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Vivências de mães no cuidado a crianças e adolescentes com Epidermólise Bolhosa

Experiencias de madres en el cuidado de niños y adolescentes con Epidermólisis Ampollosa

Resumo

Objetivo

conhecer e analisar as vivências de mães no cuidado a crianças e adolescentes com Epidermólise Bolhosa.

Método

estudo descritivo de abordagem qualitativa desenvolvido junto a dez mães de crianças e adolescentes com Epidermólise Bolhosa de diferentes regiões do Brasil, a partir de entrevistas semiestruturadas, áudio e vídeo gravadas, por via remota, utilizando-se a plataforma Google Meet®, entre setembro e novembro de 2021. A técnica da análise temática direcionou a apreciação do material empírico.

Resultados

participaram do estudo mães com idade entre 23 e 53 anos. Duas categorias traduzem a vivência materna: i) O “baque” do diagnóstico e os desafios iniciais e ii) “Deixar de viver para viver para ele”: as mudanças no cotidiano das famílias.

Considerações finais e implicações para a prática

as mães vivenciaram sentimentos de medo e insegurança diante do diagnóstico do filho e a rotina de cuidados, em especial, as trocas diárias de curativos, acarretaram sobrecarga física e emocional. Esses resultados podem subsidiar o acompanhamento dessas famílias de modo a instrumentalizá-las para o cuidado e apoiá-las emocionalmente.

Palavras-chave:
Adolescente; Criança; Enfermagem; Epidermólise Bolhosa; Mães

Resumen

Objetivo

conocer y analizar la vida de las madres en el cuidado de niños y adolescentes con Epidermólisis Bullosa.

Método

estudio descriptivo de abordaje cualitativo desarrollado junto a diez madres de niños y adolescentes con Epidermólisis Bullosa de diferentes regiones de Brasil, a partir de entrevistas semiestructuradas con grabación de audio y video, por vía remota, utilizando la plataforma Google Meet®, entre septiembre y noviembre de 2021. La técnica de análisis temático dirigió la apreciación del material empírico.

Resultados

participaron en el estudio mujeres de entre 23 y 53 años. Dos categorías traducen la experiencia materna: i) El “shock” del diagnóstico y los retos iniciales; y ii) “Dejar de vivir para vivir por él”: los cambios en la vida cotidiana de las familias.

Consideraciones finales e implicaciones para la práctica

las madres experimentaron sentimientos de miedo e inseguridad ante el diagnóstico de su hijo y la rutina de cuidados, especialmente los cambios de apósito diarios provocaron una sobrecarga física y emocional. Estos resultados pueden servir de apoyo para el seguimiento de estas familias, con el fin de poder cuidarlas y apoyarlas emocionalmente.

Palabras clave:
Adolescente; Niño; Enfermería; Epidermólisis Bullosa; Madres

Abstract

Objective

to know and analyze mothers’ experiences in caring for children and adolescents with Epidermolysis Bullosa.

Method

a descriptive qualitative study was developed with ten mothers of children and adolescents with epidermolysis bullosa from different regions of Brazil using semi-structured interviews recorded remotely using Google Meet® between September and November 2021. The thematic analysis technique guided the appreciation of the empirical material.

Results

mothers aged between 23 and 53 years participated in the study. Two categories translate the maternal experience: i) the “shock” of the diagnosis and the initial challenges and ii) “Stop living to live for them”: the changes in the families’ daily life.

Final considerations and implications for practice

mothers experienced fear and insecurity when their child was diagnosed, and the care routine, especially the daily dressing changes, caused a physical and emotional burden. These results can support the follow-up of these families to provide them with care tools and emotional support.

