Acessibilidade / Reportar erro

Contribuições para a construção de estratégias de suporte ao controle social em ações de saneamento 1 1 Agradecimentos: A Universidade Federal do Tocantins (UFT) e ao Deutscher Akademischer Austausch Dienst (DAAD), pelas bolsas concedidas, de produtividade e de mestrado, respectivamente.

Resumos

Este trabalho objetivou contribuir para a construção de estratégias de suporte ao controle social em ações de saneamento, por meio da realização de pesquisas que reuniram experiências de estratégias de controle social em políticas públicas consolidadas e em saneamento e analisou-as à luz do pensamento de Raymundo Faoro, e outros teóricos das ciências sociais que trabalharam o controle social e os temas correlatos. Como resultados diagnosticou-se a ascendência do poder executivo nas instâncias participativas, a falta de estrutura e subsídio para a participação da comunidade, tendência à tecnificação do discurso nas políticas públicas, ausência de educação para a cidadania e fragmentação das políticas públicas. Concluindo-se que se faz necessário: flexibilizar as estratégias para adaptá-las aos contextos locais; promover a participação dos cidadãos; construir redes interdisciplinares na implementação de ações de saneamento; utilizar metodologias que acessem a demanda e o conhecimento popular, e a inclusão de avaliação qualitativa do processo.

Controle social; Saneamento; Participação popular; Participação social


This study aims to contribute to the development of strategies to support the social control of sanitation actions. The current research is based on experiences of social control strategies related to sanitation and policies in other more consolidated sectors, analyzed here in light of the theories of Raymundo Faoro and other social scientists who study social control and related topics. Findings revealed a growing involvement of the executive in participatory bodies, a lack of infrastructure and subsidies for community participation, a tendency toward the technification of the discourse on public policy, an absence of citizenship education, as well as the fragmentation of public policies. The study concludes that it is essential to prioritize flexible strategies which can be adapted to local contexts; to promote citizen participation; to develop interdisciplinary networks for the implementation of sanitation; and to use methodologies which take into account popular demands and knowledge. Furthermore, it is important to implement a process for the qualitative evaluation of these strategies.

Social Control; Sanitation; Popular Participation; Social Participation


Este estudio ha objetivado contribuir a las estrategias de construcción al control social en las acciones de saneamiento, mediante investigación que reunió las experiencias de estrategias de control social en las declaraciones de política pública y de saneamiento y analizados a la luz de Raymundo Faoro, y otros teóricos de las ciencias sociales. Como resultados se diagnosticó predominio del poder ejecutivo en los órganos de participación, la falta de infraestructura y de subvenciones para la participación comunitaria, la tecnificación del discurso como tendencia en las políticas públicas, ausencia de educación para la ciudadanía y la fragmentación de las políticas públicas. Concluyendose ser necesario: estrategias flexibles para adaptarse a los contextos locales, promocionar la participación ciudadana, la construcción de redes interdisciplinarias en la aplicación de las acciones de saneamiento, utilizando metodologías que oportunicen el acceso a la demanda popular y el conocimiento, y la inclusión de la evaluación cualitativa del proceso.

Control social; Saneamiento; Participación popular; Participación social


Em 2007 foi promulgada a Lei 11.445 que instituiu a Política Nacional de Saneamento Básico (PNSB), e estabeleceu entre seus princípios a universalidade de acesso e instituiu a participação popular, também referida como participação social.

A participação popular institucionalizada trouxe o paradoxo de que o sucesso destas instâncias colegiadas em exercer o controle sobre as ações dos governos depende da disposição dos próprios governos para serem controlados. A institucionalização da participação popular na Constituição Brasileira de 1988 foi fruto da pressão de movimentos sociais, estando vinculada ao aprofundamento da democracia e ampliação da cidadania (DAGNINO, 2004DAGNINO, E. Construção democrática, neoliberalismo e participação: os dilemas da confluência perversa. Política e Sociedade, nº 5, 2004. p. 139-164)

Destaca-se que o setor de saneamento encontra-se em um momento crucial de implementação de um projeto político construído ao longo de muitos anos com diversos segmentos sociais, em especial técnicos da área, representantes de empresas, representantes do poder público municipal e membros da academia. Porém, e como menciona Rosenquist, (2005)ROSENQUIST, L. E. D. A psychosocial analysis of the human-sanitation nexus. Journal of Environmental Psychology, 25, p. 335-346, 2005., um dos grandes desafios consiste em promover a participação popular, uma área de complexidade técnica que em geral desperta pouco interesse da população.

Apesar do exercício do controle social não ter alcançado as expectativas que remontam ao período de sua implantação, esse é um espaço essencial no processo de aprofundamento da democracia, (DAGNINO, TATAGIBA, 2007DAGNINO, E.; TATAGIBA, L. Introdução. In: Democracia, sociedade civil e participação. DAGNINO, E.; TATAGIBA, L (org.). Chapecó: Argos, 2007. p. 9-21). Portanto, este trabalho tem como objetivo contribuir para a construção de estratégias de suporte ao controle social em ações de saneamento, refletindo sobre o contexto brasileiro de construção de democracia e cidadania nos espaços de participação popular.

O método empregado para este estudo contemplou o uso da pesquisa qualitativa, utilizando como estratégia para desenvolver o artigo, a técnica da pesquisa documental. Ainda se utilizaram como palavras-chave os termos: controle social; participação popular; participação social e saneamento. Também as expressões "participação popular" e "participação social" por ambas serem utilizadas fazendo referências à participação em instâncias de controle social.

Buscou-se verificar o material relacionado ao controle social em políticas públicas no Brasil, e, mais especificamente, ao controle social em ações de saneamento e, assim, tomar conhecimento da forma como esse assunto tem sido abordado e analisado em estudos anteriores.

