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As Contribuições da Psicologia para o Sistema de Justiça em Situações de Abuso Sexual

The Contributions of Psychology to the Legal System in Situations of Sexual Abuse

Las Contribuciones de la Psicología para el Sistema de Justicia en Situaciones de Abuso Sexual

Resumos

Este trabalho investigou a percepção de operadores do sistema de justiça sobre o papel da Psicologia nos casos de abuso sexual, os elementos que influenciam suas decisões e as possibilidades de aperfeiçoamento da contribuição da Psicologia. Foram entrevistados 15 profissionais do sistema de justiça do estado do Rio Grande do Sul (cinco juízes de direito, cinco defensores públicos e cinco promotores de justiça). Os dados foram submetidos à análise de conteúdo com auxílio do software webQDA e revelaram que os operadores do Direito concordam com a importância da atuação da Psicologia nesses casos, tanto em função das possibilidades de comprovação do abuso sexual quanto da proteção da vítima e da família. As limitações da formação jurídica foram indicadas como um dos motivos do encaminhamento e da importância da Psicologia. Documentos, testemunhos e percepções subjetivas aparecem influenciando as decisões tomadas por esses operadores. Para maior contribuição da Psicologia para a Justiça, os operadores relatam que uma maior atenção aos acusados e documentos mais consistentes seriam necessidades da área. O diálogo e a comunicação são apresentados como meios para aproximação entre Psicologia e Direito e como qualificação para a garantia de direitos para a população vítima de violência.

Abuso sexual; Psicologia forense; Tomada de decisão; Julgamento


This work analyzed the perception of the legal system operators on the role of Psychology in cases of sexual abuse, the elements that influence their decisions and the possibilities for enhancing contributions from Psychology. Fifteen professionals from the State of Rio Grande do Sul legal system (five judges, five legal aid counselors, and five public attorneys). Data were submitted to content analysis with the support of webQDA software and they revealed that Law operators agree on the importance of the role of Psychology in those cases, both in view of possibilities of sexual abuse evidencing and on protecting the victim and family. Limitations of the legal courses were pointed out as one of the reasons for the referral and of the importance of Psychology. Documents, testimonies, and subjective perceptions appear influencing decisions made by those operators. The operators report that, for a greater contribution of Psychology to Justice, higher attention to defendants and more consistent documents would be necessities of the field. Dialogue and communication are presented as means for the approximation of Psychology and Law, and as qualification to ensure the rights for those who are victims of violence.

Sexual abuse; Forensic psychology; Decision making; Judgment


Este trabajo investigó la percepción de operadores del sistema de justicia sobre el papel de la Psicología en los casos de abuso sexual, los elementos que influencian sus decisiones y las posibilidades de perfeccionamiento de la contribución de la Psicología. Fueron entrevistados 15 profesionales del sistema de justicia del Estado de Rio Grande do Sul (cinco jueces de derecho, cinco defensores públicos y cinco promotores de justicia). Los datos fueron sometidos al análisis de contenido con auxilio do software webQDA y revelaron que los operadores del Derecho concuerdan con la importancia de la actuación de la Psicología en estos casos, tanto en función de las posibilidades de comprobación do abuso sexual como la protección de la víctima y de la familia. Las limitaciones de la formación jurídica fueron indicadas como uno de los motivos del encaminamiento y de la importancia de la Psicología. Documentos, testimonios y percepciones subjetivas aparecen influenciando las decisiones tomadas por estos operadores. Para una mayor contribución de la Psicología para la Justicia, los operadores relatan que una mayor atención a los acusados y documentos más consistentes serían necesidades del área. El diálogo y la comunicación son presentados como medios para la aproximación entre Psicología y Derecho y como cualificación para la garantía de derechos para la población víctima de violencia.

Abuso sexual; Psicología forense; Toma de decisión; Julgamento


São muitas as situações em que a interdisciplinaridade entre Psicologia e Direito se faz necessária e fundamental. Maus-tratos contra crianças e adolescentes, disputas de guarda e adoção são algumas das principais problemáticas envolvendo a infância e adolescência que, obrigatoriamente, devem ser objeto de intervenção por uma equipe composta por diferentes disciplinas (Brasil, 1990Brasil. (1990). Lei n° 8069/1990: Estatuto da Crianca e do Adolescente. Brasilia, DF: Autor. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm.
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). Especificamente, a Psicologia vem contribuindo de muitas maneiras, atuando sempre na tentativa de atingir o melhor interesse da criança, independentemente da tarefa ou contexto em que o trabalho é realizado. No contexto do judiciário, revisões sobre a história da Psicologia Jurídica no Brasil indicam a importância e a necessidade desse trabalho, mas também demonstram alguns desencontros e dificuldades (Brito, 2012Brito, L. M. T. (2012). Anotações sobre a Psicologia jurídica. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(Spe), 194-205. doi: 10.1590/S1414-98932012000500014;Lago, Amato, Teixeira, Rovinski, & Bandeira, 2009Lago, V. M., Amato, P., Teixeira, P. A., Rovinski, S. L. R., & Bandeira, D. R. (2009). Um breve histórico da Psicologia jurídica no Brasil e seus campos de atuação. Estudos de Psicologia (Campinas), 26(4), 483-491. doi: 10.1590/S0103-166X2009000400009;Lago & Bandeira, 2009)Lago, V. M., & Bandeira, D. R. (2009). A Psicologia e as demandas atuais do Direito de família. Psicologia: Ciência e Profissão, 29(2), 290305. doi: 10.1590/S1414-98932009000200007. Impasses legais, opiniões divergentes sobre métodos e técnicas, assim como linguagens diferentes emergem juntamente com novas demandas que surgem para o psicólogo no mundo contemporâneo. Especificamente no contexto do trabalho com situações de abuso sexual contra crianças e adolescentes, a articulação entre áreas da saúde e da justiça é inevitável, uma vez que as situações são geralmente bastante complexas e com evidências muitas vezes contraditórias ou pouco claras (Oates, Jones, Denson, Sirotnak, & Krugman, 2000Oates, R. K., Jones, D. P., Denson, D., Sirotnak, A. G. N., & Krugman, R. D. (2000). Erroneous concerns about child sexual abuse. Child Abuse & Neglect, 24(1), 149-157. doi: 10.1016/S0145-2134(99)00108-8
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).

