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Práticas Integrativas e Complementares na atuação dos enfermeiros da Atenção Primária à Saúde

Prácticas integradoras y complementarias en la actuación de enfermeras de atención primaria de salud

Resumo

Objetivo

analisar o conhecimento e o uso das Práticas Integrativas e Complementares (PIC) na atuação dos enfermeiros da Atenção Primária à Saúde (APS).

Método

estudo transversal realizado em 85 Unidades Básicas de Saúde de Curitiba-PR em 2021. A amostra foi de 195 enfermeiros recrutados pela técnica Snowball. Os dados foram coletados por um instrumento eletrônico estruturado contendo 20 afirmativas com respostas tipo Likert e analisados por métodos estatísticos descritivos.

Resultados

43(22,1%) dos participantes utilizam PIC na assistência, sendo que 31(15,9%) referiram ter formação em alguma modalidade. Identificou-se a utilização de 17 modalidades de PIC, sendo 33(47,8%) em auriculoterapia e sete (10,1%) em reiki. O ranking médio do item sobre o conhecimento teórico dos participantes sobre o tema foi >3,89, demonstrando concordância às afirmativas. Sobre as vivências dos participantes em relação às PIC, verificou-se o reconhecimento dessas práticas pelos enfermeiros.

Conclusão

o estudo contribui para a caracterização da atuação dos enfermeiros na APS, a partir das PIC. Os achados servem de subsídio para os profissionais e os gestores identificarem as lacunas no conhecimento, na atuação, bem como no gerenciamento dos serviços de saúde da APS, com o intuito de fortalecer a autonomia profissional daqueles que se utilizam dessas práticas na assistência.

Palavras-chave:
Atenção Primária à Saúde; Enfermagem; Estratégia Saúde da Família; Sistema Único de Saúde; Terapias Complementares

Resumen

Objetivo

analizar el conocimiento y uso de prácticas integradoras y complementarias en el trabajo de enfermeros en la Atención Primaria de Salud.

Método

estudio transversal realizado en 85 Unidades Básicas de Salud de Curitiba-PR en 2021. La muestra estuvo compuesta por 195 reclutas reclutados mediante la técnica Snowball. Se confirmaron por medio de un instrumento electrónico de selección de datos y métodos por métodos electrónicos de datos descriptivos.

Resultados

43 (22,1%) de los participantes utilizan prácticas integradoras y complementarias (PIC) en el cuidado, y 31 (15,9%) relataron tener formación en alguna modalidad. Se identificó el uso de 17 modalidades de PIC, 33 (47,8%) en auriculoterapia y 7 (10,1%) en reiki. El ítem del Ranking sobre el conocimiento teórico de los participantes promedio sobre el tema fue >3,89, demostrando concordancia con los enunciados. Sobre cómo los participantes experimentan el PIC, debido al reconocimiento de las prácticas de enfermería.

Conclusión

el estudio contribuye para la caracterización de la actuación de los enfermeros en la atención primaria a partir de prácticas integradoras y complementarias. Los hallazgos sirven de subsidio para que los profesionales y gestores identifiquen lagunas en el conocimiento, en la acción, así como en la gestión de los servicios de salud de la atención básica para fortalecer la autonomía profesional de quien utiliza esas prácticas en el cuidado.

Palabras clave:
Primeros auxilios; Enfermería; Estrategia de Salud de la Familia; Sistema único de Salud; Terapias Complementarias

Abstract

Objective

to analyze the knowledge and use of integrative and complementary practices in the work of nurses in Primary Health Care.

Method

a cross-sectional study carried out in 85 Basic Health Units in Curitiba-PR in 2021. The sample consisted of 195 recruits recruited using the Snowball technique. The were confirmed by means of an electronic data selection instrument and methods by electronic descriptive data methods.

Results

43 (22.1%) of the participants use integrative and complementary practices (PIC) in care, and 31 (15.9%) reported having training in some modality. The use of 17 PIC modalities was identified, 33 (47.8%) in auriculotherapy and 7 (10.1%) in reiki. The Ranking item on the theoretical knowledge of the average participants on the topic was >3.89, demonstrating agreement with the statements. About how participants experience the PIC, due to the recognition of nursing practices.

Conclusion

the study contributes to the characterization of nurses' performance in primary care based on integrative and complementary practices. The findings serve as a subsidy for professionals and managers to identify gaps in knowledge, in action, as well as in the management of primary care health services in order to strengthen the professional autonomy of those who use these practices in care.

Keywords:
Primary Health Care; Nursing; Family Health Strategy; Health Unic System; Complementary Therapies

INTRODUÇÃO

O uso de Práticas Integrativas e Complementares (PIC) nos serviços públicos e privados de saúde tem crescido de maneira significativa, principalmente em países desenvolvidos. Trata-se de um conjunto de ações e práticas terapêuticas que complementam e integram as ações de saúde, estimulando uma perspectiva ampliada do processo saúde-doença e valorizando a promoção do cuidado humano.11 Amado DM, Rocha PRS, Ugarte OA, Ferraz CC, Lima MC, Carvalho FFB. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde 10 anos: avanços e perspectivas. Manag Prim Health Care. 2018 ago;8(2):290-308. http://dx.doi.org/10.14295/jmphc.v8i2.537.
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,22 Martins PG, Brito RS, Santos PCM, Laverde CR, Oliveira NF, Calíope P. Conhecimento popular e utilização das práticas integrativas e complementares na perspectiva das enfermeiras. J Nutr Health. 2021 abr;11(2):2111219495.

