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Dona Yvonne Lara e o compasso entre a arte e a ciênciaa a O artigo é decorrente da trajetória das autoras com as temáticas da história da enfermagem e de tudo o que se refere a ela. Neste caso em especial, apresentar os aspectos relativos a história de uma cantora e compositora brasileira, Dona Ivone Lara, em sua trajetória como Enfermeira. Trata-se de uma narrativa quase inédita na enfermagem, considerando que este é o primeiro manuscrito a apresentar este aspecto da vida desta personagem, com tal aprofundamento.

Dona Yvonne Lara y la cadencia entre el arte y la ciencia

RESUMO

Objetivo

Resgatar e refletir sobre a história profissional da enfermeira Yvonne da Silva Lara, conhecida nacionalmente por seu nome artístico Dona Ivone Lara.

Método

Reflexão teórica realizada a partir de fontes documentais públicas disponíveis online como livros, Teses, Dissertações, artigos científicos, reportagens e documentários acerca da personagem e da psiquiatra Nise da Silveira.

Resultados

Pela apresentação de sua história de vida detalhou-se a escolha e formação como Enfermeira, e depois como Assistente Social, narrando sua atuação profissional e apontando sua importância nas profissões. Retrata o significado e a luta de uma mulher negra e pobre investindo em educação e formação profissional, destacando-se sua primazia pela oportunidade de estudos, aproveitando ao máximo as oportunidades a ela apresentadas, para estudar e trabalhar até se aposentar. Conclusão e implicações para a prática: Atuando profissionalmente em áreas do cuidado de enfermagem e posteriormente, do serviço social, manteve a musicalidade em sua vida, colaborando, inclusive, com seu uso como atividade terapêutica em psiquiatria. Este texto inédito acerca da história de Yvonne Lara, amplia a visibilidade sobre sua construção profissional em duas carreiras, e mobiliza os leitores para compreender a sua importância para a enfermagem.

Palavras-chave:
Construção social do gênero; Enfermagem; História da enfermagem; Música; Serviço social

RESUMEN

Objetivo

Rescatar y reflexionar sobre la trayectoria profesional de la enfermera Yvonne da Silva Lara, conocida a nivel nacional por su nombre artístico Dona Ivone Lara.

Metodología

Se utilizaron fuentes documentales públicas disponibles online como libros, tesis, disertaciones, artículos científicos, reportajes y documentales con el personaje y la psiquiatra Nise da Silveira. Resultados: La presentación de su historia de vida detalla su elección y formación como Enfermera, y luego como Asistente Social y narra su desempeño profesional y el trabajo desarrollado. Retrata el significado y la lucha de una mujer negra pobre que invierte en educación y formación profesional y destaca su primacía por la oportunidad de estudiar, al aprovechar las oportunidades que se le presentan, para estudiar y trabajar hasta jubilarse.

Conclusiones e implicaciones para la práctica: Con actuación profesional en áreas asistenciales, mantuvo la musicalidad en su vida, colaborando, incluso, con su uso como actividad terapéutica en psiquiatría. Este texto inédito sobre la historia de Yvonne Lara amplía la visibilidad de su construcción profesional en dos carreras y moviliza a los lectores a comprender su importancia para la enfermería.

Palabras clave:
Construcción social de género; Enfermería; Historia de la enfermería; Música; Servicio social

ABSTRACT

Objective

To rescue and reflect on nurse Yvonne da Silva Lara’s professional history, nationally known by her stage name: Dona Ivone Lara.

Method

Public documentary sources available online such as books, theses, dissertations, scientific articles, reports and documentaries with the character and with psychiatrist Nise da Silveira were used.

Results

The presentation of her life history detailed her choice and training as a Nurse, and later as a Social Worker, narrating her professional performance and work developed. It portrays the meaning and struggle of a poor black-skinned woman investing in education and professional training, highlighting her primacy for the opportunity to study, making the most of the opportunities presented to her, to study and work until retiring.

Conclusion and implications for the practice

Acting professionally in the areas of care, she maintained her musicality in her life, even collaborating with its use as a therapeutic activity in Psychiatry. This unprecedented text about Yvonne Lara's story expands the visibility of her professional construction in two careers and mobilizes the readers to understand her importance for Nursing.

Keywords:
Social construction of gender; Nursing; History of Nursing; Music; Social work

INTRODUÇÃO

Produções em história da enfermagem e saúde vêm desenvolvendo estudos que tratam dos aspectos que permeiam a história da profissão e de seus personagens que de algum modo fizeram a diferença na construção histórica profissional.

Biografias de enfermeiras têm sido utilizadas na educação de enfermagem com várias finalidades – ressaltar o desenvolvimento de uma área profissional específica; orientar a criação de instituições de enfermagem; criar teorias de enfermagem; investigar os avanços sociais e políticos da profissão.11 Padilha MI, Nelson S, Borenstein M. As biografias como um dos caminhos na construção da identidade do profissional da enfermagem. Hist Cienc Saude Manguinhos. 2011;18(1, Supl. 1):241-52. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-59702011000500013. PMid:22240956.
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:243 O enfoque e a opção pelas biografias de enfermeiras concentram o olhar naquelas que ocuparam posições de destaque na Enfermagem, em algum momento da sua carreira.22 Pereira FDO, Dantas RD, Oliveira DRCO, Padilha MI, Teodósio SSCS. Biografias de enfermeiras brasileiras: constructos da identidade da profissão. Hist Enferm Rev Eletrônica [Internet]. 2019; [citado 2021 dez 14];10(2):23-34. Disponível em: http://here.abennacional.org.br/here/v10/n2/a2.pdf
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3 Borenstein M, Padilha MI, Carvalho JB, Espíndola DS, Winters JRF, Sell CT. Mercedes Trentini: her professional journey and innovative contribution to nursing research. Texto Contexto Enferm. 2017;26(3):e3400016. http://dx.doi.org/10.1590/0104-07072017003400016.
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-44 Oliveira NL, Ribeiro JC, Costa HOG, Melo CMMM, Silva GTRS. 100 Anos de Haydée Guanais Dourado: contributos para a enfermagem brasileira. Rev Baiana Enferm. 2016;30(2):1-12. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v30i2.15041.
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Este texto contará a história de uma personagem da Enfermagem brasileira, cujo sucesso, memória e homenagens não se deram no campo da enfermagem, mas sim, da música. Uma história não contada e que precisa desse resgate. Uma mulher que deixou sua marca na história das mulheres brasileiras, que se rebelou frente aos costumes de sua época e perseguiu o sonho de ser alguém que, pela expressão de suas capacidades, pudesse transformar, de alguma maneira, a sociedade. Uma mulher Enfermeira que se dedicou ao bem comum, à recuperação da saúde mental de pessoas internadas, medicalizadas, muitas abandonadas por familiares a própria sorte.55 Padilha MI. O cuidar e a arte. Ciência Hoje [Internet]. 2021; [citado 2021 dez 14];374:1-5. Disponível em: https://cienciahoje.org.br/artigo/o-cuidar-e-a-arte/
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A enfermagem e o serviço social aparecem como pano de fundo nos textos acerca da vida de Yvonne Lara/Dona Ivone Lara (13/04/1921–16/04/2018), embora esses tenham sido os primeiros cenários de luta pela liberdade na sua vida. Utilizaremos seu nome de nascimento, Yvonne da Silva Lara, porque assim ela ficou conhecida profissionalmente como Enfermeira e Assistente Social. A construção dessa narrativa soma-se a outras fontes que tratam da história de vida dessa mulher, a maioria sobre sua belíssima carreira como sambista, cantora e compositora, sendo menos proeminente sua formação em duas importantes instituições de ensino no campo da saúde: as atuais Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), onde diplomou-se enfermeira e a Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde realizou sua graduação em serviço social.

