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FORMAÇÃO DA MACROMETRÓPOLE NO BRASIL: PROCESSO DE URBANIZAÇÃO E A CONSTITUIÇÃO DE UMA REGIÃO GANHADORA

Resumo

Esse texto tem o objetivo de problematizar a formação da Macrometrópole Paulista (MMP) pelo processo de urbanização a partir das origens da dispersão urbana no estado de São Paulo. O objeto de análise são as ações planejadoras que promoveram a dispersão urbana, entre as décadas de 1910 e 1980, destacando aquelas que constituíram a MMP como espaço privilegiado da industrialização. Metodologicamente, busca-se compreender a macrometrópole a partir da escala estadual e nacional, investigando-a pelos aspectos urbanísticos, culturais, sociais e históricos de sua formação. Essa compreensão é feita pelos referenciais teóricos do desenvolvimento regional e pela ideia de região ganhadora (BENKO; LIPIETZ, 1992), interpretada segundo a realidade brasileira. As conclusões apontam para a delimitação da MMP como uma área de competitividade produtiva definida pelos critérios econômicos que se consolida como núcleo bem sucedido de uma região mais ampla, conflituosa e complexa cultural e socialmente.

Palavras-chave:
Macrometrópole Paulista; desigualdades regionais; região ganhadora; Região dos Vetores Produtivos

Abstract

The main aim of the current study is to investigate the formation of São Paulo Macrometropolis (MMP - Macrometrópole Paulista) through an urbanization process based on the origins of urban dispersion in São Paulo State. The object of the analysis lies on planning actions aimed at promoting urban dispersion from the 1910s to the 1980s, with emphasis on actions that turned the MMP into a privileged industrialization space. The herein adopted methodology focused on investigating the urban, cultural, social and historical aspects of MMP’s formation to help better understanding it at state and national scale, based on theoretical references of regional development and on the idea of a victorious region (BENKO; LIPIETZ, 1992). Conclusions point out to the definition of MMP as a productive competitiveness area defined by economic criteria that consolidate it as a successful core inserted in a broader, conflictive, culturally and socially complex region.

Keywords:
Macrometropolis; regional inequalities; victorious region; Region of Production Vectors

Resumen

Este texto tiene el objetivo de problematizar la formación de la Macrometrópolis Paulista (MMP) por el proceso de urbanización a partir de los orígenes de la dispersión urbana en el estado de São Paulo. El objeto de análisis son las acciones planificadoras que promovieron la dispersión urbana, entre las décadas de 1910 y 1980, destacando aquellas que constituyeron la MMP como espacio privilegiado de la industrialización. Metodológicamente, se busca comprender la macrometropía a partir de la escala estadual y nacional investigando por los aspectos urbanísticos, culturales, sociales e históricos de su formación. Esta comprensión es hecha por los referenciales teóricos del desarrollo regional y por la idea de región ganadora (BENKO, LIPIETZ, 1992). Las conclusiones apuntan a la delimitación de la MMP como un área de competitividad productiva definida por los criterios económicos que se consolida como núcleo exitoso de una región más amplia, conflictiva y compleja cultural y socialmente.

Palabras clave:
Macrometropolis Paulista; desigualdades regionales; región ganadora; Región de los Vectores Productivos

Introdução

A Macrometrópole Paulista (MMP) tornou-se objeto de ações planejadoras orientadas - não exclusivamente, mas principalmente - pelos fatores econômicos atendendo ao principal objetivo de conformar um espaço de competitividade global. Nesse aspecto, a constituição da MMP por essas ações planejadoras ocorreu pela escolha de uma área apta a potencializar os investimentos públicos e privados pela distinção de um núcleo desenvolvido a partir de uma região mais ampla e complexa.

Partindo dessa hipótese, propomos compreender a formação da MMP pelas particularidades urbanísticas, culturais, sociais e históricas que implicam em dois marcos: o temporal, a partir dos anos 1950, quando se efetiva um planejamento regional contínuo que constituiu a base industrial e administrativa estadual que dá suporte à MMP; e o marco territorial, pela compreensão funcional da MMP na escala nacional, tendo em vista que ela se consolidou como o núcleo economicamente bem sucedido da porção mais desenvolvida do país.

Para romper a interpretação insular da MMP, vamos analisá-la a partir do processo de urbanização e, mais especificamente, a partir da verificação da dispersão urbana que ocorre como tendência da ocupação territorial não só paulista, mas brasileira.