No Brasil, aprovada e publicada em 2006, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), promoveu a inserção de ações e serviços relativos às PIC no Sistema Único de Saúde (SUS) em todo o território nacional. Buscou-se, a partir disso integralizar e ampliar o cuidado em seu aspecto biopsicossocial, destacando-se a Atenção Primária à Saúde (APS) como o principal cenário para a produção dessas práticas.11 Amado DM, Rocha PRS, Ugarte OA, Ferraz CC, Lima MC, Carvalho FFB. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde 10 anos: avanços e perspectivas. Manag Prim Health Care. 2018 ago;8(2):290-308. http://dx.doi.org/10.14295/jmphc.v8i2.537.
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A construção da autonomia do usuário em seu tratamento de saúde, o estímulo ao seu potencial de autocura nas situações de saúde de menor gravidade são elementos típicos da APS. Assim, o fortalecimento da relação de vínculo entre profissional-usuário, direcionam a assistência com foco central na pessoa. Desse modo, é possível afirmar que a assistência na APS com a utilização das PIC considera a multidimensionalidade e as necessidades de cuidado multidisciplinar dos usuários.33 Aguiar J, Kanan LA, Masiero AV. Práticas integrativas e complementares na atenção básica em saúde: um estudo bibliométrico da produção brasileira. Saúde Debate. 2019 out/dez;43(123):1205-18. http://dx.doi.org/10.1590/0103-1104201912318.
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A Portaria nº 971 de 03 de dezembro de 2006, destacou as diretrizes que contemplaram pela primeira vez as PIC no SUS disponibilizando para a população os serviços e as práticas de Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura, Homeopatia, Plantas Medicinais e Fitoterapia, Termalismo Social/Crenoterapia e Medicina Antroposófica. Em 2017 foram acrescidas 14 práticas à PNPIC: arteterapia, ayurveda, biodança, dança circular, meditação, musicoterapia, naturopatia, osteopatia, quiropraxia, reflexoterapia, reiki, shantala, terapia comunitária integrativa e yoga. Recentemente, em 2018, foi lançada outra portaria que incluiu aromaterapia, apiterapia, bioenergética, constelação familiar, cromoterapia, geoterapia, hipnoterapia, imposição de mãos, ozonioterapia e terapia de florais à PNPIC.11 Amado DM, Rocha PRS, Ugarte OA, Ferraz CC, Lima MC, Carvalho FFB. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde 10 anos: avanços e perspectivas. Manag Prim Health Care. 2018 ago;8(2):290-308. http://dx.doi.org/10.14295/jmphc.v8i2.537.
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Segundo os dados do Ministério da Saúde (MS), as PIC têm sido expandidas nos serviços de saúde, principalmente nos públicos, de administração municipal, concentrada em capitais majoritariamente na região sul e nordeste.44 Tesser CD, Sousa IMC, Nascimento MC. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde brasileira. Saúde Debate. 2018 set;42(spe1):174-88. http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042018s112.
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De acordo com dados parciais, em 2019 as PIC eram ofertadas em 17.335 serviços de saúde do SUS distribuídos em 4.297 (77%) municípios brasileiros e, em todas as capitais, sendo que 14.508 (90%) das PIC utilizadas eram ofertadas na APS. Além disso, a oferta das PIC em 2019 aumentou 324% em comparação ao ano de 2017.55 Brasil. Ministério da Sáude. Relatório de monitoramento nacional das práticas integrativas e complementares em saúde nos sistemas de informação em saúde [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2020 [citado 2022 out 27]. Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/documentos/pics/Relatorio_Monitoramento_das_PICS_no_Brasil_julho_2020_v1_0.pdf
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No Brasil, alguns estudos do tipo revisão sistemática têm evidenciado a efetividade, a qualidade e a segurança no uso das PIC no tratamento de usuários em diversos serviços especializados, em todos os níveis de atenção à saúde.66 Souza MC, Werner M, Souza BRC, Rosa JR. The effectiveness of integrative and complementary therapies provided by the unified health system for oncologic pain relief: a systematic review. Res Soc Dev. 2021 out;10(13):e537101321580. http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v10i13.21580.
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7 Fróes NBM, Arrais FAS, Aquino PS, Maia JC, Balsells MMD. Efeitos da auriculoterapia no tratamento de náuseas e vômitos: revisão sistemática. Rev Bras Enferm. 2021 set;75(1):e20201350. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2020-1350. PMid:34586198.
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-88 Torres BV, Almeida LA, Silva RC, Silva JS, Vieira AC. Práticas integrativas e complementares no cuidado em saúde de crianças. Enferm Foco. 2021 jun;12(1):154-62. Alguns estudos clínicos têm demonstrado que as PIC agem positivamente na promoção da saúde de usuários do SUS.99 Silva HL, Almeida MVS, Diniz JSP, Leite FMC, Moura MAV, Bringuente ME et al. Efeitos da auriculoterapia na ansiedade de gestantes no pré-natal de baixo risco. Acta Paul Enferm. 2020 ago;33:eAPE20190016. http://dx.doi.org/10.37689/acta-ape/2020AO0016.
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,1010 Kurebayashi LFS, Gnatta JR, Kuba G, Giaponesi ALL, Souza TPB, Turrini RNT. Massagem e Reiki para redução de estresse e melhoria de qualidade de vida: ensaio clínico randomizado. Rev Esc Enferm USP. 2020 out;54:e03612. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2018059103612. PMid:33053005.
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Apesar de as PIC se desenvolverem no âmbito multiprofissional, cabe destacar que, no Brasil, a Enfermagem foi primeira profissão a reconhecer as PIC como prática de cuidado, com foco na autonomia da pessoa sobre sua saúde.1111 Soares DP, Coelho AM, Silva LEA, Silva RJR, Figueiredo CR, Fernandes MC. Política nacional de práticas integrativas e complementares em saúde: discurso dos enfermeiros da atenção básica. Rev Enferm Cent-Oeste Min. 2019 nov;9:e3265. http://dx.doi.org/10.19175/recom.v9i0.3265.
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Ao se considerar as possibilidades de aplicação das PIC no cuidado pelos enfermeiros da APS e a necessidade de conhecer como essas práticas têm sido desenvolvidas por esses profissionais, surgiu a pergunta de pesquisa que norteou o estudo: como os enfermeiros da APS do município de Curitiba-PR têm utilizado as PIC no cuidado em saúde? Por conseguinte, o objetivo deste estudo foi analisar o conhecimento e o uso das PIC na atuação dos enfermeiros da APS.

MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa transversal de abordagem quantitativa, realizada em 85 Unidades Básicas de Saúde (UBS) do município de Curitiba, Paraná.

A técnica de amostragem levou em consideração o universo de 405 enfermeiros atuantes em UBS e Estratégia Saúde da Família (ESF). A amostra selecionada foi obtida por meio do cálculo amostral finito, considerando o índice de confiança de 95%, e erro amostral de 5%. Desse modo, participaram do estudo 195 enfermeiros.

Os critérios de inclusão foram: ter idade igual ou superior a 18 anos e prestar assistência direta aos usuários. Os critérios de exclusão foram: profissional em cargo de gestão, estar afastado, em férias, ou deixar de responder duas ou mais questões do instrumento de pesquisa.

Ao se considerar a condição de saúde pública instalada no mundo, devido à pandemia da COVID-19 e as orientações de distanciamento social, os participantes foram recrutados por meio da técnica de bola de neve (Snowball), na qual os primeiros participantes recrutados são aqueles contidos à rede de contatos dos pesquisadores e, após a sua participação, indicaram novos participantes pertencentes à mesma população-alvo, e assim sucessivamente, até que se atingiu o número determinado na amostragem.1212 Costa BRL. Bola de neve virtual: o uso das redes sociais virtuais no processo de coleta de dados de uma pesquisa científica. Rev Interdiscip Gest Soc. 2018 jan/abr;7(1):15-37. Os dados foram coletados entre os meses de fevereiro e julho de 2021, por um instrumento estruturado eletrônico criado no Google Forms®, enviado por meio de um link de acesso para as Redes Sociais Virtuais (RSV), ou e-mail. O instrumento foi composto por questões organizadas em três sessões: I) identificação e caracterização dos participantes, II) conhecimento e prática profissional dos participantes em relação às PIC, e III) questionário com 20 afirmativas com graus de resposta para medir as opiniões, as percepções e os comportamentos, com base na escala de Likert, que varia de uma atitude extrema a outra: (1) discorda totalmente, (2) discorda, (3) sem opinião, (4) concorda, (5) concorda totalmente. As questões formuladas para o instrumento foram embasadas no referencial teórico sobre PIC disponíveis nos documentos do Ministério da Saúde (MS).11 Amado DM, Rocha PRS, Ugarte OA, Ferraz CC, Lima MC, Carvalho FFB. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde 10 anos: avanços e perspectivas. Manag Prim Health Care. 2018 ago;8(2):290-308. http://dx.doi.org/10.14295/jmphc.v8i2.537.
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Os dados foram armazenados e analisados pelo Software Statistical Package for the Social Sciences SPSS® 21.0, por métodos estatístico-descritivos. Foi realizada a dupla digitação independente dos dados no software, a fim de evitar inconsistências.