O abuso sexual infantil - ASI inclui tanto experiências com contato físico como sem contato físico, perpetrado por membros da família ou de fora da família e comportamentos que envolvem uso de autoridade,statusou tamanho físico com o objetivo de atingir uni camente os interesses do perpetrador (Miller-Perrin & Perrin, 2013Miller-Perrin, C. L., & Perrin, R. D. (2013). Child maltreatment: an introduction (3a ed.). Thousand Oaks, Calif.: Sage Publications.). Um dos mais importantes estudos internacionais revisando dados epidemiológicos do abuso sexual foi publicado porFinkelhor em 1994Finkelhor, D. (1994). The international epidemiology of child sexual abuse. Child Abuse & Neglect, 18(5), 409417.. Esse pesquisador encontrou níveis entre 7-36% de vitimização entre mulheres e 3-29% entre homens, em 21 países (Finkelhor, 1994)Finkelhor, D. (1994). The international epidemiology of child sexual abuse. Child Abuse & Neglect, 18(5), 409417.. Recentemente, uma meta-análise usando uma mostra não clínica de quase 100 mil participantes encontrou resultados médios de prevalencia de abuso sexual de 19,7% para mulheres e 7,9% para homens, em 22 países (Pereda, Guilera, Forns, & Gómez-Benito, 2009). Nesse mesmo sentido, outra metaanálise revisou 217 estudos que incluíram 9.911.748 participantes. Neste estudo, os autores identificaram uma média global de prevalência de abuso sexual de 11,8%, sendo 18% para meninas e 7,6% para meninos (Stoltenborgh, van Ijzendoorn, Euser, & Bakermans-Kranenburg, 2011). Esses trabalhos continuam demonstrando a dimensão do problema do abuso sexual no mundo, justificando, portanto, o reconhecido status de um problema global de saúde pública (World Health Organization, 2002)World Health Organization. (2002). World report on violence and health. Geneva: Autor..

Sendo um problema de saúde, o abuso sexual deve ser pensado, conhecido e discutido pelas disciplinas dessa área. Entretanto, não é apenas a área da saúde que está envolvida e participa ativamente das intervenções nesse problema, mas as áreas da educação, da justiça e da assistência social atuam nessas situações diretamente, configurando-as, portanto, como uma questão interdisciplinar. Especificamente, o Direito é responsável direto pelas ações que levam à condenação do agressor e à proteção da criança. O Direito tem seu papel principalmente como aplicador da lei, preocupando-se com a produção das provas e prolação da sentença (Granjeiro & Costa, 2010Granjeiro, I. A. C. L., & Costa, L. F. (2010). A interdisciplinaridade entre Direito e Psicologia no conflito familiar violento. Revista de Informação Legislativa, 47(185), 195-209. Recuperado de http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/198667
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). Contudo, algumas situações, especialmente quando se trata de crimes contra crianças e adolescentes, podem exigir desses profissionais mais do que o domínio do conteúdo jurídico, mais do que a doutrina lhes ensina.Granjeiro e Costa (2010)Granjeiro, I. A. C. L., & Costa, L. F. (2010). A interdisciplinaridade entre Direito e Psicologia no conflito familiar violento. Revista de Informação Legislativa, 47(185), 195-209. Recuperado de http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/198667
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afirmam que falta a esses operadores a compreensão sobre a complexidade dos fenômenos e o entendimento sobre os contextos em que estes ocorrem e nos quais se inserem as famílias, instituições e redes sociais. Segundo essas autoras, o Direito faz uma tentativa de objetividade que, muitas vezes, é impossível. Além disso, a Justiça enfrenta problemas como a lentidão dos processos judiciais, a falta de estratégias efetivas de proteção e a desconsideração das consequências do abuso sexual (Costa, Penso, Almeida, & Ribeiro, 2008).

