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Aspectos conceituais do perdão no campo da Psicologia

Conceptual issues of forgiveness in the field of Psychology

Aspectos conceptuales del perdón en el campo de la Psicología

Resumos

Como a Psicologia é uma ciência relativamente nova, o interesse pelo estudo do perdão nessa área do conhecimento também é recente. Trabalhos mais sistemáticos surgiram apenas na década de 80, ainda fora do País, enquanto aqui, aparecem somente no início dos anos 2000. Considerando a recenticidade da produção científica relativa ao perdão em território nacional, este artigo tem como objetivo apresentar uma revisão de literatura abordando os aspectos conceituais do perdão no campo da Psicologia. Tendo em vista ser comum nas publicações sobre perdão o cuidado dos pesquisadores em definir e esclarecer como compreendem esse construto - sempre enfatizando que o modo como é compreendido tem implicações importantes na maneira como o estudam - um trabalho que trate dessas questões conceituais se mostra relevante para aqueles que estão envolvidos com pesquisas relativas ao tema em nosso país. O texto está estruturado em quatro partes, começando por uma breve apresentação de aspectos históricos relativos aos estudos sobre o perdão. Em seguida, são apresentados os principais pontos de divergência que envolvem a conceituação sobre o perdão. Após isso, são elencadas as principais definições propostas pelos estudiosos do tema, seguidas das considerações finais.

Perdão; Psicologia; Atitudes; Comportamento social; Formação de conceito; Pesquisa científica


As Psychology is a relatively new science, the interest in the study of forgiveness in this area is also new. More systematic works appeared only in the 80's, outside our country, while here it appeared only in the early 2000s. Considering the recency of the scientific production on forgiveness in our country, this article aims to present a review of the literature addressing the conceptual issues of forgiveness in the field of Psychology. Since it is common in publications about forgiveness the concern of researchers to define and clarify how they understand this construct - always emphasizing that the way how we understand forgiveness has important implications in the way we will study it - a work that addresses these issues seems relevant to those who are engaged into research in the topic in our country. The text is divided into four parts, beginning with a brief presentation of the historical aspects of the studies on forgiveness. Next the main points of disagreement surrounding the concept of forgiveness are presented. After that, the main definitions proposed by the researchers are listed, followed by final considerations.

Forgiveness; Psychology; Social behavior; Concept formation; Scientific research


Como la Psicología es una ciencia relativamente nueva, el interés por el estudio del perdón en esa área del conocimiento también es reciente. Trabajos más sistemáticos surgieron sólo en la década de 80, aún fuera del País, mientras aquí, aparecen solamente en el inicio de los años 2000. Considerando el carácter reciente de la producción científica relativa al perdón en territorio nacional, este artículo tiene como objetivo presentar una revisión de literatura abordando los aspectos conceptuales del perdón en el campo de la Psicología. Teniendo en vista ser común en las publicaciones sobre perdón el cuidado de los investigadores en definir y esclarecer como comprenden ese constructo - siempre enfatizando que el modo como es comprendido tiene implicaciones importantes en la manera como lo estudian - un trabajo que trate de esas cuestiones conceptuales se muestra relevante para aquellos que están involucrados con pesquisas relativas al tema en nuestro país. El texto está estructurado en cuatro partes, comenzando por una breve presentación de aspectos históricos relativos a los estudios sobre el perdón. En seguida, son presentados los principales puntos de divergencia que involucran la conceptuación sobre el perdón. Después de eso, son añadidas las principales definiciones propuestas por los estudiosos del tema, seguidas de las consideraciones finales.

Perdón; Psicología; Conducta social; Formación del concepto; Investigación científica


ARTIGOS

Aspectos conceituais do perdão no campo da Psicologia

Conceptual issues of forgiveness in the field of Psychology

Aspectos conceptuales del perdón en el campo de la Psicología

Rodrigo Gomes Santana* * Mestre em Psicologia Aplicada pela Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais – MG – Brasil. E-mail: santagom@hotmail.com ; Renata Ferrarez Fernandes Lopes** ** Doutora em Psicobiologia pela Universidade de São Paulo. Professora associada do Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais – MG – Brasil. E-mail: rfernandeslopes@fapsi.ufu.br

Universidade Federal de Uberlândia

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Rodrigo Gomes Santana Rua do Pedreiro 40, Jardim das Palmeiras, Uberlândia – MG – Brasil. CEP: 38412-302 Email: santagom@hotmail.com

RESUMO

Como a Psicologia é uma ciência relativamente nova, o interesse pelo estudo do perdão nessa área do conhecimento também é recente. Trabalhos mais sistemáticos surgiram apenas na década de 80, ainda fora do País, enquanto aqui, aparecem somente no início dos anos 2000. Considerando a recenticidade da produção científica relativa ao perdão em território nacional, este artigo tem como objetivo apresentar uma revisão de literatura abordando os aspectos conceituais do perdão no campo da Psicologia. Tendo em vista ser comum nas publicações sobre perdão o cuidado dos pesquisadores em definir e esclarecer como compreendem esse construto – sempre enfatizando que o modo como é compreendido tem implicações importantes na maneira como o estudam – um trabalho que trate dessas questões conceituais se mostra relevante para aqueles que estão envolvidos com pesquisas relativas ao tema em nosso país. O texto está estruturado em quatro partes, começando por uma breve apresentação de aspectos históricos relativos aos estudos sobre o perdão. Em seguida, são apresentados os principais pontos de divergência que envolvem a conceituação sobre o perdão. Após isso, são elencadas as principais definições propostas pelos estudiosos do tema, seguidas das considerações finais.