Para a análise dos dados provenientes das questões do tipo Likert, foi calculado o Ranking Médio do item (RMi), por meio da fórmula RMi=∑(fr.ve)/Nti, em que ∑=somatório; fr=frequência das respostas; ve=valor da escala Likert; NTi=número total de respostas do mesmo item; a fim de verificar a concordância ou a discordância das questões, a partir da pontuação atribuída às respostas. Desse modo, consideraram-se os valores maiores de três como concordantes, menores de três como discordantes, e três como ponto neutro.1313 Hermida PMV, Nascimento ERP, Echevarría-Guanilo ME, Bruggemann OM, Malfussi LBH. User embracement with risk classification in an emergency care unit: an evaluate study. Rev Esc Enferm USP. 2018 abr;52:e03318. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2017001303318. PMid:29668786.
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Os resultados a partir das variáveis numéricas foram apresentados em medidas de tendência central (média±desvio padrão) e as categóricas em frequências absolutas (n) e relativas (%).

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba-PR, sob o parecer n. 4.465.838, em conformidade com a Resolução nº 466/12, do Conselho Nacional de Saúde.

RESULTADOS

Participaram da pesquisa 195 enfermeiros, dos quais 174 (89,2%) eram mulheres, com idade média 44±7,8 anos, variando entre 23 e 59 anos. O tempo de formação variou entre um e 35 anos 18±7,4 anos. Atuavam na ESF 104 (53,3%) e 91 (46,7%) em UBS. O tempo de atuação no serviço foi 7±6,0 anos, variando entre um e 25 anos, e na APS foi 13±7,9 anos, entre um e 35 anos.

Dentre os participantes, 181 (92,8%) possuem pós-graduação, sendo 152 (77,9%) especialização, 18 (9,2%) mestrado, três (1,5%) aperfeiçoamento e um (0,5%) doutorado.

Destaca-se que 25 (12,8%) participantes referiram não conhecer as PIC, e 86 (44,1%) não conhecem a PNPIC. Foram 43 (22,1%) participantes que referiram utilizar alguma modalidade de PIC na sua prática profissional, sendo 28 (14,4%) em uma modalidade, nove (4,6%) em duas, três (1,5%) em três, um (0,5%) em quatro e dois (1,0%) em cinco, conforme demonstrada na Tabela 1.

Tabela 1
Distribuição dos participantes, segundo as modalidades de PIC utilizadas na assistência aos usuários. Curitiba, PR, Brasil, 2021.

A Tabela 2 apresenta-se os resultados referentes ao uso das PIC no cenário profissional dos enfermeiros da APS. Destaca-se que 12 (6,2%) participantes referiram não ter formação específica em PIC.

Tabela 2
Distribuição dos participantes em relação ao uso das PIC no cenário de prática nas UBS, segundo a formação. Curitiba, PR, Brasil, 2021.

Dentre os participantes, 120 (61,5%) referiram que outros profissionais, exceto enfermeiros, da sua equipe fazem o uso das PIC na assistência. Ainda, 117 (60%) afirmaram já ter recebido algum atendimento profissional por meio de PIC.

A Tabela 3 dispõe sobre a distribuição dos respondentes às afirmativas referentes ao conhecimento sobre as PIC.

Tabela 3
Distribuição dos participantes, em relação à avaliação do conhecimento sobre as PIC. Curitiba, PR, Brasil, 2021.

Na Tabela 4 apresenta a vivência dos participantes com as PIC no cenário profissional.

Tabela 4
Distribuição dos participantes, segundo a vivência no uso das PIC no serviço. Curitiba, PR, Brasil, 2021.

A Tabela 5 dispõe sobre o conhecimento dos participantes a respeito das PIC.

Tabela 5
Distribuição dos participantes em relação a autoavaliação do conhecimento sobre as PIC na Atenção Primária. Curitiba, PR, Brasil, 2021.

DISCUSSÃO

A implementação das PIC na prática de Enfermagem por enfermeiros qualificados, fortalece o vínculo terapêutico e, consequentemente, possibilita a maior adesão dos usuários aos tratamentos, uma vez que reconhecem a história da comunidade e valorizam a sua cultura. O resultado deste estudo demonstrou uma frequência de 43 (22,1%) de participantes com vivência em relação ao uso das PIC. Contudo, nos últimos anos, a estratégia de formação profissional para atuar com as PIC está entre as principais ações realizadas na esfera da PNPIC, visando a necessidade de ampliar as ofertas dessas práticas nos serviços de saúde.44 Tesser CD, Sousa IMC, Nascimento MC. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde brasileira. Saúde Debate. 2018 set;42(spe1):174-88. http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042018s112.
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,1414 Freitas JR, Silva AJ, Silva JAA, Ramos JRB, Silva FMV. A importância do enfermeiro nas práticas integrativas e complementares no sistema único de saúde. Saúde Colet. 2021 abr;11(63):5376-89. http://dx.doi.org/10.36489/saudecoletiva.2021v11i63p5376-5389.
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Os resultados deste estudo destacam que 47,8% dos participantes possui formação em auriculoterapia, seguido de reiki (10,1%), terapia de florais (7,2%) e medicina tradicional chinesa/acupuntura (4,3%), contrastando com os últimos dados do MS,44 Tesser CD, Sousa IMC, Nascimento MC. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde brasileira. Saúde Debate. 2018 set;42(spe1):174-88. http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042018s112.
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em que as PIC ofertadas em maior frequência no Brasil são as práticas corporais (53%) e acupuntura (20%).