Na pesquisa sobre a atuação de Yvonne Lara nas carreiras que precederam seu reconhecimento como artista, encontramos textos reportando e reverenciando seu trabalho como uma das Assistentes Sociais pioneiras do Brasil, não sendo nenhum deles escrito por Enfermeira. Em tais produções, o enfoque sobre seu trabalho em saúde é revelado principalmente pela sua atuação junto a Psiquiatra Nise da Silveira,66 Castro ED, Lima EMFA. Resistência, inovação e clínica no pensar e no agir de Nise da Silveira. Interface. 2007;11(22):365-76. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832007000200017.
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reformista na área de saúde mental, e importante referência pelo trabalho que desenvolveu com pacientes psiquiátricos, no qual defendia a arte como instrumento libertador, portanto, terapêutico.77 Adamo C, Mendes D, Gaeta I, Vergueiro P, Daré OS, Campos P, et al. Reflexões sobre o método de Nise da Silveira. Self - Rev IJUSP. 2019;4(1):e7. http://dx.doi.org/10.21901/2448-3060/self-2019.vol04.0007.
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Este manuscrito tem por objetivo refletir e resgatar a história profissional de Dona Yvonne Lara, com enfoque especial na sua formação e carreira como Enfermeira.

MÉTODO

Esta reflexão foi orientada pela análise minuciosa de fontes documentais públicas e disponíveis online, em acervos como a Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional, além de Teses, Dissertações, artigos científicos, reportagens e documentários disponíveis na plataforma youtube, e o filme “Nise – o coração da loucura”, no qual Yvonne Lara foi interpretada pela atriz Roberta Rodriguesb b NISE – O coração da loucura.8 . Também foram selecionados a título de ilustração desta reflexão alguns verbatins, contidos em entrevistas concedidas por Yvonne Lara para a construção das pesquisas de Burns99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009. e Santos.1010 Santos KRC. Dona Ivone Lara: voz e corpo da síncopa do samba [tese]. Georgia: University of Georgia; 2005 [citado 2021 dez 14]. Disponível em https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_katia_c_200505_phd.pdf
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Ademais, utilizaram-se leis e decretos dos cursos de Enfermagem da Escola de Enfermeiras e Enfermeiros de Assistência aos Alienados, Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, e do Curso de Serviço Social da Escola de Enfermagem Anna Nery, primeiro a ser criado no Rio de Janeiro, além de outros documentos que se fizeram necessários, para contextualizar a discussão. Para garantir a fidedignidade das fontes desta reflexão, foi realizada a validação interna e externa das mesmas.1111 Padilha MI, Bellaguarda MLR, Nelson S, Maia ARC, Costa R. O uso das fontes na condução da pesquisa histórica. Texto Contexto Enferm. 2017;26(4):e2760017. http://dx.doi.org/10.1590/0104-07072017002760017.
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Foram tomados todos os cuidados éticos na leitura e uso dos documentos, que seguiram os princípios da Resolução nº510/2016, do Conselho Nacional de Saúde, no que concerne à ética na pesquisa em Ciências Humanas e Sociais. Assim, foram respeitadas a dignidade e proteção humana, impedindo qualquer prejuízo às pessoas, populações e instituições investigadas.

Um pouco da história de vida de Yvonne da Silva Lara

Nascida e registrada como Yvonne da Silva Lara, em 13 de abril de 1921, sua primeira infância foi vivida na Rua Voluntários da Pátria, em Botafogo, na Zona Sul do Rio de Janeiro, Distrito Federal à época. Sua data de nascimento é mencionada como 1921 em muitas fontes, contudo, após sua morte, seu filho informou a um jornalista que Dona Yvonne teve sua certidão de nascimento alterada para ser admitida no colégio interno, de 1922 para 1921.1212 Nobile L. Dona Ivone Lara: a Primeira-Dama do Samba. 1ª ed. Rio de Janeiro: Sonora; 2015. Aqui, ficamos com a data contida em sua carteira de identidade, cuja imagem foi reproduzida em capa de livro lançado em 2007.1212 Nobile L. Dona Ivone Lara: a Primeira-Dama do Samba. 1ª ed. Rio de Janeiro: Sonora; 2015.

Dona Yvonne Lara foi a primeira filha de Emerentina Bento da Silva, costureira e João da Silva Lara, mecânico de bicicletas. Ambos com veia musical predominante, sendo ele violonista de sete cordas que desfilava no Bloco dos Africanos; ela, cantora dos ranchos carnavalescos tradicionais do Rio de Janeiro.99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009.,1313 Malta PP. Pequenos notáveis [Internet]. Rio de Janeiro: MultiRio; 2012. (Série Televisiva: Textos Complementares; vol. 1) [citado 2021 dez 14]. Disponível em: http://www.multirio.rj.gov.br/media/PDF/pdf_1243.pdf
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Sendo de família com muitos músicos, não é de estranhar que nossa personagem tenha composto seu primeiro samba aos 12 anos de idade.

Eu era muito moleca, não tinha boneca, não tinha nada disso. Eu tinha meu primo Fuleiro, que eu amava. Era um irmão que eu tinha na época. E caçava muito passarinho. Uma vez ele saiu e, quando voltou, trouxe um tiê-sangue. Botou numa gaiola e disse assim: ‘Ô, prima! Vona!’ Era como ele me chamava. ‘Olha a tua boneca...’ Ih, eu fiquei numa alegria, que só vendo. Dali eu comecei a fazer versinhos pro Tiê.99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009.:33,1414 Fenske EK. Dona Ivone Lara: a senhora da canção. Templo Cultural Delfos [Internet]. 2022 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: https://www.elfikurten.com.br/2021/02/dona-ivone-lara.html
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c c Alguns verbatins relativos as entrevistas concedidas por Yvonne Lara9,10 foram encontrados também no Repositório Digital de conteúdos culturais, educacionais, artísticos e científicos.14

Yvonne, perdeu o pai repentinamente quando tinha 3 anos de idade e aos 12 perdeu a mãe, que faleceu aos 33 anos, de Infarto Agudo do Miocárdio. Antes disso, porém, Emerentina teve um segundo casamento, com Venino José da Silva, gerente da loja de instrumentos musicais “Violão Carioca”, em Madureira, com quem teve outros dois filhos homens.1515 Biblioteca Nacional (BR). A manhã [periódico na internet], Rio de Janeiro (RJ), 19 dez 1950: Ano X: 5 [citado 2021 dez 14]. 2º Caderno – Mundo Social. Disponível em: http://memoria.bn.br/pdf/116408/per116408_1950_02881.pdf
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A condição social da família com quatro filhos era difícil, e todos mudaram para o Bairro da Tijuca, onde, ficava a Escola Municipal Orsina da Fonseca,d d Foi Inaugurada em 1877, construída com recursos públicos e privados. A partir de 1901, passa a abrigar o Instituto Profissional Feminino. Em 1912, muda o nome para Escola Orsina da Fonseca, em homenagem à esposa do Pres. Hermes da Fonseca, por seu apoio ao Instituto. Em 1933, na gestão de Anísio Teixeira, passa a se chamar Escola Técnica Secundária Orsina da Fonseca. Atualmente chama-se Escola Municipal Orsina da Fonseca.16 -1616 Arruda AMV. Arquitetura dos Edifícios da Escola Pública no Brasil (1870-1930): construindo os espaços para a educação [Internet]. Campo Grande: Universidade Federal do Mato Grosso do Sul; 2010 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: http://www1.udesc.br/arquivos/id_submenu/2317/teseangeloarruda_final.pdf
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um internato público, mantido pela prefeitura, com ótima reputação em termos de qualidade de ensino e rigor na formação geral das estudantes. Com isso, embora público, o colégio era procurado por famílias mais abastadas da cidade. Era um lugar dedicado à formação de meninas de classes sociais menos privilegiadas, visando torná-las “mulheres ideais”, ou seja, com boa educação e preparadas para o casamento, mas também para o trabalho fora de casa. A família de Yvone entendeu que este seria o lugar próprio para sua filha mais velha. Para entrar, era necessário se inscrever e aguardar ser chamada. Foi o que aconteceu com nossa biografada, quando tinha dez anos de idade, permanecendo lá até os seus 17 anos.