Reposicionando o debate sobre a MMP, que permite interpretá-la não como elemento isolado, mas como parte de um conjunto mais amplo e complexo, é possível apontar discussões necessárias para uma nova agenda na sua legitimação como alternativa e não como agente promotor de desigualdade. Nesse aspecto, a MMP foi considerada como um resultado - e possível evidência - da urbanização dispersa que se caracteriza pelo processo de espraiamento da urbanização por todo o território e que ocorre de forma contínua, nem sempre contígua, mas que constitui um único sistema; apresenta a “regionalização do cotidiano” a partir de novos modos de vida baseados na intensa mobilidade metropolitana e intermetropolitana; com a “nova gestão do espaço urbano” por meio da vida em condomínios/loteamentos fechados de moradia, de veraneio, de serviços ou industriais; e com novas formas de gestão do espaço que apresentam caráter público, mas de domínio privado; “esgarçamento crescente do tecido”; formação de “constelações ou nebulosas” pela consolidação de núcleos urbanos ou bairros em áreas tidas até então como rurais e integradas no sistema metropolitano; e pelas “mudanças no transporte diário intrametropolitano de passageiros” transformando o uso ao redor das rodovias e das vias expressas intra e intermetropolitanas (REIS, 2006REIS, Nestor Goulart. Notas sobre urbanização dispersa e novas formas de tecido urbano. São Paulo: Via das Artes. 2006.).

Por fim, cabe destacar que a formação histórica da macrometrópole foi aqui sintetizada pela expressão “região ganhadora” por meio de um empréstimo interdisciplinar de Georges Benko e Alain Lipietz, cujo termo está presente no título do livro organizado por eles, de 1992, sobre os novos paradigmas da geografia econômica. A ideia original de região ganhadora explorada pelos autores referiu-se a áreas em recuperação econômica promovidas por ações de planejamento. Foi uma expressão cunhada em resposta à ideia das regiões problemas conhecidas como áreas com estagnações econômicas e passivos sociais que antagonizavam com as regiões de planejamento, nos anos 1960 e 1970.

A aplicação do termo “regiões ganhadoras” à MMP ganha significados mais amplos e que são válidos por demonstrarem as contradições do processo brasileiro de planejamento e de desenvolvimento. Essa transposição auxilia numa investigação dos fatores das desigualdades regionais construídas por uma intrincada relação entre Estado e Capital. Assim, no caso da MMP, o uso do termo “regiões ganhadoras” abre caminho para uma analogia que demonstra, por um lado, que há proximidade com os casos analisados por Benko e Lipietz na ação planejadora de qualificar uma determinada área para proporcionar desenvolvimento; mas, por outro lado, há uma contradição, pois no caso brasileiro, as ações concentram recursos numa área tradicionalmente privilegiada pelos investimentos públicos e privados que pode acentuar uma realidade de diferenças sociais e vulnerabilidades ambientais. À luz dessas aproximações e contradições, pretendemos explorar a formação da Macrometrópole Paulista a partir do processo de urbanização.

As recentes interpretações sobre a Macrometrópole Paulista: fluxos e competitividade num novo modelo de governança

Em relação ao planejamento, a Macrometrópole pode ser compreendida como resultante do modelo pós-fordista de produção que constituiu um sistema urbano por meio de uma nova escala, a territorial, em que as regiões metropolitanas tornaram-se os pontos nodais de uma rede que se conformou como a base material da vida cotidiana (MEYER; GALVÃO; LONGO, 2015MEYER, R. P.; GALVÃO, R. F. P; LONGO, M. R. São Paulo e suas escalas de urbanização. Riurb. Revista ibero-americana de urbanismo, n. 12, diciembre (p. 7-31). Barcelona, Buenos Aires, Palma de Mallorca: s. n. 2015., p. 10-27). Na MMP, a periferia tem papel estrutural, pois o território da metropolização (tomado como o conjunto das metrópoles paulistas e aglomerações urbanas relacionadas à capital) consolidou-se pelo padrão periférico urbano-regional que estrutura o espaço periurbano da Macrometrópole incentivado pelos investimentos em infraestrutura com participação do mercado imobiliário e do capital financeiro resultando em espaços de conflitos sociais (GROSTEIN, 2015GROSTEIN, M. D. Periferias metropolitanas em nova escala. Riurb. Revista ibero-americana de urbanismo, n. 12, diciembre (p. 33-52). Barcelona, Buenos Aires, Palma de Mallorca: s. n. 2015., p. 35-48).

Os eixos, espaços dos fluxos, também tiveram e têm papel fundamental na estruturação da MMP ao consolidar novos rumos dos investimentos estaduais com fins a garantir a continuidade do processo de reestruturação produtiva pela organização do território, fundamentalmente pela relação global-local. No eixo São Paulo-Campinas, composto pelas rodovias Anhanguera e Bandeirantes, a permanência de investimentos e de concentração de riquezas transformou a morfologia urbana do seu entorno por meio dos usos habitacionais, comerciais, de serviços, logísticos e industriais fortalecendo as cidades de médio e pequeno porte (EIGENHEER; SOMEKH, 2017EIGENHEER, D.; SOMEKH, N. Formas avançadas de dispersão urbana no vetor noroeste paulista: eixo São Paulo-Campinas. Cadernos Metrópole. Volume 19, n. 40, set-dez (p. 777-797). São Paulo: EDUC. 2017., p. 779-794). Importância aos fluxos semelhantes ao que ocorre no eixo que liga a Região Metropolitana de Campinas à Região Metropolitana do Vale do Paraíba e Litoral Norte, em especial na Rodovia Tamoios, recentemente duplicada, que se consolida pela lógica da atividade industrial e da proliferação de uso residencial de alto padrão, além da sua importância para a entrada de maquinários, matérias primas e escoamento da produção industrial pelo porto de S. Sebastião (HENRIQUE; SOUZA; RESCHILIAN, 2017HENRIQUE, M. A.; SOUZA, A. A. M de; RESCHILIAN, P. R. Duplicação da rodovia dos Tamoios-SP: fluidez e repercussões no espaço regional da Região Metropolitana do Vale do Paraíba e Litoral Norte. Cadernos Metrópole. Volume 19, n. 40, set-dez. (p. 799-816). São Paulo: EDUC. 2017., p. 800-804).

