Teoria de médio alcance do risco de volume de líquidos excessivo

Teoría de rango medio del riesgo de un volumen de líquido excesivo

RESUMO

Objetivo

construir uma teoria de médio alcance para o desenvolvimento da proposição diagnóstica risco de volume de líquidos excessivo em pacientes em hemodiálise.

Método

trata-se de um estudo metodológico, desenvolvido para a validade teórico-causal de um diagnóstico de enfermagem. O estudo foi realizado em quatro etapas: seleção dos estudos, identificação dos conceitos principais da teoria, construção do pictograma e elaboração das proposições. Essas etapas foram operacionalizadas por meio de uma revisão integrativa da literatura, com uma amostra de 82 artigos selecionados nas bases de dados Web of Science, PubMed, CINAHL, Scopus e Science Direct.

Resultados

os dados extraídos dos artigos da amostra possibilitaram a identificação de cinco termos essenciais para a definição do risco de volume de líquidos excessivo. Além disso, foram identificados 31 fatores etiológicos do risco de volume de líquidos excessivo, além de construídos um pictograma e 12 proposições.

Conclusão e implicações para a prática

a construção de uma teoria de médio alcance voltada para o risco de volume de líquidos excessivo em pacientes em hemodiálise refina as terminologias e amplia a compreensão dos fenômenos da enfermagem. Assim, os dados desta pesquisa fornecerão conhecimentos claros e robustos para a condução das ações do enfermeiro na prática clínica.

Palavras-chave:
Adulto; Diálise Renal; Enfermagem; Líquidos Corporais; Teoria de Enfermagem

RESUMEN

Objetivo

construir una teoría de rango medio para el desarrollo de la propuesta diagnóstica del riesgo de volumen excesivo de líquidos en pacientes en hemodiálisis.

Método

se trata de un estudio metodológico, desarrollado para la validez teórico-causal de un diagnóstico de enfermería. El estudio se realizó en cuatro etapas: selección de estudios, identificación de los principales conceptos de la teoría, construcción del pictograma y elaboración de proposiciones. Estos pasos se pusieron en práctica a través de una revisión integradora de la literatura, con una muestra de 82 artículos seleccionados de las bases de datos Web of Science, PubMed, CINAHL, Scopus y Science Direct.

Resultados

los datos extraídos de los artículos permitieron identificar cinco términos esenciales para definir el riesgo de exceso de volumen de líquido. Además, se identificaron 31 factores etiológicos de riesgo de exceso de volumen de líquidos, además de un pictograma y 12 proposiciones.

Conclusión e implicaciones para la práctica

la construcción de una teoría de rango medio centrada en el riesgo de volumen excesivo de líquido en pacientes en hemodiálisis afina la terminología y amplía la comprensión de los fenómenos de enfermería. Así, los datos de esta investigación proporcionarán un conocimiento claro y robusto para la conducción de las acciones del enfermero en la práctica clínica.

Palabras clave:
Adulto; Diálisis Renal; Enfermería; Líquidos Corporales; Teoria de Enfermería

ABSTRACT

Objective

to construct a middle range theory for developing the excessive fluid volume risk diagnostic proposition in patients undergoing hemodialysis.

Method

this is a methodological study, developed for the theoretical-causal validity of a nursing diagnosis. The study was carried out in four stages: study selection, identification of the main concepts of the theory, pictogram construction and proposition elaboration. These steps were operationalized through an integrative literature review, with a sample of 82 articles selected from the Web of Science, PubMed, CINAHL, Scopus and Science Direct databases.

Results

the data extracted from the sample articles enabled identifying five essential terms to define excessive fluid volume risk. Furthermore, 31 etiological factors of excessive fluid volume risk were identified, in addition to a pictogram and 12 propositions.

Conclusion and implications for practice

the construction of a middle-range theory focused on excessive fluid volume risk in patients undergoing hemodialysis refines terminology and expands the understanding of nursing phenomena. Thus, the data from this research will provide clear and robust knowledge for the conduct of nurses’ actions in clinical practice.

