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Estratégias Formativas em Serviços-Escola de Psicologia: Revisão Bibliográfica da Produção Científica

Educational Strategies in Psychology School-Services: a Bibliographic Review of Scientific Publications

Estrategias de Formación en Servicios Escolares de Psicología: Revisión Bibliográfica de la Producción Científica

Resumo

O artigo apresenta revisão bibliográfica sobre estratégias formativas em serviços-escola de Psicologia. Reúne artigos completos disponíveis na Biblioteca Virtual de Saúde em Psicologia (BVS-psi), publicados entre 2011 e 2015. A pesquisa a partir dos termos, em separado: formação de psicólogos; formação profissional e clínica-escola, identificou 13 artigos, que foram organizados em três blocos temáticos: ensino/transmissão da psicanálise; relatos de procedimentos pedagógicos; referências a supervisor e/ou supervisão. Ainda é expressiva, nas publicações, a presença da área da Psicologia Clínica, com destaque para a prática da psicoterapia. A psicanálise tem sido revisitada, em especial, quanto à possibilidade de sua transmissão na Universidade. Relatos de procedimentos pedagógicos e produções sobre a relação supervisão-estagiário/a têm a importante função de ampliar o debate sobre projeto político-pedagógico e sua execução na rotina das instituições de ensino e de serviços-escola. Entendemos que a psicanálise tem encontrado mediações para a questão que lhe é peculiar de questionar-se sobre a possibilidade de sua transmissão em instituição com regras próprias, como a Universidade. Os relatos de procedimentos explicitam estratégias micropolíticas na relação docente-estudante, supervisor/a-estagiário/a. As questões sobre supervisor/a e/ou supervisão indicam a complexidade de aspectos envolvidos na relação e as especificidades de vivência de cada um dos envolvidos. Consideramos que o tema em questão carece de estudos que explicitem estratégias macropolíticas de formação, bem como pesquisas que abordem o que se passa com o/a estagiário/a em seu processo formativo. Otimistas, acreditamos que a riqueza de experiências em torno das estratégias formativas, não necessariamente ganharam as páginas de periódicos.

Formação do Psicólogo; Clínicas-Escola; Supervisão Clínica

Abstract

The article presents a literature review on educational strategies in Psychology School-Services. It brings together complete articles available in the Virtual Library of Health in Psychology (BVS-psi), published between 2011 and 2015. The research of the terms, individually: training of psychologists; professional training and clinical-school, identified 13 articles, which were organized into three thematic blocks: teaching/transmission of psychoanalysis; reports of pedagogical procedures; references to supervisor and/or supervision. It is still expressive in the publications the presence of the area of Clinical Psychology, with emphasis on the practice of psychotherapy. Psychoanalysis has been revised, in particular, regarding the possibility of its transmission in the University. Reports of pedagogical procedures and productions on the supervisor-intern relationship have the important function of broadening the debate on Psychology’s political-pedagogical project and its execution in the routine of educational institutions and School-Services. We understand that psychoanalysis has found mediations for its peculiar question of the possibility of its transmission in an institution with its own rules, such as the University. The reports of procedures explain micropolitical strategies in the teacher-student relationship, supervisor/intern. Supervisory and/or supervision issues indicate the complexity of aspects involved in the relationship and the specificities of the experience of each of those involved. We consider that the subject in question needs studies that explain macro-political educational strategies, as well as research that addresses what happens to the intern in his/her educational process. Optimists, we believe that the wealth of experiences around the educational strategies hasn’t necessarily been brought to the pages of journals.