O juiz é, em nossa sociedade, a figura de autoridade e de representação do poder (Santos & Costa, 2010Santos, M. R. R., & Costa, L. F. (2010). Campo psicossocial e jurídico: relações de poder nas decisões de conflito familiares. Estudos de Psicologia (Campinas), 27(4), 553-561. doi: 10.1590/S0103-166X2010000400013). Ele é autorizado a intervir no destino de famílias, tomando decisões que têm consequências relevantes em suas vidas (Santos & Costa, 2010)Santos, M. R. R., & Costa, L. F. (2010). Campo psicossocial e jurídico: relações de poder nas decisões de conflito familiares. Estudos de Psicologia (Campinas), 27(4), 553-561. doi: 10.1590/S0103-166X2010000400013. A família deposita confiança na sua figura (Costa et al., 2008)Costa, L. F., Penso, M. A., Almeida, T. M. C., & Ribeiro, M. A. (2008). A justiça é demorosa, burra e cega: percepções de famílias sobre a dimensão jurídica dos crimes de abuso sexual. Boletim de Psicologia, 58(128), 85-102.. Entretanto, mesmo sabendo que a lei para todos os juízes brasileiros é a mesma, diferentemente dos Estados Unidos da América, onde cada estado legisla suas próprias questões e são independentes, as decisões tomadas no Brasil podem ser diferentes, tendo em vista o princípio do livre convencionamento motivado do juiz, que pode valorar a prova livremente, desde que fundamente a sua decisão (Oliveira, 2009)Oliveira, E. P. (2009). Curso de processo penal (11a ed.). Rio de Janeiro: Editora Lumens Juris.. Nas situações de abuso sexual, a ausência de evidências materiais leva a uma maior valorização da avaliação psicossocial, no sentido de que somente avaliações dessa ordem podem trazer mais consistência ao caso. Mas essa não é a opinião de todos os magistrados. Os juízes variam em suas opiniões sobre a importância da Psicologia: alguns acreditam em seu valor e investem em conhecimento nessa área, enquanto outros acreditam que somente as normas têm importância na atuação jurídica (Cesca, 2004)Cesca, T. B. (2004). O papel do psicólogo jurídico na violência intrafamilar: possíveis articulações. Psicologia & Sociedade, 16(3), 41-46. doi: 10.1590/S0102-71822004000300006
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Contribuindo no sentido de humanizar a Justiça, a Psicologia interage com o Direito de forma complementar. Essas duas áreas atravessam-se mutuamente (Perucchi, 2010Perucchi, J. (2010). Nos trâmites da lei: uma crítica à perspectiva tradicional da noção de família no âmbito da psicologia jurídica brasileira. Psicologia em Pesquisa, 4(1), 3-14. Recuperado de http ://pepsic. bvsal ud .orgscielo. php?scri pt=sci_a rttext&pid=S1982-12472010000100002&lng=es&nrm=iso
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) e buscam a proteção da criança, mas por caminhos diferentes: uma buscando objetivamente a aplicação da lei e outra tentando entender a complexidade dos sujeitos no seu contexto familiar e social (Granjeiro & Costa, 2010Granjeiro, I. A. C. L., & Costa, L. F. (2010). A interdisciplinaridade entre Direito e Psicologia no conflito familiar violento. Revista de Informação Legislativa, 47(185), 195-209. Recuperado de http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/198667
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). Agir de forma interdisciplinar significa buscar um conhecimento unificado e a integração do pensamento, em oposição à fragmentação desses saberes (Granjeiro & Costa, 2010)Granjeiro, I. A. C. L., & Costa, L. F. (2010). A interdisciplinaridade entre Direito e Psicologia no conflito familiar violento. Revista de Informação Legislativa, 47(185), 195-209. Recuperado de http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/198667
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. Uma relação igualitária deve ser perseguida por esses profissionais, assim como o diálogo e a parceria devem ser buscadas para que seja alcançada de fato a interdisciplinaridade necessária (Granjeiro & Costa, 2010)Granjeiro, I. A. C. L., & Costa, L. F. (2010). A interdisciplinaridade entre Direito e Psicologia no conflito familiar violento. Revista de Informação Legislativa, 47(185), 195-209. Recuperado de http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/198667
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. A possibilidade do trabalho em conjunto entre Psicologia e Direito reside no diálogo consistente e no espaço de articulação entre esses saberes (Perucchi, 2010)Perucchi, J. (2010). Nos trâmites da lei: uma crítica à perspectiva tradicional da noção de família no âmbito da psicologia jurídica brasileira. Psicologia em Pesquisa, 4(1), 3-14. Recuperado de http ://pepsic. bvsal ud .orgscielo. php?scri pt=sci_a rttext&pid=S1982-12472010000100002&lng=es&nrm=iso
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Muitas vezes, o diálogo entre operadores do Direito e psicólogos se dá exclusivamente por meio de documentos, como laudos/relatórios. Os documentos produzidos por psicólogos têm sido compreendidos como importantes influências na tomada de decisão de operadores do Direito nos casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes.Coimbra (2004)Coimbra, J. C. (2004). Algumas considerações sobre o parecer psicológico na justiça da infância e da juventude. Psicologia: Ciência e Profissão, 24(2), 2-13. doi: 10.1590/S1414-98932004000200002 analisou 46 pareceres produzidos por cinco psicólogos relacionados a uma vara da infância e juventude e entrevistou profissionais, buscando verificar a importância atribuída a esses documentos. O autor concluiu que o parecer é uma narrativa escrita pelo psicólogo e que contribui para que os operadores do Direito possam reconhecer aquele sujeito de outra maneira, orientando o juiz em sua tomada de decisão (Coimbra, 2004Coimbra, J. C. (2004). Algumas considerações sobre o parecer psicológico na justiça da infância e da juventude. Psicologia: Ciência e Profissão, 24(2), 2-13. doi: 10.1590/S1414-98932004000200002).

O documento deve responder ao juiz, dirimir questões de ordem psicológica que podem auxiliar na solução do caso, propiciar o entendimento das situações, fornecer subsídios ao juiz e dar respaldo a decisões (Coimbra, 2004Coimbra, J. C. (2004). Algumas considerações sobre o parecer psicológico na justiça da infância e da juventude. Psicologia: Ciência e Profissão, 24(2), 2-13. doi: 10.1590/S1414-98932004000200002).

Uma decisão judicial pode transformar a vida de pessoas e famílias, promovendo rupturas ou uniões (Costa, Penso, Legnani, & Sudbrack, 2009Costa, L. F., Penso, M. A., Almeida, T. M. C., & Ribeiro, M. A. (2008). A justiça é demorosa, burra e cega: percepções de famílias sobre a dimensão jurídica dos crimes de abuso sexual. Boletim de Psicologia, 58(128), 85-102.). Por isso, a melhor decisão não pode ser baseada apenas em doutrinas rígidas, tampouco em avaliações subjetivas, sendo necessário que mais disciplinas sejam consideradas simultaneamente na perspectiva da complementariedade (Costa, Penso et al., 2009). Quando um juiz solicita a avaliação para um setor psicossocial, compreende-se que ele está compartilhando seu poder decisório com a equipe (Santos & Costa, 2010)Santos, M. R. R., & Costa, L. F. (2010). Campo psicossocial e jurídico: relações de poder nas decisões de conflito familiares. Estudos de Psicologia (Campinas), 27(4), 553-561. doi: 10.1590/S0103-166X2010000400013. Somente com esse olhar e com abertura para enfrentar os desafios dessa união (Psicologia/Direito) é que as decisões serão fundamentadas em informações mais abrangentes, complexas, reais e justas. Nesta busca da complementariedade, criam-se o queSantos e Costa (2010)Santos, M. R. R., & Costa, L. F. (2010). Campo psicossocial e jurídico: relações de poder nas decisões de conflito familiares. Estudos de Psicologia (Campinas), 27(4), 553-561. doi: 10.1590/S0103-166X2010000400013 chamam de espaços consensuais de conhecimento, os quais não são possíveis sem o compartilhamento do conhecimento entre profissionais de equipe psicossocial e profissionais do Direito.