Comprovando a importância dos fluxos, os estudos de mobilidade pendular na MMP identificaram uma taxa oito vezes maior que a taxa de crescimento anual da população nas regiões metropolitanas. Em 2010, 14,18% da população em idade ativa (PIA) das regiões metropolitanas que a compõem praticaram a mobilidade pendular e, desse percentual, 81% dos movimentos pendulares foram dentro das próprias regiões, além de crescimento de 131% entre 2000 e 2010 dos pendulares inter-regionais (CUNHA et al., 2013CUNHA, J. M. P.; STOCO, S.; DOTA, E. M.; NEGREIROS, R.; MIRANDA, A. A. I. A mobilidade pendular na Macrometrópole Paulista: diferenciação e complementaridade espacial. Cadernos Metrópole. Volume 15, n. 30, jul-dez. (p. 433-459). São Paulo: s. n. 2013., p. 434-454), característica em grande parte considerada expressão das desigualdades socioespaciais. Os fluxos migratórios, por sua vez, comprovaram a hegemonia da capital São Paulo e da permanência de uma forte hierarquia entre os municípios (FARIAS; HINESTROZA, 2016FARIAS, L. A. C.; HINESTROZA, B. C. Uma leitura dos fluxos migratórios através da Teoria dos Grafos: contribuições ao estudo da formação da macrometrópole paulista. Blucher Social Sciences Proceedings. Volume 2, Número 2, janeiro (p. 1 a 15). Rio de Janeiro: s. n. 2016., p. 3-8). Por outro lado, a frequência e intensidade desses fluxos demonstraram complementaridade entre os aglomerados urbanos que constituem a MMP pelo movimento de extensão, dispersão e fragmentação da mancha urbana, pela formação de uma nova morfologia urbana baseada em maior integração entre as partes, compartilhamento de um sistema produtivo, de infraestruturas e de uso do solo, interdependência e complementaridade, mas com espoliação e diferenciação entre centro e periferia (SILVA; CUNHA; ORTEGA, 2017SILVA, K. A. A. da; CUNHA, J. M. P.; ORTEGA, G. M. Um olhar demográfico sobre a constituição da macrometrópole paulista: fluxos populacionais, integração e complementaridade. Cadernos Metrópole. Volume 19, n. 40, set- dez (p. 721-748). São Paulo: EDUC. 2017., p. 723-743).

Diante dessas evidências, a MMP passou a representar nova escala de planejamento, investimento e governança que exigem articulação, integração e cooperação a fim de atender no âmbito metropolitano as demandas sociais, urbanas e ambientais; e possibilitar a formulação de estratégias de competitividades para a região (NEGREIROS; SANTOS; MIRANDA, 2015NEGREIROS, R.; SANTOS, S. M. M. dos; MIRANDA, Z. A. I. de. Nova escala de planejamento, investimento e governança. Riurb. Revista ibero-americana de urbanismo, n. 12, diciembre (p. 121-135). Barcelona, Buenos Aires, Palma de Mallorca: s. n. 2015., p. 124). Por ser tomada como um território uno, o planejamento da MMP deveria implicar na aproximação entre os planos municipais e metropolitanos com forte tendência à cooperação entre os entes federados (NEGREIROS; SANTOS; MIRANDA, 2015, p. 125-133). Dessa forma, o reconhecimento da MMP representa oportunidade de integração de escopo e de escala nas ações de gestão dos serviços públicos (como água e saneamento) por considerar a totalidade do território submetido a um único processo de urbanização (SILVA, 2015SILVA, R. T. Águas e saneamento na Macrometrópole Paulista. Riurb. Revista ibero-americana de urbanismo n. 12, diciembre (137-156). Barcelona, Buenos Aires, Palma de Mallorca: s. n. 2015., p. 137-152). Em nível nacional, a MMP tornou-se oportunidade para a metropolização institucional tendo em vista que, atualmente, o arcabouço jurídico metropolitano no nível estadual e nacional não corresponde aos problemas de desigualdade socioespacial existentes, reforçando o caráter do federalismo no Brasil, assimétrico e competitivo (CASTRO; SANTOS JÚNIOR, 2017CASTRO, H. R. de; SANTOS JÚNIOR, W. R. dos. A expansão da macrometrópole e a criação de novas RMs: um novo rumo para a metropolização institucional no estado de São Paulo? Cadernos Metrópole. Volume 19, n. 40, set-dez (p. 703-720). São Paulo: EDUC. 2017., p. 704-716). Haja vista a diretriz do Plano de Ação da Macrometrópole (PAM, 2015) que traçou estratégias para aumento de competitividade da região para se manter na liderança dos investimentos, contrariando a prerrogativa do planejamento regional de combate ao desequilíbrio (RESCHILIAN; UEHARA, 2015RESCHILIAN, P. R.; UEHARA, A. Y. Arranjos institucionais no Brasil - paradoxos de riqueza e déficit social: o estudo da dimensão territorial para o planejamento e a Macrometrópole Paulista. Anais do XVI ENANPUR (p. 1 a 16). Belo Horizonte: s. n. 2015., 5-10).