Keywords:
Adult; Renal Dialysis; Nursing; Body Fluids; Nursing Theory

INTRODUÇÃO

A revisão e a construção de novos diagnósticos de enfermagem são incentivadas pela NANDA Internacional, com o objetivo de fortalecer e desenvolver a taxonomia por pesquisadores de diferentes países.^1,2 Para o desenvolvimento de diagnósticos de enfermagem, pesquisas são necessárias para embasá-lo cientificamente.³

Portanto, a literatura sugere a construção de diagnósticos de enfermagem com base em teorias de médio alcance (TMA), com o objetivo de subsidiar relações causais entre os componentes diagnósticos, para garantir um melhor entendimento da terminologia pelos enfermeiros, possibilitando raciocínio e julgamento clínico acurados e apoiando a aplicabilidade do diagnóstico na prática clínica.⁴

Nesse aspecto, as TMA conferem maior aplicabilidade dos fenômenos de enfermagem na prática clínica, por apresentarem afirmações teóricas mais claras que podem ser testadas empiricamente.^5,6 Quando criadas para o desenvolvimento de diagnósticos de enfermagem, auxiliam na identificação dos agentes etiológicos e/ou sinais e sintomas de um diagnóstico de enfermagem, estabelecem com clareza as relações entre os componentes de um diagnóstico, fundamentam cientificamente a prática de enfermagem com dados robustos e melhoram os sistemas de classificação de enfermagem.^2,4,7

Nessa perspectiva, pesquisas sobre revisão e/ou desenvolvimento de novos diagnósticos de enfermagem a partir da construção de TMA estão sendo realizadas por pesquisadores da área de enfermagem com o objetivo de consolidar e aprimorar os diagnósticos de enfermagem nas taxonomias de enfermagem.^8-10 Porém, entre os estudos desenvolvidos e publicados, nenhuma TMA foi encontrada sobre o risco de volume de líquidos excessivo. Essa situação de risco requer atenção do enfermeiro, principalmente quando se refere ao paciente renal crônico em hemodiálise.

A sobrecarga de fluidos está frequentemente presente em pacientes em hemodiálise.^11,12 Nesses pacientes, o volume excessivo de fluidos está associado a um aumento na taxa de hospitalização e alta morbimortalidade.^13-16 Além disso, sua ocorrência acarreta sérios problemas de saúde nessa clientela, como piora e aumento da prevalência de doenças cardiovasculares,^17,18 além de anormalidades respiratórias restritivas e obstrutivas, como edema agudo de pulmão.^19,20 Portanto, verifica-se que o volume de líquidos excessivo é um importante problema de enfermagem na progressão de resultados clínicos adversos em pacientes em hemodiálise.¹⁶

Assim, com base na lacuna do conhecimento sobre uma TMA voltada para o risco de volume de líquidos excessivo, objetiva-se construir uma TMA para o desenvolvimento da proposição diagnóstica risco de volume de líquidos excessivo em pacientes em hemodiálise. Este estudo é fundamental para o avanço teórico da enfermagem e esclarecimento do conceito.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo metodológico, desenvolvido para a validade teórico-causal de um diagnóstico de enfermagem. Esse método visa construir uma TMA voltada para a identificação de fatores etiológicos e/ou característica definidoras de um diagnóstico de enfermagem e a verificação de relações causais que estabeleçam claramente a ocorrência dessa resposta humana.⁴ Destarte, para a construção da TMA voltada para o risco de volume de líquidos excessivo, este estudo utilizou o caminho metodológico baseado nas etapas: seleção dos estudos; classificação dos estudos; identificação dos conceitos principais; construção do pictograma; e elaboração das proposições.^4,6

O estudo foi operacionalizado pela revisão integrativa da literatura, a partir de cinco etapas, a saber: identificação do questionamento da revisão; busca na literatura; avaliação dos dados dos estudos inclusos; interpretação dos achados; e síntese do conhecimento encontrado nos artigos avaliados.²¹

Para a formulação das questões da revisão, seguiu-se o mnemônico PICo (P – População; I - Interesse; Co - Contexto), sendo estabelecidos como População os adultos com insuficiência renal crônica; Interesse, os conceitos principais do risco de volume de líquidos excessivo; e Contexto, a hemodiálise. Assim, como questões norteadoras, elencaram-se as seguintes: quais são os termos essenciais para a definição do risco de volume de líquidos excessivo em pacientes submetidos à hemodiálise? E quais são os fatores etiológicos do risco de volume de líquidos excessivo em pacientes submetidos à hemodiálise?