Dessa forma, é importante considerar que há uma lacuna a ser preenchida por pesquisas na área da Psicologia Jurídica. Essa área tem sido considerada recente e carente de publicações e de inserção no currículo acadêmico (Cesca, 2004Cesca, T. B. (2004). O papel do psicólogo jurídico na violência intrafamilar: possíveis articulações. Psicologia & Sociedade, 16(3), 41-46. doi: 10.1590/S0102-71822004000300006
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;Lago et al., 2009Lago, V. M., Amato, P., Teixeira, P. A., Rovinski, S. L. R., & Bandeira, D. R. (2009). Um breve histórico da Psicologia jurídica no Brasil e seus campos de atuação. Estudos de Psicologia (Campinas), 26(4), 483-491. doi: 10.1590/S0103-166X2009000400009), bem como de novas metodologias e de desenvolvimento nas diferentes áreas de sua atuação (França, 2004França, F. (2004). Reflexões sobre Psicologia jurídica e seu panorama no Brasil. Psicologia: Teoria e Prática, 6(1), 73-80.). Um dos desafios da Psicologia Jurídica é a troca de conhecimentos com outros campos para a ampliação da compreensão de ser humano (Lago et al., 2009Lago, V. M., Amato, P., Teixeira, P. A., Rovinski, S. L. R., & Bandeira, D. R. (2009). Um breve histórico da Psicologia jurídica no Brasil e seus campos de atuação. Estudos de Psicologia (Campinas), 26(4), 483-491. doi: 10.1590/S0103-166X2009000400009). Tendo em vista a recenticidade do investimento acadêmico na área da Psicologia Jurídica e, especialmente, as lacunas dessa disciplina com relação à complexidade das situações envolvendo abuso sexual contra crianças e adolescentes, este trabalho teve por objetivo investigar as percepções sobre o papel da Psicologia nesses casos, dentro do contexto do judiciário.

Método

Participantes

Foram entrevistados cinco juízes de direito (homens), cinco promotores de justiça (três mulheres e dois homens) e cinco defensores públicos (três mulheres e dois homens), que tiveram atuação em casos de abuso sexual infantil de cinco municípios do estado do Rio Grande do Sul. Os municípios foram selecionados em razão de serem os únicos cinco em todo o estado que contavam, no ano de 2012, com psicólogos judiciários concursados em seu quadro funcional no Poder Judiciário atuando em salas de Depoimento Especial.

Instrumento

Foi utilizado um roteiro de entrevista semiestruturada, que investigava a contribuição da Psicologia para a Justiça, influências na tomada de decisão sobre o caso e necessidades observadas na experiência profissional.

Procedimentos, considerações éticas e análise de dados

Foram selecionados cinco municípios do estado do Rio Grande do Sul que possuíam psicólogos vinculados ao Poder Judiciário (concursados), com anos de experiência no trabalho com abuso sexual infantil. Dessa forma, no sentido de garantir o anonimato dos participantes, os municípios não serão identificados, uma vez que os participantes exercem funções específicas e únicas nessas localidades.

Os contatos com os foros de cada município foram realizados por meio de e-mails ou ligações telefônicas direcionadas a cada uma das psicólogas judiciárias. Solicitou-se o apoio das psicólogas no sentido de verificar se os operadores jurídicos tinham experiência em situações de abuso sexual contra crianças e adolescentes. Algumas das psicólogas judiciárias contribuíram agendando as entrevistas com todos os participantes. Em outros casos, foram demandados procedimentos mais formais, como o envio de um resumo do projeto de pesquisa, para posterior contato e agendamento das entrevistas por meio de um profissional administrativo do foro.

Foi necessário um dia de coleta de dados com cada município. A duração das entrevistas variou de 15 minutos a mais de uma hora, com uma média de 40 minutos. Os dados foram armazenados em arquivos digitais e transcritos pela equipe de pesquisa para a análise qualitativa. Foi utilizado o software webQDA para a sistematização da análise de conteúdo (Souza, Costa, & Moreira, 2011Souza, F. N., Costa, A. P, & Moreira, A. (2011, maio). Análise de dados qualitativos suportada pelo software webQDA. In Atas da VII Conferência Internacional de TIC na Educação: Perspectivas de Inovação (CHALLANGES2011), Braga, Portugal. ). As categorias foram levantadas aposteriori,por meio de uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto. As categorias foram geradas a partir dos princípios de exclusão mútua, homogeneidade, pertinência, objetividade, fidelidade e produtividade (Bardin, 1977)Bardin, L. (1977). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70..

Os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Conselho Nacional de Saúde, 1996Conselho Nacional de Saúde. (1996). Resolução 196/96: Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília, DF.). O projeto teve aprovação do Comitê de Ética do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sob o protocolo de número 20698.

Delineamento

A pesquisa foi fundamentada na metodologia de estudo de caso coletivo (Stake, 1994Stake, R. (1994). Case studies. In N. Denzin & Y Lincoln (Eds.), Hanbook of qualitative research (pp.236-247). London: Sage.). Este trabalho é parte de um estudo maior que busca verificar as possibilidades e limites da Psicologia atuando dentro do Poder Judiciário, incluindo a questão do Depoimento Especial, que será abordada em outro artigo. No presente trabalho, foram analisadas as percepções de profissionais de três categorias diferentes acerca das contribuições da Psicologia para a Justiça nos casos de abuso sexual.

Resultados

Os resultados referentes às três carreiras jurídicas foram agrupados tendo em vista, principalmente, suas semelhanças. Foram destacadas as especificidades observadas por uma ou outra carreira, quando necessário. Tais resultados foram agrupados em três categorias, sendo elas: Papel da Psicologia, Tomada de Decisão e Necessidades da Área.