Keywords:
Adolescent; Child; Nursing; Epidermolysis Bullosa; Mothers

INTRODUÇÃO

A Epidermólise Bolhosa (EB) pertence a um grupo de genodermatoses fenotipicamente diferentes que podem ser hereditárias ou adquiridas. De maneira geral, caracteriza-se pela fragilidade da pele, com formação de bolhas ou outras lesões, podendo afetar as mucosas.11 Secco IL, Costa T, Moraes ELL, Freire MHS, Danski MTR, Oliveira DAS. Cuidados de enfermagem a neonato com epidermólise bolhosa: relato de caso. Rev Esc Enferm USP. 2019;53:e03501. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2018023603501. PMid:31800804.
http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2018...
Existem mais de 30 subtipos de EB, categorizados em quatro grupos: i) Epidermólise Bolhosa Simples (EBS); ii) Epidermólise Bolhosa Juncional (EBJ); iii) Epidermólise Bolhosa Distrófica (EBD); e iv) Epidermólise Bolhosa de Kindler (EBK).22 Bardhan A, Bruckner-Tuderman L, Chapple ILC, Fine JD, Harper N, Has C et al. Epidermolysis bullosa. Nat Rev Dis Primers. 2020;6(1):78. http://dx.doi.org/10.1038/s41572-020-0210-0.
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Estima-se cerca de 500.000 pessoas com EB no mundo, em sua maioria crianças e adolescentes. A incidência nos Estados Unidos da América (EUA) é de 19,57 casos por um milhão de nascidos vivos.33 Fine JD. Epidemiology of inherited epidermolysis bullosa based on incidence and prevalence estimates from the national epidermolysis bullosa registry. JAMA Dermatol. 2016;152(11):1231-8. http://dx.doi.org/10.1001/jamadermatol.2016.2473.
http://dx.doi.org/10.1001/jamadermatol.2...
No Brasil, não há dados epidemiológicos robustos, porque a EB não compõe a lista de doenças e agravos de notificação compulsória.44 Silva RA, Souza SPS, Bernardino FBS, Alencastro LCS. Cuidado familiar à criança e ao adolescente com epidermólise bolhosa: uma revisão integrativa da literatura. Rev Baiana Enferm. 2020;34:e35781. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v34.35781.
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No que se refere aos desafios vivenciados por essa população, destaca-se a dificuldade de definição do diagnóstico e de início precoce e oportuno do tratamento. Ainda se observa fragilidades no acesso aos insumos, prejudicando a continuidade do cuidado.44 Silva RA, Souza SPS, Bernardino FBS, Alencastro LCS. Cuidado familiar à criança e ao adolescente com epidermólise bolhosa: uma revisão integrativa da literatura. Rev Baiana Enferm. 2020;34:e35781. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v34.35781.
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,55 Kearney S, Donohoe A, McAuliffe E. Living with epidermolysis bullosa: Daily challenges and health-care needs. Health Expect. 2020;23(2):368-76. http://dx.doi.org/10.1111/hex.13006. PMid:31868299.
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A dor é uma experiência comum entre as pessoas com EB, sobretudo frente à necessidade de realização de curativos diários.55 Kearney S, Donohoe A, McAuliffe E. Living with epidermolysis bullosa: Daily challenges and health-care needs. Health Expect. 2020;23(2):368-76. http://dx.doi.org/10.1111/hex.13006. PMid:31868299.
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,66 Mauritz P, Jonkman MF, Visser SS, Finkenauer C, Duipmans JC, Hagedoorn M. Impact of painful wound care in Epidermolysis Bullosa during childhood: an interview study with adult patients and parents. Acta Derm Venereol. 2019;99(9):783-8. http://dx.doi.org/10.2340/00015555-3179. PMid:30896776.
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As trocas de curativos costumam representar uma experiência traumática tanto para a criança/o adolescente quanto para os pais e cuidadores, mas não devem ser negligenciadas em razão do risco de infecção.11 Secco IL, Costa T, Moraes ELL, Freire MHS, Danski MTR, Oliveira DAS. Cuidados de enfermagem a neonato com epidermólise bolhosa: relato de caso. Rev Esc Enferm USP. 2019;53:e03501. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2018023603501. PMid:31800804.
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A falsa ideia de se tratar de uma doença infectocontagiosa também traz prejuízo às relações sociais.44 Silva RA, Souza SPS, Bernardino FBS, Alencastro LCS. Cuidado familiar à criança e ao adolescente com epidermólise bolhosa: uma revisão integrativa da literatura. Rev Baiana Enferm. 2020;34:e35781. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v34.35781.
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De maneira geral, a condição repercute negativamente na qualidade de vida da pessoa afetada e da família.77 Chogani F, Parvizi MM, Murrell DF, Handjani F. Assessing the quality of life in the families of patients with epidermolysis bullosa: the mothers as main caregivers. Int J Womens Dermatol. 2021;7(5):721-6. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijwd.2021.08.007.
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Uma revisão de escopo recentemente publicada, que tinha como problema “Quais são as necessidades de suporte de pais cuidadores de crianças com EB?”, identificou 11 estudos que atenderam aos critérios de inclusão, em sua maioria oriundos da Europa e da América do Norte.88 Ireland CJ, Pelentsov LJ, Kopecki Z. Caring for a child with Epidermolysis Bullosa: a scoping review on the family impacts and support needs. Wound Pract Res. 2021;29(2):86-97. http://dx.doi.org/10.33235/wpr.29.2.86-97.
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Nenhum estudo brasileiro foi incluído nessa revisão, indicando escassez de pesquisas nacionais sobre a temática.

Diante do exposto, o presente estudo partiu dos seguintes questionamentos: como se dá a vivência de mães no cuidado de crianças e adolescentes com EB? Quais são os desafios e as estratégias de enfrentamento adotadas? Assim, esse estudo teve como objetivo conhecer e analisar as vivências de mães no cuidado de crianças e adolescentes com EB.

MÉTODO

Trata-se de um estudo descritivo de abordagem qualitativa.99 Flick U. Introdução à pesquisa qualitativa. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2009. Essa abordagem busca reconhecer e analisar diferentes perspectivas, valorando características subjetivas e individualidades.99 Flick U. Introdução à pesquisa qualitativa. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2009.

Quanto às participantes do estudo, os critérios de inclusão foram ser mãe de uma criança ou adolescente com EB e ser maior de 18 anos. Adotou-se como critério de exclusão não ser a principal responsável pelo cuidado do(a) filho(a). Apesar da existência desse critério de exclusão, não foi necessário aplicá-lo, uma vez que todas as mães que manifestaram interesse em participar da pesquisa eram as principais responsáveis pela criança ou pelo adolescente.

A fim de localizar e recrutar potenciais participantes, foram realizadas buscas eletrônicas nas redes sociais (Instagram® e Facebook®), utilizando o uni termo “epidermólise bolhosa”. Foram identificados diversos grupos e páginas de Organizações Não-Governamentais (ONGs) que apoiam famílias de crianças e adolescentes com EB e/ou divulgam informações para a conscientização sobre a doença.