Palavras-chave: Perdão, Psicologia, Atitudes, Comportamento social, Formação de conceito, Pesquisa científica.

ABSTRACT

As Psychology is a relatively new science, the interest in the study of forgiveness in this area is also new. More systematic works appeared only in the 80's, outside our country, while here it appeared only in the early 2000s. Considering the recency of the scientific production on forgiveness in our country, this article aims to present a review of the literature addressing the conceptual issues of forgiveness in the field of Psychology. Since it is common in publications about forgiveness the concern of researchers to define and clarify how they understand this construct – always emphasizing that the way how we understand forgiveness has important implications in the way we will study it – a work that addresses these issues seems relevant to those who are engaged into research in the topic in our country. The text is divided into four parts, beginning with a brief presentation of the historical aspects of the studies on forgiveness. Next the main points of disagreement surrounding the concept of forgiveness are presented. After that, the main definitions proposed by the researchers are listed, followed by final considerations.

Keywords: Forgiveness, Psychology, Social behavior, Concept formation, Scientific research.

RESUMEN

Como la Psicología es una ciencia relativamente nueva, el interés por el estudio del perdón en esa área del conocimiento también es reciente. Trabajos más sistemáticos surgieron sólo en la década de 80, aún fuera del País, mientras aquí, aparecen solamente en el inicio de los años 2000. Considerando el carácter reciente de la producción científica relativa al perdón en territorio nacional, este artículo tiene como objetivo presentar una revisión de literatura abordando los aspectos conceptuales del perdón en el campo de la Psicología. Teniendo en vista ser común en las publicaciones sobre perdón el cuidado de los investigadores en definir y esclarecer como comprenden ese constructo – siempre enfatizando que el modo como es comprendido tiene implicaciones importantes en la manera como lo estudian – un trabajo que trate de esas cuestiones conceptuales se muestra relevante para aquellos que están involucrados con pesquisas relativas al tema en nuestro país. El texto está estructurado en cuatro partes, comenzando por una breve presentación de aspectos históricos relativos a los estudios sobre el perdón. En seguida, son presentados los principales puntos de divergencia que involucran la conceptuación sobre el perdón. Después de eso, son añadidas las principales definiciones propuestas por los estudiosos del tema, seguidas de las consideraciones finales.

Palavras clave: Perdón, Psicología, Conducta social, Formación del concepto, Investigación científica.

A ideia de que as pessoas, por serem perdoadas por Deus, deveriam perdoar seus próprios transgressores é comum à maioria das religiões – especialmente as três grandes tradições monoteístas – que vêm articulando o conceito de perdão por milênios (McCullough & Witvliet, 2002). Além disso, estudiosos como Rique (s.d.), Rique, Camino, Enright e Queiroz (2007) e Exline e Baumeister (2001), explicam que muito do que as pessoas vivenciam e interpretam como injustiça e mágoa – situações que podem ser manejadas por meio do perdão – faz parte da rotina dos relacionamentos em família, na escola e no trabalho, ocasionado, muitas vezes, por aqueles que são mais próximos. Entretanto, apesar da importância do perdão dentro de tradições religiosas – que permeiam nossa sociedade – e do papel do perdão no enfrentamento de situações de mágoa que ocorrem cotidianamente, levou tempo para que surgissem estudos sistemáticos sobre o tema, especialmente no Brasil.

Do mesmo modo como a Psicologia é uma ciência relativamente nova, o interesse pelo estudo do perdão nesse campo do saber também é recente, já que, até pouco tempo, a Psicologia científica não havia dedicado quase nenhuma atenção ao tema. Mas, ainda assim, como apontam McCullough, Pargament e Thoresen (2001), é possível identificar, já na década de 30, artigos teóricos e trabalhos empíricos ainda modestos, elaborados para entender minimamente alguns aspectos relacionados ao comportamento de perdoar. Entretanto, é somente a partir da década de 80 que surge um interesse mais intensivo e metodologicamente estruturado voltado para o estudo do perdão.

Desde então, houve um progresso considerável na definição técnica da atitude de perdoar e de suas formas de mensuração, sendo possível encontrar atualmente diversas escalas que avaliam esse construto e que permitem explorá-lo em seus aspectos desenvolvimental, social, de personalidade, bem como em suas relações com fatores associados à qualidade de vida e de bem-estar (Wade, 1989; WHOQOL group, 1995). Ademais, como apontam McCullough e Witvliet (2002), estudiosos têm progredido na avaliação de seu valor para o bem-estar individual e social (Worthington & Scherer, 2004) e também no desenvolvimento de intervenções para promover o perdão individualmente, em díades e grupos (Enright & Coyle, 1998; Thoresen, Harrys, & Luskin, 2001; Malcom & Greenberg, 2001; Worthington, Sandage, & Berry, 2001; Worthington, 1998; Luskin, 2007).