Foram analisadas leis que tratam do controle social, conforme mostra a Tabela 1, experiências já implantadas de controle social em políticas públicas de saúde e outras sob a perspectiva do pensamento de Raymundo Faoro (2008 aFAORO, R. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro.São Paulo: Globo, 2008.; 2008 b; 1987______ Existe um pensamento político brasileiro? Estudos Avançados, São Paulo, v.1, n.1, Dez.1987. p. 9-58) tendo ainda o aporte de teorias das ciências sociais que abordam as questões da democracia e cidadania.

Tabela 1
Informações adquiridas e documentos oficiais empregados

A análise do material reunido foi realizada tendo em vista a observação das dificuldades encontradas e em que medida estas comprometeriam a eficácia do controle social, enquanto exercício da cidadania. A partir das reflexões traçadas sobre as experiências encontradas, foram propostas algumas sugestões para as estratégias de controle social em ações de saneamento.

Controle social em políticas públicas

A Constituição Federal de 1988 foi escrita sem que houvesse a participação popular, mas atendeu a demandas da população. Entre estas demandas, destaca-se aqui a de participação nas políticas públicas.

A Constituição Cidadã (Constituição Federal, 1988) assegurou a participação popular nas políticas públicas, bem como outras formas de participação política. Desta forma, o Governo Federal garantiu o direito da população exercer o controle social sobre as ações do governo.

A Política Nacional de Saúde é um exemplo que estabelece os conselhos em caráter deliberativo sua composição e funcionamento, bem como a Política Nacional de Saneamento (Lei Federal 11.445), entretanto sem poder deliberativo.

Isto leva a ponderar sobre a autonomia de desenvolvimento, estruturação e ação das instâncias participativas, restringindo assim o próprio processo de amadurecimento da capacidade associativa da população, bem como seu processo de aprendizagem da cidadania.

Apesar disso, o conhecimento e a avaliação do desempenho de certas estratégias podem contribuir, tanto para o aprofundamento destas, enquanto espaços de exercício de cidadania, como na formulação de novas estratégias.

Os conselhos têm sido avaliados, em detrimento das dificuldades que encontram como espaços potencialmente capazes de receber as demandas da comunidade (BATISTA, MELO, 2011BATISTA, E. C.; MELO, E. M. A participação popular em Ipatinga (MG, Brasil): conquistas e desafios do setor de saúde. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, Jan. 2011. p. 337-347) e, assim, afirmando o seu "potencial como instrumentos de democratização e das relações de poder e da produção de políticas públicas", (CUNHA, 2007CUNHA, E. S. M. O potencial dos conselhos de políticas e Orçamentos Participativos para o aprofundamento democrático. In: Democracia, sociedade civil e participação. DAGNINO,E.; TATAGIBA, L (org.). Chapecó: Argos, 2007. p. 25-44).

De forma geral, observa-se uma crescente "despolitização" da sociedade frente às políticas públicas, o que promove, em contrapartida, tendência a uma tecnificação dessas, em detrimento da sua dimensão social e política no processo de tomada de decisões (IPEA, 2010INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Estado, sociedade civil e institucionalização da participação no Brasil: avanços e dilemas. In: Estado, instituições e democracia: democracia. Brasília: Ipea, 2010. p. 485-503 (2 v.)). Um ciclo vicioso é constatado, no qual os conselhos gestores terminam por servir apenas para referendar ações ou decisões previamente tomadas pelos gestores, tornando as decisões centralizadas e despolitizadas. Isto pode ser em parte atribuído à própria concepção dos conselhos gestores que terminam por reiterar a segmentação das políticas públicas (IPEA, 2010INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Estado, sociedade civil e institucionalização da participação no Brasil: avanços e dilemas. In: Estado, instituições e democracia: democracia. Brasília: Ipea, 2010. p. 485-503 (2 v.)).

Outro fator que contribui para o esvaziamento das instâncias de controle social é a dificuldade de acesso da população aos canais de participação e às informações (BATISTA, MELO, 2011BATISTA, E. C.; MELO, E. M. A participação popular em Ipatinga (MG, Brasil): conquistas e desafios do setor de saúde. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, Jan. 2011. p. 337-347; CUNHA, 2007CUNHA, E. S. M. O potencial dos conselhos de políticas e Orçamentos Participativos para o aprofundamento democrático. In: Democracia, sociedade civil e participação. DAGNINO,E.; TATAGIBA, L (org.). Chapecó: Argos, 2007. p. 25-44; GALVÃO JR, XIMENES, 2007GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. Desafios para os Conselhos de saneamento básico. In: GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 69-93; VAN STRALEN et al., 2006VAN STRALEN, C. J.; LIMA, A. M. D.; FONSECA SOBRINHO, D.; SARAIVA, L. E. S.; SOUSA VAN STRALEN, T. B.; BELISÁRIO, S. A.. Conselhos de Saúde: efetividade do controle social em municípios de Goiás e Mato Grosso do Sul. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v.11, n. 2006. p. 621-632), que se somam ao uso indevido do conhecimento técnico-científico (BATISTA, MELO, 2011BATISTA, E. C.; MELO, E. M. A participação popular em Ipatinga (MG, Brasil): conquistas e desafios do setor de saúde. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, Jan. 2011. p. 337-347; CUNHA, 2007CUNHA, E. S. M. O potencial dos conselhos de políticas e Orçamentos Participativos para o aprofundamento democrático. In: Democracia, sociedade civil e participação. DAGNINO,E.; TATAGIBA, L (org.). Chapecó: Argos, 2007. p. 25-44; GUIZARDI, PINHEIRO, 2006GUIZARDI, F. L.; PINHEIRO, R. Dilemas culturais, sociais e políticos da participação dos movimentos sociais nos Conselhos de Saúde. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 11, n. 3, 2006. p. 797-805; VAN STRALEN et al., 2006VAN STRALEN, C. J.; LIMA, A. M. D.; FONSECA SOBRINHO, D.; SARAIVA, L. E. S.; SOUSA VAN STRALEN, T. B.; BELISÁRIO, S. A.. Conselhos de Saúde: efetividade do controle social em municípios de Goiás e Mato Grosso do Sul. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v.11, n. 2006. p. 621-632).