A seguir, foi realizada uma busca na lista de seguidores dos grupos ou das páginas, com atenção especial aos usuários que interagiam nas postagens. Preconizou-se a busca por perfis abertos nas redes sociais, que muitas vezes continham em suas descrições a referência ao/à filho(a) com EB, bem como a divulgação de fotos da criança/do adolescente disponíveis publicamente. O convite foi enviado individualmente, por mensagem direta nos perfis das participantes, cadastrados nas redes sociais.

A mensagem continha a apresentação pessoal, os objetivos do estudo e o endereço de e-mail da primeira autora para que as interessadas entrassem em contato. O convite foi enviado por mensagem privada a 48 mães e, destas, 14 manifestaram interesse inicial, mas quatro delas não estiveram presentes virtualmente no dia e horário agendados. A pesquisadora entrou em contato para reagendar e não obteve retorno. Assim, foi constituída uma amostragem de conveniência de 10 participantes. Vale destacar que foi solicitada a divulgação do estudo nas redes sociais das ONGs e das páginas relacionadas à temática; contudo, não houve nenhuma manifestação de interesse por essa via.

Diante da manifestação de interesse em integrar o estudo, foi disponibilizado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para leitura. Após a concordância, foi realizado o agendamento da entrevista remota via Google Meet®. Optou-se por essa plataforma pela familiaridade e pela facilidade de uso, bem como pela gratuidade. Ademais, trata-se de um recurso que garante a segurança da privacidade das participantes, pois os dados são criptografados.

A produção do material empírico ocorreu entre os meses de setembro e novembro de 2021 e as entrevistas foram conduzidas pela primeira autora desse artigo, estudante do curso de bacharelado em enfermagem, mediante treinamento prévio ofertado pela orientadora e pela coorientadora, ambas com experiência na condução de estudos qualitativos. Desse modo, as perguntas iniciais tinham a intenção de caracterizar as mães quanto à idade, à situação conjugal, à escolaridade, à ocupação e à renda, bem como caracterizar a criança ou o adolescente com EB quanto ao sexo, à idade, à idade do diagnóstico e ao número de internações no último ano. A segunda parte da entrevista foi desenvolvida a partir das seguintes questões norteadoras: conte-me sobre a sua experiência em cuidar de um/a filho/a com EB; conte-me sobre as repercussões e os desafios de ter um/a filho/a com EB; e conte-me sobre as estratégias que você utiliza para lidar com esses desafios. Todas as entrevistas foram áudio-gravadas na própria plataforma e tiveram a duração aproximada de 30 minutos.

Faz-se importante destacar que a opção por realizar as entrevistas de forma remota se deu em virtude do contexto pandêmico. Dentre as vantagens dessa estratégia, destaca-se a possibilidade de entrevistar mães de diversas regiões do Brasil e, como fator limitante, a impossibilidade de o pesquisador se inserir e observar o contexto de vida dessas mulheres, cujas constatações certamente enriqueceriam o material empírico.

A seguir, as entrevistas tiveram áudio e vídeo gravados remotamente, foram transcritas na íntegra e sofreram os processos analíticos preconizados pela análise de conteúdo na modalidade temática,1010 Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2011. 229 p. iniciando com a leitura flutuante das transcrições e passando para sucessivas e minuciosas leituras para explorar o material empírico produzido. Houve a codificação dos dados a partir das suas semelhanças e diferenças e, posteriormente, o agrupamento em categorias temáticas. O Quadro 1 apresenta uma síntese de como se deu o processo analítico até a construção das categorias temáticas, as quais foram: i) O “baque” do diagnóstico e os desafios iniciais; e ii) “Deixar de viver para viver para ele”: as mudanças no cotidiano das famílias.

Quadro 1
Codificação dos dados da pesquisa. Ribeirão Preto - SP, Brasil, 2021.

Todos os preceitos éticos para estudos envolvendo seres humanos foram seguidos. O projeto foi apreciado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob o número CAAE 48589221.0.0000.5393 e o número do parecer 4.952.903, de setembro de 2021. Para a garantia do sigilo e da confidencialidade, as participantes foram identificadas pela letra “P”, seguida de um número ordinal de acordo com a ordem de realização das entrevistas.

RESULTADOS

Participaram do estudo 10 mães, sendo nove biológicas e uma afetiva, com idade entre 23 e 53 anos. Com relação à situação conjugal, 06 referiram conviver com companheiro, 03 estavam divorciadas e 01 solteira. Quanto ao nível de escolaridade, a maioria cursou até o ensino médio, mas 03 tinham ensino superior completo e 01, ensino fundamental incompleto. A renda per capita da família variou de 275 a 6.250 reais, o que corresponde a uma média de 1.321,83 reais. A maioria (60%) não exercia atividade remunerada. A aplicação remota possibilitou a participação de mães que residiam em diferentes regiões do país, sendo 06 do Sudeste, 03 do Nordeste e 01 do Sul.

As crianças e os adolescentes com EB tinham entre 2 e 16 anos, sendo 05 do sexo feminino e 05 do sexo masculino. Na maior parte dos casos (90%), o diagnóstico de EB foi confirmado nos primeiros 03 dias de vida. Somente uma criança necessitou de internação no último ano, em três ocasiões.