No Brasil, o interesse e os estudos que envolvem o perdão começaram a surgir – ou melhor, a ser divulgados – apenas na primeira década de 2000, sendo possível encontrar referências ao tema em alguns livros e artigos que vêm sendo publicados desde então. Há no livro Habilidades Sociais Cristãs: Desafios para uma Nova Realidade, de autoria de Almir e Zilda Del Prete (2003), docentes da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), um capítulo que apresenta o perdão como uma habilidade social importante para o estabelecimento de relações sociais saudáveis. Há também o artigo de Paludo e Koller (2007), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), no qual as autoras, ao discorrerem sobre aspectos da Psicologia positiva, apontam o perdão como uma das características passíveis de serem estudadas. Elas explicam que, nessa perspectiva positiva, a investigação assenta-se também sobre estudos a respeito de características individuais relacionadas a forças e virtudes – como sabedoria, espiritualidade, afeto, e perdão – que poderiam promover condições para o desenvolvimento pleno, saudável e positivo dos aspectos biológicos e sociais dos seres humanos.

Há ainda um capítulo de livro intitulado Perdão: uma Visão da Psicologia Evolucionista e da Abordagem Comportamental (Lopes & Santana, 2010) no qual os autores apresentam o estado da arte dos estudos sobre o perdão, enfatizando as possibilidades oferecidas pela Psicologia comportamental para a compreensão desse comportamento, além de fazerem uma exposição focalizando os mecanismos de seleção do comportamento (seleção natural, ontogênica e cultural) possivelmente ligados ao ato de perdoar ou de se vingar.

No mesmo sentido, temos também o livro Comportamento Moral: uma Proposta para o Desenvolvimento das Virtudes. Organizado e publicado em 2010 pela professora Drª Paula I. C. Gomide, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), esse livro, que tem por objetivo tratar as virtudes sob o enfoque da análise do comportamento, apresenta um capítulo no qual a temática do perdão é tratada em termos de componentes complexos, como relembrar, ser empático com o ofensor e firmar compromisso com atos de perdão, mesmo que o evento aversivo não possa ser esquecido, além de demonstrar a importância desse processo comportamental para quem perdoa, para quem é perdoado e para a sociedade (Del Prette, 2010).

Entretanto, é a partir de pesquisas que vem sendo realizadas pelo professor Dr. Júlio Rique Neto, docente da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), e seus colaboradores nos grupos de pesquisa sobre desenvolvimento sociomoral e perdão, que podemos encontrar estudos mais estruturados e sistemáticos dedicados ao tema, que envolvem principalmente a tradução e a validação, para o Brasil, da Escala de Atitudes para o Perdão (EFI), que avalia a disposição dos indivíduos para perdoar, e é frequentemente utilizada em estudos nos EUA e em outros países (Enright & Rique, 2001; Rique et al. 2007; Rique, Camino, Santos, & Gouveia, 2009), e também pesquisas sobre a relação entre a disposição de perdoar, a religião e a desejabilidade social (Gouveia, Costa, Araújo, Gouveia, Medeiros, & Gonçalves, 2009), investigações que tratam do perdão interpessoal em relação a variáveis psicossociais e demográficas (Rique & Camino, 2010), e ainda, o modo como se dá pensamento moral do perdão em crianças (Abreu, Moreira, & Rique, 2011).

Finalmente, há ainda duas dissertações de mestrado dedicadas ao estudo do perdão, uma oriunda da Universidade Católica de Brasília, que buscou investigar o fenômeno do perdão interpessoal segundo a perspectiva de psicólogos clínicos psicanalistas e comportamentais (Aranha 2005), e outra da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), que desenvolveu um estudo correlacional com o intuito de investigar as possíveis relações entre a disposição para perdoar ofensas interpessoais e a intensidade dos esquemas iniciais desadaptativos (Santana, 2011), sendo o presente artigo fruto desta última.

Tendo sido apresentadas algumas particularidades referentes ao histórico dos estudos sobre perdão de modo geral e considerando a insipiente produção nacional do ponto de vista quantitativo, embora qualitativamente encontremos produções consistentes e aprofundadas sobre o tema, voltar-nos-emos agora para o objetivo principal deste artigo, que é apresentar uma revisão de literatura a respeito dos aspectos conceituais do perdão no campo da Psicologia. Considerando que é comum nas publicações sobre perdão – especialmente fora do País – o cuidado dos autores e pesquisadores em definir e esclarecer como compreendem esse construto, sempre enfatizando que o modo como compreendemos o perdão tem implicações importantes na maneira como o estudamos, um artigo que trate dessas questões conceituais mostra-se relevante e útil para aqueles que estão engajados em pesquisas sobre o tema em território nacional.