Essas análises e interpretações sobre a MMP apresentam-na como uma evidência contemporânea da urbanização dispersa caracterizada pela hegemonia dos fluxos (materiais e imateriais; humano e de capital; demográfico e industrial), pela regionalização do cotidiano e metropolização institucional, espaço de uma nova forma de produção das relações urbano-regionais pela afinidade entre o global e o local e organizada pelas centralidades, periferias e eixos numa nova escala de governança que requer redefinições e integração dos serviços públicos condizentes com as interdependências.

Unanimemente, os autores apresentam a MMP como resultante da reestruturação produtiva e do deslocamento da atividade industrial para o interior. Contudo, é importante destacar que esse processo histórico de “interiorização do desenvolvimento”, do qual a MMP é, simultaneamente, evidência e produto, foi mais abrangente e constituiu uma região mais ampla e complexa da qual a própria MMP tornou-se o núcleo mais bem-sucedido.

Processo de urbanização paulista orientado pela interiorização industrial e administrativa

Em território paulista, as ações planejadoras vinculadas aos paradigmas do planejamento regional propagaram-se por meio da interiorização industrial e administrativa direcionando o processo de urbanização e constituindo o embrião da urbanização dispersa.

As ações pioneiras iniciaram-se pela provisão de estradas de rodagem propostas pelos planos estadual e nacional, entre os anos 1910 e 1940, que transformaram o estado de São Paulo em um grande nó rodoviário nacional de integração da cadeia produtiva industrial. Em resposta à tendência de concentração industrial que já se anunciava nos anos 1950, o incentivo ao espraiamento das atividades industriais foi preconizado pelos estudos da SAGMACS - Economia e Humanismo (“Problemas de Desenvolvimento - Necessidades e Possibilidades do Estado de São Paulo”, de 1954), que propunham a expansão industrial para os principais polos urbanos do interior paulista localizados ao longo das principais estradas. A proposta de Anhaia Mello (“Plano Regional de São Paulo - Uma Contribuição da Universidade para o estudo de ‘Um Código de Ocupação Lícita do Solo‘”, também de 1954) consolidou uma estratégia similar ao plano da SAGMACS ao propor a desconcentração industrial e demográfica da capital estabelecendo um raio de 100 km a partir dela para o espraiamento dessas atividades e pessoas.

A disseminação de infraestrutura de transportes como a construção da rodovia Castello Branco (anos 1960), da D. Pedro I e Bandeirantes (anos 1970) e da rodovia dos Imigrantes (nos anos 1970 e 1980) consolidou a formação dos eixos de desenvolvimento econômico com faixas destinadas às atividades produtivas pelos distritos e condomínios industriais. A estrutura radial planejada em 1913 pelo segundo plano de viação para o estado de São Paulo foi rompida apenas com a constituição dos anéis viários (marginais aos rios Tietê e Pinheiros), a partir dos anos 1970 e do anel rodoviário (Rodoanel), a partir dos anos 1990, favorecendo o espraiamento da atividade industrial, mas restringindo-a ao raio de influência da capital.

Ao longo desse período, alguns programas derivados das políticas públicas federais foram fundamentais para a constituição da rede urbana como estratégia de organização territorial com fins à produtividade. O programa “Balcão de Projetos” (1974) disseminou a criação de distritos industriais nas principais cidades do interior e a “Política de Desenvolvimento e Desconcentração Industrial” (PDDI, 1982) consolidou esse movimento de desconcentração ao estabelecer um zoneamento que distinguiu os municípios prioritários para as indústrias e os municípios prioritários para outras atividades econômicas de menor remuneração e de baixa qualificação de mão-de-obra.

Paralelamente ao incentivo estatal do espraiamento da atividade industrial, ocorreu também a interiorização administrativa. O reconhecimento do interior do estado como espaço da integração das esferas de poder administrativo, político e econômico resultou na regionalização do estado e na destinação aos principais municípios de cada região à função de sub-sedes administrativas, que ocorreu desde os anos 1930 (Lei No. 311 de 02 de março de 1938, Decreto No. 9.775, de 30 de Novembro de 1938) acentuando-se nos anos 1950 com o “Plano de Ação do Governo” (PAG, 1959) que proporcionou a efetiva descentralização administrativa pelos investimentos nos serviços de saúde, do judiciário, dos incentivos à produção agrícola e logística pelo interior do Estado. Em 1967, após estudos do Cepeu (Centro de Pesquisas e Estudos Urbanísticos) (“A Regionalização da Ação Governamental”, 1967), o governo do estado instituiu (por meio dos decretos 48.162/67 e 48.163/67) uma divisão territorial em dez regiões polarizadas consolidando a estratégia de territorialização das diretrizes de investimentos prioritários. Desse processo resultou a implantação dos Escritórios Regionais de Planejamento (ERPLAN) e dos Conselhos de Desenvolvimento Regional (CDR) bem como a profusão da constituição de uma rede de novos hospitais, escolas, faculdades, bibliotecas, fóruns, penitenciárias, infraestrutura urbana como pontes, etc. construídos pelo Departamento de Edifícios e Obras Públicas (DOP) do governo estadual afim de qualificarem o território e sua população para atraírem capital privado pela instalação de indústrias.