O “baque” do diagnóstico e os desafios iniciais

Segundo as mães, o diagnóstico de EB foi inesperado e provocou a vivência de uma diversidade de emoções. O sentimento de luto diante da ruptura da criança idealizada e saudável ocorreu de forma brusca e intensa no nascimento:

No começo é o susto, né? Existe o luto que você tem que fazer do filho idealizado, porque é uma doença que não aparece no processo de pré-natal, gestação. P9

Como eu sou mãe de primeira viagem, esperava a criança saudável, porque na gestação eu fiz tudo certinho. E aí quando nasce assim é um baque, né? P7

Meus pés saíram do chão, eu acho que eu nem senti o chão embaixo dos meus pés. Parece que o mundo desabou sobre mim. P3

Ainda, o diagnóstico inesperado causou revolta e questionamentos acerca da justiça de Deus, bem como sentimentos negativos:

É claro que ninguém espera ter um filho com qualquer tipo de problema, eu tive um momento de revolta, de me questionar [...] eu pensava as piores coisas, tanto em relação a ela quanto em relação a mim, questionamentos a Deus do tipo porque comigo, eu fiz tudo certinho. P1

Por se tratar de uma doença rara, a maioria das mães a desconhecia, o que intensificou o medo e as incertezas. Nessa direção, o início da trajetória foi marcado por muitos desafios, sobretudo pelo ineditismo da experiência:

Não é fácil não. Nossa! No começo é muito difícil, é tudo novo, a gente nunca tinha ouvido falar da epidermólise bolhosa, é tudo novo. P6

No início, foi muito difícil, porque eu nunca tinha ouvido falar sobre o caso. Nos primeiros dias foi muito difícil, né? P7

Foi assim bem assustador, sabe. Eu nunca tinha visto isso na minha vida. P2

Diante da surpresa, a busca inicial por informações na internet se fez presente. No entanto, as imagens impactantes das lesões repercutiram negativamente, conforme exposto no depoimento abaixo:

O pior que uma mãe faz é pesquisar na internet, porque na internet é devastador, a internet é a pior coisa [...] a internet piora cinquenta mil vezes, tem imagens, cenas muito pesadas. Então, inicialmente foi brutal, foi terrível. Eu fiquei sem chão, fiquei sem reação. P10

Contudo, o impacto é atenuado quando há um histórico de experiências pessoais com filhos com EB ou de casos na família, propiciando a troca de experiências sobre o cuidado e constituindo uma rede de apoio para o enfrentamento da doença:

Eu tinha minha tia que tem uma filha com EB, aí ela passou pra mim os cuidados que ela já tinha com ela...Aí no meu caso, apesar de ser difícil, foi ainda um pouco mais fácil que algumas mães que não tem nem um pouco de noção do que é a doença. P8

A gente tinha uma filha já com essa doença, a primeira filha que foi né? Que foi a surpresa tudo… só mesmo o dia a dia, pra mostrar que a gente é capaz. P10

Transcorrido o impacto inicial do diagnóstico, que para a maioria das entrevistadas ocorreu ainda na maternidade, chega o momento da alta hospitalar e da consequente transição do recém-nascido com EB para o domicílio sob o cuidado da família, geralmente das mães. Os cuidados diários, como o banho, a troca de roupas e os curativos, representaram um desafio diante da complexidade da condição da criança, associada ao desconhecimento para a realização desses procedimentos. A participante número 01 (P1) utilizou a expressão “tudo muito intenso” para se referir a esse momento, perspectiva que também foi retratada pelas mães 04 e 05:

Desde banho, curativo, leite, foi tudo muito intenso naquele momento, tudo muito intenso. P1

Os primeiros dias a gente enlouquece, a verdade é essa. P5

Foi bem difícil, porque não tinha nem pegado numa atadura, não sabia nada desses procedimentos. Furar bolhas, os curativos, nada, a gente não sabia nada. P4

Todavia, com o passar do tempo, as mães vão acumulando experiências e se sentem menos aflitas para o cuidado cotidiano. Assim, a experiência adquirida pela P1 possibilitou um manejo descontraído e lúdico dos curativos diários da filha, de modo a minimizar o sofrimento físico e emocional da criança:

Hoje em dia, eu já me acostumei, ela já está com 11 anos, eu já me acostumei a lidar com a EB. Eu não deixo a peteca dela cair, eu tento procurar ser sempre muito engraçada, eu brinco na hora dos curativos, até com os curativos, eu faço desenho no curativo, sabe, eu corto curativo em forma de coração. P1

As reações iniciais com o intuito de proteção levaram as mães a isolarem a criança, inserindo-a “dentro de uma bolha”. O estresse relacionado à doença ocasionou o comportamento de cuidado excessivo com a criança e com o ambiente domiciliar, sobretudo na questão da limpeza, para evitar infecções. Nessa perspectiva, a P10 contou sobre o seu receio de receber visitas logo após a alta hospitalar e sobre como, ao longo do tempo, foi se tranquilizando e buscando equilíbrio, no sentido de manter uma vida normal:

Quando você chega em casa, você já fica neurótica, você não quer ninguém na sua casa, porque você tem medo das pessoas passarem alguma coisa pra ela. Você limpa o quarto vinte e quatro horas por dia com álcool, é aquela neurose bem louca mesmo [...] depois você aprende com o dia a dia que sua filha pode ser normal, que sua filha está protegida com as coberturas, que não vai pegar nada, que você não precisa proteger ela do mundo. P10

“Deixar de viver para viver para ele”: as mudanças no cotidiano das famílias

Embora mais tranquilas para manejar a EB, a exigência de atenção e de cuidados constantes concomitante aos afazeres domésticos e ao trabalho formal acarreta cansaço, privação de sono e sobrecarga, causando repercussões físicas e emocionais para as mães.