Essa situação gera a neutralização do debate político dentro do Conselho, pois a legitimidade da argumentação técnico-científica tende a impor o silêncio às experiências populares e a desautorizar o posicionamento dos representantes de usuários (BATISTA, MELO, (2011)BATISTA, E. C.; MELO, E. M. A participação popular em Ipatinga (MG, Brasil): conquistas e desafios do setor de saúde. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, Jan. 2011. p. 337-347; CUNHA, (2007)CUNHA, E. S. M. O potencial dos conselhos de políticas e Orçamentos Participativos para o aprofundamento democrático. In: Democracia, sociedade civil e participação. DAGNINO,E.; TATAGIBA, L (org.). Chapecó: Argos, 2007. p. 25-44; VAN STRALEN et al., (2006)VAN STRALEN, C. J.; LIMA, A. M. D.; FONSECA SOBRINHO, D.; SARAIVA, L. E. S.; SOUSA VAN STRALEN, T. B.; BELISÁRIO, S. A.. Conselhos de Saúde: efetividade do controle social em municípios de Goiás e Mato Grosso do Sul. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v.11, n. 2006. p. 621-632).

Neste sentido, questiona-se o acesso a informações, bem como à possibilidade de uma formação que promova não somente a aquisição de conhecimentos, mas a construção de uma postura autônoma e critica da sociedade. A falta de conhecimento ou formação específica para uma atuação em instâncias de controle social, ou de forma mais ampla, participação política, terminam por fragilizar os representantes da sociedade e contribui para a formação de relações de poder assimétricas, como as observadas no interior dos Conselhos Municipais de Saúde (CMS), (GUIZARDI e PINHEIRO, 2006GUIZARDI, F. L.; PINHEIRO, R. Dilemas culturais, sociais e políticos da participação dos movimentos sociais nos Conselhos de Saúde. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 11, n. 3, 2006. p. 797-805).

Há predominância dos interesses de certos setores sobre as necessidades da comunidade (BATISTA, MELO, 2011BATISTA, E. C.; MELO, E. M. A participação popular em Ipatinga (MG, Brasil): conquistas e desafios do setor de saúde. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, Jan. 2011. p. 337-347) e, em certas situações, o descumprimento da composição do Conselho pode promover o aumento da influência do poder de setores específicos como o governo ou prestadores de serviços (COTTA, CAZAL, MARTINS, 2010COTTA, R. M. M.; CAZAL, M. de M.; MARTINS, P. C. Conselho Municipal de Saúde: (re)pensando a lacuna entre o formato institucional e o espaço de participação social. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 15, n. 5, 2010. p. 2437-2445). Estas situações revelam a relação assimétrica de poder no interior desses conselhos, tornando o espaço de deliberação política inacessível, fragilizado e burocratizado (COTTA et al., 2010COTTA, R. M. M.; CAZAL, M. de M.; MARTINS, P. C. Conselho Municipal de Saúde: (re)pensando a lacuna entre o formato institucional e o espaço de participação social. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 15, n. 5, 2010. p. 2437-2445; GUIZARDI, PINHEIRO, 2006GUIZARDI, F. L.; PINHEIRO, R. Dilemas culturais, sociais e políticos da participação dos movimentos sociais nos Conselhos de Saúde. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 11, n. 3, 2006. p. 797-805).

Um fator amplamente discutido diz respeito ao distanciamento entre representantes dos usuários e suas bases. Esta situação é evidenciada pela ausência de disputas e a continuidade dos mesmos representantes (VAN STRALEN et al., 2006VAN STRALEN, C. J.; LIMA, A. M. D.; FONSECA SOBRINHO, D.; SARAIVA, L. E. S.; SOUSA VAN STRALEN, T. B.; BELISÁRIO, S. A.. Conselhos de Saúde: efetividade do controle social em municípios de Goiás e Mato Grosso do Sul. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v.11, n. 2006. p. 621-632) e por muitos conselheiros não serem eleitos, mas indicados (COTTA et al., 2010COTTA, R. M. M.; CAZAL, M. de M.; MARTINS, P. C. Conselho Municipal de Saúde: (re)pensando a lacuna entre o formato institucional e o espaço de participação social. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 15, n. 5, 2010. p. 2437-2445).

A questão da institucionalização da representação como meio possível de participação social em instâncias de controle social pode ser questionada tendo em vista os diferentes graus de cultura associativa de cada região. A restrição da participação a representações pode contribuir para desarticular a formação de uma cultura associativa e participativa genuína.

Um ponto digno de nota é a diferença de funcionamento das instâncias colegiadas em municípios de médio e pequeno porte e capitais. Em princípio, os conselhos se disseminaram nas grandes capitais, e expandindo-se posteriormente para as cidades de porte médio mantendo, porém, os mesmos elementos organizacionais, (AVRITZER, 2009AVRITZER, L. A Dinâmica da Participação local no Brasil. In: Democracia, desigualdade e políticas públicas no Brasil. AVRITZER, L. (coordenador) volume2. Agência Financiadora: FINEP, 2009. p. 14-49. Disponível em:http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=51625&chPlc=51625&viewbusca=s Acesso em 16 de mar. de 2011
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/cont...
).