Aos 12 anos, a menina negra, órfã de pai e mãe, foi juntamente com seus três irmãos morar com sua tia Maria, irmã de Emerentina, no morro da Serrinha, em Madureira. Passava a semana no internato, convivendo com meninas de toda classe social, e quinzenalmente passava os finais de semana na casa de Tia Maria. Segundo ela mesma, Fiquei emancipada por minha conta mesmo. Minha mãe morreu, ninguém ficou tomando conta de mim. Com a idade de 12 anos, eu que resolvia tudo, me guiava. Foi muito bom, porque me fez ser como sou hoje. Tudo o que fiz a partir daí foi por decisão própria.88 NISE: o coração da loucura. Direção de Roberto Berliner. Rio de Janeiro: Rio-Filme; 2016. (120 min.).:40,1313 Malta PP. Pequenos notáveis [Internet]. Rio de Janeiro: MultiRio; 2012. (Série Televisiva: Textos Complementares; vol. 1) [citado 2021 dez 14]. Disponível em: http://www.multirio.rj.gov.br/media/PDF/pdf_1243.pdf
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Nos finais de semana com a família convivia com os familiares sambistas, tendo inclusive aprendido cavaquinho com seu tio Dionísio Bento da Silva, conhecido como músico de chorinho, e desenvolvido seu talento para a composição de sambas. Porém, na escola também se destacava nas aulas de canto e, com isso, angariava muitos méritos. Participava do orfeão e tinha uma das vozes mais afinadas. As meninas com belas vozes, faziam apresentações na própria escola, mas também fora dela, em eventos na cidade. Era um modo de reconhecimento, assim como uma possibilidade de “reafirmar sua condição, seu status” e seu valor enquanto mulher negra.99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009.,1010 Santos KRC. Dona Ivone Lara: voz e corpo da síncopa do samba [tese]. Georgia: University of Georgia; 2005 [citado 2021 dez 14]. Disponível em https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_katia_c_200505_phd.pdf
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O aprendizado no internato, nas primeiras décadas do século XX, estava direcionado à formação feminina objetivando formar moças prendadas, desenvolvendo aptidões voltadas para as artes domésticas; e para o trabalho, fornecendo as noções básicas para saberem seus deveres enquanto mulheres. A escola submetia suas internas às regras de uma sociedade hierárquica e fechada atuando como aparelho reprodutor de ideologia. Este tipo de sistema educacional permitia o controle total da produção de novos cidadãos, no caso, de novas cidadãs, moças de “boa família”, tornando-se um espaço de produção e difusão não apenas de saber, mas de regras sociais, padrões de comportamento e posicionamentos ideológicos.1717 Alves TVF. A escola como espelho: a trajetória das alunas do Instituto Profissional Orsina da Fonseca (1930-1945) através do arquivo permanente da instituição. Anais do 17º Encontro de História da Anpuh-Rio [Internet]; 2016; Rio de Janeiro. Nova Iguaçu: Instituto Multidisciplinar, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; 2016. p. 1-13 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: http://www.encontro2016.rj.anpuh.org/resources/anais/42/1472492623_ARQUIVO_ArtigoTeresaANPUH2016.pdf
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Nesta conjuntura, o aprendizado no internato para uma menina negra, pobre e órfã, foi essencial para o seu desenvolvimento como pessoa, com valores densos, que influenciariam em muitas de suas decisões futuras. Conforme ela mesma reconhece: “E fui seguindo os regimes do colégio interno, que era bem rígido. E foi ótimo pra mim. Porque se eu fosse criada aqui fora eu não ia ter estudado tanto”.1010 Santos KRC. Dona Ivone Lara: voz e corpo da síncopa do samba [tese]. Georgia: University of Georgia; 2005 [citado 2021 dez 14]. Disponível em https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_katia_c_200505_phd.pdf
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:166 Aos 17 anos, em 1939, Yvonne teve que deixar o internato e foi morar com o seu Tio Dionísio que trabalhava como motorista de ambulância da rede pública de saúde.

Graças a Deus, sempre tivemos um ambiente musical. Tio Dionísio Bento da Silva era muito amigo de Pixinguinha, Jacob do Bandolim... Ele tocava trombone. Era chorão. Quando chegava nos dias de ensaio, a gente assistia ao pessoal cantar, tocar. De vez em quando a gente também fazia parte. Aprendíamos a cantar. Principalmente quando ele estava compondo, ele fazia questão que nós aprendêssemos para ele não esquecer.99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009.:51,1313 Malta PP. Pequenos notáveis [Internet]. Rio de Janeiro: MultiRio; 2012. (Série Televisiva: Textos Complementares; vol. 1) [citado 2021 dez 14]. Disponível em: http://www.multirio.rj.gov.br/media/PDF/pdf_1243.pdf
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:06,1414 Fenske EK. Dona Ivone Lara: a senhora da canção. Templo Cultural Delfos [Internet]. 2022 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: https://www.elfikurten.com.br/2021/02/dona-ivone-lara.html
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O caminho natural esperado em termos de expectativas de futuro para uma jovem cheia de vida, com uma sólida formação escolar aos 17 anos, porém, com parcos recursos financeiros, ademais sendo negra e de família de músicos, era tornar-se dona de casa, empregada doméstica, costureira como sua mãe, ou tinha ainda a opção de trabalhar em uma fábrica.

A condição das mulheres negras no Brasil recebe influência do degradante regime de escravidão, quando a elas se atribuíam sentidos de objeto sexual, reprodutora de mão de obra escrava, ama de leite, entre outros.1818 Saffioti HIB. Gênero, patriarcado, violência. São Paulo: Fundação Perseu Abramo; 2004. Na década de 1930, Yvonne Lara sabia que socialmente recaía sobre ela uma dupla desvantagem, que não seria minimizada por seu talento de compositora. Nas primeiras décadas do século XX, as mulheres musicistas, especialmente dedicadas ao piano, eram respeitadas, contudo, as compositoras tinham que ocultar esse talento ou dispensá-lo para continuar em seu papel de esposa e mãe dedicada. Uma das poucas exceções foi Chiquinha Gonzaga (1847-1935). Após a morte dessa compositora foi registrado um vazio de mulheres na composição só quebrado por Maysa nos anos 1950.1919 Lacerda LD. Compondo o gênero: trajetórias de cantoras-compositoras no Rio de Janeiro. Revista Aspas. 2018;8(1):176-88. http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-3999.v8i1p176-188.
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Assim, os trabalhos reservados para mulheres nos anos 1930 quase não lhes davam opções diferenciadas. Mas, ao nosso ver, Yvonne da Silva Lara, não era uma mulher comum e conformada com a sorte que lhe era destinada, ela acreditava no estudo e no seu direito de fazer escolhas.55 Padilha MI. O cuidar e a arte. Ciência Hoje [Internet]. 2021; [citado 2021 dez 14];374:1-5. Disponível em: https://cienciahoje.org.br/artigo/o-cuidar-e-a-arte/
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Então, como não podia deixar de ser, seu Tio Dionísio chamou a adolescente Yvonne à realidade, se propondo “arrumar um emprego para ela na Fábrica de Tecidos Nova América, em Vila Isabel, onde um de seus primos já estava empregado”.1313 Malta PP. Pequenos notáveis [Internet]. Rio de Janeiro: MultiRio; 2012. (Série Televisiva: Textos Complementares; vol. 1) [citado 2021 dez 14]. Disponível em: http://www.multirio.rj.gov.br/media/PDF/pdf_1243.pdf
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:06 Mais uma vez, os rumos da vida de Yvonne iriam se delinear contra seus anseios. Ela tinha planos maiores que nem mesmo tinha consciência, porém, sabia que não queria trabalhar na Fábrica e, no dia seguinte, leu no Jornal do Brasil o anúncio de um concurso para a Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras da Assistência a Alienados. O curso era gratuito e as alunas receberiam, além do aposento para moradia, alimentação, uniforme e uma gratificação mensal como forma de pagamento pelos serviços prestados no hospital de alienados durante o curso.2020 Decreto nº 17.805, de 23 de maio de 1927 (BR). Approva o regulamento para execução dos serviços da Assistencia a Psychopathas no Districto Federal. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 1 jun 1927.