Eu só trabalho, trabalho [...] parece que não, mas tudo aumenta, praticamente todos os dias você troca a roupa de cama dele, é uma casa que precisa ser um pouquinho mais limpa por causa de contaminação e tudo. P5

A batalha é grande, o cansaço é extremo, porque tem toda a rotina de trabalho, aí chega em casa tem a questão dele, não dorme direito, ou seja, se ele não dorme direito a gente também não consegue descansar, é bem cansativo, bem cansativo mesmo. P6

Diante da intenção de fazer o melhor pelo/a filho/a, muitas vezes as mães negligenciam as próprias necessidades, o olhar para si e o autocuidado. As mulheres se habituam e se adaptam a esse tipo de comportamento, mantendo-o por um longo período e mudando drasticamente as suas vidas para viverem prioritariamente para o cuidado do/a filho/a, como exemplificado nas falas a seguir:

A última vez que eu fui no médico, foi quando eu tive meu filho mais novo (risos). P3

Não sobra tempo, e você acaba se esquecendo de você e acostumando a ser assim. P5

A gente acaba ficando um pouco desleixada. Eu conseguia fazer academia, fazer unha, fazer cabelo, hoje não dá. O pai fazia caminhada, não dá também. Hoje a gente faz pra gente o que der e quando der, a prioridade é ele. Então, a gente mudou muito a vida pra encaixar ele na nossa vida, a gente deixou de viver pra gente pra viver pra ele. P6

Eu acho que eu me descuidei um pouco. Porque eu só penso nela. Eu só quero saber dela. Ela estando bem é o que importa, né? P7

Em contrapartida, algumas mães reconhecem o autocuidado como essencial para o seu bem-estar físico e mental e lançam esforços na tentativa de adaptar a rotina para conciliar e incorporar ações nessa direção:

Eu comecei faz pouco tempo a olhar pra mim, eu comecei a ir na psicóloga, porque eu estava chegando num limite assim. Eu esqueci de mim completamente. P4

Eu cuido de mim em casa mesmo, arrumo meu cabelo em casa, arrumo minha unha em casa, tudo eu mesma. P10

Condições econômicas favoráveis, assim como uma rede de apoio social estruturada e fortalecida, mostraram-se determinantes para possibilitar momentos de lazer e de autocuidado. Entretanto, essa realidade não é a mais frequente para a maioria das mães entrevistadas nesse estudo:

Eu tenho uma empregada doméstica e tenho babá. Então, é uma realidade diferente da maior parte das mães. Eu faço pilates, eu faço natação com meu filho, se eu tiver vontade de sair e tomar um café à tarde eu saio e tomo meu café. Eu tenho um tempo pra mim, eu posso sair porque eu sei que minha filha vai ficar bem cuidada. P9

Eu tenho muita ajuda do pai, apesar de tudo, de a gente ser separado, ele fica de 15 em 15 dias com ela o final de semana, tenho a minha mãe que me ajuda. Aí nesses momentos eu aproveito pra fazer uma unha, pra fazer um cabelo, pra me cuidar, pra fazer terapia. P1

DISCUSSÃO

O presente estudo apresentou a vivência das mães no cuidado de crianças e adolescentes com EB, revelando suas emoções iniciais diante do diagnóstico, ainda na maternidade, e as tensões com os cuidados cotidianos.

De acordo com os resultados apresentados, a maioria (06) das mães afirmou conviver com o companheiro. Entretanto, em um inquérito epidemiológico realizado nos Estados Unidos da América, foi identificada a alta incidência de divórcio em famílias com filhos com EB, sobretudo nos casos mais severos da doença.33 Fine JD. Epidemiology of inherited epidermolysis bullosa based on incidence and prevalence estimates from the national epidermolysis bullosa registry. JAMA Dermatol. 2016;152(11):1231-8. http://dx.doi.org/10.1001/jamadermatol.2016.2473.
http://dx.doi.org/10.1001/jamadermatol.2...
O cuidado e a atenção às necessidades da criança portadora de EB é um evento que ocasiona estresse físico e mental e que tem o potencial de impactar no relacionamento marital.1111 Chateau AV, Blackbeard D, Aldous C. The impact of epidermolysis bullosa on the family and healthcare practitioners: a scoping review. Int J Dermatol. 2022. No prelo. http://dx.doi.org/10.1111/ijd.16197. PMid:35524482.
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Ademais, o maior grau de severidade da condição da criança impacta negativamente nas relações sexuais do casal55 Kearney S, Donohoe A, McAuliffe E. Living with epidermolysis bullosa: Daily challenges and health-care needs. Health Expect. 2020;23(2):368-76. http://dx.doi.org/10.1111/hex.13006. PMid:31868299.
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e na decisão de não ter outros filhos.1212 Bruckner AL, Losow M, Wisk J, Patel N, Reha A, Lagast H et al. The challenges of living with and managing epidermolysis bullosa: insights from patients and caregivers. Orphanet J Rare Dis. 2020;15(1):1. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-1279-y. PMid:31900176.
http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-127...