As buscas foram realizadas na seguintes bases de dados: Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), Scopus, National Library of Medicine e National Institutes of Health (PubMed), Web of Science e Science Direct. Na busca, foram utilizadas as palavras-chave indexadas no Medical Subject Headings (MeSH): Risk Factors e Hemodialysis. Fluid retention e fluid overload também foram utilizadas. Esses termos foram separados pelo operador booleano “AND”. Os cruzamentos usados foram: Fluid retention AND Risk Factors AND Hemodialysis (01); Fluid overload AND Risk Factors AND Hemodialysis (02); Fluid retention AND Hemodialysis (03); e Fluid overload AND Hemodialysis (04).

Os critérios de inclusão utilizados foram artigos completos disponíveis nas bases de dados selecionadas, artigos disponíveis em português, inglês ou espanhol, estudos que abordassem a temática, pacientes com insuficiência renal crônica em hemodiálise, e indivíduos adultos. Por sua vez, os critérios de exclusão foram editoriais, cartas ao editor, resumos e revisões integrativas da literatura. Não houve recorte temporal para a seleção dos artigos, por se tratar de uma busca ampla de conceitos relacionados ao fenômeno risco de volume de líquidos excessivo.

A busca foi realizada simultaneamente e de forma manual por três enfermeiras previamente treinadas, para evitar vieses no processo de seleção dos artigos. Foi identificada uma amostra inicial de 6.958 artigos nas cinco bases de dados, sendo selecionados 82 artigos para compor a amostra. Na base CINAHL, foram identificados 687 artigos, sendo excluídos seis, por estarem duplicados, e 666, por não se enquadrarem nos critérios de elegibilidade, sendo selecionados 15 artigos para a amostra. Na base Scopus, foram identificados 294 artigos, sendo excluídos seis por estarem duplicados e 274 por não se enquadrarem nos critérios, sendo considerados 14 artigos para a amostra. Na base PuBMed, foram identificados 1.026 artigos, sendo excluídos 35, por estarem duplicados, e 965, por não se enquadrarem nos critérios, sendo considerados 26 artigos para a amostra. Na base Web of Science, foram identificados 678 artigos, sendo excluídos 62, por estarem duplicados, e 603, por não se enquadrarem nos critérios de elegibilidade, sendo selecionados 13 artigos. Na base Science Direct, foram identificados 4.273, sendo excluídos 30, por estarem duplicados e 4.229, por não se enquadrarem nos critérios, sendo selecionados 14 artigos.

Para a identificação dos conceitos principais da TMA, foram extraídos dos artigos da revisão integrativa os conceitos – fatores etiológicos do risco de volume de líquidos excessivo e termos essenciais para a definição do risco de volume de líquidos excessivo.^4,6 A busca por esses conceitos principais foi determinada conforme os componentes necessários para a construção de um diagnóstico de enfermagem de risco (definição do título diagnóstico e os seus fatores de risco), os quais são baseados na estruturação preconizada pela NANDA Internacional.¹ Por se tratar de um diagnóstico de risco, não houve a necessidade de se identificar as características definidoras do fenômeno.

Dessa forma, os artigos selecionados na revisão foram lidos na íntegra, sendo extraídos e compilados em um quadro sinóptico os fatores etiológicos do risco de volume de líquidos excessivo e os termos que auxiliassem na definição do rótulo diagnóstico. Por se tratar de um diagnóstico de risco, esses termos essenciais selecionados para compor a definição do rótulo apresentaram relação principalmente com os agentes etiológicos do risco de volume de líquidos excessivo mais citados nos artigos.

A partir dos conceitos extraídos, foram construídos o pictograma e as proposições teóricas, para representar as inter-relações entre os conceitos.⁶ Para a construção do pictograma da teoria, foi realizada uma analogia entre os ciclos das marés - que consistem nas alterações cíclicas do nível da água do mar – fenômeno influenciado pela rotação da Terra e as forças gravitacionais da lua. De forma semalhante, o volume corporal do paciente em hemodiálise aumenta entre as sessões de diálise e diminui durante a hemodiálise. Essa oscilação do estado hídrico do paciente é influenciada por uma série de fatores etiológicos, lembrando os ciclos das marés, que se modificam também conforme influências lunares. A analogia sobre esses fenômenos foi criada a partir de um insight criativo da autora, e o desenho gráfico foi desenhado por uma designer profissional.