Existe uma justificativa plausível para a maior frequência à formação em auriculoterapia, haja vista que, entre 2016 e 2017 em torno de quatro mil profissionais de saúde foram capacitados nessa prática por meio de um curso semipresencial de 80 horas, financiado pelo MS com polo regional em 21 estados brasileiros.44 Tesser CD, Sousa IMC, Nascimento MC. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde brasileira. Saúde Debate. 2018 set;42(spe1):174-88. http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042018s112.
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A utilização da auriculoterapia na assistência de Enfermagem tem baixo custo, alta eficácia, não causa efeitos colaterais, e é de fácil aplicação por enfermeiros capacitados. Um estudo demonstrou que o uso da auriculoterapia em gestantes atendidas em pré-natal de baixo risco de um serviço público do Espírito Santo proporcionou a diminuição dos índices de estresse e ansiedade durante o ciclo gestacional.99 Silva HL, Almeida MVS, Diniz JSP, Leite FMC, Moura MAV, Bringuente ME et al. Efeitos da auriculoterapia na ansiedade de gestantes no pré-natal de baixo risco. Acta Paul Enferm. 2020 ago;33:eAPE20190016. http://dx.doi.org/10.37689/acta-ape/2020AO0016.
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A melhora na condição de saúde dos pacientes submetidos ao tratamento quimioterápico também foi observada em um estudo.77 Fróes NBM, Arrais FAS, Aquino PS, Maia JC, Balsells MMD. Efeitos da auriculoterapia no tratamento de náuseas e vômitos: revisão sistemática. Rev Bras Enferm. 2021 set;75(1):e20201350. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2020-1350. PMid:34586198.
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Apesar do inquérito nacional apontar, que entre a frequência das PIC no Brasil, a acupuntura ter 20% entre os profissionais de saúde, entre os participantes deste estudo ela apresentou uma frequência baixa (4,3%). A baixa procura pela formação e frequência baixa na aplicação dessa prática pode ser justificada pela restrição dos planos de saúde em cadastrar os profissionais não médicos para uso dessa prática. Outra barreira foi a luta judicial desde 2001 entre o Conselho Federal de Medicina (CFM) contra o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) para anular a resolução que reconhecia a qualificação e a atuação dos enfermeiros como acupunturistas. Somente em 2018, após o COFEN vencer a ação judicial, houve possibilidades de assegurar a acupuntura como especialidade de enfermeiros.1515 Azevedo C, Moura CC, Correa HP, Mata LRF, Chaves ECL, Chianca TCM. Práticas integrativas e complementares no âmbito da enfermagem: aspectos legais e panorama acadêmico-assistencial. Esc Anna Nery. 2019 mar;23(2):e20180389. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0389.
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Diante disso, cumpre citar que os estudos têm verificado a efetividade da acupuntura no tratamento de disfunções fisiológicas. Foi observado a melhora e o aumento de bem-estar, a aceitação e a diminuição da dor, o maior autocuidado e a motivação na busca de estratégias efetivas de enfrentamento em 64 pessoas portadoras de dores crônicas, após serem submetidas ao uso de acupuntura, yoga, quiropraxia e massagem no período de três meses.1616 Matos PC, Laverde CR, Martins PG, Souza JM, Oliveira NF, Pilger C. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde. Cogitare Enferm. 2018 fev;23(2):e54781. http://dx.doi.org/10.5380/ce.v23i2.54781.
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A partir dos dados apresentados, foi possível observar que 12 (6,2%) participantes não possuíam formação em PIC, mas as utilizam na prática profissional na UBS. De acordo com um estudo realizado com enfermeiros da ESF no Rio Grande do Norte, alguns profissionais referiram orientar o uso de plantas e outros produtos naturais, baseados em rituais religiosos e crenças populares, repassados por seus familiares. Logo, as PIC implementadas durante a assistência à saúde pelos participantes podem ser baseadas em experiências culturais e, aliadas ao conhecimento científico angariado em sua formação de enfermeiro.1717 Jales RD, Nelson ICASR, Solano LC, Oliveira KKD. Knowledge and implementation of integrative and complementary practices by primary care nurses. Rev Pesq: Cuid Fundam. 2020 jan/dez;12:808-13.