Principais pontos de divergência que envolvem a conceituação do perdão

As definições proporcionam uma estrutura para explicar porque e como um fenômeno acontece, e, no caso do perdão interpessoal, guiam intervenções e embasam o desenvolvimento de protocolos para ajudar pessoas a perdoar, bem como auxiliam os terapeutas no desenvolvimento de métodos direcionados para a mudança de atitudes. Entretanto, uma das grandes questões que caracterizam esse novo campo de estudos do perdão está relacionada justamente à questão da definição precisa desse construto (Worthington, 2005).

De acordo com o Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa (2009), a palavra perdão pode ser definida como:

(1) Remissão de pena; desculpa; indulto. (2) Ét. Renúncia de pessoa ou instituição à adesão às consequências punitivas que seriam justificáveis em face de uma ação que, em níveis diversos, transgride preceitos jurídicos, religiosos, morais ou afetivos vigentes. O verbo perdoar, de acordo com o mesmo dicionário, pode ser definido como: (1) Desculpar, absolver, remitir (pena, culpa, dívida, etc.). (2) Poupar; evitar. (3) Conformar-se com; aceitar (4) Conceder perdão a; desculpar. (5) Desculpar, absolver, remitir. (6) Conceder perdão, desculpa; remitir as faltas. (7) Conceder perdão ou desculpa e (8) Poupar-se

Etimologicamente, o verbo perdoar tem origem no verbo perdonare (do latim vulgar). Em uma leitura do Glossarium Mediae et Infimae Latinitatis (Du Cange, 1850), é possível notar que inicialmente os significados do verbo perdonare (mas não os únicos) seriam os de dar, conceder. A fim de abarcar essa definição e ir além à busca das raízes etimológicas dessa palavra, Lopes e Santana (2010) propõem que se considerem os escritos de um dos principais autores da concepção cristã medieval de homem, Tomás de Aquino, sobre o tema. A partir disso, é possível notar que o verbo perdonare não é citado na obra desse autor, possivelmente por se tratar de uma forma tardia de se remeter ao conceito, mesmo em latim. A palavra correspondente por ele empregada é per-cere. No entanto, é em São Tomás que se observam as bases filosóficas que justificam a etimologia das formas modernas das palavras: perdoar, perdão, perdonar, pardon, pardonner, etc. O prefixo per agrega os sentidos de por (através de) e de plenitude. Dessa forma, do ponto de vista etimológico, o perdão pode ser concebido como um superlativo da noção de doação, o mesmo ocorrendo se considerarmos as formas inglesa (for-give) e alemã (vor-geben) do verbo.

Em se tratando de definições conceituais propostas pelos estudiosos do tema, é importante mencionar que não existe ainda uma definição consensual sobre o que é perdão (Worthington, 1998, 2004; Enright & North, 1998; McCullough et al., 2001), e alguns interpretam a falta de consenso na definição como um dos problemas mais importantes do campo (Elder, 1998; Enright & Coyle, 1998; Enright, Freedman, & Rique, 1998; Enright, Gassin, & Wu, 1992). O mais interessante é que parece haver mais consenso sobre o que não é perdão, de modo que alguns autores fazem distinções entre o perdão e outras denominações comumente utilizadas como sinônimos, como, por exemplo, esquecimento e reconciliação. Em relação a isso, a maioria dos teóricos e pesquisadores concorda com Enright e Coyle (1998) que o perdão deve ser diferenciado de termos como:

Pardoning (absolvição): conceito relacionado à Justiça, e que implica perdoar legalmente alguém da pena consequente à transgressão cometida. No entanto, o perdão pode ocorrer independentemente de o sistema jurídico já ter realizado seu julgamento e/ou aplicado punições.

Condoning (que pode ser entendido como fazer vista grossa): significa aprovar um comportamento que a maioria das pessoas pensa ser errado, que implicaria justificativa para a ofensa, liberando o ofensor de qualquer responsabilidade. Diferentemente dessa ideia, perdoar não é o mesmo que desistir do pleito por justiça ou por tolerância à injustiça.

Excusing (desculpas): termo que sugere que o ofensor teve um motivo que justifique ter cometido a afronta. Mesmo que haja motivos razoáveis que expliquem a ofensa, e que esses sejam considerados, perdoar não é somente entender que não houve intencionalidade.

Forgetting (esquecimento): que traduz a ideia de que a memória da ofensa foi suprimida da consciência. Entretanto, ao perdoar, o indivíduo não deixa de se lembrar da afronta, embora seja possível relembrar a situação de um modo diferente e menos perturbador.

Denying (negação): refere-se a uma indisposição ou incapacidade para perceber que uma afronta tenha ocorrido. Contudo, fingir que nada aconteceu ou que não se sentiu magoado não é o mesmo que perdoar, embora, antes que o perdão seja posto em prática, as pessoas possam inicialmente utilizar esse recurso como forma de evitar entrar em contato com os sentimentos dolorosos eliciados pela afronta.