Ressalta-se que, para a elaboração da TMA, foi utilizado o modelo de adaptação de Roy²² como referencial teórico. Esse modelo foi escolhido diante das características apresentadas pela clientela submetida à hemodiálise - pacientes que vivenciam uma série de transformações, restrições no seu cotidiano e complicações decorrentes de sua doença e tratamento; portanto, podem apresentar uma série de comportamentos não adaptativos que necessitam ser investigados perante a ótica desse modelo.

Assim, para subsidiar a construção da TMA neste estudo, os fatores etiológicos encontrados na literatura foram subdividos em estímulos focais, contextuais e residuais. Esses estímulos são responsáveis por afetar os modos adaptativos do indivíduo e, consequentemente, gerar um comportamento ineficaz, como a retenção excessiva de água nos pacientes em hemodiálise. O estímulo focal consiste naquele que confronta imediatamente uma pessoa, portanto, são os que mais causam impacto nos indivíduos. Os estímulos contextuais são aqueles que de forma indireta influenciam a produção do comportamento ineficaz. Os estímulos residuais produzem efeitos não centrais e, geralmente, a pessoa não tem consciência sobre a existência desses estímulos.²² Os termos utilizados no modelo de Roy também foram expressados no pictograma e nas proposições.

RESULTADOS

A construção da TMA do risco de volume de líquidos excessivo foi realizada com base nos estudos identificados na literatura. A medicina foi a disciplina com maior publicação sobre o assunto. A Europa foi o continente que mais divulgou sobre o tema, e a língua inglesa foi soberana. O tipo de estudo mais frequente foi o descritivo.

Nos tópicos a seguir, serão expostos os principais conceitos identificados, o pictograma construído, as proposições da TMA do risco de volume de líquidos excessivo e a proposição diagnóstica desenvolvida.

Principais conceitos do risco de volume de líquidos excessivo

Os principais conceitos da TMA foram os termos essenciais para a definição do rótulo diagnóstico e os fatores etiológicos do risco de volume de líquidos excessivo, os quais estão apresentados nas Tabelas 1 e 2.

Tabela 1
Conceitos essenciais para a definição do risco de volume de líquidos excessivo em pacientes em hemodiálise.

Conceitos essenciais do risco de volume de líquidos excessivo	n (%)
Ganho de peso interdialítico acima de 3,5% do peso seco	14 (17,07)
Hidratação excessiva	14 (17,07)
Retenção excessiva de líquidos	13 (15,8)
Processo de acumulação de líquidos isotônicos	04 (4,8)
Falta de controle do volume corporal	01 (1,2)
Definição: vulnerabilidade à retenção excessiva de líquidos que ocorre quando o ganho de peso interdialítico é superior a 3,5% do peso seco, devido à hidratação excessiva, capaz de descontrolar o volume corporal e comprometer a saúde.

• Fonte: elaborada pelas autoras.

Tabela 2
Fatores etiológicos do risco de volume de líquidos excessivo em pacientes em hemodiálise.

Fatores etiológicos	n (%)
Estímulos focais
Remoção inadequada de fluidos durante a hemodiálise	10 (12,1)
Aumento da concentração de sódio do dialisado	05 (6,1)
Abuso da dieta	04 (4,8)
Ingestão excessiva de líquidos	04 (4,8)
Declínio da função renal	02 (2,4)
Diminuição do volume de ultrafiltração	02 (2,4)
Falha na diurese	02 (2,4)
Ausência na sessão de hemodiálise	01 (1,2)
Diminuição da gordura corporal	01 (1,2)
Falha do acesso vascular	01 (1,2)
Índice de Kt/V baixo	01 (1,2)
Estímulos contextuais
Comorbidades	10 (12,1)
Hemodiálise intermitente convencional	08 (9,7)
Baixa autoeficácia para ingestão de líquidos	05 (6,1)
Índice de Massa Corporal alterado	05 (6,1)
Ingestão excessiva de sódio	05 (6,1)
Maior experiência em tratamento de diálise	04 (4,8)
Sede	03 (3,6)
Xerostomia	03 (3,6)
Nível baixo de albumina sérica	02 (2,4)
Nível alto de fósforo sérico	02 (2,4)
Avaliação hídrica com frequência insuficiente	01 (1,2)
Conhecimento deficiente	01 (1,2)
Estado inflamatório	01 (1,2)
Estresse diário	01 (1,2)
Hospitalização	01 (1,2)
Uso de drogas anti-hipertensivas	01 (1,2)
Nível de linfócitos séricos diminuído	01 (1,2)
Estímulos residuais
Jovens adultos	04 (4,8)
Idosos	02 (2,4)
Afro-americanos	02 (2,4)