Essas ações guardaram a particularidade de abrangerem a quase totalidade do estado de São Paulo, excetuando as regiões do Vale do Ribeira e do Pontal do Paranapanema tidas como “regiões problemas” e, por diversas vezes, não consideradas ou consideradas objetos distintos das ações públicas.

A interiorização da indústria ocorreu paulatinamente e resultou, num primeiro momento, no seu deslocamento para um raio máximo de 150 km da capital paulista, coincidente com a atual delimitação da MMP. Mas as ações estatais espraiaram-se e qualificaram uma área mais abrangente e se consolidaram ao redor dos principais eixos rodoviários e organizadas pelos principais polos urbanos, constituindo o que chamamos de Região dos Vetores Produtivos, ou seja, uma região do estado de São Paulo que concentra altos índices de urbanização e de investimentos, mas também é historicamente caracterizada pelas disparidades produtivas e socioeconômicas. O seu núcleo principal, mais bem-sucedido e economicamente predominante, pode ser caracterizado pela Macrometrópole Paulista, limite da concentração do Capital cujo movimento controlado de interiorização foi incentivado pelo Estado.

As decisões locacionais na formação da Macrometrópole Paulista

Nesse contexto, a Macrometrópole Paulista constituiu-se como uma região ganhadora pela incidência de ações planejadoras que a distinguiram do restante da Região dos Vetores Produtivos, justificada pela sua capacidade de reproduzir - com mais eficácia e em menor tempo - retornos econômicos crescentes frente aos investimentos públicos e privados.

No programa “Interiorização do Desenvolvimento”, a “Política de Desenvolvimento Urbano e Regional” (PDUR, 1976) propôs a associação entre os municípios da Região Metropolitana da Grande São Paulo aos aglomerados de Santos, Jundiaí, Sorocaba, Campinas e São José dos Campos com a finalidade de espraiar o crescimento metropolitano denominando essa área de “Macro-metrópole” (SÃO PAULO (Estado); SECRETARIA DE ECONOMIA E PLANEJAMENTO; INSTITUTO DE PLANEJAMENTO ECONÔMICO E SOCIAL; COMISSÃO NACIONAL DE REGIÕES METROPOLITANAS E POLÍTICA URBANA, 1976).

Na “Ação Regional” (que se iniciou em 1971), o programa “Cidades Médias e Desenvolvimento Industrial. Uma Proposta de Descentralização Metropolitana” (1978) definiu uma área de interesse para estudos e ações prioritárias formada pelo “Núcleo Principal” (Região Metropolitana de São Paulo) e “Núcleos Secundários” (Santos, São José dos Campos, Campinas e Sorocaba) (SÃO PAULO (Estado); SECRETARIA DE ECONOMIA E PLANEJAMENTO, 1978), com 63 municípios num raio de 100 a 120 km da capital, também denominada “Macro-Metrópole”.

No mesmo ano de 1978, essa área tornou-se objeto de levantamentos e estudos cartográficos pela Lei 1.825/1978 que autorizava o poder público a obter empréstimos para o estudo da “macro-metrópole” sem, contudo, definir os limites exatos que abrangiam tal designação.

A própria PDDI (1982), que se destinou às cidades ao longo do vale do rio Tietê, designou um recorte de municípios que deveriam ter prioridade de investimentos por representarem oportunidade de retornos imediatos numa delimitação geográfica muito próxima ao que é hoje a MMP.

No final da década de 1980, a “macro-metrópole” foi utilizada como base territorial para, entre outros argumentos, justificar a construção e a concessão de rodovias à DERSA, tendo em vista os interesses da exploração industrial (Decreto n. 27.962/1987 e Decreto n. 28.206/1988). Nesses decretos, a “macro-metrópole” estava delimitada pela “extensa zona circunvizinha à Região Metropolitana da Grande São Paulo”, a Baixada Santista, a região de Campinas, o Vale do Paraíba, a região de Sorocaba e desde a região de Atibaia até os limites do Vale do Ribeira (Decreto n. 28.206/1988).

Nos anos 2000, o governo do estado promulgou o Decreto no. 52.748/2008 que, ao dispor sobre a criação de um “Grupo de Trabalho para propor alternativas de aproveitamento dos recursos hídricos da Macro-metrópole de São Paulo”, delimitou-a pelas regiões metropolitanas de São Paulo, Campinas e Baixada Santista, além das Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Alto Tietê, do Piracicaba, Capivari e Jundiaí, Baixada Santista, Sorocaba e Médio Tietê , Paraíba do Sul entre outras (Artigo 1º., § 2º e 3º).