Reconciliation (reconciliação): sugere a restauração do relacionamento. De fato, para que possa haver reconciliação, deve haver alguma forma de perdão, entretanto, quando se perdoa, não necessariamente deve ocorrer reconciliação.

Em relação a esse último ponto, “a distinção filosófica básica entre perdão e reconciliação é que perdoar envolve a resposta de uma pessoa a uma ofensa, enquanto a reconciliação envolve duas pessoas relacionando-se bem novamente” (Enright et al., 1998, p. 49).

Segundo McCullough et al. (2001), embora teóricos e pesquisadores geralmente concordem sobre o que não é perdão, eles não concordam sobre o que é o perdão, podendo ser identificados ao menos três pontos de discordância: (1) se é um fenômeno intrapessoal ou interpessoal, (2) se está mais relacionado a abrir mão de sentimentos, comportamentos e pensamentos negativos ou se inclui também o acréscimo de elementos positivos ou a substituição daqueles por estes, e (3) em que extensão o perdão é um evento extraordinário – um processo que envolve transformações fundamentais na vida – ou se se trata de algo bastante comum na experiência cotidiana das pessoas.

Em relação ao primeiro ponto, há teóricos e pesquisadores que têm definido o perdão como um processo intrapessoal, como algo que ocorre internamente no indivíduo, e que traria mudanças nas cognições, nos comportamentos, nas emoções e/ou nas motivações da pessoa ofendida, que podem desdobrar-se mesmo se ela não está mais engajada em um relacionamento com o ofensor, mesmo quando o ofensor não está mais vivo. Pesquisas a partir dessa perspectiva têm se centrado mais na pessoa ofendida, focando os preditores do perdão, os processos através dos quais as pessoas afrontadas perdoam e as consequências do perdão para as mesmas (McCullough et al., 2001).

Outros estudiosos conceitualizam perdão como um processo interpessoal. Exline e Baumeister (2001), por exemplo, chamam atenção para o fato de que transgressões frequentemente envolvem pessoas próximas (familiares, amigos, colegas de trabalho, cônjuges, etc.). Para esses autores, ter em mente como as pessoas se comportam em relação às outras depois de incidentes e transgressões e quais as fontes e consequências de suas escolhas ao lidar com tais situações é crítico para o entendimento do perdão no contexto de relacionamentos em curso. Dessa perspectiva, segundo McCullough et al. (2001), é o relacionamento, em vez da própria pessoa ofendida, a unidade apropriada de análise dos estudos de perdão. Como ofensores afetam vítimas, como essas afetam ofensores, e como cada parceiro contribui para o relacionamento são todos objetos importantes para o estudo a partir desse ponto de vista.

Em relação ao segundo ponto de divergências entre os estudiosos, como se verá adiante, alguns definem perdão como um processo que basicamente produz uma diminuição na frequência de pensamentos e ações negativas em relação ao ofensor (Gordon, Baucom, & Snyder, 2001; Temoshok & Chandra, 2001; Thorensen, Harris, & Luskin, 2001). Segundo McCullough et al. (2001), tais estudiosos fazem uma clara distinção entre as ações de livrar-se (letting go) da amargura e da raiva e a reconciliação com o indivíduo que cometeu a ofensa, sugerindo, desse modo, que as pessoas podem perdoar sem reconciliar-se. Em relação a isso, é importante compreender que, para esses estudiosos, perdoar não requer necessariamente substituir elementos negativos por outros positivos. Em outras palavras, ao perdão bastaria a liberação de ações, sentimentos e comportamentos negativos ou orientados para a vingança.

Outros autores e pesquisadores, entretanto, defendem a ideia de que perdoar envolve mais do que livrar- se dos aspectos negativos, e acreditam que expressões positivas de sentimentos, pensamentos e comportamentos em relação ao ofensor são essenciais para a concretude do perdão. Baseado nesse raciocínio, a linha que separa perdão de reconciliação pode tornar-se mais tênue. Autores que partilham dessa perspectiva e que serão apresentados adiante são Enright e Coyle (1998), Worthington (2005) e McCullough et al. (2001), dentre outros.

Quanto ao terceiro ponto de discussão, McCullough et al.(2001), afirmam que é importante notar que os teóricos que definem perdão como algo extraordinário (pouco comum) têm focado nas vítimas que experimentaram violações muito intensas. Contudo, para esses autores, as ofensas variam em magnitude, de modo que os desapontamentos e transgressões, que têm lugar entre pessoas conhecidas e próximas durante a convivência cotidiana, são certamente mais frequentes e podem eliciar formas de perdão mais corriqueiras e menos profundas. Esse perdão, que os autores denominam de ordinário, é o tipo que pode ser abarcado por estudos desenvolvimentais e sociopsicológicos de pessoas que transgridem, desculpamse, confessam erros, arrependem-se e perdoam e são perdoadas, no curso de uma experiência diária. Os autores ainda dizem mais sobre essa questão e destacam que essas duas modalidades nas quais o perdão pode se apresentar – extraordinário ou comum – podem ser fenômenos qualitativamente diferentes, com estruturas e funções diversas, podendo-se inclusive considerar que um é mais genuíno que o outro. Todavia, continuam os autores, a despeito disso, os dois tipos podem estar relacionados um ao outro, ou ainda, conduzir um ao outro, ciclicamente.