• Fonte: elaborada pelas autoras.

A Tabela 1 mostra cinco termos essenciais, dos quais três apresenaram maior prevalência, como ganho de peso interdialítico acima de 3,5% do peso seco, hidratação excessiva e retenção excessiva de líquidos. Esses termos auxiliaram na construção da definição do título da proposição diagnóstica.

Os fatores etiológicos foram categorizados de acordo com o modelo de adaptação de Roy em estímulos focais, contextuais e residuais, conforme mostrado na Tabela 2. Foram identificados na revisão da literatura 31 fatores para o risco de volume de líquidos excessivo em pacientes em hemodiálise. Destacaram-se os fatores etiológicos remoção inadequada de líquidos durante a hemodiálise, aumento na concentração de sódio do dialisado, abuso da dieta, ingestão excessiva de líquidos, comorbidades, hemodiálise intermitente convencional, baixa autoeficácia para ingestão de líquidos, Índice de Massa Corporal alterado e ingestão excessiva de sódio.

Pictograma do risco de volume de líquidos excessivo

Na Figura 1, será apresentado o pictograma com os principais conceitos inter-relacionados da TMA risco de volume de líquidos excessivo.

Figura 1
Pictograma com os principais conceitos inter-relacionados da teoria de médio alcance risco de volume de líquidos excessivo.

O pictograma (Figura 1) expressa a Terra, que representa o indivíduo com doença renal crônica em hemodiálise. Esse indivíduo, como a Terra, é constituído de água. Ambos são influenciados por vários fatores que podem aumentar ou diminuir essa quantidade de fluido. A Terra apresenta um ciclo de marés. Nas fases da lua cheia ou lua nova, as forças gravitacionais influenciam o aumento do volume da maré. Além disso, no período da lua minguante ou crescente, as forças gravitacionais estimulam pouco ou quase nada as marés.

Assim, considerou-se que o paciente em hemodiálise (a Terra) é influenciado por diversos estímulos (fases da lua) que podem provocar a ocorrência de comportamentos ineficazes, como a retenção excessiva de água.

Proposições dos conceitos principais inter-relacionados

Além do pictograma, foram criadas 12 proposições para a TMA risco de volume de líquidos excessivo, as quais estão expostas no Quadro 1 a seguir:

Quadro 1
Proposições da teoria de médio alcance para o risco de volume de líquidos excessivo em pacientes em hemodiálise.

1. O estado do balanço hídrico corporal em pacientes em hemodiálise está relacionado à ingestão e excreção de líquidos. A ingestão ocorre por meio do consumo de bebidas e alimentos, e a excreção ocorre pela eliminação das fezes, respiração, suor e, principalmente, pela eliminação da urina, que é regulada pelos rins. Nesses pacientes, a função renal está comprometida; portanto, os alimentos e líquidos ingeridos não são suficientemente eliminados, um problema que desencadeia o comportamento ineficaz de retenção excessiva de água intracelular/extracelular.

2. Os estímulos focais, contextuais e residuais afetam o modo físico-fisiológico do indivíduo em hemodiálise e atingem a necessidade básica de fluidos, aumentando a vulnerabilidade do paciente renal crônico em hemodiálise à ocorrência de comportamento ineficaz de retenção excessiva de água.

3. Dependendo do tipo de estímulo aplicado aos pacientes em hemodiálise, o comportamento de retenção excessiva de água intracelular/extracelular pode variar em maior ou menor grau.

4. O equilíbrio hídrico do paciente em hemodiálise é afetado por estímulos do próprio paciente (biológico-genético, psicossocial e sociodemográfico) e influenciado pelas ações dos profissionais de saúde que atuam em hemodiálise.