PAPEL DA PSICOLOGIA: A Psicologia é considerada pelos operadores do Direito essencial em todos os casos envolvendo abuso sexual contra crianças e adolescentes. Os participantes destacam que a relação de confiança estabelecida entre psicólogo e vítima faz a diferença na abordagem do caso pelo Poder Judiciário. A faixa etária, por si só, já é um motivo para encontrar na Psicologia uma ajuda imprescindível, tendo em vista o conhecimento desses profissionais sobre desenvolvimento humano e abordagens com crianças. Alguns acreditam que a Psicologia deveria ser mais utilizada, mesmo que seja apenas uma das disciplinas de um conjunto de outras necessárias para o bom funcionamento da Justiça. Segundo um juiz participante:"O trabalho é interdisciplinar...e o Direito não pode querer resolver tudo com Códigos e Leis".

O papel da Psicologia nos casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes foi observado sob diferentes aspectos. Os operadores do Direito explicam diferentes razões para seus encaminhamentos para a Psicologia, demonstrando que existem motivos variados pelos quais esses profissionais podem auxiliar o Judiciário. A relevância do papel exercido pelas psicólogas judiciárias reside tanto em um aspecto geral, explicado pela complexidade do fenômeno do abuso e pela faixa etária das vítimas, como por aspectos mais específicos. Dentre os aspectos específicos, os operadores entendem que a Psicologia pode contribuir para com a comprovação das situações de abuso sexual, proteção das vítimas e envolvidos, e realizando atendimentos e encaminhamentos que são impossíveis aos operadores do Direito, tendo em vista os limites de suas formações.

Comprovação:Considerando a dificuldade observada pelos operadores em obter dados relativos à materialização do abuso sexual, uma vez que a maioria dos casos não deixa vestígios e tampouco possui testemunhas, a importância da intervenção da Psicologia reside também no sentido de buscar elementos de veracidade do caso. A disciplina, segundo os participantes, apresenta conhecimentos e técnicas que podem contribuir para a busca de informações e detalhes das situações abusivas, que podem ser decisivas para o processo judicial. Uma das questões abordadas pelos operadores refere-se à possibilidade da Psicologia de diferenciar uma situação em que um abuso realmente ocorreu de uma situação inventada ou em que a vítima está sendo influenciada, como ocorre na Síndrome de Alienação Parental."O psicólogo é uma pessoa que tem capacitação para apurar e para ouvir uma criança sem causar nela maiores danos e para verificar se aquilo que ela diz é verdade ou se isso é uma história inventada por outro".

Proteção:O aspecto protetivo oferecido pela Psicologia foi bastante enfatizado por todos os operadores entrevistados. Os participantes observam que os profissionais da Psicologia podem atuar na proteção, tanto na função de avaliação quanto na de atendimento. Especificamente na função investigativa, os psicólogos são percebidos como profissionais que podem minimizar os danos em situações de depoimentos com crianças e adolescentes, identificar outras situações de maus-tratos que porventura estejam sofrendo, observar consequências comportamentais, emocionais e sociais para as vítimas, bem como a necessidade de acompanhamento na rede de saúde e sugerir encaminhamentos. O aspecto emocional é relatado por um operador que percebe a necessidade da participação do psicólogo diante do impacto emocional desencadeado pelas situações de abuso:"a gente vê um turbilhão de sentimentos, ao mesmo tempo de dor, de culpa... e nesse turbilhão, eu acho muito importante que intervenha uma profissional da Psicologia".

A verificação de consequências do abuso para as vítimas pode contribuir para a comprovação do fato e também para a proteção da criança/adolescente. Os operadores do Direito entendem que avaliar as possíveis consequências da situação abusiva pode ser relevante tanto no sentido de prover maiores elementos para o processo judicial quanto no sentido de observar os efeitos na criança e na família e, assim, diagnosticar a necessidade de atenção específica. Comportamento da criança, desempenho escolar, aspectos emocionais e possíveis comprometimentos em qualquer área são aspectos que a Psicologia pode investigar, conforme os participantes deste estudo.

Auxílio diante da limitação do Direito:A Psicologia também mostra sua importância por meio da fragilidade, em determinados aspectos, da disciplina jurídica:"Eu sou, hoje, um juiz convencido de que não há sucesso garantido no bom funcionamento de uma vara criminal se não houver uma equipe multidisciplinar, paralela e atuante."A afirmação do participante demonstra que não somente a Psicologia, mas outras disciplinas são cada vez mais valorizadas pelo Poder Judiciário e são chamadas a contribuir para com a Justiça. Falta de habilidade, impotência, incapacidade, limitações e despreparo foram algumas expressões utilizadas pelos participantes para expressar a dificuldade de lidar com os conteúdos que os profissionais da Psicologia lidam em seu cotidiano de trabalho, especialmente o sofrimento humano. Segundo um dos entrevistados, em tempos mais remotos, o operador do Direito tinha a"pretensão"de tudo saber e, prescindir, portanto, de opiniões técnicas. Entretanto, hoje, para os participantes, não há como ter domínio sobre matérias tão diversas como as que são julgadas por esses operadores, necessitando assim, valer-se de profissionais especializados.

TOMADA DE DECISÃO: A decisão judicial propriamente dita é um papel do juiz de Direito. Entretanto, a tomada de decisão foi concebida neste estudo como a decisão sobre entender que o abuso sexual ocorreu ou não. Dessa forma, a tomada de decisão ocorre para cada um dos profissionais envolvidos no trabalho com situações de abuso sexual contra crianças e adolescentes. Sendo um fenômeno sem evidências fortes e claras que tornariam lógico se o crime aconteceu ou não, a tomada de decisão sobre o caso pode incluir diferentes fontes de dados, bem como diferentes processos cognitivos e afetivos (Pelisoli, Gava, & Dell'Aglio, 2011Pelisoli, C., Gava, L. L., & Dell'Aglio, D. D. (2011). Psicologia jurídica e tomada de decisão em situações envolvendo abuso sexual infantil. Psico-USF, 16(3), 327-338. doi: 10.1590/S1413-82712011000300009
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). Juízes de direito, promotores de justiça e defensores públicos afirmaram que, ao refletirem sobre se um caso ocorreu ou não, avaliam provas documentais, testemunhais e, além disso, aspectos de ordem não tão objetiva, que acabam percebendo no decorrer do processo judicial.