Outro fator impactante na dinâmica familiar se refere à dificuldade de o cônjuge compreender a complexidade da doença e o cuidado requisitado.1212 Bruckner AL, Losow M, Wisk J, Patel N, Reha A, Lagast H et al. The challenges of living with and managing epidermolysis bullosa: insights from patients and caregivers. Orphanet J Rare Dis. 2020;15(1):1. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-1279-y. PMid:31900176.
http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-127...
As mães são as principais responsáveis pelo cuidado da criança e, consequentemente, as mais afetadas nesse processo,1212 Bruckner AL, Losow M, Wisk J, Patel N, Reha A, Lagast H et al. The challenges of living with and managing epidermolysis bullosa: insights from patients and caregivers. Orphanet J Rare Dis. 2020;15(1):1. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-1279-y. PMid:31900176.
http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-127...
,1313 Kahraman S, Çiftçi EK, Timuçin A. Determination of caregiving burden of parentsproviding care to their children with epidermolysis bullosa. Egypt J Dermatol Venerol. 2017;37(1):1-6. http://dx.doi.org/10.4103/1110-6530.207488.
http://dx.doi.org/10.4103/1110-6530.2074...
sendo fundamental que os profissionais de saúde encorajarem o envolvimento paterno no cuidado do/a filho/a com EB.1313 Kahraman S, Çiftçi EK, Timuçin A. Determination of caregiving burden of parentsproviding care to their children with epidermolysis bullosa. Egypt J Dermatol Venerol. 2017;37(1):1-6. http://dx.doi.org/10.4103/1110-6530.207488.
http://dx.doi.org/10.4103/1110-6530.2074...

A renda média mensal das mães participantes do presente estudo foi de 1.321,83 reais e a maioria não exercia atividade remunerada. A problemática do ônus socioeconômico decorrente da EB foi abordada em uma investigação realizada em 08 países europeus e, segundo os autores, os custos são decorrentes de cuidados direta ou indiretamente relacionados à saúde, como transporte, aquisição de medicamentos, consultas médicas especializadas, exames, insumos para os curativos e, por fim, a perda de produtividade do principal cuidador.1414 Angelis A, Kanavos P, López-Bastida J, Linertová R, Oliva-Moreno J, Serrano-Aguilar P et al. Social/economic costs and health-related quality of life in patients with epidermolysis bullosa in Europe. Eur J Health Econ. 2016;17(Supl. 1):31-42. http://dx.doi.org/10.1007/s10198-016-0783-4. PMid:27107597.
http://dx.doi.org/10.1007/s10198-016-078...
Na mesma direção, um estudo norte-americano concluiu que a doença causa encargos financeiros mesmo para aqueles que possuem cobertura de saúde, uma vez que nem todas as despesas são reembolsadas, como curativos e materiais para as feridas.1515 Wu YH, Sun FK, Lee PY. Family caregivers’ lived experiences of caring for epidermolysis bullosa patients: a phenomenological study. J Clin Nurs. 2020;29(9-10):1552-60. http://dx.doi.org/10.1111/jocn.15209. PMid:32043289.
http://dx.doi.org/10.1111/jocn.15209...

Outro resultado encontrado diz respeito aos desafios vivenciados pelas mães participantes após o nascimento e a confirmação do diagnóstico de EB do/a filho/a, especialmente pelo desconhecimento sobre a doença e pela insegurança para realizar o cuidado no domicílio. Os pais vivenciam uma ampla gama de emoções frente a um recém-nascido com EB, o que perdura por toda a vida da criança.1212 Bruckner AL, Losow M, Wisk J, Patel N, Reha A, Lagast H et al. The challenges of living with and managing epidermolysis bullosa: insights from patients and caregivers. Orphanet J Rare Dis. 2020;15(1):1. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-1279-y. PMid:31900176.
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Soma-se ao nascimento o choque, a ansiedade, a negação, a perda de esperança, o medo e a sobrecarga, podendo inclusive rejeitar ou evitar ver o bebê, possivelmente devido ao impacto da condição do recém-nascido e do aspecto das lesões cutâneas.1212 Bruckner AL, Losow M, Wisk J, Patel N, Reha A, Lagast H et al. The challenges of living with and managing epidermolysis bullosa: insights from patients and caregivers. Orphanet J Rare Dis. 2020;15(1):1. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-1279-y. PMid:31900176.
http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-127...
,1515 Wu YH, Sun FK, Lee PY. Family caregivers’ lived experiences of caring for epidermolysis bullosa patients: a phenomenological study. J Clin Nurs. 2020;29(9-10):1552-60. http://dx.doi.org/10.1111/jocn.15209. PMid:32043289.
http://dx.doi.org/10.1111/jocn.15209...
,1616 Silva RA, Santos RES, Alencastro LCS, Mocheuti KN, Pinheiro TF, Bernardino FBS. A vivência do cuidado materno a uma lactente com epidermólise bolhosa. Rev Enferm Cent Oeste Min. 2020;10:e4133. http://dx.doi.org/10.19175/recom.v10i0.4133.
http://dx.doi.org/10.19175/recom.v10i0.4...