“O curso de Enfermagem era o único de graça, então escolhi, não tive muita opção” (...). “Meu tio repetiu que, se eu não passasse, faria qualquer outra coisa.” Yvonne passou em terceiro lugar – posição que ainda lhe deu direito a uma ajuda de custo de 90 mil-réis (“Muito dinheiro!”). “Eu dava tudo o que recebia para a minha tia, que comprava meus sapatos, e cobria as despesas da casa”.99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009.:48,1414 Fenske EK. Dona Ivone Lara: a senhora da canção. Templo Cultural Delfos [Internet]. 2022 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: https://www.elfikurten.com.br/2021/02/dona-ivone-lara.html
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Infere-se que Dona Yvonne Lara já havia vivenciado o sistema do Internato no ensino médio. Portanto, não seria difícil adaptar-se às regras, num ambiente que lhe garantiria a formação profissional de Enfermeira para atuação no mercado de trabalho, com um pouco mais de distinção tanto no status social quanto financeiro (seria remunerada como profissional). Ademais, destaca-se que Dona Yvonne garantiu a sua autossuficiência pela bolsa de estudos conquistada.

A partir de 1931, o Brasil passou a reconhecer a Enfermeira diplomada como uma profissional respeitável, uma vez que o governo federal estabeleceu critérios para o funcionamento das escolas de enfermagem que deveriam aceitar somente mulheres e funcionar em regime de internato. Assim, estudar enfermagem passou a ser uma opção para moças de boa família que desejavam ingressar no mercado de trabalho.2020 Decreto nº 17.805, de 23 de maio de 1927 (BR). Approva o regulamento para execução dos serviços da Assistencia a Psychopathas no Districto Federal. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 1 jun 1927.,2121 Santos TCF, Barreira IA. A mulher e a enfermeira na nova ordem social do Estado Novo. Texto Contexto Enferm. 2008;17(3):587-93. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072008000300021.
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A construção pessoal e a Enfermagem como uma contingência

A decisão por cursar enfermagem tinha um outro fator importante. Em entrevista, Yvonne Lara informou que várias pessoas de sua família também eram enfermeiras:

Muita gente fazia enfermagem. Eu mesma trabalhei com uma porção de pessoas do meio do samba nos hospitais. O pessoal que morava na zona norte, que não tinha muito dinheiro, via nisso a chance de mudar de vida. Trabalhei com a mãe do Paulinho da Viola, mulher de seu Paulo Faria, que já era reconhecido como músico. Mas ela mantinha o seu emprego estável. Era importante e mais seguro ter alguém com salário fixo.99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009.:49,1010 Santos KRC. Dona Ivone Lara: voz e corpo da síncopa do samba [tese]. Georgia: University of Georgia; 2005 [citado 2021 dez 14]. Disponível em https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_katia_c_200505_phd.pdf
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A Escola de Enfermagem Alfredo Pinto (EEAP), foi a primeira escola de enfermagem do Brasil, fundada em 1890, no Rio de Janeiro. Denominada então de Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras, foi criada pelo decreto nº 791 de 27/09/1890, junto à Assistência Médico-Legal à Alienados. O conteúdo do curso, dirigido por médicos, era voltado para o cuidado aos doentes alienados. Em 1921, os antigos requisitos estabelecidos desde a criação da escola se mantiveram os mesmos na esfera da Assistência a Psicopatas do Distrito Federal, criada em 1927, de forma que os psiquiatras mantiveram as posições de poder administrativo e pedagógico no espaço da Escola.2222 Bessa MN, Amorim WM. Aspectos da formação Profissional na escola de enfermagem Alfredo Pinto (1943-1949). Esc Anna Nery. 2006;10(1):64-74. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452006000100008.
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Esta condição muda apenas em 1942, quando a Escola passa a chamar-se Escola de Enfermeiros Alfredo Pinto (E.E.A.P.), pelo Decreto-lei n. 4725/1942 e mais precisamente em 1943, quando assume a direção, pela primeira vez, uma Enfermeira, Maria de Castro Pamphiro (gestão 1943-1956), iniciando uma reforma no currículo, visando atender2323 Porto F, Luchesi LB. Primeira república: a implantação da enfermagem laica e seus desdobramentos (1889-1930). Parte A: primeiras iniciativas para a formação de enfermeiras e enfermeiros no Brasil. In: Padilha MI, Borenstein M, Santos I, Bellaguarda MLR. Enfermagem: história de uma profissão. 3ª ed. São Caetano do Sul: Difusão; 2020. aos preceitos vigentes desde 1931, pelo Decreto n. 20.109, o qual definia que a partir daquele momento, todas as escolas deveriam se adequar ao padrão Anna Nery.2424 Santos FBO, Carregal FAS, Schreck RSC, Marques RC, Peres MAA. Padrão Anna Nery e perfis profissionais de enfermagem possíveis para enfermeiras e enfermeiros no Brasil. Hist Enferm Rev Eletrônica [Internet]. 2020; [citado 2021 dez 14];11(1):10-21. Disponível em: http://here.abennacional.org.br/here/v11/n1/a1.pdf
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Um dos requisitos para as escolas se adequarem ao padrão Anna Nery era que a diretora da Escola fosse uma Enfermeira diplomada, com curso de aperfeiçoamento experiência de ensino e administração em instituições similares. Essa condição muda apenas em 1949, com a promulgação da lei n. 775/1949, a qual regulamenta o ensino de enfermagem no Brasil.2525 Pava AM, Neves EB. A arte de ensinar enfermagem: uma história de sucesso. Rev Bras Enferm. 2011;64(1):145-51. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672011000100021. PMid:21468502.
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A formação na Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras da Assistência a Alienados era focada na assistência psiquiátrica. As condições básicas para a matrícula, pelo Decreto nº 17.805, de 23 de maio de 1927, que norteavam a Escola cursada por Yvonne, eram: ter mais de 19 anos de idade; possuir instrução, ao menos elementar; ser vacinado, não sofrer de doença contagiosa e ter saúde regular e; apresentar atestado de bons costumes. Como já comentado, nossa biografada, tinha 17 anos quando iniciou o curso, e não os 19 exigidos no decreto. Porém, o parágrafo únicoe e Parágrafo único. Na falta de documentos especiais ou outros idôneos (escolares ou colegiais), referentes a habilitação dos candidatos, a qual convém corresponda, mais ou menos, á adquirida nos cursos completos das Escolas Públicas, deverá ser efetuado no exame de suficiência.20 relativo às matrículas deve ter sido levado em conta no momento de sua inscrição, considerando que ela advinha da Escola Orsina da Fonseca, reconhecida pelo alto padrão em termos de qualidade de ensino. Isso fez com que fosse aceita na escola de enfermagem, apesar de não atender às condições de idade indicadas no decreto. Cursar enfermagem nos anos 1930, para uma pessoa como Yvonne Lara, cujas características de mulher, negra e pobre pesavam desfavoravelmente na sociedade, significava muito mais do que “a única opção por ser um curso gratuito”. Era uma possibilidade real de crescimento econômico e social, de conquistar um emprego seguro, estável e, mais lucrativo do que o da maior parte de seu círculo familiar e social, que sobreviviam com muitas dificuldades financeiras.8 Outro aspecto a ser ressaltado é de que a gratuidade do curso e os benefícios oferecidos aos estudantes, provavelmente eram decorrentes do pouco interesse de candidatos para atuar em hospitais psiquiátricos, e, a aceitação destas condições deviam se dar na sua maioria por pessoas na mesma situação de Yvonne. O curso de enfermagem era ministrado em dois anos e as alunas, ao final desse período, faziam mais um ano de formação como Visitadoras Sociais. As matérias que compunham o currículo do curso teórico-prático eram muito mais práticas do que teóricas. As aulas práticas eram ministradas em duas Seções do Hospício Nacional de Alienados (HNA), uma mista, localizada na Sede, na Praia Vermelha, e uma feminina, que ficava na Colônia Gustavo Riedel, no bairro do Engenho de Dentro. As matérias eram as seguintes:

Primeiro anno: 1) Noções geraes de sciencias physicas e naturaes. 2) Noções geraes de anatomia e physiologia. 3) Noções geraes de hygiene e pathologia; enfermagem elementar. 4) Administração e organização sanitarias, ethica enfermeiral. Segundo anno: 5) Noções práticas de propedeutica clínica e pharmacia. 6) Technica therapeutica geral e especializada, dietetica, enfermagem médica. 7) Noções práticas de pequena cirurgia, gynecologia e obstetricia, enfermagem cirurgica. 8) Noções de medicina social, serviços de assistencia medico-social.2020 Decreto nº 17.805, de 23 de maio de 1927 (BR). Approva o regulamento para execução dos serviços da Assistencia a Psychopathas no Districto Federal. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 1 jun 1927.

O curso era ministrado pelos médicos psiquiatras do hospício, ou outro professor designado pelo diretor da escola. Após os dois anos de curso, as estudantes recebiam o diploma de enfermeiras e iniciavam o curso de visitadoras sociais, com mais um ano de duração. O curso de visitadoras sociais era composto das seguintes matérias, consideradas “indispensáveis” à educação médico-social das enfermeiras: “9) Hygiene social. 10) Puericultura. 11) Organização da vida social: legislação social e leis de assistencia. 12) Diagnostico, prophylaxia e therapeutica das doenças socies. 13) Noções geraes de psychologia”.2020 Decreto nº 17.805, de 23 de maio de 1927 (BR). Approva o regulamento para execução dos serviços da Assistencia a Psychopathas no Districto Federal. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 1 jun 1927. Importante ressaltar que o curso de visitadoras sociais não era para todas as estudantes, mas sim para aquelas enfermeiras escolhidas entre as melhores da turma, em termos de instrução, educação, equilíbrio emocional, moral e social. O curso também era realizado na seção mista do HNA ou na feminina da Colônia Gustavo Riedel. Era considerado como uma especialização à formação de Enfermeira.

Com isso, percebe-se que a inserção de Yvonne Lara no curso de enfermagem havia tido um destaque especial, e que ela estava devidamente preparada para o curso de visitadora social, e, portanto, para atuar na enfermagem psiquiátrica. Sua formação no Internato mostrava a qualidade de sua formação mais completa que outras candidatas. Durante o curso, já atuava como plantonista na emergência da Colônia Gustavo Riedel, que em 1940, mudaria a denominação para Centro Psiquiátrico Nacional. Nas suas palavras,

“Quando eu me formei [enfermeira], tive a felicidade também de ficar bem colocada e aí fui admitida no Serviço Nacional de Doenças Mentais. Quer dizer, a minha opção foi essa [Enfermagem] por causa disso [questões financeiras]. Eu não tinha dinheiro para continuar fazendo outras coisas aqui fora, ou escolher o que eu quisesse.1010 Santos KRC. Dona Ivone Lara: voz e corpo da síncopa do samba [tese]. Georgia: University of Georgia; 2005 [citado 2021 dez 14]. Disponível em https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_katia_c_200505_phd.pdf
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:161,1414 Fenske EK. Dona Ivone Lara: a senhora da canção. Templo Cultural Delfos [Internet]. 2022 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: https://www.elfikurten.com.br/2021/02/dona-ivone-lara.html
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Entende-se que o trabalho de Enfermeira no hospício naquela época se resumia a cumprir prescrições manter os doentes alimentados e limpos e não interferir ou contestar as decisões médicas. Ou seja, um trabalho restrito, limitado, que não permitia uma atenção integral aos doentes internados, nem tampouco uma ação mais efetiva relacionada aos familiares.2626 Peneiras EM, Silva Jr OC. Semelhanças e diferenças entre as enfermeiras de Saúde Pública e as enfermeiras visitadoras sociais, no Rio de Janeiro em meados do século XX (1927-1943). R Pesq Cuid Fundam Online. 2010;2(Supl.):466-9. http://dx.doi.org/10.9789/2175-5361.2010.v0i0.%25p.
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,2727 Cunha AP, Silva Jr OC, Silva LCS. The performance of the social visiting nurse as a monitor of mental hygiene (1927-1942). R Pesq Cuid Fundam Online. 2013;5(3):318-27. http://dx.doi.org/10.9789/2175-5361.2013.v5i3.318-327.
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Diferente disso, a enfermeira visitadora social deveria estender seu cuidado para além do ambiente hospitalar, atendendo os doentes e seus familiares no hospital, nos domicílios e na comunidade. A criação do Curso de Enfermeiras Visitadoras Sociais na Escola de Enfermeiras e Enfermeiros de Assistência aos Alienados, deu-se pela estrutura na qual se encontrava desde a sua criação em 1890. Sob o comando dos médicos psiquiatras, era considerado um instrumento de consolidação do poder médico na sociedade brasileira, no hospital psiquiátrico, espaço de construção de saber e poder. Esperavam que o curso de especialização em Visitadora Social fortalecesse e ampliasse o trabalho da enfermeira, do ponto de vista de atenção à saúde pública, considerando que, na época, o curso de Serviço Social era inexistente.2626 Peneiras EM, Silva Jr OC. Semelhanças e diferenças entre as enfermeiras de Saúde Pública e as enfermeiras visitadoras sociais, no Rio de Janeiro em meados do século XX (1927-1943). R Pesq Cuid Fundam Online. 2010;2(Supl.):466-9. http://dx.doi.org/10.9789/2175-5361.2010.v0i0.%25p.
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,2727 Cunha AP, Silva Jr OC, Silva LCS. The performance of the social visiting nurse as a monitor of mental hygiene (1927-1942). R Pesq Cuid Fundam Online. 2013;5(3):318-27. http://dx.doi.org/10.9789/2175-5361.2013.v5i3.318-327.
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Gustavo Riedel, psiquiatra, criador do ambulatório Rivadávia Corrêa e da Liga Brasileira de Higiene Mental, definiu que nos serviços do Ambulatório de Psiquiatria da Colônia, as visitadoras deveriam ser intituladas de monitoras de higiene mental. Eram parte do serviço social, ainda como ocupação, e não uma profissão, fundamentado na atividade médica e filantrópica simultaneamente, tendo como atividade central, a prática de visita domiciliar, visando a aproximação ao meio social, econômico e moral do doente.2727 Cunha AP, Silva Jr OC, Silva LCS. The performance of the social visiting nurse as a monitor of mental hygiene (1927-1942). R Pesq Cuid Fundam Online. 2013;5(3):318-27. http://dx.doi.org/10.9789/2175-5361.2013.v5i3.318-327.
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A higiene mental pregava a prevenção da doença mental realizada fora da internação psiquiátrica, por equipe multiprofissional capacitada, o que levou enfermeiras a um trabalho mais voltado para o cuidado educativo-preventivo em ambulatórios e domicílios.2828 Pereira MM, Padilha MI, Oliveira AB, Santos TCF, Almeida Fo AJ, Peres MAA. Discourses on the nursing and psychiatric nurse models, published in the Annals of Nursing (1933-1951). Rev Gaúcha Enferm. 2014;35(2):47-52. http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2014.02.25736. PMid:25158460.
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Nos intervalos e nas férias do trabalho, que considerava essencial para sua sobrevivência, Yvonne se dedicava a suas maiores paixões, o canto, a composição e as escolas de samba. Ao comentar sobre a diferença do trabalho da Enfermeira diplomada e da visitadora social, ela refere:

(...) a visitadora social não é supervisora, ela já não trabalha diretamente com o médico. Ela trabalha, sim, em prol do doente, atendendo as necessidades do doente, e da família do doente. Agora, sendo que depois, com o Serviço Social, ele se expandiu mais, a gente fez mais coisas, foi aonde eu tive que fazer a pós-graduação que era para poder ter outros conhecimentos e fazer jus ao meu diploma de assistente social. Quando eu terminei o curso, o meu diretor me chamou e perguntou, “Como é Dona Yvone, você quer continuar como enfermeira, ou você quer ser transferida para a carreira de Assistente Social?”. Eu já estava toda influenciada como Assistente Social, então eu quis ser Assistente Social. Eu já não dava plantão, e essas coisas todas, e como enfermeira eu dei muito plantão. Eu trabalhava só à noite.1010 Santos KRC. Dona Ivone Lara: voz e corpo da síncopa do samba [tese]. Georgia: University of Georgia; 2005 [citado 2021 dez 14]. Disponível em https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_katia_c_200505_phd.pdf
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Como pode ser observado na construção profissional de Yvonne Lara, a sua atuação como enfermeira e posteriormente, como visitadora social, ampliou seu espaço de independência dos médicos no cotidiano de sua prática, o que remetia aos anseios profissionais de enfermeiros da época por autonomia. E, de certo modo, o trabalho como visitadora social já se aproximava muito mais do que seria configurado como prática de uma assistente social. Além disso, uma enfermeira titulada na Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras da Assistência a Alienados, no período em que essa Escola era dirigida e instruída por médicos psiquiatras, concorria no mercado de trabalho com Enfermeiras formadas no padrão Anna Nery, que se difundiam pelo Brasil ocupando, em maioria, os melhores postos de trabalho.

Yvonne Lara, na condição de uma mulher jovem, negra e pobre, sem autonomia de decisão nos espaços do hospital, viu a possibilidade de uma mudança de profissão, considerando condições que lhe dariam mais status, mais liberdade, mais flexibilidade de carga horária e talvez, uma melhor colocação no mercado, o que lhe renderia um salário melhor. Como é sabido, a profissão de Enfermeira tem como uma de suas características longas jornadas de trabalho, que incluem plantões diurnos, noturnos e, na época, de 24 horas, inclusive em feriados e finais de semana, e Yvonne Lara já tinha a experiência de ser uma Enfermeira de plantão noturno, o que certamente influenciou a sua decisão em estudar Serviço Social.

O Serviço Social como escolha

O ritmo da vida levou Yvonne Lara a outra fase profissional, a de Assistente Social. Ainda não existia no Brasil, no estrito sentido da palavra, o curso de Serviço Social. Ela dizia: “agora, depois de oito anos, surgiu o Serviço Social, que antes era Visitadora Social. Era obrigatório. Quem fizesse Enfermagem logo a seguir fazia Visitadora Social. Eu estava fazendo Visitadora Social quando surgiu a Assistência Social.1010 Santos KRC. Dona Ivone Lara: voz e corpo da síncopa do samba [tese]. Georgia: University of Georgia; 2005 [citado 2021 dez 14]. Disponível em https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_katia_c_200505_phd.pdf
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:162,1414 Fenske EK. Dona Ivone Lara: a senhora da canção. Templo Cultural Delfos [Internet]. 2022 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: https://www.elfikurten.com.br/2021/02/dona-ivone-lara.html
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O primeiro curso de serviço social do Brasil foi criado na cidade do Rio de Janeiro em 1937, vinculado ao curso de Enfermagem da Escola Ana Néri (EAN), por ocasião de sua incorporação à Universidade do Brasil (UB) na condição de instituição complementar de ensino.2929 Peres MAA, Aperibense PGGS, Bellaguarda MLR, Almeida DB, Santos FBO, Luchesi LB. Reconhecimento à Anna Justina Ferreira Nery: mulher e personalidade da história da enfermagem. Esc Anna Nery. 2021;25(2):e20200207. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2020-0207.
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Institucionalizado como uma “profissão feminina”, teve sua gênese no bojo do movimento feminista liderado por mulheres de classes sociais privilegiadas, como Bertha Lutz e a Deputada Carlota Pereira de Queiroz, autora da emenda número 1 do projeto de Lei 595/1936 de reestruturação da UB que definia especificava a Escola Anna Nery, destinada ao ensino de Enfermagem e de Serviço Social.3030 Pereira LD. Escola de Serviço Social da Universidade do Brasil: um breve resgate de sua história. In: Universidade Federal do Rio de Janeiro. Curso de Serviço Social na UFRJ: 70 anos de história. Rio de Janeiro: UFRJ; 2007. O curso tinha por objetivo “preparar agentes sociais para ensinar com eficiência e individualmente a arte de viver física, moral e economicamente”. Para isto, além dos conteúdos específicos, focava no estudo das causas morais, sofridas pelos indivíduos, de modo a conduzi-los ao retorno à sociedade, para uma vida adequada, independente; contribuindo para a melhoria nas condições materiais e morais; além de trabalhar em conjunto com as instituições de caridade e outros estabelecimentos de auxílio aos necessitados.2727 Cunha AP, Silva Jr OC, Silva LCS. The performance of the social visiting nurse as a monitor of mental hygiene (1927-1942). R Pesq Cuid Fundam Online. 2013;5(3):318-27. http://dx.doi.org/10.9789/2175-5361.2013.v5i3.318-327.
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,3131 Aperibense PGGS, Barreira IA. Connections among Nursing, Nutrition and Social Work, pioneering female careers in the heathcare area. Rev Esc Enferm. 2008;42(3):472-9. https://doi.org/10.1590/S0080-62342008000300009.
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32 Machado GS. Serviço social, formação brasileira & questão social: na cadência do pionerismo carioca [tese]. Rio de Janeiro: Escola de Serviço Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2015.