5. Os estímulos focais, como abuso na dieta, ausência na sessão de hemodiálise, declínio da função renal, diminuição da gordura corporal, ingesta excessiva de líquidos e falha na diurese, são originados das escolhas feitas pelo paciente em hemodiálise ou de seus próprios processos biológicos, refletindo diretamente no aumento da vulnerabilidade ao desenvolvimento de comportamentos de retenção excessiva de água.

6. Os estímulos focais, como aumento da concentração de sódio no dialisado, diminuição do volume de ultrafiltração, falha no acesso vascular, menor índice de Kt/V e remoção inadequada de fluidos durante a hemodiálise, envolvem as ações realizadas pelos profissionais de saúde diretamente envolvidos no cuidado ao paciente em hemodiálise, refletindo diretamente sobre o aumento da vulnerabilidade ao comportamento de retenção de água.

7. Os estímulos contextuais, como comorbidades, estado inflamatório, estresse diário, hospitalização, Índice de Massa Corporal alterado, ingestão excessiva de sódio, maior experiência no tratamento de diálise, albumina sérica diminuída e nível de linfócitos, nível elevado de fósforo sérico, sede e xerostomia, surgem das escolhas feitas pelo paciente em hemodiálise ou são causadas por processos biológicos, podendo influenciar/potencializar o desenvolvimento de comportamento de retenção excessiva de água.

8. O sódio plasmático desempenha um papel central no equilíbrio de fluidos em pacientes em hemodiálise. A mudança no nível de sódio plasmático é responsável por afetar o volume dos líquidos.

9. A baixa autoeficácia para ingestão de líquidos é um comportamento que se origina no modo de identidade autoconceito, mas atua como um estímulo contextual que afeta o modo físico-fisiológico do paciente em hemodiálise, podendo influenciar/potencializar o desenvolvimento do comportamento de retenção excessiva de água.

10. Os estímulos contextuais, como avaliação hídrica com frequência insuficiente e uso de anti-hipertensivos, são fatores decorrentes das condutas dos profissionais de saúde que atuam em hemodiálise e podem influenciar/potencializar o desenvolvimento do comportamento de retenção excessiva de água.

11. A ocorrência de estímulos contextuais, como conhecimento deficiente e hemodiálise convencional intermitente, derivam conjuntamente da conduta dos profissionais de saúde que atuam na hemodiálise e das atitudes dos pacientes em hemodiálise, podendo influenciar potencializar o desenvolvimento do comportamento de retenção excessiva de água.

12. Fatores sociodemográficos, como ser idoso, ser adulto jovem e/ou ser afro-americano, são estímulos residuais que podem influenciar de alguma forma o desenvolvimento de um comportamento de retenção excessiva de água.

• Fonte: elaborada pelas autoras.

Nessas proposições, foram ressaltadas as relações entre dois ou mais conceitos da TMA, como os fatores etiológicos e a ocorrência do volume de líquidos excessivo nos pacientes em hemodiálise.

Proposição diagnóstica risco de volume de líquidos excessivo

Diante da construção da TMA, foi possível desenvolver a proposição diagnóstica risco de volume de líquidos excessivo com os elementos requeridos pela NANDA Internacional, conforme Quadro 2.

Quadro 2
Proposição diagnóstica do risco de volume de líquidos excessivo.

Risco de volume de líquidos excessivo
Domínio 2. Nutrição
Classe 5. Hidratação
Definição: vulnerabilidade à retenção excessiva de líquidos isotônicos que ocorre quando o ganho de peso interdialítico está acima de 3,5% do peso seco, devido à hidratação excessiva, capaz de descontrolar o volume do corpo e comprometer a saúde.
Fatores de risco
• Abuso na dieta	• Índice de Massa Corporal alterado
• Ausência na sessão de hemodiálise	• Ingesta excessiva de líquidos
• Avaliação hídrica com frequência insuficiente	• Ingesta excessiva de sódio
• Baixa autoeficácia para ingestão de líquidos	• Maior experiência no tratamento dialítico
• Conhecimento deficiente	• Menor índice do Kt/V
• Diminuição na gordura corporal	• Remoção inadequada de líquidos durante a hemodiálise
• Estresse diário	• Sede
• Falha no acesso vascular	• Xerostomia
Populações em risco
• Adultos jovens
• Idosos
• Raça afro-americana ou branca
Condições associadas
• Aumento na concentração de sódio do dialisado
• Comorbidades
• Declínio da função renal
• Diminuição no volume de ultrafiltração
• Estado inflamatório
• Falha na diurese
• Hospitalização
• Hemodiálise convencional intermitente
• Nível sérico de albumina baixo
• Nível sérico de fósforo elevado
• Nível sérico de linfócito diminuído
• Uso de medicamentos anti-hipertensivos

• Fonte: elaborada pelas autoras.