O medo do desconhecido e a necessidade de suporte emocional também foram retratados em um estudo de abordagem qualitativa realizado na Irlanda.55 Kearney S, Donohoe A, McAuliffe E. Living with epidermolysis bullosa: Daily challenges and health-care needs. Health Expect. 2020;23(2):368-76. http://dx.doi.org/10.1111/hex.13006. PMid:31868299.
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Segundo relatos dessa investigação, as trocas de curativos foram uma tarefa particularmente difícil, pois causava dor intensa ao/à filho/a e esse sofrimento era insuportável para os pais. Todavia, o amparo do profissional enfermeiro foi evidenciado positivamente.55 Kearney S, Donohoe A, McAuliffe E. Living with epidermolysis bullosa: Daily challenges and health-care needs. Health Expect. 2020;23(2):368-76. http://dx.doi.org/10.1111/hex.13006. PMid:31868299.
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Outras investigações corroboram ao apontar que o manuseio diário das lesões mobiliza nos cuidadores sentimentos de tristeza, ansiedade, raiva, desespero, estresse e impotência, podendo ainda emergir a culpa por se sentirem responsáveis pela dor da criança durante os cuidados e as trocas de roupas.66 Mauritz P, Jonkman MF, Visser SS, Finkenauer C, Duipmans JC, Hagedoorn M. Impact of painful wound care in Epidermolysis Bullosa during childhood: an interview study with adult patients and parents. Acta Derm Venereol. 2019;99(9):783-8. http://dx.doi.org/10.2340/00015555-3179. PMid:30896776.
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,1616 Silva RA, Santos RES, Alencastro LCS, Mocheuti KN, Pinheiro TF, Bernardino FBS. A vivência do cuidado materno a uma lactente com epidermólise bolhosa. Rev Enferm Cent Oeste Min. 2020;10:e4133. http://dx.doi.org/10.19175/recom.v10i0.4133.
http://dx.doi.org/10.19175/recom.v10i0.4...
,1717 Martin K, Geuens S, Asche JK, Bodan R, Browne F, Downe A et al. Psychosocial recommendations for the care of children and adults with epidermolysis bullosa and their family: evidence based guidelines. Orphanet J Rare Dis. 2019;14(1):133. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-1086-5. PMid:31186066.
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Denota-se que os níveis de ansiedade e de sentimentos negativos vivenciados pelos pais se relacionam diretamente à intensidade do desconforto e da ansiedade da criança, de modo que envolver a criança no cuidado e implementar abordagens lúdicas para distraí-las podem ser estratégias efetivas para o enfrentamento desses sentimentos negativos durante o cuidado com as lesões.1818 Mauritz PJ, Bolling M, Duipmans JC, Hagedoorn M. Patients’ and parents’ experiences during wound care of epidermolysis bullosa from a dyadic perspective: a survey study. Orphanet J Rare Dis. 2022;17(1):313. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-022-02462-y. PMid:35964099.
http://dx.doi.org/10.1186/s13023-022-024...

A sobrecarga materna também foi identificada no presente estudo, com destaque para a sobreposição dos cuidados do/a filho/a com EB com os afazeres domésticos e/ou o trabalho formal. Segundo uma revisão integrativa da literatura que analisou como se dá o cuidado familiar de crianças e adolescentes com EB, é recorrente a necessidade de conciliar as tarefas domésticas com os cuidados diários do filho adoecido. No entanto, tal realidade impacta negativamente na qualidade de vida e nas atividades socioprofissionais dessas mulheres.44 Silva RA, Souza SPS, Bernardino FBS, Alencastro LCS. Cuidado familiar à criança e ao adolescente com epidermólise bolhosa: uma revisão integrativa da literatura. Rev Baiana Enferm. 2020;34:e35781. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v34.35781.
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As repercussões físicas e emocionais são evidenciadas na exaustão, na privação de sono e na frustração ao tentar conciliar o trabalho e o cuidado do/a filho/a, com a presença de sintomas como perda de apetite e de peso e dores de cabeça.1515 Wu YH, Sun FK, Lee PY. Family caregivers’ lived experiences of caring for epidermolysis bullosa patients: a phenomenological study. J Clin Nurs. 2020;29(9-10):1552-60. http://dx.doi.org/10.1111/jocn.15209. PMid:32043289.
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,1717 Martin K, Geuens S, Asche JK, Bodan R, Browne F, Downe A et al. Psychosocial recommendations for the care of children and adults with epidermolysis bullosa and their family: evidence based guidelines. Orphanet J Rare Dis. 2019;14(1):133. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-1086-5. PMid:31186066.
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,1818 Mauritz PJ, Bolling M, Duipmans JC, Hagedoorn M. Patients’ and parents’ experiences during wound care of epidermolysis bullosa from a dyadic perspective: a survey study. Orphanet J Rare Dis. 2022;17(1):313. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-022-02462-y. PMid:35964099.
http://dx.doi.org/10.1186/s13023-022-024...