Essas definições que se sobrepõem ao longo do tempo advêm de interesses setoriais ora ligados à logística; ora à indústria; ora ao meio-ambiente (mais especificamente na provisão dos recursos hídricos), mas todos dentro do sistema de planejamento estadual que parte do reconhecimento do processo de urbanização do estado de São Paulo. Apresentam convergência quanto à importância da área delimitada pela influência da metrópole paulista, contudo alternam quanto à delimitação de suas bordas, variando conforme a ocasião e o interesse setorial.

Não bastasse a divergência que perfaz o nível do debate técnico pelo viés setorial, há ainda a divergência pela influência política que ocorre por força da tradição municipalista. Em 1978, a MMP reunia 63 municípios; em 2011, 153 (SÃO PAULO (Estado), 2011b) que, mantendo as áreas sob direta influência da metrópole paulista, incluía, por exemplo, os municípios do Circuito das Águas paulista. Em 2014, a delimitação da MMP aumentou para 172 municípios (SÃO PAULO (Estado); SECRETARIA DA CASA CIVIL; EMPLASA, 2014, livro 1, p. 09), contudo excluiu os pequenos municípios do Circuito das Águas, região menos produtiva e economicamente inferior às regiões metropolitanas; e incorporou aqueles ligados à recém criada Região Metropolitana de Sorocaba.

Em 2018, eram 174 municípios (https://www.emplasa.sp.gov.br/MMP, acessado em 22.06.2017) por incorporar o município de Itapetininga (tardiamente inserido à Região Metropolitana de Sorocaba) e o município de Laranjal Paulista, pertencente à Aglomeração Urbana de Piracicaba, desde 2012. Essa recente configuração apresenta variação de área aproximada de 44 mil km2 a 53 mil km2 e ilustra a disputa municipalista em pertencer a uma região ganhadora, ao menos no planejamento.

As rápidas transformações institucionais que se sucederam nos últimos anos com a criação de três regiões metropolitanas (duas delas constituintes da MMP) e do atendimento aos requisitos municipalistas ansiosos por se inserirem no quadro metropolitano e macrometropolitano consolidaram um cenário de alternâncias dos limites da MMP, ao mesmo tempo em que evidenciaram o que há de mais seguro nela, a constituição de uma região ainda muito vinculada à área de influência da capital São Paulo, cuja evidência só é compreendida pelo entendimento do processo de urbanização estadual.

Esse fato, por sua vez, explica a exclusão - em todas as propostas - dos municípios e respectivas regiões administrativas de Bauru e São Carlos-Araraquara, por exemplo. Ambas regiões mantém fortes relações de serviços, empregos, comércio, pesquisa e produção científica com a capital paulista e outros municípios da MMP, apesar da distância superior a 250 km da cidade de São Paulo. Por outro lado, possuem dinâmica regional própria e compõem uma rede urbana coesa com outros municípios do interior. Suas inclusões representariam a possibilidade de um equilíbrio territorial pela policentralidade, contudo e ao mesmo tempo, essa possibilidade romperia com a hegemonia monocêntrica da MMP capitaneada pela capital paulista.

Dessas divergências resultaram ao menos cinco delimitações físico-administrativas para a Macrometrópole, três delas propostas nos últimos dez anos. Condições que demonstram um interesse em constitui-la como um território que atenda às demandas setoriais em que, para cada caso, cabe uma delimitação repetindo um estereótipo da administração pública baseado na hegemonia do planejamento setorial sobre o planejamento territorial. E, complementarmente, essa configuração acolhe as solicitações políticas com a finalidade de satisfazer um patronato municipalista que garante ao estado apoio nas suas decisões em escala regional e federal. É, portanto uma estratégia de articulação por mais recursos e até de status metropolitano, mesmo nos casos em que o(s) município(s) não apresente(m) tais características.

Sobre essas disputas, impasses e conflitos escalares, emerge o setor econômico como fator determinante e aglutinador das principais decisões, sobretudo por compor, como solução territorial, uma estratégia de desenvolvimento local transbordado à escala regional, ou regional que depende do crescimento local.

A Macrometrópole como principal núcleo da Região dos Vetores Produtivos

Pode-se afirmar que a MMP se constituiu dentro da Região dos Vetores Produtivos. Ambas se formaram de um mesmo processo de urbanização, mas a MMP foi destacada recentemente como unidade de planejamento e principal destino de uma carteira de recursos públicos e privados.

Ao final dos anos 1970, o cartograma de intensidade de trânsito na rede rodoviária comprovou o contínuo aumento do tráfego numa área ao redor da capital com claro espraiamento pelos eixos da Rodovia Dutra, Anchieta e Anhanguera evidenciando a forma da macrometrópole pela lógica da integração da cadeia produtiva industrial.

Figura 01
Fluxograma de intensidade de trânsito das rodovias paulistas na década de 1970

Esse movimento transformou a realidade urbana das cidades abrangidas cujas funções regionais foram consolidadas pela intensidade de relações de interdependências que redundaram no acentuado movimento pendular em relação ao emprego, ao comércio, aos serviços especializados, ao ensino, ao lazer e entretenimento, etc.