As dificuldades encontradas no funcionamento dos conselhos refletem aspectos da cultura local, tais como a organização da sociedade civil, (AVRITZER, 2009AVRITZER, L. A Dinâmica da Participação local no Brasil. In: Democracia, desigualdade e políticas públicas no Brasil. AVRITZER, L. (coordenador) volume2. Agência Financiadora: FINEP, 2009. p. 14-49. Disponível em:http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=51625&chPlc=51625&viewbusca=s Acesso em 16 de mar. de 2011
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/cont...
); projeto político do gestor local (AVRITZER, 2009AVRITZER, L. A Dinâmica da Participação local no Brasil. In: Democracia, desigualdade e políticas públicas no Brasil. AVRITZER, L. (coordenador) volume2. Agência Financiadora: FINEP, 2009. p. 14-49. Disponível em:http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=51625&chPlc=51625&viewbusca=s Acesso em 16 de mar. de 2011
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/cont...
; DAGNINO, 2004DAGNINO, E. Construção democrática, neoliberalismo e participação: os dilemas da confluência perversa. Política e Sociedade, nº 5, 2004. p. 139-164), além de aspectos que tangem à própria estrutura institucional do modelo adotado. Avritzer, (2009)AVRITZER, L. A Dinâmica da Participação local no Brasil. In: Democracia, desigualdade e políticas públicas no Brasil. AVRITZER, L. (coordenador) volume2. Agência Financiadora: FINEP, 2009. p. 14-49. Disponível em:http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=51625&chPlc=51625&viewbusca=s Acesso em 16 de mar. de 2011
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/cont...
cita que apesar das dificuldades, a eficácia das ações participativas está associada a uma melhor organização do governo. Os efeitos positivos destas práticas estendem-se ao acesso à educação e à saúde como à gestão destas áreas de políticas sociais.

Estratégias de controle social em ações de saneamento

Com a aprovação da Política Nacional de Saneamento Básico (PNSB) pela Lei 11.445, em 5 de janeiro de 2007, e seu Decreto de Regulamentação nº 7.217, de 21 de junho de 2010, o setor saneamento vem trabalhando no sentido de implantá-la. O processo de construção da PNSB uniu diversos segmentos em torno da noção de saneamento no que se refere a ação de saúde e não mera implantação de infraestrutura.

A dispersão das fontes de financiamento, a fragmentação da política, além da ausência de uma regulação central das ações de saneamento dificultam o controle social destas ações.

Há basicamente duas formas de caracterizar o saneamento, uma enquanto prevenção em saúde e outra em relação à promoção da saúde. Nesta segunda perspectiva, entende-se o saneamento como uma intervenção multidimensional que ocorre no ambiente, dessa forma considera-se as dimensões física, social, econômica, política e cultural. O objetivo, desta perspectiva é a implantação de sis temas de engenharia associados a um conjunto de ações integradas capazes de contribuir para a saúde.

Considera-se a partir deste estudo que é necessário pensar na sustentabilidade desses sistemas e ações associadas e em sua adaptação ao contexto geral no qual são executados, buscando a articulação entre instituições e a população com vistas ao fortalecimento da mesma, compartilhando com ela e com os outros setores técnicos envolvidos a responsabilidade pelas ações (SOUZA et al., 2007SOUZA, C. M. N.; FREITAS, C. M.; MORAES, L. R. S. Discursos sobre a relação saneamento-saúde-ambiente na legislação: uma análise de conceitos e diretrizes. Revista de Engenharia Sanitária e Ambiental, Rio de Janeiro, v. 12, n. 4, Dec. 2007. p. 371-379).

Laporte (2000)LAPORTE, D.. History of shit. Cambridge, Massachussetts:MIT Press, 2000. Originalmente publicado em francês em 1978. diz que a perspectiva das ações de saneamento enquanto promoção de saúde contempla uma visão mais abrangente destas ações, permitindo a incorporação de aspectos subjetivos que ligam o saneamento às questões que tangem ao corpo e ao espaço, pois sanear o meio para promover saúde remete a relação homem/espaço, bem como homem/corpo com o mundo e com as representações que ele constrói a partir da sua situação na sociedade.

Neste aspecto, espera-se que ocorra a participação da população no planejamento, implementação e manutenção de ações de saneamento, promovendo assim, a apropriação destas ações, quanto a ação de saúde e desta forma contribuindo para a eficácia e sustentabilidade destas etapas.

O saber técnico-científico é de grande importância, mas só ele não é suficiente. A participação é também consequência de um processo de empoderamento coletivo, a partir do qual in divíduos e comunidade tornam-se aptos a compreender mecanismos e processos (opinar, contribuir, concordar e discordar) a partir de sua experiência, dos saberes construídos no cotidiano e das informações que lhes chegam ao conheci mento (SOUZA, FREITAS, 2009SOUZA, C. M. N.; FREITAS, C. M. Discursos de usuários sobre uma intervenção em saneamento: uma análise na ótica da promoção da Saúde e da prevenção de doenças. Revista de Engenharia Sanitária e Ambiental, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, 2009. p. 59-68). Ainda assim, os mesmos autores mencionam que a participação popular nas ações de saneamento remete ao cumprimento de seu próprio objetivo enquanto promoção de saúde, empoderamento da sociedade e construção coletiva de um bem comum: a saúde.

A simples implantação de uma estrutura não garante a sua utilização adequada e manutenção. Com isto, os executores das ações de saneamento tornam-se todos os atores envolvidos, tanto técnicos, como população.

Outro aspecto importante para promoção da saúde em relação ao saneamento e fomento ao controle social, são as ações de educação ambiental e saúde, que vêm sendo realizadas pela Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), desde 1999, além da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental (SNSA) do Ministério das Cidades (MCidades), desde 2005. Observa-se que o objetivo destas ações é mobilizar os usuários para o exercício do controle social, incluindo sua participação no planejamento, no acompanhamento e na avaliação da gestão, buscando garantir o comprometimento para o uso adequado dos serviços prestados (MOISÉS, 2010MOISÉS, M. A política federal de saneamento básico e as iniciativas de participação, mobilização, controle social, educação em saúde e ambiental nos programas governamentais de saneamento. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 15, n. 5, Aug. 2010. p. 2581-2591).

A PNSB trouxe novos princípios e objetivos e a indução de uma prática mais inclusiva, com a garantia do exercício do controle social. A participação popular ganhou contornos bem delineados com a institucionalização da necessidade de elaboração do Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB) em todos os municípios para que estes possam receber investimentos neste setor, mas não promoveu uma mudança significativa em relação ao papel da União, como relata Heller, (2009)HELLER, L. O papel da União na política de Saneamento Básico: entre o que se deve e o que se pode esperar. In: (Coord.) Berenice de Souza Cordeiro. Instrumentos das políticas e da gestão dos serviços públicos de saneamento básico. Brasília: Editora, 2009. p. 89-99.