Psychologist Education; School-Clinics; Clinical Supervision

Resumen

El artículo presenta una revisión bibliográfica sobre estrategias de capacitación en servicios escolares de psicología. Reúne artículos completos disponibles en la Biblioteca Virtual en Salud en Psicología (BVS-psi), publicados entre 2011 y 2015. La investigación basada en los términos, por separado: capacitación de psicólogos; la formación profesional y la clínica-escuela identificaron 13 artículos, que se organizaron en tres bloques temáticos: enseñanza/transmisión del psicoanálisis; informes de procedimientos pedagógicos; referencias al supervisor y/o supervisión. La presencia del área de Psicología Clínica sigue siendo significativa en las publicaciones, con énfasis en la práctica de la psicoterapia. El psicoanálisis ha sido revisado, en particular, con respecto a la posibilidad de su transmisión en la Universidad. Los informes de procedimientos pedagógicos y producciones sobre la relación supervisión-pasante tienen la importante función de expandir el debate sobre el proyecto político-pedagógico y su ejecución en la rutina de las instituciones educativas y los servicios escolares. Entendemos que el psicoanálisis ha encontrado mediaciones para el tema que le es peculiar: cuestionarse sobre la posibilidad de su transmisión en una institución con sus propias reglas, como la Universidad. Los informes de procedimiento explican las estrategias micro-políticas en la relación profesor-alumno, supervisor(a)/pasante. Las preguntas sobre el supervisor(a) y/o supervisión indican la complejidad de los aspectos involucrados en la relación y los detalles de la experiencia de cada uno involucrado. Consideramos que el tema en cuestión carece de estudios que expliquen las estrategias de capacitación macro-política, así como de investigaciones que aborden lo que sucede con el pasante en su proceso de capacitación. Optimistas, creemos que la riqueza de experiencias en torno a las estrategias de capacitación, no necesariamente han tenido destaque en las páginas de los periódicos.

Formación del Psicólogo; Servicios Escolares; Supervisión Clínica

Introdução

As Diretrizes Curriculares nacionais (DCN) para os Cursos de Graduação em Psicologia (Resolução nº 5/2011, Resolução nº 8/2004) orientam reformulações significativas dos projetos políticos-pedagógicos dos referidos cursos, mobilizando mudanças na formação graduada. Ajustes dessa ordem são consonantes com a tarefa de formar profissionais habilitados a lidar com os problemas oriundos da realidade.

As atuais DCN (Resolução nº 5/2011, Resolução nº 8/2004) avançam consideravelmente em relação ao desenho que a formação assumia anteriormente, marcada pelo destaque à transmissão de conhecimentos e acúmulo de informações, conforme previsto no Currículo Mínimo ( Bernardes, 2012Bernardes, J. S. (2012). A formação em Psicologia após 50 anos do Primeiro Currículo Nacional da Psicologia: alguns desafios atuais. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(num. esp.), 216-231. https://doi.org/10.1590/S1414-
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). Elas projetam flexibilidades na construção do projeto político-pedagógico em suas proposições de núcleo comum, ênfases curriculares, eixos estruturantes, cujos detalhamentos no projeto devem ser assumidos pelo próprio curso de graduação. As DCN são antecedidas de movimentos na realidade social que constitui a formação graduada e o próprio lugar social da Psicologia. Destacamos, nesse sentido, dois significativos vetores que se apresentam no campo de forças em questão.

Um deles refere-se às mudanças no cenário sócio-político brasileiro desde meados dos anos de 1980, com o fim do regime militar, elaboração da Constituição de 1988 e retomada de eleições diretas. O outro vetor é representado pela própria autocrítica da Psicologia, a partir de profissionais que problematizam sua inserção social como profissão liberal circunscrita ao atendimento em consultório individual-privado, de uma classe média beneficiária dos anos de governos militares (Ferreira Neto, 2004, 2011; Gonçalves, 2010Gonçalves, M. G. M. (2010) Psicologia e políticas públicas. In M. G. M. Gonçalves, Psicologia, subjetividade e políticas públicas (pp. 79-129). São Paulo: Cortez. ; Yamamoto, & Oliveira, 2010).

O fim do período de ditadura civil-militar anunciou, com a Carta Constitucional de 1988, o reconhecimento de direitos sociais. Soma-se a estas formulações a pressão social para a efetivação de políticas públicas que concretizem o reconhecimento de direitos. Formulamos, assim, dentre outras políticas, o Sistema Único de Saúde (SUS) (Lei nº 8.080, 1990) e o Sistema Único de Assistência Social (SUAS). ( Aguiar, 2011Aguiar, Z. N. (Org.) (2011). Sistema Único de Saúde: Antecedentes, percurso, perspectivas e desafios. São Paulo: Martinari. ; Brasil, 2005Brasil (2005). Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004: Norma Operacional Básica NOAB/SUAS. Brasília, DF. ; Paim, 2009Paim, J. S. (2009). O que é o SUS. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz. )