Provas documentais e periciais:Enfatizando a importância dos documentos, os operadores do Direito demonstram que o documento psicológico (laudo/relatório ou parecer) é uma das provas no processo judicial de abuso sexual. Junto a essa prova, estão outros documentos, como o laudo de estudo social, exame de corpo de delito, documentos do Conselho Tutelar e boletins de ocorrência. Em conjunto, todos esses documentos contribuem para a formação da convicção sobre a ocorrência ou não do fato. Todos os documentos são considerados pelos participantes e exercem importante influência para a tomada de decisão desses operadores.

Os documentos produzidos pelo psicólogo são considerados, pelos operadores do Direito, relevantes no contexto jurídico, especialmente naqueles casos em que não há prova material do abuso sexual. Laudos/relatórios e pareceres são utilizados como complementares a outras provas à disposição no processo judicial, que auxiliam na formação de convicção e fazem"pensar e repensar"a situação abusiva. Entretanto, há queixas no sentido de que muitos desses documentos chegam às mãos dos operadores do Direito escritos de forma vaga e superficial. Os operadores relatam também que, muitas vezes, os profissionais realizaram somente uma entrevista com a vítima, limitando assim as possibilidades que apresenta a Psicologia para contribuir com os casos. Os entrevistados, referindo-se à legislação nacional, afirmam que o documento psicológico é também a materialização do estudo psicológico realizado e que precisa ser apresentado às partes (defensoria e promotoria), garantindo assim o respeito aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa (Brasil, 1988)Brasil. (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm in 02/06/2013.
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. As partes poderão manifestar-se diante do documento psicológico. Não estando presente o documento psicológico, os participantes relatam que há o risco de nulidade do processo, uma vez que sua ausência fere esses princípios.

Provas testemunhais:Devido à complexidade da situação do abuso sexual, a palavra de diferentes atores tem influência sobre a decisão tomada. Portanto, são relevantes para os operadores do Direito, os relatos da vítima, familiares, suposto agressor e porventura, outra testemunha. Questionado sobre o que mais influencia na sua tomada de decisão, relata um dos participantes (juiz):"Um depoimento bem realizado. Primeiro que a criança ou adolescente se sinta à vontade, exercendo um direito dela que ela não tá obrigada a depor, e ela não sendo induzida a responder nada, que tenha um relato livre, que se sinta bem naquele momento, que tenha uma certa lógica no que ela tá expressando, mesmo que seja uma criança pequena, que a gente entende que o desenvolvimento dela é ainda é muito pequeno, mas isso nós temos que o depoimento é muito importante".

Percepções sobre a criança/adolescente e da família:Além desses aspectos mais objetivos como provas documentais, periciais e testemunhais, os operadores entendem que outros aspectos também contribuem para suas decisões nos processos judiciais envolvendo abuso sexual contra crianças e adolescentes. A expressão de sentimentos que possam estar associados à vitimização é, por exemplo, levada em consideração pelos participantes. Ou seja, se o operador do Direito perceber a expressão de sentimentos congruentes com a vitimização (sofrimento), considerará mais provável de o abuso alegado ser verdadeiro:"a gente vê que é algo que mexeu com ela, então, isso também é um indicativo de que está falando a verdade".Além disso, são avaliados aspectos cognitivos como a coerência e uniformidade do relato da vítima, bem como seu conhecimento prévio sobre sexualidade, considerando a etapa desenvolvimental na qual se encontra. Os operadores relatam que realizam também uma observação das reações e comportamentos dos familiares da vítima. Um aspecto destacado é a possibilidade de haver conflitos entre os pais anteriores à denúncia, como em casos de separações não consensuais. Este seria um indicador de menor credibilidade na denúncia realizada.

NECESSIDADES DA ÁREA: Os operadores do Direito foram questionados quanto às suas percepções sobre o trabalho da Psicologia frente às necessidades do processo. Para qualificar a contribuição da Psicologia à Justiça, os operadores afirmaram que seria importante uma maior atenção aos supostos abusadores, à elaboração de documentos mais fundamentados e à abertura para um diálogo mais próximo entre as duas áreas.Maior atenção ao agressor:Uma maior atenção aos supostos agressores e agressores já condenados foi observada como uma necessidade da Psicologia Jurídica pelos defensores públicos, que são os operadores responsáveis por atuar na defesa desses que também são sujeitos de direitos. De acordo com esses participantes, os supostos abusadores raramente passam por avaliações psicológicas e/ou acompanhamento psicológico. Não há a preocupação com a possibilidade de eles serem inocentes e, não sendo, não há preocupação no tratamento daqueles que podem ser acometidos de psicopatologias. Para os defensores, seria importante a presença e atuação da Psicologia junto à defensoria para que se pudesse realizar avaliações psicológicas com esses acusados: "seria ideal ter um psicólogo atuando na defensoria em tempo integral, em todas as comarcas".Esses participantes enfatizam que as avaliações seriam de extrema relevância para as pessoas acusadas, uma vez que muitas delas apresentam psicopatologias e, por tal motivo, cometem tal crime. Particularmente nos casos em que o acusado é um adolescente, a atuação da Psicologia poderia contribuir para a adequação da medida socioeducativa imposta.