A construção dos PMSB tem sido financiada pela FUNASA e pelo Ministério das Cidades, ambas as instituições possuem roteiros para a elaboração deste documento, nos quais o envolvimento da sociedade ocupa papel central. O objetivo na elaboração deste documento é que seja transformado em Lei e, desta forma, garanta o empoderamento da população que passa a ter um mecanismo formal para exigir seus direitos (BRASIL, 2006).

O PMSB busca possibilitar a criação de mecanismos de gestão pública da infraestrutura do município, relacionada aos quatro eixos do saneamento básico: abastecimento de água; esgotamento sanitário; manejo de resíduos sólidos e manejo de águas pluviais, considerando entre outros aspectos o "estabelecimento de mecanismos e procedimentos que garantam efetiva participação da sociedade em todas as etapas do processo de elaboração, aprovação, execução, avaliação e revisão do PMSB" (BRASIL, 2012BRASIL. Termo de Referência para elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico. Procedimentos relativos ao convênio de cooperação técnica e financeira da Fundação Nacional de Saúde - Funasa/MS. Brasília: 2012. Disponível em: http://www.funasa.gov.br/internet/Web%20Funasa/not/not2012/TR_PMSB_V2012.pdf Acesso em 18 de mar de 2012.
http://www.funasa.gov.br/internet/Web%20...
).

O Ministério das Cidades preparou o Guia para a elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico, onde propõe um conjunto de critérios e conceitos que, aplicados às condições específicas de cada município, podem facilitar a tarefa de planejar os sistemas de saneamento básico.

Em relação à participação da população neste processo, apesar de não prever a elaboração do plano de mobilização social como etapa de desenvolvimento, ressalta a importância desta dimensão ao longo de todo o processo e sugere uma escala de participação e diversos critérios a serem considerados. Nota-se, assim, maior flexibilidade no modo de execução destas ações em relação ao instrumento orientativo da FUNASA.

De forma geral, alguns princípios orientam a construção do PMSB como a promoção do protagonismo social a partir da criação de canais de acesso à informação e à participação que possibilite a conscientização e a autogestão da população; promoção da educação sanitária e ambiental que vise à construção da consciência individual e coletiva, como também uma relação mais harmônica entre o homem e o ambiente e a informação tecnológica.

Tendo em vista as diversas experiências de controle social em saneamento, bem como de construção de PMSB, de forma geral deve-se considerar o ambiente político local; as preferências culturais e hábitos locais (especialmente no que tange à hábitos pessoais de limpeza e relação com o espaço); além da inserção de debate sobre tecnologias possíveis disponíveis e viáveis. Assegurar a construção de estratégias flexíveis e capilarizadas, que possam ser inseridas numa rede interdisciplinar que possa dar suporte às estratégias adotadas, pode favorecer a eficácia das mesmas.

A efetivação da PNSB e a realização dos PMSB por si só constituem desafios à sociedade brasileira pela sensível mudança de perspectiva que representam. É inquestionável que cada experiência soma o conhecimento e os fracassos, observando que obstáculos, neste momento, são parte de um processo de aprendizagem e construção de cidadania do povo, portanto, avanços e recuos devem ser esperados.

No Guia para a elaboração de planos municipais de saneamento, Bernardes et al., (BRASIL, 2006) desenvolveram uma classificação hierárquica semelhante à de Arnstein, (ARNSTEIN,1969ARNSTEIN, Sherry. R. A Ladder of Citizen Participation. Journal of the American Institute of Planners - JAIP, vol. 35, n. 4, 1969. p. 216-224), em que atribuem sete níveis de participação, que variam de acordo com o grau de envolvimento da comunidade na sua elaboração.

HELLER et al., (2007)HELLER, L.; REZENDE, S. C.; HELLER, P. G. B. Participação e controle social em saneamento básico: aspectos teórico-conceituais. In:GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 37-68 ao analisarem os modelos de participação propostos por Arnstein (1969)ARNSTEIN, Sherry. R. A Ladder of Citizen Participation. Journal of the American Institute of Planners - JAIP, vol. 35, n. 4, 1969. p. 216-224 e Bernardes et al., (BRASIL, 2006) identificaram que esses modelos caracterizam o início do processo participativo quando a população é apenas informada do que está acontecendo.

Caracterizando a informação como participação unidirecional. O avanço da participação caracteriza-se pela influência no processo decisório que progride até a transferência de poder para a população, que passa a ser responsável pelo processo de decisão e até mesmo de implementação.

A utilização da lógica hierarquizada para avaliação dos processos participativos desconsidera a descontinuidade típica destes processos, que envolve avanços e retrocessos, devido à dinâmica política e cultural própria de cada localidade, supondo assim a possibilidade de uma escala ascendente nos processos participativos quando, estes se assemelham a espirais.

Sugere-se ainda que a avaliação destas etapas seja realizada ao longo de um espectro temporal amplo, que vá além da avaliação das estratégias de mobilização utilizadas, para que, desta forma, seja possível observar seus efeitos em curto, médio e longo prazo.

Fortalecimento da participação social em saneamento

A efetividade do controle social em ações de saneamento tem se desenvolvido em um processo permanente de aprendizado. A experiência acumulada em outras áreas e a trajetória do setor de saneamento no Brasil aponta para algumas questões aqui destacadas.

Galvão Jr. e Ximenes (2007)GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. Desafios para os Conselhos de saneamento básico. In: GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 69-93 sugerem que os conselhos municipais setoriais ou de mesma natureza possam ser instrumentos eficientes no exercício do controle social e no apoio à regulação dos serviços de água e esgoto, e convém ponderar que de acordo com a Lei 11.445/2007, o caráter dos conselhos de saneamento deverá ser consultivo, já que é possível que esta ausência de poder leve ao esvaziamento e descrédito desta instância. Como é mencionado por Mello (2009), esse mecanismo poderia inclusive dificultar a sustentação da participação na implementação do PMSB.