Como proposta diagnóstica, foi construída uma definição para o rótulo diagnóstico, e 31 fatores etiológicos foram apresentados, desses, três são classificados como populações em risco, e 12, como condições associadas. Sugere-se que essa proposição seja inserida no domínio 2 (nutrição) e na classe 5 (hidratação) da NANDA Internacional.

DISCUSSÃO

A TMA do risco de volume de líquidos excessivo em pacientes submetidos à hemodiálise expõe os termos essenciais envolvidos na definição desse fenômeno de enfermagem, além de apontar os fatores etiológicos ressaltados pela literatura responsáveis por propiciar a ocorrência da sobrecarga hídrica na clientela estudada. Diante dos conceitos principais expressos na TMA construída, serão tecidas abaixo as relações causais entre os conceitos identificados com maior frequência nos estudos.

No que tange aos principais termos definidores do rótulo diagnóstico do fenômeno investigado, destacam-se a retenção excessiva de líquidos, o ganho de peso interdialítico e a hidratação excessiva. A retenção excessiva de líquidos é frequente em pacientes em diálise, sendo caracterizada pela soma do ganho de peso entre as diálises e a sobrecarga de volume residual após a diálise. A retirada incompleta de fluidos na hemodiálise determina o volume residual, de forma que interfere diretamente no peso seco ao final da hemodiálise.^13,16

Embora tenham semelhanças, a retenção hídrica e o ganho de peso interdialítico não são sinônimos. A retenção hídrica é uma consequência do ganho de peso excessivo entre as diálises.^23,24 O ganho de peso interdialítico é caracterizado pela diferença entre o peso pré-diálise e o peso no final da sessão de hemodiálise anterior.^25,26 O volume corporal do paciente aumenta entre as sessões de diálise e diminui durante a hemodiálise, atingindo um valor final pós-hemodiálise, geralmente menor.²⁵

O ganho de peso entre as sessões não indica necessariamente que o paciente está sobrecarregado. No entanto, se esse ganho for superior ao padrão recomendado (acima de 3,5% do peso seco), a retenção hídrica estará presente.^27,28 Quando o ganho de peso interdialítico é ≥ 5,7% do peso seco, há um risco maior de mortalidade.²⁹

A hidratação excessiva é um dos fatores responsáveis pelo ganho de peso nesses pacientes, com consequente retenção hídrica. Portanto, aparece como um possível fator de risco genérico, pois pode ser causado por vários outros fatores, como sede, boca seca, hiperglicemia e baixa autoeficácia para restrição de líquidos.^30,31

Destarte, alguns fatores etiológicos se destacam na literatura por contribuírem para a hidratação excessiva e aumentarem a vulnerabilidade para o volume de líquidos excessivo em pacientes em hemodiálise, tais como remoção inadequada de líquidos durante a hemodiálise, aumento da concentração de sódio no dialisato, abuso da dieta, ingestão excessiva de líquidos, comorbidades, hemodiálise convencional intermitente, baixa autoeficácia para ingestão de líquidos, Índice de Massa Corporal alterado e ingestão excessiva de sódio.