Como demonstrado na Tabela 2, dentre os 43 participantes com formação em PIC, 31 fazem a sua utilização em sua prática profissional. Um estudo demonstrou a existência de preocupação dos profissionais quanto à receptividade das PIC, como entrave na aplicabilidade, somada à sobreposição do modelo biomédico, ausência ou pouco apoio dos gestores, resultando na precarização de planejamento das PIC, ausência de espaços adequados e de número insuficiente de profissionais capacitados.1818 Soares DP, Coelho AM, Silva LEA, Silva RJR, Linard LLP, Fernandes MC. Fatores intervenientes das práticas integrativas e complementares em saúde na atenção básica pelos enfermeiros. Rev Enferm Atenção Saúde. 2019 jan/jul;8(1):93-102. http://dx.doi.org/10.18554/reas.v8i1.3544.
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Como atividade privativa do enfermeiro, a Consulta de Enfermagem é desenvolvida para identificar as situações de saúde-doença, prescrever e implementar as medidas que contribuam com a promoção, a proteção, a recuperação ou a reabilitação do paciente. Dentre os participantes, 32 utilizam as PIC nesse campo de atuação. Um estudo demonstrou que o uso da musicoterapia, dançaterapia e a aromaterapia na consulta de puericultura ao paciente autista auxilia no controle de sintomas psicológicos e traz benefícios na interação social, comunicação e resposta motora.1919 Souza VM, Nogueira AMF, Santos LFM, Pereira ER, Ribeiro WA. O uso de terapias complementares no cuidado à criança autista. Rev Saúde Fís Ment. 2019 abr [citado 2022 out 27];6(2):69-88. Disponível em: https://revista.uniabeu.edu.br/index.php/SFM/article/view/3495
https://revista.uniabeu.edu.br/index.php...

Apesar de apenas 11 participantes utilizarem as PIC em visitas domiciliares, conforme a Tabela 2, este campo de atuação profissional mostra-se como um espaço eficiente de educação em saúde, e quando aliado às PIC proporcionam uma troca de saberes e valorização do processo de cuidado. Os participantes submetidos à auriculoterapia domiciliar referiram sobre os benefícios com o uso da prática, conforme estudo.2020 Caldeira S, Silvério-Lopes S. Auriculoterapia realizada por enfermeiro no âmbito domiciliar: percepção dos clientes. Rev Bras Terap e Saúde. 2017 jul/dez;7(2):9-16. http://dx.doi.org/10.7436/rbts-2017.07.02.03.
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Pela Tabela 3 é possível observar que os participantes concordam que as PIC promovem o cuidado integral e autocuidado dos usuários. A humanização do cuidado retoma a autonomia dos usuários sobre a própria saúde. É possível notar em um estudo que as PIC são responsáveis pelo fortalecimento da relação entre o profissional/usuário, uma vez que a comunidade possui interesse em adquirir um maior conhecimento sobre o tema.1616 Matos PC, Laverde CR, Martins PG, Souza JM, Oliveira NF, Pilger C. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde. Cogitare Enferm. 2018 fev;23(2):e54781. http://dx.doi.org/10.5380/ce.v23i2.54781.
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Apesar de RMi=3,24, os resultados demonstraram que os participantes apresentaram incerteza sobre a legalidade do uso das PIC pelos enfermeiros. É importante ressaltar que atualmente, as PIC são reafirmadas como especialidade de Enfermagem por meio da Resolução COFEN nº 581 de 2018, assegurando o respaldo legal deste profissional para a atuação nesse campo, bem como a desenvolver pesquisas na área das PIC em geral.1515 Azevedo C, Moura CC, Correa HP, Mata LRF, Chaves ECL, Chianca TCM. Práticas integrativas e complementares no âmbito da enfermagem: aspectos legais e panorama acadêmico-assistencial. Esc Anna Nery. 2019 mar;23(2):e20180389. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0389.
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Segundo os dados da Tabela 3, 28,2% dos participantes não possui opinião quanto à afirmativa de que a base das PIC é subjetiva, e 18% concordaram com a afirmativa. As PIC são utilizadas a partir de buscas sobre sua segurança e eficácia, sendo este conhecimento estimulado desde a declaração de Alma Ata pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e adicionadas como parte estratégica de pesquisa dentro da Agência Nacional de Prioridades em Pesquisa (2004). Dessa forma, pode-se afirmar que essas práticas têm buscado pautar e se fundamentar cientificamente.11 Amado DM, Rocha PRS, Ugarte OA, Ferraz CC, Lima MC, Carvalho FFB. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde 10 anos: avanços e perspectivas. Manag Prim Health Care. 2018 ago;8(2):290-308. http://dx.doi.org/10.14295/jmphc.v8i2.537.
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2 Martins PG, Brito RS, Santos PCM, Laverde CR, Oliveira NF, Calíope P. Conhecimento popular e utilização das práticas integrativas e complementares na perspectiva das enfermeiras. J Nutr Health. 2021 abr;11(2):2111219495.