Nesse sentido, conforme nos diz Pargament (1997 como citado em McCullough et al., 2001), o indivíduo que experiencia uma forma extraordinária de perdão pode ter mais probabilidade de responder com perdão quando enfrenta insultos e injúrias mais comuns, presentes em seu cotidiano. Por outro lado, a experiência e a prática com formas ordinárias de perdão, em resposta a ofensas menores, podem estabelecer o estágio para expressões mais profundas de perdão em resposta a traumas de vida maiores que a pessoa possa, porventura, ter vivido ou ainda vivenciar.

Mas afinal, o que é perdão?

Explicadas as principais divergências, vamos às definições mais conhecidas, começando por Enright et al., que propõem uma definição na qual perdão interpessoal é

uma atitude moral na qual uma pessoa considera abdicar do direito ao ressentimento, julgamentos negativos, e comportamentos negativos para com a outra pessoa que a ofendeu injustamente, e, ao mesmo tempo, nutrir sentimentos imerecidos de compaixão, misericórdia e, possivelmente, amor para com o ofensor (1998, pp.46-47)

Essa definição enfatiza alguns aspectos importantes: a ofensa é considerada injusta e infligida por outra pessoa, o perdão é uma escolha ou disposição por parte da vítima, e não uma obrigação, uma vez que a pessoa ofendida tem direito ao ressentimento, e a nova postura da pessoa ofendida inclui mudanças em três dimensões: afeto (superação do ressentimento por meio da compaixão), cognição (superação da condenação por meio do respeito e/ou generosidade) e comportamento (superação da indiferença ou tendência à vingança por meio de um senso de boa vontade em relação ao ofensor, ou mesmo de condutas de reaproximação).

Além disso, Enright et al. (1998) afirmam que o perdão ocorre somente entre pessoas (é, portanto, um processo interpessoal), e não entre pessoas e forças da natureza, já que, para eles, o perdão é um caso especial de piedade (mercy) direcionada a alguém que magoou outra pessoa. E os autores vão além, afirmando que o perdão é mais do que fazer cessar a raiva pelo ofensor, pois perdoar, a partir da concepção dos mesmos, significa necessariamente substituir emoções negativas por outras positivas.

Para Enright (2008), perdoar é mais do que aceitar o que aconteceu, ou deixar de sentir raiva, ser neutro em relação ao outro, ou ainda, fazê-lo apenas por se sentir bem. Pode-se dar seguimento à vida mesmo com frieza e indiferença em relação ao ofensor. Contudo, ele enfatiza que apesar de lidar com a raiva ser uma das tarefas envolvidas no processo de perdoar, ter como principal objetivo a eliminação da raiva e do ressentimento pode distorcer o processo de perdão, já que é possível fazer cessar a raiva ou o ressentimento também por meio da vingança, por exemplo. Dada sua característica interpessoal, o perdão tem como objetivo final a disposição em ver o ofensor com certa compaixão e, a partir daí, conseguir oferecer a ele o perdão. Consiste, essencialmente, em que aquele que perdoa tenha sentimentos e pensamentos positivos em relação ao ofensor. Nesse sentido, as pessoas podem iniciar o processo de perdão por quererem sentir-se melhor, mas, quando decidem ofertar o perdão ao ofensor, a pessoa que perdoa deixa de estar concentrada em si mesma e passa a concentrar-se no outro, dando início ao processo de cura da mágoa.

Esse autor ainda ressalta a distinção entre o perdão e o que ele chama de pseudoperdão (pseudoforgiveness), que, segundo ele, é uma estratégia usada para manter ou garantir poder ou controle sobre o comportamento do transgressor, na medida em que, apesar de ter comunicado o perdão ao ofensor, a pessoa ofendida continua lembrando-o continuamente de seu erro, exercendo, dessa maneira, uma superioridade ou um controle incompatíveis com o perdão.

De acordo com Worthington (2005), o crucial para Enright em sua definição é sua visão de perdão como um processo que integra as esferas do comportamento, da cognição e do afeto. A partir desse ponto de vista, Enright propõe um modelo heurístico de como as pessoas perdoam (ver Tabela 1), constituído de vinte etapas pelas quais as pessoas podem passar. É importante explicar que nem todas as pessoas passam por todas as etapas, ou o fazem na ordem em que estão apresentadas, ou despendem o mesmo tempo nessa tarefa. Em outras palavras, o processo é singular para cada indivíduo.