Nesse aspecto, a evolução demográfica das cidades pertencentes a esse raio demonstrou o grau de desenvolvimento que ocorreu na Macrometrópole e foi fundamental para consolidá-la como espaço de concentração e adensamento, bem como para ilustrar igualmente a tendência de espraiamento de seus tentáculos numa contínua onda de crescimento no sentido do interior do estado reforçando seu caráter de lugar central e núcleo dominador de uma hinterlândia.

Figura 02
Tamanho Urbano e Papel Funcional das Cidades Paulistas - década de 1980

Figura 03
População dos Subsistemas dos Centros Regionais - década de 1980

Nessa interpretação, a verdadeira policentralidade não ocorre dentro da MMP, pois essa é formada por polos urbanos de diferentes categorias que orbitam ao redor da capital São Paulo e estão diretamente submetidos à sua influência. Essa dependência leva a MMP a um modelo monocêntrico, embora multipoliarizado. A policentralidade ocorre na Região dos Vetores Produtivos, na qual a MMP representa esse importante núcleo que se articula com outras centralidades formadas por polos urbanos interiorizados. Esses polos consolidam-se como centralidades regionais por serem mais independentes da capital paulista e por constituírem outras regiões de influência.

Figura 04
Distribuição da População Total - década de 1980

O acentuado crescimento da MMP, derivado da concentração industrial num raio de 100km da capital, reforçou sua autonomia em relação ao restante do estado e do país e desequilibrou as relações dos polos que a compõem, indicando a hegemonia da capital paulista. Os polos interiorizados mais distantes e menos submetidos a essa influência não se beneficiaram diretamente do movimento industrial, mas ganharam maior autonomia constituindo o conjunto da Região dos Vetores Produtivos. O que demonstra a importância do planejamento regional que, ao instituir esses polos como um motivador de cadeias produtivas, consolidou um sistema de cidades articuladas pelos serviços e comércios reorientando o desenvolvimento territorial do estado de São Paulo.

Até que se legalize a MMP, muito pode ser mudado ou complementado a julgar pela necessidade da legitimação técnica e política. Contudo, o que permanece na definição da MMP é uma visão ampla de região de planejamento que destaca do conjunto uma região ganhadora. Diferentemente da visão dualista, cujas ações orientavam-se por um equilíbrio a ser alcançado por ações conjuntas entre centro e periferia, tem-se na construção histórica da Macrometrópole o objetivo de transformá-la em propulsor dos investimentos econômicos, espaço potencial de retornos às atividades produtivas e, portanto, região isolada e competitiva no mercado global como estratégia de investimentos. Condição que explica a retirada do Circuito das Águas dos seus limites e a oposição à inclusão dos aglomerados urbanos de Bauru e de São Carlos/Araraquara (região Central) por capitanearem, paralelamente outros sistemas urbanos, ainda que essas regiões (Circuito das Águas, de Bauru e Central) guardem relações cotidianas, culturais e históricas diretas com muitos dos polos que compõem a Macrometrópole, inclusive com a capital São Paulo. Suas inclusões não corresponderiam à constituição daquilo que, na prática e diferentemente do que foi enunciado pelos seus planos, pode ser considerada uma região monocêntrica, embora multipolarizada.

Assim, como principal núcleo da Região dos Vetores Produtivos e espaço privilegiado de investimentos, a MMP conforma-se pelos positivos índices: econômicos (concentra 83% do PIB do estado e 27% do país); demográficos (64% do total do estado, 2,6% do país) e de urbanização (com taxa de urbanização de 94,83%, 50% da área urbanizada do estado); pela concentração de infraestrutura de transportes (principais rodovias do país, o porto de Santos que detém 25% do movimento de exportações e importações do país; e o maior aeroporto internacional, de Guarulhos, que movimentou 39,5 milhões de passageiros em 2014). Vemos, portanto sua formação construída como área bem sucedida de uma região mais ampla, mais complexa e a ela ligada historicamente pelo processo de urbanização.

Figura 05
Macrometrópole Paulista e a Região dos Vetores Produtivos

Conclusão

Como parte da Região dos Vetores Produtivos, a Macrometrópole Paulista está estruturada pelos principais polos urbanos e eixos rodoviários paulista e se formou num raio de 150 km de influência da capital paulista. Foi constituída a partir das políticas públicas nacionais e estaduais que buscaram promover o desenvolvimento industrial brasileiro pelo modo de produção fordista e por isso ainda traz algumas características desse período, fundamentalmente a divisão territorial do trabalho que diferencia porções de predomínios muito díspares de atividades econômicas com maior ou menor potencial de crescimento. Formou-se pelos efeitos das ações planejadoras que promoveram a interiorização industrial e administrativa da Região dos Vetores Produtivos e sua delimitação físico-administrativa expõe os conflitos escalares da setorização administrativa e do predomínio do municipalismo nas tomadas de decisão, mas ainda assim destaca-se pelos melhores índices econômicos e historicamente concentra os principais investimentos públicos e privados com fins ao desenvolvimento.