Apesar da institucionalização da participação ser vista como necessária para garantir a efetividade (JOURALEV, 2007JOURALEV, A. Participação dos consumidores no processo regulatório. In:GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 20-36) é possível questionar o controle que o Poder Público acaba exercendo neste processo. A vinculação da participação a organizações da sociedade civil, bem como o caráter consultivo do conselho, podem ser elementos que não só desmotivam a participação, como enfraquecem a mobilização social ao criar a necessidade de organizações temáticas específicas.

Desse modo, o que se propõe é que, uma vez que se observam níveis distintos de associativismo nas localidades, a possibilidade de participação individual (independente de entidades representativas). Deve-se ainda valorizar os espaços de agregação natural para que possa fomentar o associativismo e a criação de um projeto comum nas localidades. Com isso, é possível também contornar o desinteresse da comunidade pelos Conselhos (GERSCHMAN, 2004).

A criação de mecanismos ou procedimentos de participação da população no processo regulatório por si mesmo, não garante a sua participação efetiva. É importante salientar para as condições sociais que limitam a participação, o custo da dedicação ao controle social também contribui para uma tendência natural de delegar ao governo o controle da administração pública, observa-se que há poucos incentivos para que a sociedade civil exerça o controle social (BUGARIN, 2003BUGARIN, M. S. Um Mecanismo para ampliar o Envolvimento Social. In:Controle dos gastos públicos no Brasil: instituições oficiais, controle social e um mecanismo para ampliar o envolvimento da sociedade.BUGARIN, Maurício Soares; VIEIRA, Laércio Mendes;GARCIA, Leice Maria (ORG). Rio de Janeiro: Konrad-Adenauer-Stifung, 2003. p. 179-200.).

Fator de especial relevância para a promoção do controle social em ações de saneamento é a não tecnificação do discurso.

A discussão sobre as opções tecnológicas é tema constante nas ações de saneamento, uma vez que estas ações impactam não só a saúde humana, mas o meio ambiente faz-se necessário inserir o debate sobre sustentabilidade ambiental.

De forma geral, questiona-se o fato do controle social da população sobre as ações do governo estar atrelado a concessões do próprio governo, seguindo uma lógica disciplinar e fragmentada fortemente marcada pela tecnificação do conhecimento em detrimento da interdisciplinaridade. Isto marca mais uma vez a exclusão da população nesse processo.

O modelo que vem sendo adotado, que é dependente do projeto político local e vinculado a representações por meio de agrupamentos organizados da sociedade, em conselhos temáticos são fatores a serem observados como possíveis limitadores à própria mobilização social.

Desta maneira, o que se propõe é a construção de espaços de diálogo e valorização do saber da comunidade, pela equipe técnica envolvida nas ações de saneamento e elaboração dos PMSB, com a utilização de metodologias apropriadas: como a construção de uma intervenção, adotando-se o conhecimento da comunidade local e de suas demandas.

Deve-se adotar o caráter interssetorial do saneamento básico com a saúde, com o meio ambiente e com o planejamento urbano, demonstrando a necessidade de integração entre estas ações, como também é preciso observar que em nível local, a população não faz distinções disciplinares. Portanto, a fragmentação da organização do Estado promove a fragmentação da participação popular, como relatam HELLER et al., (2007)HELLER, L.; REZENDE, S. C.; HELLER, P. G. B. Participação e controle social em saneamento básico: aspectos teórico-conceituais. In:GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 37-68.

A formação dos atores sociais e a disponibilidade de informação devem ser trazidas com frequência, quando se discute a efetivação dos mecanismos de controle social. Carvalho (2002)CARVALHO, José Murilo de. Introdução. Cidadania no Brasil. O longo Caminho.3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 7 - 13. coloca que, de acordo com T. A. Marshall, a educação popular, apesar de ser um direito social cuja aquisição tende a ocorrer após a conquista de direitos civis e políticos, seria um pré-requisito à conquista dos demais direitos. Jouralev (2007)JOURALEV, A. Participação dos consumidores no processo regulatório. In:GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 20-36 recomenda que se invista em capacitação e educação da população.

Assim, questiona-se aqui o papel da educação no exercício do controle social nas políticas públicas, pois é dada ao indivíduo a responsabilidade de conhecer as leis sem, contudo, criar condições para que isso ocorra. Sugere-se, portanto, a construção de processos educativos quanto às políticas públicas que favoreçam a reflexão sobre os direitos e deveres dos cidadãos.

A construção do controle social em ações de saneamento é um desafio à sociedade, pois, além das dificuldades comuns às práticas já implantadas, envolve ainda a questão do debate acerca de questões técnicas, em uma temática imersa em peculiaridades culturais. Questiona-se: como se promover saúde com ações de saneamento sem que a comunidade se aproprie das benfeitorias?

A forma como uma comunidade aborda o saneamento remete à forma como a ela se relaciona com o espaço que a cerca e com os cuidados com o próprio corpo, formando corpo e cidade elementos simbólicos altamente relacionados em uma rede cultural. A apropriação das ações de saneamento pela sociedade é certamente um grande desafio que remete à apropriação também do espaço da cidade e da saúde coletiva.

Os pontos acima colocados levam a refletir sobre o caráter ambíguo da expressão "controle social" e em que medida a institucionalização desta prática no Brasil e a formalização posterior destas estratégias têm servido ao controle do Estado sobre a sociedade.

A institucionalização destas instâncias pode ter ocorrido como uma concessão antecipada do Estado, antes que os movimentos populares se fortalecessem demasiadamente e passassem a prescindir deste reconhecimento formal.