A formação de psicólogos/as1 1 Utilizaremos indistintamente feminino e masculino ao longo do texto. tem, diante de si, o desafio de revisar as práticas profissionais e ajustar-se de modo a disponibilizar para a sociedade profissionais para atuarem em campos emergentes. Novos campos de atuação distintos da clássica psicoterapia individual em consultório privado têm emergido e demandado novas práticas profissionais. Mudamos o cenário (instituições públicas, espaços públicos), a autoria (equipes multidisciplinares) e o sujeito da intervenção (camadas populares, historicamente à margem da atenção psicológica).

No que concerne à formação, concordamos com Bernardes (2012)Bernardes, J. S. (2012). A formação em Psicologia após 50 anos do Primeiro Currículo Nacional da Psicologia: alguns desafios atuais. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(num. esp.), 216-231. https://doi.org/10.1590/S1414-
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de que um Currículo não merece ser considerado como mera reprodução, mas sim, uma produção “de pessoas e coisas, modos de ser e de viver, produzindo modos de subjetivação” (p. 219). Nesse contexto, os serviços-escola de Psicologia reconhecidamente como espaço privilegiado para a prática de estágios é dispositivo importantíssimo na formação. As DCN (Resolução nº 5/2011) apresentam em seu Art. 25.:

O projeto de curso deve prever a instalação de um Serviço de Psicologia com as funções de responder às exigências para a formação do psicólogo, congruente com as competências que o curso objetiva desenvolver no aluno e as demandas de serviço psicológico da comunidade na qual está inserido.

Participar do debate sobre como os serviços-escola de Psicologia têm realizado suas atividades formativas diante das mudanças sociais, históricas e institucionais que se impõem à sua realidade é o objetivo do presente artigo. Nele, apresentamos parte dos esforços empenhados nesta direção, compartilhando revisão bibliográfica sobre o assunto. É digno de nota, entretanto, que novas Diretrizes Curriculares estão em debate, cuja Minuta foi aprovada pelo Conselho Nacional de Saúde, em sua Resolução nº 597, de 13 de setembro de 2018. Manter o debate sobre Diretrizes na formação de psicólogas/os, portanto, é indispensável.

Metodologia

Em levantamento bibliográfico realizado no mês de agosto de 2015, buscamos artigos científicos completos disponíveis na Biblioteca Virtual de Saúde em Psicologia (BVS-Psi), publicados entre 2011 e 2015. Foram utilizados, na busca, os termos, em separado: formação de psicólogos; formação profissional e clínica-escola2 2 A busca pelo termo serviço-escola não nos apresentou resultados satisfatórios. Considerando que a alteração dos termos, proposição das DCN, ainda está em curso e ainda não está refletida na produção científica sobre o assunto, decidimos usar como termo de busca clínica-escola. . A leitura de títulos orientou a primeira seleção de artigos, cuja seleção final foi realizada a partir da leitura de resumos. Guiou a pesquisa bibliográfica, o tema geral no estudo – formação de psicólogas em serviços-escola de Psicologia. Em reunião de trabalho da equipe de pesquisa, os artigos foram organizados em grupos, por temáticas abordadas. Nova busca de artigos foi feita em novembro de 2016 com objetivo de acessar publicações de 2015 não identificadas na primeira pesquisa bibliográfica. Neste artigo apresentamos a apreciação do grupo de 13 artigos que versa sobre estratégias formativas em serviços-escola de Psicologia.

Para cada um dos 13 artigos foi feita uma síntese/fichamento, respeitando as formulações dos autores, ainda não se configurando, neste momento, qualquer apreciação nossa. Em reuniões da equipe de pesquisa as sínteses foram estudadas e debatidas. Exercício de sínteses e análises foram empenhadas, subsidiando os resultados e discussões apresentadas a seguir.

Resultados

Organizamos os 13 artigos referentes a estratégias formativas em três blocos temáticos. No primeiro bloco reunimos produções sobre o ensino da psicanálise em serviço-escola de Psicologia. No segundo bloco foram incluídos relatos de procedimentos pedagógicos na formação de psicólogos. No terceiro bloco estão as publicações que discutem sobre supervisor e/ou supervisão. O Quadro 1 apresenta os Blocos de Temas e as respectivas Referências.

