é uma arena de lutas em que locutores, vozes, falando de posições ideológicas, sociais, culturais diferentes procuram interagir e atuar uns sobre os outros" (BRANDÃO, 2011).

Partindo dessa premissa da AD é possível afirmar também que apesar da considerável quantidade de matérias produzidas pelos jornais sergipanos, especialmente sobre riscos e impactos socioambientais que podem vir a ser provocados pela transposição, poucas foram as nuances percebidas nos discursos jornalísticos. Em outras palavras, ao longo dos quatro anos analisados, os discursos sobre riscos e impactos ambientais são aprimorados, contudo, o sentido de seus enunciados permanece o mesmo. Isso fica evidente ao realizar o mapeamento das vozes, haja vista que os falantes são relativamente restritos.

Assim, falam sobre riscos da transposição alguns políticos que levantam a bandeira de defesa do rio São Francisco, sobretudo, o então governador João Alves Filho (PFL) e sua esposa, a senadora Maria do Carmo Alves (PFL), o deputado federal José Carlos Machado (PMDB), o deputado federal Iran Barbosa (PT), o deputado estadual Augusto Bezerra (PMDB), e a deputada estadual Ana Lúcia (PT); representantes de instituições públicas, como o procurador do Ministério Público Estadual (MPE), Eduardo Matos; representantes de entidades públicas, como o secretário-executivo do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco, Luis Carlos Silveira Fontes; representantes de entidades de classe, a exemplo do presidente da OAB/SE, Henri Clay; membros da Igreja, como o Bispo Luís Flávio Cappio; além de técnicos e pesquisadores.

Do lado oposto, ou seja, aqueles que defendem o projeto do Governo Federal de transposição das águas do rio São Francisco aparecem como principais fontes: o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva; os ministros da Integração Nacional Ciro Gomes e Pedro Brito, respetivamente; e a então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. É importante salientar que raras são às vezes em que os jornais dão oportunidade de a população opinar sobre o tema. Essa abertura à polifonia é verificada, sobretudo, em matérias que cobrem manifestações ou audiências públicas.

Depois de realizado o levantamento das notícias, estudado seus sentidos e mapeadas as vozes, finalmente, chega-se às formações discursivas (FD) sobre os riscos socioambientais da transposição. Elaborada por Pêcheux, o conceito de FD regula, desta forma, a referência à interpelação-assujeitamento do indivíduo em sujeito do discurso. "É ela que permite dar conta do fato de que os sujeitos falantes, situados numa determinada conjuntura histórica, possam concordar ou não sobre o sentido a dar às palavras" (BRANDÃO, 1991, p. 39). Além disso, a FD reitera a ideia de uma não neutralidade discursiva. Pois, quando o discurso é proferido, ele já nasce filiado a uma rede tecida por outros discursos com semelhantes escolhas e exclusões. A formação discursiva é, portanto, tudo aquilo que se repete e que ao se repetir se transforma e se resignifica num determinado tempo histórico e ideológico.

Com base nesses preceitos, identificaram-se sete formações discursivas ao longo das matérias analisadas, sendo elas:

1ª FD: "o RIMA trás informações tendenciosas", por isso não serve como fonte segura de análise (CORREIO DE SERGIPE, 2004, p. B6). Esse discurso vai se concretizando a medida que técnicos e pesquisadores em recursos hídricos vão desenvolvendo suas análises com base no RIMA;

2ª FD: "a transposição não é para o consumo humano, mas para a produção de camarão e irrigação" e isso seria um dos grandes erros do projeto. Numa tentativa de contenção ao projeto, o Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF), em reunião extraordinária, decide que "só podem ser autorizadas retiradas de água para a transposição exclusivamente para o consumo humano, desde que não haja nenhuma alternativa para a captação de água" (JORNAL DA CIDADE, 2004, p. A3);

3ª FD: "a vazão do rio estaria toda comprometida", e com a transposição a outorga da água para projetos futuros estaria inviabilizada (CORREIO DE SERGIPE, 2004, p. A6). Seria necessário, primeiro aumentar a vazão do rio com medidas de revitalização para somente depois voltar a pensar em transposição;

4ª FD: "o rio está doente, na UTI", então como "retirar água de um rio doente para incentivar o agronegócio" (CINFORM, 2005, p. 07). A doença do rio da qual se referem seus defensores estaria relacionada à degradação, ao assoreamento, à erosão, ao desmatamento das matas ciliares, à queda no volume de água e a redução do estoque pesqueiro;

5ª FD: "a morte do Velho Chico" é apregoada em decorrência do "aumento da cunha salina, ou seja, o aumento da massa salgada que, se não for devidamente controlada, pode tornar a água salobra e provocar forte impacto ambiental negativo, especialmente sobre o solo, a fauna e a flora da Bacia" (CORREIO DE SERGIPE, 2005, p. A3);

6ª FD: a transposição é "tecnicamente errada, ecologicamente destrutiva e politicamente desastrosa", frase muito utilizada pelo então governador de Sergipe João Alves Filho, pois além de provocar uma divisão entre os estados nordestinos, a má condução do projeto poderá provocar uma catástrofe ambiental na região da foz, que divide os estados de Sergipe e Alagoas (CORREIO DE SERGIPE, 2005, p. A3);

7ª FD: o discurso apocalíptico de que a transposição causará uma "crise no abastecimento de água", pois "60% da população de Aracaju teria que ser evacuada por falta de água para beber, além de populações inteiras do sertão que teriam de abandonar suas cidades porque as adutoras de Sergipe são abastecidas com águas do rio São Francisco" (CORREIO DE SERGIPE, 2006, p. A4).