Worthington (2005), por sua vez, enfatiza a importância da conexão entre o componente emocional e motivacional, e observa que o perdão é formado por dois tipos. Para esse autor, há o perdão decisional, que envolve mudança nas intenções (objetivos a serem atingidos por determinado comportamento) de se comportar do indivíduo que sofreu a afronta em relação ao transgressor (daí uma mudança na motivação), e há também o perdão emocional, que se caracteriza pela substituição de emoções negativas por outras emoções positivamente orientadas.

Da perspectiva dessa definição, as emoções positivas neutralizariam algumas emoções negativas em um primeiro momento, o que resulta em um decréscimo das mesmas. Ao longo do tempo, havendo uma diminuição substancial das emoções negativas, emoções positivas poderiam ser então edificadas. Pode-se dizer que, assim como Enright e North (1998), Worthington também aborda o perdão como um processo que, para ele, tem início com uma decisão e evolui até uma mudança emocional significativa por parte daquele que sofreu a ofensa. Vale ressaltar, conforme afirma Worthington (2005), que sua visão de perdão decisional foi influenciada por DiBlasio (1998), estudioso que propôs a ideia de “perdão baseado em decisão” (forgiveness decision-based), definindo-o como uma mudança na “força de vontade” (good will) empreendida pela pessoa ofendida com o objetivo de fazer cessar comportamentos nocivos direcionados ao ofensor.

Michael E. McCullough, que, junto com seu grupo de pesquisa trabalhou ao lado de Worthington e de seus colaboradores, especialmente no início dos anos 90, partilha da ênfase na conexão emoção-motivação. Para McCullough, Worthington e Rachal (1997), McCullough et al. (2001), McCullough e Witvliet (2002) e McCullough (2000, 2009), o perdão interpessoal é um conjunto de mudanças motivacionais em que há um decréscimo na motivação para a vingança em relação ao ofensor, uma diminuição da motivação para evitá-lo e um aumento de motivações mais conciliadoras e de boa vontade em relação ao ofensor, apesar das ações dolorosas infligidas por este. Dito de outra forma, “a essência do perdão residiria em mudanças pró-sociais na motivação (evitação e/ou conciliação) de alguém em relação ao transgressor, mudanças essas que podem resultar em outras modificações cognitivas e comportamentais que Enright e colegas conceitualizam como parte do perdão interpessoal” (McCullough et al., 2001, p. 8).

Já outros autores, como Exline e Baumeister (2001), propõem que, quando uma pessoa age de maneira injusta em relação à outra, essa ação efetivamente cria algo como um débito interpessoal. Segundo eles, o perdão poderia então ser entendido como o cancelamento ou a suspensão desse débito pela pessoa que foi magoada, sendo que essa suspensão poderia dar-se através de canais múltiplos, incluindo aqueles que são cognitivos (por exemplo, decidindo não pensar sobre o acontecido ou relembrar os próprios débitos causados a outros), afetivos (interrompendo sentimentos de raiva e hostilidade em relação ao ofensor), comportamentais (decidindo não vingar-se pela injustiça sofrida) e mesmo espirituais. Contudo, em relação a essa definição de perdão, se pensarmos sobre o cuidado dos autores do campo em diferenciar perdão de formas sinônimas, ela parece conflitar com esse esforço, uma vez que “decidir não pensar sobre o acontecido” pode ser entendido como uma forma de negação.

No sentido de considerar a mágoa como um débito ou dívida, temos ainda a definição proposta por Tangney, Fee, Reinsmith, Boone e Lee (1999 como citado em Snyder & Lopez, 2007), em que o perdão refletiria uma

transformação cognitivo-afetiva a partir de uma transgressão na qual a vítima faz uma avaliação realista do prejuízo causado e reconhece a responsabilidade do autor, mas escolhe livremente “cancelar a dívida”, abrindo mão da necessidade de vingança ou punições merecidas e de qualquer busca de compensação. Esse “cancelamento da dívida” também envolve um “cancelamento das emoções negativas” diretamente relacionadas à transgressão. Especificamente, ao perdoar, a vítima supera seus sentimentos de ressentimento e raiva em função da atitude. Resumindo, por meio do perdão, o indivíduo prejudicado essencialmente se retira do papel de vítima. Tal modelo sugere, então, que abrir mão das emoções negativas é o núcleo do processo de perdão (2007, p. 254)

Há também a definição de Thompson et al., para quem o perdão pode ser compreendido como

o reenquadramento da percepção de uma transgressão de modo que as respostas ao transgressor, à transgressão e às sequelas da mesma passem de negativas a neutras ou positivas. A fonte da transgressão, e, portanto, o objeto do perdão pode ser a própria pessoa, outros indivíduos ou uma situação que seja vista como fora da possibilidade de controle (como, por exemplo, uma doença, o destino, ou um desastre natural) (2005, p.318)

É interessante mencionar que, em função da amplitude de alvos para o perdão que essa definição apresenta (incluindo até mesmo catástrofes naturais), Snyder e Lopez (2007) consideram-na uma das mais abrangentes dentre todas as definições já propostas. Nesse sentido, outra autora que partilha da visão de perdão que inclui não apenas pessoas é Casarjian (1992), que, em sua obra, descreve o perdão como uma maneira de lidar inclusive com doenças físicas, já que parte do pressuposto de que o ressentimento acaba contribuindo com o adoecimento do corpo.