Cabe então, questionar a que controle se presta a institucionalização da participação popular no Brasil, pois como coloca Gohn, (2011) trata-se de um processo contraditório, já que observa-se, por um lado, a formação de novas relações, oportunidades e a consolidação de espaços democráticos; e por outro, impactos nas formas de organização popular, no encaminhamento das demandas e nos resultados para os diferentes setores da sociedade civil organizada que participa daqueles processos.

Portanto, a consolidação de estratégias de controle social requer uma incessante busca por recursos de exercício de contra-controle na rede de poder da sociedade brasileira. Bem como, a inclusão de classificação qualitativa em que seja considerado o contexto sociopolítico aplicado em lugar de escalas (HELLER et al., 2007HELLER, L.; REZENDE, S. C.; HELLER, P. G. B. Participação e controle social em saneamento básico: aspectos teórico-conceituais. In:GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 37-68), e, por último, um maior intercâmbio de experiências entre as áreas que vêm desenvolvendo estratégias de controle social, que podem favorecer o fortalecimento destas ações no saneamento.

Considerações Finais

A partir do estudo das estratégias de controle social no país nas últimas décadas, é possível traçar algumas considerações:

  • Há necessidade de se atentar para as características de cada localidade, desde o índice de associativismo, histórico político, geografia, cultura popular, projeto político da administração local e contexto nacional no qual se insere, bem como a flexibilidade na formulação de estratégias de mobilização popular. O fato do controle social estar assegurado na Constituição, não significa que este será concretizado

  • Utilização de abordagens que privilegiem a demanda da comunidade e seu saber, sem restringir a especificidades disciplinares, favorece o envolvimento de setores diversos e inusitados da sociedade, no debate das questões de saneamento. Estas questões fazem parte da rotina das pessoas e estão naturalmente relacionadas a outras áreas como lazer, saúde, educação, entre outras. A utilização de uma abordagem interdisciplinar parte assim de um dado real, de uma demanda a partir da qual podem ser somadas as contribuições técnicas específicas pertinentes

  • Atenção aos aspectos subjetivos, que tangem ao tema saneamento

  • O fomento a processos educativos relacionados à participação social em políticas públicas é um elemento que pode contribuir para a qualidade da participação de uma sociedade e para o fortalecimento da cidadania. O que aqui se designa como processo educativo não se restringe aos espaços de educação formal, mas ao entendimento de que a aprendizagem ocorre nas experiências cotidianas constantemente

  • A participação social deve estar presente desde a definição de princípios e diretrizes de uma política pública de saneamento básico ao planejamento, acompanhamento da execução e avaliação de ações, acrescentando que diante do exposto é pertinente a inclusão de variáveis qualitativas de avaliação qualitativa dos processos participativos

As reflexões de Raymundo Faoro apontam para a união da sociedade civil em torno do bem comum, independente da área a que se remeta como um meio de fortalecer a sociedade brasileira. De fato, o que se pode concluir é que o aprendizado de uma cultura de associação coletiva se constrói a partir dos recursos de cada povo, com a flexibilidade e peculiaridades de cada localidade.