3 Aguiar J, Kanan LA, Masiero AV. Práticas integrativas e complementares na atenção básica em saúde: um estudo bibliométrico da produção brasileira. Saúde Debate. 2019 out/dez;43(123):1205-18. http://dx.doi.org/10.1590/0103-1104201912318.
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-44 Tesser CD, Sousa IMC, Nascimento MC. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde brasileira. Saúde Debate. 2018 set;42(spe1):174-88. http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042018s112.
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Os participantes concordaram que é necessário discutir sobre as PIC no processo de formação acadêmica. Todavia, nota-se que os enfermeiros demonstraram grande difusão de conhecimentos relacionados às PIC e a participação em projetos de pesquisa e extensão, entretanto, há fragilidades na formação destes profissionais.1515 Azevedo C, Moura CC, Correa HP, Mata LRF, Chaves ECL, Chianca TCM. Práticas integrativas e complementares no âmbito da enfermagem: aspectos legais e panorama acadêmico-assistencial. Esc Anna Nery. 2019 mar;23(2):e20180389. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0389.
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Diante disso, com o intuito de seguir as recomendações da PNPIC, existe a necessidade de maior incentivo à inclusão de disciplinas de interesse do SUS e da Política nas grades curriculares dos cursos de graduação e especialização na área da saúde em instituições de ensino, tanto públicas quanto privadas.2121 Nascimento MC, Romano VF, Chazan ACS, Quaresma CH. Formação em práticas integrativas e complementares em saúde: desafios para as universidades Públicas. Trab Educ Saúde. 2018 mai/ago;16(2):751-72. http://dx.doi.org/10.1590/1981-7746-sol00130.
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Destaca-se a importância de que o ensino seja orientado para os diversos cenários do SUS, com foco na APS, conforme preconizado pela PNPIC.44 Tesser CD, Sousa IMC, Nascimento MC. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde brasileira. Saúde Debate. 2018 set;42(spe1):174-88. http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042018s112.
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Os participantes (41,5%) responderam não ter opinião quanto ao aumento da demanda na utilização das PIC. Alguns estudos demonstraram que a procura pelas PIC elevou em 46%, passando de 216 mil atividades desenvolvidas para 315 mil entre os anos de 2017 e 2018.44 Tesser CD, Sousa IMC, Nascimento MC. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde brasileira. Saúde Debate. 2018 set;42(spe1):174-88. http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042018s112.
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A alta demanda pelas PIC por parte dos usuários e impactos positivos à saúde, bem como os benefícios em relação às doenças crônicas e promoção à saúde foram identificadas em estudos.66 Souza MC, Werner M, Souza BRC, Rosa JR. The effectiveness of integrative and complementary therapies provided by the unified health system for oncologic pain relief: a systematic review. Res Soc Dev. 2021 out;10(13):e537101321580. http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v10i13.21580.
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7 Fróes NBM, Arrais FAS, Aquino PS, Maia JC, Balsells MMD. Efeitos da auriculoterapia no tratamento de náuseas e vômitos: revisão sistemática. Rev Bras Enferm. 2021 set;75(1):e20201350. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2020-1350. PMid:34586198.
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8 Torres BV, Almeida LA, Silva RC, Silva JS, Vieira AC. Práticas integrativas e complementares no cuidado em saúde de crianças. Enferm Foco. 2021 jun;12(1):154-62.

9 Silva HL, Almeida MVS, Diniz JSP, Leite FMC, Moura MAV, Bringuente ME et al. Efeitos da auriculoterapia na ansiedade de gestantes no pré-natal de baixo risco. Acta Paul Enferm. 2020 ago;33:eAPE20190016. http://dx.doi.org/10.37689/acta-ape/2020AO0016.
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-1010 Kurebayashi LFS, Gnatta JR, Kuba G, Giaponesi ALL, Souza TPB, Turrini RNT. Massagem e Reiki para redução de estresse e melhoria de qualidade de vida: ensaio clínico randomizado. Rev Esc Enferm USP. 2020 out;54:e03612. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2018059103612. PMid:33053005.
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,2222 Dacal MPO, Silva IS. Impacto das práticas integrativas e complementares na saúde de pacientes crônicos. Saúde Debate. 2018 jul/set;42(118):724-35. http://dx.doi.org/10.1590/0103-1104201811815.
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A pesquisa revelou RMi concordante para as afirmativas de falta de divulgação e capacitação sobre as PIC, por meio da educação permanente e pouco incentivo à utilização das práticas. O dado corrobora com a literatura, que tem descrito como são os desafios na implementação das PIC: a dificuldade em relação ao fornecimento de material e aquisição de insumos utilizados em algumas das práticas, a ausência de apoio da gestão local, a falta de espaço físico, de salas disponíveis e de maior valorização das práticas.2323 Salafia MT, Gemignani EYMY. Avaliação das práticas integrativas e complementares na atenção integral à saúde do idoso na atenção primária à saúde. Rev Bras Iniciaç Cient. 2019 jun [citado 2022 out 27];6(5):23-43. Available from: https://periodicos.itp.ifsp.edu.br/index.php/IC/article/view/1529/1101
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Por outro, os gestores públicos, têm citado como barreiras para o apoio à implementação das PIC nos serviços de saúde: o financiamento insuficiente, a escassez de espaços para a realização das terapias e ainda, à dificuldade de associação entre as PIC e o modelo curativo, além dos poucos recursos humanos capacitados, se apresentando insuficiente às altas demandas.1111 Soares DP, Coelho AM, Silva LEA, Silva RJR, Figueiredo CR, Fernandes MC. Política nacional de práticas integrativas e complementares em saúde: discurso dos enfermeiros da atenção básica. Rev Enferm Cent-Oeste Min. 2019 nov;9:e3265. http://dx.doi.org/10.19175/recom.v9i0.3265.
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Em relação às capacitações, o MS tem ofertado cinco cursos à distância sobre PIC em ambiente virtual de aprendizagem por meio do Sistema Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS). Esses cursos têm caráter introdutório, com o objetivo de estimular os profissionais de saúde da rede pública a criarem interesse ao tema. Além disso, o MS promoveu um curso de formação presencial em Terapia Comunitária Integrativa para profissionais da ESF de todas as regiões do país.44 Tesser CD, Sousa IMC, Nascimento MC. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde brasileira. Saúde Debate. 2018 set;42(spe1):174-88. http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042018s112.
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As ações de educação permanente nos serviços de saúde potencializam a formação específica em PIC, mas não a substituem. Algumas secretarias municipais de saúde subsidiam as ações de educação permanente para seus profissionais e/ou cursos de especialização em uma ou mais modalidade de PIC, especificamente voltados para a APS.44 Tesser CD, Sousa IMC, Nascimento MC. Práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde brasileira. Saúde Debate. 2018 set;42(spe1):174-88. http://dx.doi.org/10.1590/0103-11042018s112.
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A Tabela 5 mostra que os participantes discordaram da afirmativa que possuem conhecimento para prescrever e realizar as PIC, como também encaminhar os usuários para este serviço. Dado este que corrobora com a literatura, uma vez que o quantitativo de profissionais que atuam com as práticas e detém o conhecimento ainda é pequeno, implicando na impossibilidade de indicá-las ou aplicá-las devido ao conhecimento deficiente. Entretanto, atualmente existe um movimento, ainda que lento, de profissionais atuando em pesquisas e atividades dentro de universidades e no cenário de prática, o que resulta na propagação do conhecimento e da divulgação das terapias à comunidade.1515 Azevedo C, Moura CC, Correa HP, Mata LRF, Chaves ECL, Chianca TCM. Práticas integrativas e complementares no âmbito da enfermagem: aspectos legais e panorama acadêmico-assistencial. Esc Anna Nery. 2019 mar;23(2):e20180389. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0389.
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CONCLUSÃO