33 Mizoguchi JF, Closs TT, Machado GS, Zacarias IR. Pioneiras do Serviço Social: um estudo de perfil a partir das relações de gênero. Serv. Soc. Rev. 2021;24(1):290-310. http://dx.doi.org/10.5433/1679-4842.2021v24n1p290.
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-3434 Scheffer G. Serviço Social e Dona Ivone Lara: o lado negro e laico da nossa história profissional. Serv Soc Soc. 2016;127(127):476-95. http://dx.doi.org/10.1590/0101-6628.081.
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A Escola Anna Neryf f Sobre a origem do nome, consultar Peres et al.29 era padrão de ensino de enfermagem no país, e sua infraestrutura, cujo Pavilhão de Aulas e Internato tinham condições de receber estudantes de ambos os cursos.2929 Peres MAA, Aperibense PGGS, Bellaguarda MLR, Almeida DB, Santos FBO, Luchesi LB. Reconhecimento à Anna Justina Ferreira Nery: mulher e personalidade da história da enfermagem. Esc Anna Nery. 2021;25(2):e20200207. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2020-0207.
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As alunas de Serviço Social conviviam lado a lado com as alunas e professoras de enfermagem. Provavelmente, algumas professoras do Curso de Serviço Social eram enfermeiras, inclusive porque, conforme explicitado pela então diretora à época, Dona Laís Netto dos Reys, os currículos tinham em comum as matérias Higiene Mental e Psiquiatria.3535 Aperibense PGGSA. A Escola Anna Nery e a formação de enfermeiras, assistentes sociais e nutricionistas na Universidade do Brasil nos anos 30/40 do século XX [dissertação]. Rio de Janeiro: Escola de Enfermagem Anna Nery, Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2009 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: http://objdig.ufrj.br/51/dissert/EEAN_M_PacitaGeovanaGamaDeSousaAperibense.pdf
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Yvonne Lara sabia que para poder atender seus doentes na totalidade, precisava aprimorar a sua formação. Assim, cursou a Graduação em Serviço Social na Escola Ana Neri, no período de 1945 a 1947. A partir daí, foi admitida no Serviço Nacional de Doenças Mentais, sendo lotada no Centro Psiquiátrico Nacional D. Pedro II, no Engenho de Dentro (antigo local da Colônia Gustavo Riedel), onde permaneceu trabalhando, primeiro como Enfermeira Visitadora Social, depois como Assistente Social, até se aposentar, em 1977.3232 Machado GS. Serviço social, formação brasileira & questão social: na cadência do pionerismo carioca [tese]. Rio de Janeiro: Escola de Serviço Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2015.,3434 Scheffer G. Serviço Social e Dona Ivone Lara: o lado negro e laico da nossa história profissional. Serv Soc Soc. 2016;127(127):476-95. http://dx.doi.org/10.1590/0101-6628.081.
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A partir daí, passou a se dedicar inteiramente a sua grande paixão, a música, mais especificamente ao samba. Seu trabalho como Enfermeira, ampliou-se com a graduação em Serviço Social, como profissões convergentes para o bem-estar das pessoas.

Entre os autores que estudam a trajetória artística e profissional de Yvonne Lara, a opinião é unânime: ela teve uma participação importante na reforma psiquiátrica proposta pela Dra. Nise da Silveira, na qual a terapêutica ocupacional assume um lugar de destaque no cuidado e no tratamento do paciente psiquiátrico. Quando começou a trabalhar com Nise da Silveira no Centro Psiquiátrico Nacional, acompanhou a implantação de atividades criativas e inovadoras para a expressão artística do doente, como pintura, desenho, cerâmica, e outros tipos de atividades que o possibilitasse se perceber como indivíduo, Ser Humano, se expressando como tal, em um processo terapêutico. Como não poderia deixar de ser para uma mulher com a veia artística aflorada, Yvonne Lara introduziu a música como parte desse tratamento, e criou uma oficina de música e realizar apresentações nas festas, e todo tipo de celebração social entre os pacientes, seus familiares e os funcionários da instituição. “Nesses dias especiais, a gente organizava alguns internos que queriam se apresentar, dançar, cantar, e eram essas atividades mais estimulantes pelo método da doutora Nise, que começava ser posto em prática”.99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009.:87,13

Assim, o talento musical de Yvonne Lara passa a servir aos cuidados por ela prestados. Vale comentar que no filme “Nise – o coração da loucura”, este lado seminal da personalidade de Yvonne Lara foi deixado completamente de lado, mostrando apenas uma “enfermeira” ou “assistente social” (as aspas indicam a não clareza de como a personagem é apresentada ao público), cumpridora das ordens médicas de Nise da Silveira, nada criativa ou pró-ativa, como era a personalidade da mulher aqui retratada, e como exigia as profissões que tinha. Em que pese o interesse do diretor do filme em ressaltar a forte personalidade de Nise da Silveira, não se justifica esta exclusão do papel de Dona Ivone Lara (nome artístico) na utilização da música como mais uma expressão artística no rol das terapias ocupacionais implantadas pelo serviço coordenado por Nise da Silveira. Falando ainda de sua experiência com a Psiquiatra Nise da Silveira ou como ela a chamava: Dra. Nise, Yvonne Lara vivenciou no dia a dia, o poder da música como processo curativo.

Trabalhando com a Dra. Nise eu tive a oportunidade de descobrir muito músico doente mental, catatônico, esquizofrênico... Gente que não tinha qualquer contato com o mundo, mas que, quando via um instrumento, volta e meia contava uma história ligada à música: pertenci a tal banda, toquei em orquestra... Todo aniversário do hospital tinha festa e os músicos éramos todos nós: enfermeiros e doentes.” “Tinha o Ribamar, que era catatônico. Vivia lá, esquecido pela família, quase sem falar. Um dia, estávamos ouvindo uma outra doente tocar piano e comecei a cantar. Ele prestou atenção e ficou admirando... Até que me disse que era músico. Depois, vim a saber que tinha sido clarinetista da Orquestra Tabajara. E passou a tocar nas festas do hospital. Melhorou de um dia para o outro. Fui à casa dele conversar com os familiares, que passaram a visitá-lo. E ele ficou curado. Dali a um tempo, saiu de lá bonzinho!”99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009.:58,1313 Malta PP. Pequenos notáveis [Internet]. Rio de Janeiro: MultiRio; 2012. (Série Televisiva: Textos Complementares; vol. 1) [citado 2021 dez 14]. Disponível em: http://www.multirio.rj.gov.br/media/PDF/pdf_1243.pdf
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Nise da Silveira, com quem Yvonne compartilhava as ideias de cuidados em saúde mental acreditava que o papel da psiquiatria era mais importante ainda com os egressos do hospital, que precisavam de um local de acolhimento e reabilitação, que favorecesse a sua saúde mental, com atividades lúdicas, interativas e criativas saudáveis, que os tirassem do aprisionamento de suas mentes.3636 Câmara FP. História da psiquiatria: vida e obra de Nise da Silveira. Psychiatry on line Brasil [Internet]. 2002; [citado 2021 dez 14];7(9). Disponível em: http://www.polbr.med.br/ano02/wal0902.php
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Cabe ainda destacar que Yvonne Lara se coloca como Enfermeira em seu discurso, o que mostra a identidade profissional introjetada em sua personalidade, mesmo após tornar-se Assistente Social.

Antes de finalizar, entendemos ser importante comentar sobre o nome artístico assumido aos quase 50 anos de idade, de “Dona Ivone Lara”. A história também é contada por Burns,88 NISE: o coração da loucura. Direção de Roberto Berliner. Rio de Janeiro: Rio-Filme; 2016. (120 min.). e passamos a relatar, embora o foco do texto não seja a sua carreira artística. Em 1970, quando ainda trabalhava como Assistente Social e dividia seu tempo entre o hospital e a música, fazendo parcerias importantes na carreira de sambista. Ela passou a se apresentar com Clementina de Jesus e Roberto Ribeiro na casa de espetáculos de Oswaldo Sargentelli, chamada “Sambão 70”, onde a procura pelos shows tornou-se cada vez maior. Sargentelli e o produtor Adelzon Alves resolveram fazer um disco long play (LP) reunindo esses grandes nomes do samba e, na composição do disco, os dois a chamaram e disseram: “de hoje em diante, seu nome vai ser Dona Ivone Lara”. Nome artístico, forte!