References

  • ARNSTEIN, Sherry. R. A Ladder of Citizen Participation. Journal of the American Institute of Planners - JAIP, vol. 35, n. 4, 1969. p. 216-224
  • AVRITZER, L. A Dinâmica da Participação local no Brasil. In: Democracia, desigualdade e políticas públicas no Brasil. AVRITZER, L. (coordenador) volume2. Agência Financiadora: FINEP, 2009. p. 14-49. Disponível em:http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=51625&chPlc=51625&viewbusca=s Acesso em 16 de mar. de 2011
    » http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=51625&chPlc=51625&viewbusca=s
  • BATISTA, E. C.; MELO, E. M. A participação popular em Ipatinga (MG, Brasil): conquistas e desafios do setor de saúde. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, Jan. 2011. p. 337-347
  • BERNARDES, R. S., SCÁRDUA, M. P., CAMPANA, N. A. Guia para a elaboração de planos municipais de saneamento / Ministério da Cidades. - Brasília: Ministério das Cidades, 2006.
  • BRASIL. Termo de Referência para elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico. Procedimentos relativos ao convênio de cooperação técnica e financeira da Fundação Nacional de Saúde - Funasa/MS. Brasília: 2012. Disponível em: http://www.funasa.gov.br/internet/Web%20Funasa/not/not2012/TR_PMSB_V2012.pdf Acesso em 18 de mar de 2012.
    » http://www.funasa.gov.br/internet/Web%20Funasa/not/not2012/TR_PMSB_V2012.pdf
  • ______ Ministério das Cidades. Guia para a elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico - Brasília: Ministério das Cidades, 2011. 2ª edição.
  • ______ Ministério das Cidades. Organização Pan-Americana da Saúde. Política e Plano de Saneamento Ambiental: experiências e recomendações - Brasília: Ministério das Cidades, 2011. 2ª edição. B
  • ______ Ministério da Cidades. Guia para a elaboração de planos municipais de saneamento. Brasília: Ministério das Cidades, 2006.
  • ______ Lei 11.445, de 5 de janeiro de 2007. Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico. D.O.U.- Diário Oficial da União. Disponível em: http://www6.senado.gov.br/sicon/ListaReferencias.action?codigoBase=2&codigoDocumento=255273. Acesso em 30 de jul. de 2010.
    » http://www6.senado.gov.br/sicon/ListaReferencias.action?codigoBase=2&codigoDocumento=255273
  • ______ Lei 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências. D.O.U.-Diário Oficial da União. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/Lei8142.pdf. Acesso em 30 de jul. de 2010
    » http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/Lei8142.pdf
  • ______ Constituição Federal: Artigos 5º, 6º e 144. Disponível.em:http://www.gsaconcursos.com.br/concursos/sbcgcm_102010/LINKS%20RELACIONADOS%20AOS%20CONHECIMENTOS%20ESPEC%CDFICOS.pdf Acesso em 30 de jul. de 2010
    » http://www.gsaconcursos.com.br/concursos/sbcgcm_102010/LINKS%20RELACIONADOS%20AOS%20CONHECIMENTOS%20ESPEC%CDFICOS.pdf
  • BUGARIN, M. S. Um Mecanismo para ampliar o Envolvimento Social. In:Controle dos gastos públicos no Brasil: instituições oficiais, controle social e um mecanismo para ampliar o envolvimento da sociedade.BUGARIN, Maurício Soares; VIEIRA, Laércio Mendes;GARCIA, Leice Maria (ORG). Rio de Janeiro: Konrad-Adenauer-Stifung, 2003. p. 179-200.
  • CARVALHO, José Murilo de. Introdução. Cidadania no Brasil. O longo Caminho.3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 7 - 13.
  • COTTA, R. M. M.; CAZAL, M. de M.; MARTINS, P. C. Conselho Municipal de Saúde: (re)pensando a lacuna entre o formato institucional e o espaço de participação social. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 15, n. 5, 2010. p. 2437-2445
  • CUNHA, E. S. M. O potencial dos conselhos de políticas e Orçamentos Participativos para o aprofundamento democrático. In: Democracia, sociedade civil e participação. DAGNINO,E.; TATAGIBA, L (org.). Chapecó: Argos, 2007. p. 25-44
  • DAGNINO, E. Construção democrática, neoliberalismo e participação: os dilemas da confluência perversa. Política e Sociedade, nº 5, 2004. p. 139-164
  • DAGNINO, E.; TATAGIBA, L. Introdução. In: Democracia, sociedade civil e participação. DAGNINO, E.; TATAGIBA, L (org.). Chapecó: Argos, 2007. p. 9-21
  • FAORO, R. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro.São Paulo: Globo, 2008.
  • ______ Existe um pensamento político brasileiro? Estudos Avançados, São Paulo, v.1, n.1, Dez.1987. p. 9-58
  • GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. Desafios para os Conselhos de saneamento básico. In: GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 69-93
  • GONH, M. da G. Participação de representantes da sociedade civil na esfera pública na América Latina. Política e Sociedade, vol. 10, nº 18, 2011. p. 223-244
  • GUIZARDI, F. L.; PINHEIRO, R. Dilemas culturais, sociais e políticos da participação dos movimentos sociais nos Conselhos de Saúde. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 11, n. 3, 2006. p. 797-805
  • HELLER, L. O papel da União na política de Saneamento Básico: entre o que se deve e o que se pode esperar. In: (Coord.) Berenice de Souza Cordeiro. Instrumentos das políticas e da gestão dos serviços públicos de saneamento básico. Brasília: Editora, 2009. p. 89-99
  • HELLER, L.; REZENDE, S. C.; HELLER, P. G. B. Participação e controle social em saneamento básico: aspectos teórico-conceituais. In:GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 37-68
  • INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Estado, sociedade civil e institucionalização da participação no Brasil: avanços e dilemas. In: Estado, instituições e democracia: democracia. Brasília: Ipea, 2010. p. 485-503 (2 v.)
  • JOURALEV, A. Participação dos consumidores no processo regulatório. In:GALVÃO JR, A. C.; XIMENES, M. M. F. (Edit.). Regulação: controle social da prestação dos serviços de água e esgoto. Editores. Fortaleza: Pouchain Ramos, 2007. p. 20-36
  • LAPORTE, D.. History of shit. Cambridge, Massachussetts:MIT Press, 2000. Originalmente publicado em francês em 1978.
  • MELO, G. B. Avaliação da Política Municipal de Saneamento Ambiental de Alagoinhas (BA) - Contornos da Participação e do Controle Social. 2009. 211p. Dissertação de Mestrado- Faculdade de Tecnologia. Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, Universidade de Brasília, BRASÍLIA. 2009.
  • MOISÉS, M. A política federal de saneamento básico e as iniciativas de participação, mobilização, controle social, educação em saúde e ambiental nos programas governamentais de saneamento. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 15, n. 5, Aug. 2010. p. 2581-2591
  • ROSENQUIST, L. E. D. A psychosocial analysis of the human-sanitation nexus. Journal of Environmental Psychology, 25, p. 335-346, 2005.
  • SISTEMA NACIONAL DE SANEAMENTO AMBIENTAL. Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento: diagnóstico dos serviços de água e esgotos - 2009. Brasília: MCIDADES.SNSA, 2011. Disponível em:http://www.portal2014.org.br/midia/site/1-2582011185138-Diagnostico_AE2009.pdf. Acesso em 26 de jan. de 2012.
    » http://www.portal2014.org.br/midia/site/1-2582011185138-Diagnostico_AE2009.pdf
  • SOUZA, C. M. N.; FREITAS, C. M. Discursos de usuários sobre uma intervenção em saneamento: uma análise na ótica da promoção da Saúde e da prevenção de doenças. Revista de Engenharia Sanitária e Ambiental, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, 2009. p. 59-68
  • SOUZA, C. M. N.; FREITAS, C. M.; MORAES, L. R. S. Discursos sobre a relação saneamento-saúde-ambiente na legislação: uma análise de conceitos e diretrizes. Revista de Engenharia Sanitária e Ambiental, Rio de Janeiro, v. 12, n. 4, Dec. 2007. p. 371-379
  • VAN STRALEN, C. J.; LIMA, A. M. D.; FONSECA SOBRINHO, D.; SARAIVA, L. E. S.; SOUSA VAN STRALEN, T. B.; BELISÁRIO, S. A.. Conselhos de Saúde: efetividade do controle social em municípios de Goiás e Mato Grosso do Sul. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v.11, n. 2006. p. 621-632
  • 1
    Agradecimentos: A Universidade Federal do Tocantins (UFT) e ao Deutscher Akademischer Austausch Dienst (DAAD), pelas bolsas concedidas, de produtividade e de mestrado, respectivamente.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2015

Histórico

  • Recebido
    05 Mar 2013
  • Aceito
    27 Mar 2013
ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistaambienteesociedade@gmail.com