As estratégias do SUS para a implementação das PIC na assistência dos usuários da Atenção Primária subsidiadas pelas políticas públicas trouxeram maior visibilidade e condições de conhecimento e busca de formação para tais práticas pelos profissionais.

Destarte, conclui-se que os enfermeiros demonstraram ter conhecimento teórico substancial sobre os princípios que norteiam a utilização das PIC em um ambiente de cuidado. Outrossim, os participantes reconheceram a importância da inserção das PIC na assistência e no cuidado em saúde, como elementos importantes para fortalecer o vínculo com o paciente, promover o atendimento integral e na promoção à saúde.

Apesar de se ter conhecimento, os enfermeiros demonstraram insegurança para a aplicabilidade das práticas, aliado à percepção dos participantes, à falta de maior divulgação dessas práticas e de ações formativas pelos programas de educação permanente.

Para o fortalecimento da implementação de PIC na assistência dos usuários no âmbito do sistema de saúde é imprescindível a inclusão desse tema nas disciplinas na formação da graduação dos enfermeiros, a fim de instigá-los a conhecer tais práticas e a compreender a sua importância na organização de espaços favoráveis à promoção da saúde e ao autocuidado dos usuários, com foco na Atenção Primária. A gestão dos serviços de saúde da Atenção Primária deve promover cada vez mais ações de divulgação e de capacitação das PIC por meio da educação permanente, a fim de instrumentalizar os profissionais da atenção básica.

Para tanto, este estudo contribui significativamente na caracterização da atuação dos enfermeiros na Atenção Primária a partir das PIC. Os achados podem servir de subsídio para os profissionais de Enfermagem identificarem as lacunas no conhecimento, na atuação, bem como na gestão dos serviços de saúde da Atenção Primária, com o intuito de fortalecer a autonomia profissional daqueles que se utilizam dessas práticas na assistência.

Desse modo, sugere-se que se desenvolvam outros estudos relacionados à implementação e à gestão das PIC, abrangendo outros serviços de saúde, inclusive da atenção especializada, além dos da Atenção Primária, visando propostas de ampliação da divulgação e na qualidade de oferta das PIC, contribuindo para o fortalecimento do sistema de saúde.

Para as limitações deste estudo cita-se a regionalização da coleta de dados, que ocorreu em apenas um município e que os saberes e práticas podem ser diferentes em outros locais do país. Além disso, aponta-se como dificuldade o recrutamento dos participantes devido à pandemia da COVID-19, o que dificultou o contato direto com os participantes devido às exigências de distanciamento social. Desse modo, a coleta de dados fez-se de modo online, ocasionando maior tempo de recrutamento e algumas perdas de participantes por falta de acesso à internet no ambiente de trabalho.

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EDITOR CIENTÍFICO

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    03 Abr 2022
  • Aceito
    27 Out 2022
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