De acordo com um estudo qualitativo realizado em Taiwan, a demanda por cuidados contínuos prejudica a qualidade do sono e potencializa a ansiedade e a depressão, reforçando a fadiga emocional e física desses familiares.1515 Wu YH, Sun FK, Lee PY. Family caregivers’ lived experiences of caring for epidermolysis bullosa patients: a phenomenological study. J Clin Nurs. 2020;29(9-10):1552-60. http://dx.doi.org/10.1111/jocn.15209. PMid:32043289.
http://dx.doi.org/10.1111/jocn.15209...
Ainda, um estudo desenvolvido a partir da análise de um caso de recém-nascido com EB, ocorrido em um hospital infantil do Sul do Brasil, identificou como possível diagnóstico de enfermagem a tensão no papel de cuidador, reforçando a necessidade de intervenções que atendam esse aspecto.11 Secco IL, Costa T, Moraes ELL, Freire MHS, Danski MTR, Oliveira DAS. Cuidados de enfermagem a neonato com epidermólise bolhosa: relato de caso. Rev Esc Enferm USP. 2019;53:e03501. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2018023603501. PMid:31800804.
http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2018...

Nessa pesquisa, uma das mães possuía uma condição socioeconômica mais favorável, o que lhe permitia contar com uma profissional para cuidar do filho. Segundo o seu relato, tal apoio permitia uma maior flexibilidade na sua rotina, inclusive para lazer e cuidado do filho saudável. Nesse sentido, a recomendação de suporte psicológico, em especial aos familiares cuidadores com menor nível socioeconômico, apresentada por um estudo quantitativo que analisou a qualidade de vida de 80 cuidadores de crianças com EB no Irã se alinha aos resultados do presente estudo.77 Chogani F, Parvizi MM, Murrell DF, Handjani F. Assessing the quality of life in the families of patients with epidermolysis bullosa: the mothers as main caregivers. Int J Womens Dermatol. 2021;7(5):721-6. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijwd.2021.08.007.
http://dx.doi.org/10.1016/j.ijwd.2021.08...

Algumas mães vivenciaram a oportunidade de contar com o apoio de familiares para minimizar a sobrecarga, corroborando os relatos de alguns pais irlandeses que também receberam apoio informal de amigos e familiares.55 Kearney S, Donohoe A, McAuliffe E. Living with epidermolysis bullosa: Daily challenges and health-care needs. Health Expect. 2020;23(2):368-76. http://dx.doi.org/10.1111/hex.13006. PMid:31868299.
http://dx.doi.org/10.1111/hex.13006...
Por outro lado, os autores destacam que é comum os pais terem medo de deixar seus filhos com EB com outras pessoas, principalmente pelo receio de se machucarem.55 Kearney S, Donohoe A, McAuliffe E. Living with epidermolysis bullosa: Daily challenges and health-care needs. Health Expect. 2020;23(2):368-76. http://dx.doi.org/10.1111/hex.13006. PMid:31868299.
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No entanto, faz-se fundamental a promoção de momentos de lazer e de recreação, de um período de férias e da manutenção da vida social para o fortalecimento da unidade familiar.1717 Martin K, Geuens S, Asche JK, Bodan R, Browne F, Downe A et al. Psychosocial recommendations for the care of children and adults with epidermolysis bullosa and their family: evidence based guidelines. Orphanet J Rare Dis. 2019;14(1):133. http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-1086-5. PMid:31186066.
http://dx.doi.org/10.1186/s13023-019-108...

Embora no presente estudo tenha sido relatado um impacto negativo da internet, devido ao choque inicial com as imagens das lesões cutâneas ocasionadas pela EB, as redes vêm ganhando notoriedade por possibilitar o compartilhamento de experiências entre as famílias que vivenciam a mesma situação, de modo a emponderá-las acerca das especificidades do cuidado à criança/ao adolescente.1616 Silva RA, Santos RES, Alencastro LCS, Mocheuti KN, Pinheiro TF, Bernardino FBS. A vivência do cuidado materno a uma lactente com epidermólise bolhosa. Rev Enferm Cent Oeste Min. 2020;10:e4133. http://dx.doi.org/10.19175/recom.v10i0.4133.
http://dx.doi.org/10.19175/recom.v10i0.4...
,1919 Frizzo HCF, Bousso RS, Ichikawa CRF, Sá NN. Mães enlutadas: criação de blogs temáticos sobre a perda de um filho. Acta Paul Enferm. 2017;30(2):116-21. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201700019.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-019420170...

CONSIDERAÇÕES FINAIS E IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA

Concluiu-se que os resultados apresentados atenderam ao objetivo proposto e responderam as questões de pesquisa. De maneira geral, as mães vivenciaram sentimentos de medo e de insegurança diante do nascimento de um filho com EB, os quais foram amenizados à medida em que adquiriram conhecimento e habilidades para manejar a situação. A rotina de cuidados, em especial as trocas diárias de curativos, acarretaram sobrecarga física e emocional.

Com relação às implicações para a prática, a presente investigação pode subsidiar ações de acompanhamento a crianças e adolescentes com EB e suas famílias, uma vez que disponibiliza uma síntese dos desafios vivenciados e de potenciais estratégias de apoio. Ademais, recomenda-se que a equipe de enfermagem fortaleça o seu papel de educação em saúde, instrumentalizando essas mães de modo assertivo e oportuno com relação aos cuidados exigidos e buscando apoiá-las emocionalmente.

Foram limitações desse estudo o reduzido número de mães participantes e a impossibilidade de realizar a entrevista presencialmente. Faz-se relevante desenvolver novas pesquisas para ampliar o número de mães participantes e incluir outros membros da família, como pais, avós, tios e irmãos.

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EDITOR CIENTÍFICO

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Jun 2022
  • Aceito
    26 Set 2022
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