Cabe comentar que no cotidiano da Escola Anna Nery, desde a década de 1920 até 1960, todas as alunas e professoras eram chamadas de Dona. Termo respeitoso e impunha um distanciamento profissional entre os grupos. Qualquer dicionário da língua portuguesa menciona Dona como um tratamento dispensado a senhoras casadas ou de certa condição social, o que se observa no segundo nome da escola onde Dona Yvonne Lara estudou serviço social: Escola de Enfermeiras Dona Anna Nery. Portanto, entendemos que o prenome Dona, já existia no período da formação e trabalho de Yvonne Lara como Enfermeira e Assistente Social, como mencionado por ela mesma ao lembrar de quando foi consultada pelo diretor do hospital para decidir em qual dessas profissões permaneceria trabalhando, após formar-se Assistente Social – “Como é, Dona Yvonne […]”.1010 Santos KRC. Dona Ivone Lara: voz e corpo da síncopa do samba [tese]. Georgia: University of Georgia; 2005 [citado 2021 dez 14]. Disponível em https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_katia_c_200505_phd.pdf
https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_ka...
:162 A principal afirmação que podemos deixar sobre o tema é que Dona Yvonne Lara é o nome de uma grande mulher negra, com o qual ela se fez ver e conhecer em suas lutas pela igualdade e liberdade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A trajetória de Yvonne Lara/Dona Ivone Lara nos surpreende a cada dia e muitas histórias ela teria para contar de sua vida como Enfermeira, Assistente Social, Compositora e Cantora, todas em uma mulher negra, que superou os preconceitos da época para as moças que queriam estudar e que reprimiu seu maior dom porque mulheres respeitáveis não eram compositoras. Ela não cedeu às imposições sociais e, a partir dos 12 anos de idade, começou a construir seu magnífico repertório musical, mesmo sem poder assinar suas composições. Driblou situações como a pobreza e a morte precoce dos pais e conquistou profissões importantes em sua época, pelas quais mulheres fortes e desbravadoras lutaram a fim de oferecer a outras mulheres carreira e independência financeira.

No que diz respeito a sua educação e formação profissional, destaca-se sua primazia pela oportunidade de estudos, aproveitando ao máximo as oportunidades a ela apresentadas, inclusive mudando de carreira. Dona Yvonne Lara abraçou a profissão de Enfermeira, depois de Assistente Social, mantendo a musicalidade em sua vida, colaborando inclusive com o uso da música como atividade terapêutica em psiquiatria. Seu sonho de ser artista começa a se realizar quando grava seu primeiro disco solo, após se aposentar, aos 56 anos. Contudo, sua luta continuou por respeito e espaço no ambiente de trabalho, reinando até os 97 anos de idade, bela, maravilhosa, engraçada, sorridente, com sua voz retumbante encantando a todos até os últimos dias de sua vida, com versos que nos trazem tanta emoção e poesia: na sua canção “[…] fazer a dança das flores no meu pensamento traz a pureza de um samba, sentido, marcado de mágoas de amor, samba que mexe o corpo da gente, o vento vadio embalando a flor, sonho meu”1414 Fenske EK. Dona Ivone Lara: a senhora da canção. Templo Cultural Delfos [Internet]. 2022 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: https://www.elfikurten.com.br/2021/02/dona-ivone-lara.html
https://www.elfikurten.com.br/2021/02/do...
.

Como limitações deste estudo, entendemos que o uso de fontes secundárias resultantes de Teses, Dissertações e outros arquivos, podem interferir na interpretação das informações. Além disso, o fato de não podermos realizar a entrevista com Dona Yvonne Lara pessoalmente, prejudicou a totalidade das informações sobre sua experiência como Enfermeira.

  • a
    O artigo é decorrente da trajetória das autoras com as temáticas da história da enfermagem e de tudo o que se refere a ela. Neste caso em especial, apresentar os aspectos relativos a história de uma cantora e compositora brasileira, Dona Ivone Lara, em sua trajetória como Enfermeira. Trata-se de uma narrativa quase inédita na enfermagem, considerando que este é o primeiro manuscrito a apresentar este aspecto da vida desta personagem, com tal aprofundamento.
  • b
    NISE – O coração da loucura.88 NISE: o coração da loucura. Direção de Roberto Berliner. Rio de Janeiro: Rio-Filme; 2016. (120 min.).
  • c
    Alguns verbatins relativos as entrevistas concedidas por Yvonne Lara99 Burns M. Nasci para sonhar e cantar: Dona Ivone Lara, a mulher no samba. Rio de Janeiro: Record; 2009.,1010 Santos KRC. Dona Ivone Lara: voz e corpo da síncopa do samba [tese]. Georgia: University of Georgia; 2005 [citado 2021 dez 14]. Disponível em https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_katia_c_200505_phd.pdf
    https://getd.libs.uga.edu/pdfs/santos_ka...
    foram encontrados também no Repositório Digital de conteúdos culturais, educacionais, artísticos e científicos.1414 Fenske EK. Dona Ivone Lara: a senhora da canção. Templo Cultural Delfos [Internet]. 2022 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: https://www.elfikurten.com.br/2021/02/dona-ivone-lara.html
    https://www.elfikurten.com.br/2021/02/do...
  • d
    Foi Inaugurada em 1877, construída com recursos públicos e privados. A partir de 1901, passa a abrigar o Instituto Profissional Feminino. Em 1912, muda o nome para Escola Orsina da Fonseca, em homenagem à esposa do Pres. Hermes da Fonseca, por seu apoio ao Instituto. Em 1933, na gestão de Anísio Teixeira, passa a se chamar Escola Técnica Secundária Orsina da Fonseca. Atualmente chama-se Escola Municipal Orsina da Fonseca.1616 Arruda AMV. Arquitetura dos Edifícios da Escola Pública no Brasil (1870-1930): construindo os espaços para a educação [Internet]. Campo Grande: Universidade Federal do Mato Grosso do Sul; 2010 [citado 2021 dez 14]. Disponível em: http://www1.udesc.br/arquivos/id_submenu/2317/teseangeloarruda_final.pdf
    http://www1.udesc.br/arquivos/id_submenu...
  • e
    Parágrafo único. Na falta de documentos especiais ou outros idôneos (escolares ou colegiais), referentes a habilitação dos candidatos, a qual convém corresponda, mais ou menos, á adquirida nos cursos completos das Escolas Públicas, deverá ser efetuado no exame de suficiência.2020 Decreto nº 17.805, de 23 de maio de 1927 (BR). Approva o regulamento para execução dos serviços da Assistencia a Psychopathas no Districto Federal. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 1 jun 1927.
  • f
    Sobre a origem do nome, consultar Peres et al.2929 Peres MAA, Aperibense PGGS, Bellaguarda MLR, Almeida DB, Santos FBO, Luchesi LB. Reconhecimento à Anna Justina Ferreira Nery: mulher e personalidade da história da enfermagem. Esc Anna Nery. 2021;25(2):e20200207. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2020-0207.
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Editado por

EDITOR ASSOCIADO

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EDITOR CIENTÍFICO

Ivone Evangelista Cabral 0000-0002-1522-9516

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    14 Dez 2021
  • Aceito
    22 Mar 2022
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