Considerações finais

Se no início deste artigo anunciava-se o intuito de analisar os discursos da imprensa sergipana sobre os possíveis riscos a serem causados pela transposição, ao final dele pode-se afirmar que, no período estudado, houve uma tentativa da imprensa sergipana de informar tais riscos à sociedade. Porém, isso não significa dizer que os discursos jornalísticos eram transparentes e objetivos. Ao contrário, falava-se do quanto à transposição seria prejudicial à saúde do rio e, consequentemente, às comunidades ribeirinhas, mas não se pontuava quais riscos eram esses de forma pontual. Daí, justamente, a necessidade de compreender todo o contexto histórico e polifônico do enunciado para, somente então, apreender a significância dos discursos jornalísticos.

Em virtude da existência desse movimento contrário à transposição, em Sergipe, raras foram as notícias que apresentaram os aspectos positivos do projeto conduzido pelo Governo Federal. Dos três jornais analisados, apenas o Jornal da Cidade demonstrou, ao longo do período analisado, ter uma preocupação básica do jornalismo, isto é, enquanto atividade mediadora entre os fatos e os indivíduos, o jornalismo precisa abrir espaço para mais de uma fonte, possibilitando assim um embate de opiniões, de vozes favoráveis e contrárias sobre um mesmo tema. Assim, o Jornal da Cidade foi o único jornal sergipano que publicou uma matéria sobre "impactos positivos" da transposição, sobretudo em termos econômicos. Em contrapartida, o Correio de Sergipe sempre deixou clara sua posição político-ideológica de embate ao empreendimento hídrico, enquanto o Cinform demonstrava uma tímida simpatia pelo movimento de oposição à transposição das águas do rio São Francisco.

O mapeamento das vozes, conforme demonstrado, é outro tipo de pesquisa pertinente no campo do jornalismo, além de ser muito utilizado na AD. Com base nesse procedimento de análise constatou-se que apesar da considerável quantidade de notícias publicadas pelos jornais sergipanos, especialmente sobre riscos e impactos ambientais, poucas foram as nuances percebidas nos discursos jornalísticos. Os falantes são relativamente restritos. De um lado estão os chamados "defensores do São Francisco" e do outro "os representantes do governo". A população, por sua vez, exerce o direito de expressar sua opinião apenas nas ocasiões de manifestações populares. Além disso, ao longo dos quatro anos analisados as formações discursivas vão sendo aprimoradas, contudo, o sentido de seus enunciados permanece o mesmo e são exaustivamente repetidos pelas fontes, sobretudo de autoridade denominadas por Hall (1997; 2003) com fontes institucionais, políticas e especializadas.

Observa-se, finalmente, que apesar dos riscos da transposição terem sido informados, isso não significa afirmar que a Comunicação de Risco se fez presente adequadamente durante o processo de tomada de decisão. Pois, enquanto etapa estratégica na Gestão do Risco, esse ato comunicativo prevê dois imperativos éticos - transparência nas informações e participação ampla dos atores envolvidos nos processos decisórios – que não foram praticados plenamente nem pelo gestor do projeto, nem tampouco pela imprensa sergipana.

Notas

ii Órgão ligado ao Ministério da Integração Nacional.

iii Os resultados da análise realizada neste documento de fonte primária (RIMA) estão disponíveis nos Anais do XIVth IWRA World Water Congress – Adaptive Water Management: Looking to the future – realizado entre os dias 25 e 29 de setembro de 2011, em Porto de Galinhas, Pernambuco, Brasil.

iv Conforme o RIMA, em seu capítulo Conheça os impactos que o projeto poderá causar, dos 44 impactos socioambientais identificados, 23 foram considerados como de maior relevância, sendo 11 impactos positivos e 12 impactos negativos.

Submetido em 16/01/2014

Aceito em 10/10/2014

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  • i
    Este marco temporal é determinado pela publicação do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) em consonância com o período em que ocorreram às audiências públicas para apresentação e discussão do projeto de transposição. No final de 2007, após uma série de liminares, o governo federal inicia a execução da obra.
  • v
    Esta pesquisa foi realizada no decorrer do segundo semestre de 2011 na hemeroteca do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe (IHGSE).
  • 1
    . Este artigo integra os resultados obtidos na dissertação "Ética e comunicação de risco na transposição das águas do rio São Francisco", financiada pela CAPES, bem como do projeto de pesquisa "Ética socioambiental nas comunidades tradicionais do Baixo São Francisco em Sergipe", financiado pelo CNPq.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Fev 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 2014

    Histórico

    • Recebido
      16 Jan 2014
    • Aceito
      10 Out 2014
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