A MMP construiu-se como resultado das forças centrífugas estatais que objetivaram deslocar as empresas e os órgãos administrativos para o interior, pela concentração de recursos num raio de influência da capital paulista e com objetivo de potencializar os investimentos públicos e privados com a estratégia de constituir uma área de alta competitividade produtiva de âmbito global. Sua definição como área de planejamento leva à intensificação do desenvolvimento territorial na escala estadual e nacional ao constituir uma região ganhadora, destino e local de concentração de privilégios estatais e privados. Na escala nacional, representa o maior adensamento econômico cujas relações e influências estendem-se diretamente para a região Sul, para todo o Sudeste e para os estados de Goiás e Mato Grosso do Sul (IBGE, 2010, p. 125, 135 e 204). Reforça o antigo projeto nacional de hegemonia produtiva da macrorregião Centro-Sul consolidado pelas altas taxas de urbanização, integração e hierarquização da rede urbana.

Frente à formação da MMP como núcleo hegemônico que acentua, ao invés de combater, a desigualdade regional, requer-se uma tentativa de contraposição à reprodução desse modelo, a começar pela necessidade de considerar a MMP não como exclusivamente um espaço global, muitas vezes mais conectada pelas novas tecnologias com os centros mundiais e menos articulada fisicamente e funcionalmente com seus arredores. Pois a MMP não deve ser considerada como um fim em si mesma, mas como fração de um território em rede cujas relações ocorram horizontalmente e onde importa o caráter topológico do predomínio dessas relações (VELTZ, 1999VELTZ, Pierre. Zonas, polos, redes: la economía de archipiélago. In: VELTZ, Pierre. Mundialización, ciudades y territorios: la economía de archipiélago. Mondialisation, villes et territoires. Barcelona: Ariel. 1999., p. 53-64) transpondo a conexão que se estabelece globalmente à escala regional e local. Requer, para isso, uma revisão de seus limites podendo considerar outras porções do território que desempenhem funções importantes e que possam dividir com a capital São Paulo, por exemplo, o papel de provedores de serviços, atividades produtivas, culturais, sociais, de entretenimento, etc. numa tentativa de minimizar a tendência concentradora monocêntrica. É necessário romper as fragmentações locais e regionais (BORJA; CASTELLS, 1997BORJA, J.; CASTELLS, M. El impacto de la globlización sobre la estrutura espacial y social de las ciudades. In: BORJA, Jordi; CASTELLS, Manuel. (org.) Local e Global. La gestión de las ciudades en la era de la información. (con colaboración de Mereia Belil y Chris Benner). Mexico: Taurus. 1997., p. 67) para integrar a MMP a um território com maior abrangência e criar novos espaços de escala macrometropolitana que se destinem à experiência cotidiana das pessoas, compreendendo a MMP não como núcleo destacado de uma hinterlândia, mas como parte de um todo que coopera com outras partes.

Por fim, e complementarmente, pode-se considerar a nova escala urbana que esses fenômenos regionais adquirem, ou seja, há que se valorizar no seu desenvolvimento as funções relacionadas à vida urbana que expandem da cidade tradicional e se consolidam na região não como cidade espraiada, mas como oportunidades para além das áreas centrais, ricas e excludentes. As bordas da cidade tradicional do século XX, agora inseridas num sistema de novos espaços produtivos, culturais, habitacionais, etc. devem ser encaradas como territórios de oportunidades pela provisão de recursos e infraestrutura. Tal como em outros países (GOTTDIENER, 1990GOTTDIENER, Mark. A teoria da crise e a reestruturação sócio-espacial: o caso dos Estados Unidos. In: VALLADARES, Licia; PRETECEILLE, Edmond (org.) Reestruturação urbana: tendências e desafios. São Paulo: Nobel/Iuperj, p. 59-78. 1990., p. 59-78), no Brasil e especialmente em São Paulo, as mudanças no tecido urbano não se iniciaram com a reestruturação produtiva, mas com ela se consolidaram social e economicamente e junto dela constituíram uma nova escala, a urbano-regional. E essa nova escala precisa ser internalizada como território da vida urbana para combater as baixas densidades impróprias ao desenvolvimento urbano e ambiental, bem como assumir o espraiamento já ocorrido como oportunidade de criação de novas centralidades articuladas em rede pela constituição de novos nós urbanos para além dos já existentes.

Ao trazer uma nova escala para o planejamento, a MMP deve ser considerada também pelos aspectos histórico-culturais, sociais, ambientais e de governança. Em síntese, retomando o problema colocado inicialmente, há que se combater as desigualdades regionais pelo planejamento urbano e regional da Macrometrópole Paulista. As novas formações regionais que se consolidaram no século XX e têm se tornado espaço da vida cotidiana, como a Região dos Vetores Produtivos ou a própria MMP, exigem do gestor e do planejador a compreensão dessa nova escala de ações sem desconsiderar os conflitos.

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Endereços eletrônicos:

  • 1
    . This manuscript is part of the research included in FAPESP’s Regular Project Process n. 2018/13.637-0

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    11 Jun 2019
  • Aceito
    08 Set 2019
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