A retirada inadequada de fluidos na hemodiálise consiste na retirada de fluidos durante a hemodiálise menos do que o recomendado. Sua ocorrência pode estar relacionada à prescrição médica (estimativa incorreta de peso seco), ao operador da máquina de hemodiálise (erro ao operar a máquina) e falhas no acesso vascular (interrupção do funcionamento normal do acesso vascular).³²

O aumento da concentração de sódio no dialisado também foi outro fator destacado. Pode ocorrer excesso de líquidos quando o sódio do dialisado é ajustado na máquina de hemodiálise para um valor acima do padrão recomendado. Quando isso ocorre, menos fluido é transferido do paciente para a máquina.^26,33

Além disso, a hemodiálise convencional intermitente aumenta as chances de sobrecarga hídrica.¹³ Em contrapartida, quando a hemodiálise é realizada diariamente, apresenta maior semelhança com a purificação do sangue obtida por rins saudáveis. Assim, os pacientes em hemodiálise diária apresentam uma diminuição significativa no ganho de peso interdialítico, menos problemas de pressão arterial e uma diminuição nos episódios de falta de ar.³⁴

O abuso na dieta também pode promover a retenção de líquidos nesses pacientes. Existe a necessidade de uma dieta extremamente restritiva; assim, os pacientes têm dificuldade em seguir as orientações alimentares e, portanto, costumam desenvolver um volume excessivo de líquidos.³⁵ Ressalta-se que o abuso na dieta é um fator modificador do Índice de Massa Corporal. Indivíduos em hemodiálise com maior Índice de Massa Corporal tendem a acumular mais volume.³⁶

Além da restrição alimentar, existe também a necessidade de restrição hídrica. No entanto, parece que a ingestão excessiva de líquidos é um fator causal prevalente do excesso de líquidos nessa clientela. Dentre os principais fatores responsáveis pela ingestão excessiva de líquidos, destacam-se a baixa adesão à restrição hídrica, a boca seca e a ingestão excessiva de sódio.³⁷

A baixa autoeficácia para a ingestão de líquidos pode influenciar a diminuição da adesão à restrição de líquidos em pacientes em hemodiálise.³⁷ Nesse sentido, os pacientes que não aderem à restrição de líquidos podem desenvolver sobrecarga de líquidos.³⁸ Além disso, uma dieta rica em sódio, fisiologicamente, acarreta aumento da sede e, consequentemente, aumenta a ingestão hídrica.^34,37,39

Em relação às comorbidades, a literatura destaca que a diabetes mellitus é um potencial fator de risco para o excesso de fluidos. Pacientes diabéticos em hemodiálise e com hiperglicemia constante apresentam maior tendência ao aumento da osmolaridade sérica, com consequente aumento da ingesta hídrica e aumento do ganho de peso interdialítico.⁴⁰

CONCLUSÃO E IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA

O estudo identificou cinco termos essenciais para subsidiar a construção da definição da proposição diagnóstica risco de volume de líquidos excessivo, e 31 fatores etiológicos, com destaque para aqueles com maior prevalência, como remoção inadequada de líquidos durante a hemodiálise, aumento da concentração de sódio no dialisato, abuso de dieta, ingestão excessiva de líquidos, comorbidades, hemodiálise convencional intermitente, baixa autoeficácia para ingestão de líquidos, Índice de Massa Corporal alterado e ingestão excessiva de sódio.

A partir da construção da TMA do risco de volume de líquidos excessivo, foram identificados conceitos principais e proposições, fornecendo um melhor esclarecimento para esse fenômeno de enfermagem. Assim, os dados deste estudo fornecerão conhecimentos claros e robustos para a condução das ações do enfermeiro na prática clínica. No entanto, sugere-se que pesquisas futuras sejam realizadas para testar as relações entre esses conceitos na prática clínica.

Como limitações deste estudo, destaca-se que a TMA construída foi voltada para pacientes submetidos à hemodiálise, assim, a generalização desses resultados para outra clientelas deverá ser utilizada com cautela.

REFERÊNCIAS

• ¹
  Herdman TH, Kamitsuru S. Diagnósticos de enfermagem da NANDA-I: definições e classificações 2021-2023. 12. ed. Porto Alegre: Artmed; 2021.
• ²
  Rabelo-Silva ER, Mantovani VM, Pedraza LL, Cardoso PC, Lopes CT, Herdman TH. International collaboration and new research evidence on nanda international terminology. Int J Nurs Knowl. 2021;32(2):103-7. http://dx.doi.org/10.1111/2047-3095.12300 PMid:32706525.
  » http://dx.doi.org/10.1111/2047-3095.12300
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EDITOR ASSOCIADO

EDITOR CIENTÍFICO

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  13 Jul 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  07 Mar 2022
• Aceito
  26 Maio 2022