Documentos mais consistentes:Os operadores reivindicam documentos mais consistentes, com laudos que apresentem fundamentação científica, descrição mais completa da avaliação e conclusões que possam contribuir para um melhor entendimento do caso. Nas palavras de um dos operadores:"... eu sempre digo para quem trabalha na proteção comigo: na proteção, se for pecar por alguma coisa, peca pelo excesso, não peca pela falta de informação".Foram citados vários aspectos que poderiam ser aperfeiçoados nos documentos psicológicos direcionados ao Poder Judiciário para garantir um bom aproveitamento das avaliações realizadas por esses profissionais. Para os operadores do Direito, seria importante que os psicólogos pudessem abordar, em seus documentos, o comportamento, personalidade, reações da vítima diante do abuso (sinais e sintomas, possíveis consequências do evento), como aspectos de conteúdo emocional, por exemplo, seu sofrimento, se for o caso. Segundo eles, seria relevante também a descrição do relato sobre a situação abusiva, não somente o relato em si, mas observações sobre sua coerência e, se possível, com indicadores de sua credibilidade.

Para os participantes, o documento deveria incluir também informações sobre as relações da criança/adolescente com a família, tanto com cuidadores não abusivos como com o suposto abusador. A inserção da vítima na comunidade, sua necessidade de atendimento psicológico e sua situação com relação a essa necessidade poderiam ser contempladas no laudo. Quanto aos aspectos técnicos, seria importante que os psicólogos descrevessem os testes e instrumentos utilizados, uma vez que os operadores não apresentam conhecimento a respeito. Os participantes chamam a atenção, ainda, para a necessidade de imparcialidade e isenção na elaboração da avaliação e do documento, uma vez que, no papel de perito do judiciário, o psicólogo não deve colocar-se a favor de uma ou outra parte (vítima e/ou agressor).

Diálogo entre as áreas:A ampliação da comunicação entre operadores do Direito e profissionais da Psicologia é entendida como um fator de enriquecimento para o andamento do processo judicial. Segundo os participantes, quando há liberdade para conversar sobre as impressões do profissional da Psicologia, as decisões judiciais, que afetam vítima, acusado e familiares, podem ser fundamentadas em bases mais sólidas. Um dos juízes entrevistados relata:"O processo, pra mim, é puro diálogo. Ele se materializa ainda, infelizmente, no papel... Mas o processo judicial é só diálogo, só comunicação. E se a gente não tem possibilidade de estabelecer uma comunicação permanente, bom, as rupturas ao longo do desenvolvimento do procedimento provavelmente vão levar a uma decisão não muito adequada".

Discussão

Este trabalho verificou como operadores do Direito (juízes, promotores e defensores públicos) percebem a importância e o trabalho da Psicologia no contexto judiciário, em situações de abuso sexual. Estudos anteriores indicavam que o Direito estava preocupado apenas com a produção da prova (Granjeiro & Costa, 2010Granjeiro, I. A. C. L., & Costa, L. F. (2010). A interdisciplinaridade entre Direito e Psicologia no conflito familiar violento. Revista de Informação Legislativa, 47(185), 195-209. Recuperado de http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/198667
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), mas o presente estudo demonstrou que esses participantes também estão preocupados com a proteção das vítimas e, por tal motivo, solicitam a ajuda da Psicologia a partir dos encaminhamentos para estudo psicológico e/ou depoimento. Devido às limitações da própria disciplina, os operadores do Direito encontram na Psicologia o papel que percebem necessário na avaliação e manejo dos casos de abuso sexual. Entendem que os psicólogos podem minimizar os danos de uma situação de depoimento de crianças e adolescentes, fornecer subsídios para a tomada de decisão judicial mais adequada e avaliar a necessidade da vítima e da família de encaminhamento para outros setores, como o da saúde, por exemplo. Diferentemente do estudo deCesca (2004)Cesca, T. B. (2004). O papel do psicólogo jurídico na violência intrafamilar: possíveis articulações. Psicologia & Sociedade, 16(3), 41-46. doi: 10.1590/S0102-71822004000300006
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, portanto, no presente estudo, todos os juízes entenderam fundamental a participação da Psicologia nesses casos e gostariam, ainda, que os psicólogos pudessem atuar em todos os casos envolvendo crianças e adolescentes, propiciando uma visão mais integrada dos casos e possibilitando uma relação mais próxima com as vítimas, para a qual se sentem despreparados.

Também nesse sentido, os operadores pareceram, neste estudo, preocupados em observar as consequências do abuso sexual, diferente do que foi encontrado porCosta et al. (2008)Costa, L. F., Penso, M. A., Almeida, T. M. C., & Ribeiro, M. A. (2008). A justiça é demorosa, burra e cega: percepções de famílias sobre a dimensão jurídica dos crimes de abuso sexual. Boletim de Psicologia, 58(128), 85-102.. Esse resultado sugere uma abertura do Poder Judiciário para a busca de uma aproximação com outras disciplinas, indo ao encontro das políticas nacionais que estimulam a cooperação e a interdisciplinaridade quando da atuação em casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes (Brasil, 2002). Entretanto, sabe-se que a interdisciplinaridade é um processo e não ocorre instantaneamente, mas é produto de um trabalho de longo prazo. ParaSantos (2007)Santos, B. S. (2007). Para uma revolução democrática da justiça. São Paulo: Cortez., a importância da interdisciplinaridade reside no surgimento de novas questões ao Direito, que exigem outros conhecimentos que não os jurídicos. Por vivermos esse"momento sociojurídico estimulante e exigente"(Santos, 2007, pSantos, B. S. (2007). Para uma revolução democrática da justiça. São Paulo: Cortez., p.9) é que as outras áreas têm ganhado espaço e influenciado decisões que antes eram tomadas unilateralmente.