Convém lembrar aqui Enright et al., que dizem que o perdão se dá apenas entre pessoas, e não entre pessoas e forças da natureza. Segundo esses autores, “alguém não pode perdoar uma tempestade destrutiva na qual amigos pereceram, porque uma pessoa não nutre sentimentos de compaixão, generosidade, ou amor em relação a uma tempestade” (1998, p. 47), sentimentos que são necessários ao lidar com as emoções negativas, de acordo com sua proposta conceitual, ponto de vista com o qual Snyder e Lopez dizem discordar. Segundo eles, a visão que têm sobre o perdão “está de acordo com o modelo de Thompson, no qual o alvo pode ser outra pessoa, a própria pessoa ou uma situação” (2007, p. 256).

Além dessas definições, há ainda outras mais orientadas cognitivamente – no sentido de que o perdão se assenta basicamente na mudança no modo como a pessoa interpreta a situação de mágoa – como é o caso de Luskin (2007), Flanigan (1998) e Gordon et al. (2001). Tais autores conceituam perdão como a interrupção dos sentimentos de raiva e de comportamentos hostis em relação ao transgressor sem que isso signifique necessariamente reconciliação com ele ou esquecimento da afronta sofrida. É interessante notar que, nas definições desses autores, especialmente naquela proposta por Luskin (2007), quase nunca se atribui importância à empatia no processo de perdoar. Já as demais definições apresentadas acabam considerando mais aspectos interpessoais quando abordam o perdão, enfatizando o comportamento empático da vítima em relação ao ofensor. De acordo com elas, o perdão é, sim, algo que traz benefícios para quem está efetivamente perdoando, mas isso é uma consequência secundária, já que a orientação primária é para o outro, e o objetivo final é a expressão do perdão ao ofensor.

Concluindo, é interessante enfatizar aqui a importância do conhecimento dessas visões sobre o perdão para o trabalho interventivo, especialmente o clínico. Diante de demandas que podem ser enfrentadas por meio do comportamento de perdoar, as pessoas podem escolher engajar-se nesse comportamento de modos e em intensidades diferentes, ou mesmo decidirem não perdoar dependendo da maneira como compreendem tal atitude. Conhecendo as possibilidades apresentadas pelos principais estudiosos do tema, é provável que o psicólogo esteja mais bem instrumentalizado para auxiliar seus pacientes, apontando a eles outros caminhos para lidar com seus problemas.

Considerações finais

Embora a presença de tais pontos de divergências quanto a aspectos definidores do perdão possa parecer desencorajador, convém lembrar Pargament, McCullough e Thoresen, que, ao discorrerem sobre as direções dos estudos psicológicos e da prática do campo do perdão, acreditam que

essas diferenças nos sentidos atribuídos ao perdão não são necessariamente problemáticas neste estágio recente dos estudos. Tal heterogeneidade pode, de fato, contribuir para um quadro mais dimensional do perdão. Para evitar confusão, contudo, pesquisadores, teóricos, e profissionais precisarão ser bastante explícitos sobre as definições que guiam seus trabalhos e o fenômeno de interesse que estão dentro e fora dos limites do construto de perdão. Entretanto, um entendimento mais completo de perdão requererá melhor integração dessas várias perspectivas sob uma mesma “definição” ou conceito (2001, p. 304)

Com esse propósito integrativo, Pargament et al. propõem uma definição no intuito de que ela seja suficientemente ampla e capaz de englobar os aspectos intra e interpessoais envolvidos no processo de perdoar. Essa definição conceitua o perdão como “uma mudança intraindividual, prossocial, em relação a um transgressor percebido, que está situado em um contexto interpessoal” (2001, p.304).

Finalmente, conforme aponta Worthington (2005), a pesquisa básica frequentemente investiga os aspectos singulares do perdão um de cada vez. Mesmo se os estudiosos acreditam que o perdão seja multifacetado, eles isolam aspectos e os estudam. Contudo, a maior parte das intervenções – que são guiadas por conceituações particulares de perdão como as apresentadas – inclui mudanças cognitivas, comportamentais, afetivas e frequentemente interpessoais nas motivações das pessoas. E, independentemente de qual elemento acreditam ser o mais provável de causar mudanças, os pesquisadores e profissionais buscam maximizar as possibilidades de mudança do indivíduo que está lidando com uma situação de mágoa, por meio da abertura de meios ou canais diversificados. Em outras palavras, embora as definições sejam plurais, o objetivo último das investigações que envolvem o perdão é descobrir maneiras de promover atitudes positivas que possam sustentar a decisão de perdoar.

Recebido 14/12/2011

Aprovado 30/3/2012.

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    Rodrigo Gomes Santana
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    Doutora em Psicobiologia pela Universidade de São Paulo. Professora associada do Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais – MG – Brasil. E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Dez 2012
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      14 Dez 2011
    • Aceito
      30 Mar 2012
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