As decisões judiciais implicam em consequências relevantes na vida de todos os envolvidos nessas situações (Costa, Penso et al., 2009Costa, L. F., Penso, M. A., Almeida, T. M. C., & Ribeiro, M. A. (2008). A justiça é demorosa, burra e cega: percepções de famílias sobre a dimensão jurídica dos crimes de abuso sexual. Boletim de Psicologia, 58(128), 85-102.;Santos & Costa, 2010Santos, M. R. R., & Costa, L. F. (2010). Campo psicossocial e jurídico: relações de poder nas decisões de conflito familiares. Estudos de Psicologia (Campinas), 27(4), 553-561. doi: 10.1590/S0103-166X2010000400013). Juízes, defensores públicos e promotores de justiça, no presente estudo, demonstraram preocupação em tomar suas decisões com base em dados mais próximos da realidade, garantindo os direitos constitucionais de todas as partes. Nessa difícil tarefa de tomada de decisão, a Psicologia tem papel essencial, podendo contribuir com todo seu aparato técnico, assim como usufruindo de habilidades pessoais (afetivas) que são do perfil do profissional das ciências humanas e sociais. Ao fazer isso, o psicólogo pode desempenhar a tarefa de auxiliar a Justiça e contribuir para a proteção de vítima e família, ao mesmo tempo. Os operadores disseram basear-se em provas documentais, periciais, testemunhais e percepções sobre a criança e a família, que constroem no contato com elas e/ou no contato com as provas do processo. Interessante observar que, em todos esses aspectos, a Psicologia pode ter uma participação significativa: em se tratando dos documentos, os laudos psicológicos são considerados muito relevantes; no que diz respeito às provas testemunhais, a Psicologia pode ter participação por meio do Depoimento Especial; e com relação às percepções dos operadores do Direito, os psicólogos podem contribuir na discussão do caso com os operadores. Para a qualificação da contribuição da Psicologia na Justiça, os operadores observam a necessidade de três principais aspectos. Os defensores públicos chamam a atenção para a necessidade de maior inserção de psicólogos nas Defensorias, atuando na avaliação do suposto agressor, seja adulto ou adolescente. Especificamente no caso de réus adolescentes, a Psicologia poderia contribuir mais na discussão de medidas socioeducativas adequadas à faixa etária e ao ato infracional cometido. Outra contribuição seria o tratamento do agressor já condenado, uma vez que muitos deles apresentam psicopatologias. Por sua vez, os documentos são indispensáveis, mas podem ser elaborados de forma que contribuam mais incisivamente para o compartilhamento de constatações específicas com os operadores. No estudo deCoimbra (2004)Coimbra, J. C. (2004). Algumas considerações sobre o parecer psicológico na justiça da infância e da juventude. Psicologia: Ciência e Profissão, 24(2), 2-13. doi: 10.1590/S1414-98932004000200002, os documentos psicológicos também foram citados como importantes influências para a tomada de decisão judicial.

A comunicação entre operadores do Direito e Psicologia para além dos documentos, especialmente nos casos envolvendo crianças e adolescentes, é fundamental para que os direitos de todos sejam garantidos e a proteção de vulneráveis seja adequadamente efetivada. Uma relação igualitária e baseada no diálogo já tinha sido citada por autores como um caminho a ser percorrido pelos trabalhadores no sentido de superar a fragmentação dos saberes (Granjeiro & Costa, 2010Granjeiro, I. A. C. L., & Costa, L. F. (2010). A interdisciplinaridade entre Direito e Psicologia no conflito familiar violento. Revista de Informação Legislativa, 47(185), 195-209. Recuperado de http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/198667
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;Perucchi, 2010)Perucchi, J. (2010). Nos trâmites da lei: uma crítica à perspectiva tradicional da noção de família no âmbito da psicologia jurídica brasileira. Psicologia em Pesquisa, 4(1), 3-14. Recuperado de http ://pepsic. bvsal ud .orgscielo. php?scri pt=sci_a rttext&pid=S1982-12472010000100002&lng=es&nrm=iso
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e buscar a complementaridade dessas disciplinas (Costa, Legnani, & Zuim, 2009Costa, L. F., Legnani, V. N., & Zuim, C. B. D. B. (2009). A menina que se constituiu no contexto do tráfico: o estudo psicossocial forense e o resgate da função paterna. Fractal: Revista de Psicologia, 21(1), 151-162. doi: 10.1590/S1984-02922009000100012). Neste trabalho, observou-se que alguns movimentos de aproximação entre a Psicologia e o Direito têm sido realizados, com resultados positivos, mas que pode haver, ainda, maior investimento nessa interdisciplinaridade. O diálogo entre operadores e psicólogos pode garantir a clareza da comunicação e contribuir para a troca de informações importantes para o caso, atingindo positivamente a vítima e a família.

Os operadores do Direito demonstraram considerar as potencialidades da atuação da Psicologia em situações de abuso sexual não somente pelas possibilidades técnicas da profissão, mas também pela característica de lidar com o aspecto emocional da tarefa, conforme já haviam apontadoRibeiro e Costa (2007)Ribeiro, R., & Costa, L. F. (2007). As emoções do profisssional psicossocial frente à situação de abuso sexual infantil. Estilos da Clinica, 12(23), 108-129. doi: http://dx.doi.org/10.11606/issn.19811624.v12i23p108-129
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. Entretanto, os participantes indicaram necessidades do Judiciário em que a Psicologia pode contribuir de forma mais consistente. Essas necessidades merecem atenção especialmente dos psicólogos, uma vez que este estudo foi direcionado a entender seu papel nesse contexto, mas também cabe aos operadores um olhar diferenciado sobre a profissão e sobre a atuação dos psicólogos nesses casos. Importante enfatizar que o produto da interação dessas disciplinas não implica somente na melhor execução de uma tarefa específica pelo psicólogo ou pelo operador do Direito, mas implica no impacto que as articulações entre essas disciplinas apresentam sobre as pessoas que procuram na Justiça o direito de viverem afastadas de qualquer forma de violência.

Conclusão

O estudo das relações entre Psicologia e Direito é merecedor de maior investimento acadêmico, tendo em vista o impacto social que representam as situações enfrentadas nesse domínio. Neste estudo, percebe-se a valorização do papel do psicólogo e a diversidade de sua atuação no contexto judiciário, em contraposição aos limites do Direito. A possibilidade de atuar tanto contribuindo para o esclarecimento dos fatos (com vistas à comprovação) quanto para a proteção de crianças e famílias faz da Psicologia uma profissão fundamental que contribui para a garantia dos direitos dos envolvidos em situações de abuso sexual contra crianças e adolescentes.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    07 Abr 2013
  • Revisado
    06 Ago 2013
  • Aceito
    29 Ago 2013
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