Quadro 1
Autoria e ano de artigos por bloco temático

As publicações são, majoritariamente, de autoria coletiva, constando apenas dois artigos de autoria individual, ambos da mesma autora. Dentre os 32 autores encontrados, quatro autores publicaram mais de um artigo. Dez revistas acolhem as publicações. Quanto à localização do primeiro autor, dez das publicações foram produzidas na Região Sudeste, uma na Região Sul, duas na Região Centro-Oeste e nenhuma nas Regiões Norte e Nordeste.

Ensino da Psicanálise

O estudo de Marcos (2012)Marcos, C. M. (2012). A supervisão em psicanálise na clínica escola: breve relato de uma pesquisa. Revista Mal Estar e Subjetividade, 12(3-4), 853-872. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1518-61482012000200015&lng=pt&tlng=pt
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trata da transmissão da clínica psicanalítica, da sua ética e do seu ato em uma clínica-escola. Tal discussão é apresentada como fundamental para o entendimento das práticas clínicas em estágios curriculares no âmbito da formação em Psicologia. A clínica é referida como atendimento individual sob a supervisão psicanalítica. A pergunta que se propõe responder é da possibilidade de transmissão da psicanálise em uma universidade. A autora pontua que a clínica-escola comporta diversas abordagens além da psicanalítica, assim como a clínica da psicanálise não se restringe ao âmbito ambulatorial do consultório privado. Diferente da transmissão na universidade em que o saber é tido como pleno, na clínica-escola há a possibilidade de uma vivência de aspectos da psicanálise que a partir da supervisão podem provocar uma produção de saber sobre o caso, para daí então reconhecer uma teoria. Essa supervisão é inserida em exigências curriculares e com isso obedece a um conjunto de regras, obrigações e compromissos institucionais. Essas regras enquadram a supervisão no discurso universitário , no qual o aprendizado é conduzido pela mestria, o que produz um sujeito dividido entre o saber e a verdade. Essa função do supervisor é antagônica à função do analista , pois se constitui como hierarquizada e controladora. A pesquisa a qual o artigo se propõe, buscou rever hipóteses acerca dos efeitos produzidos nos alunos pela experiência de estágio na clínica de orientação psicanalítica. A análise do discurso dos alunos pôde verificar uma representação da supervisão diferente do lugar da aprendizagem transmitida em sala de aula. A partir disso, se evidencia que o aprendizado na clínica em supervisão não está relacionado com um saber funcional da profissão, mas com um saber que é formado na experiência e a partir dela.

Os artigos de Marcos (2011)Marcos, C. M. (2011). Reflexões sobre a clínica-escola, a psicanálise e sua transmissão. Psicologia Clínica, 23(2), 205-220. https://doi.org/10.1590/S0103-56652011000200013
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e Maia e Pinheiro (2011)Maia, M. V. C. M., Pinheiro, N. N. B. (2011). Um psicanalista fazendo outra coisa: reflexões sobre setting na psicanálise ext. Psicologia: Ciência e Profissão, 31(3), 656-667. https://doi.org/10.1590/S1414-98932011000300016
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revisitam o lugar do setting terapêutico proposto pela psicanálise. Marcos (2011)Marcos, C. M. (2011). Reflexões sobre a clínica-escola, a psicanálise e sua transmissão. Psicologia Clínica, 23(2), 205-220. https://doi.org/10.1590/S0103-56652011000200013
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discute o enfoque do lugar da clínica e sua estrutura na universidade. O saber sobre a clínica é tido na ordem do particular, sendo assim, dentro na universidade, abre-se outra possibilidade de relação com o saber. A clínica-escola é caracterizada como espaço de formação com uma atuação voltada para a atenção à saúde e ao cuidado com o sofrimento psíquico, assim, ela é determinada pelo atendimento à população e não pelo processo acadêmico. A partir disso, entende-se a formação em Psicologia guiada pela prática, sendo o atendimento junto à supervisão na clínica-escola o principal fator formador. Por conseguinte, a autora discute a possibilidade de pensar a transmissão da psicanálise nesse espaço singular que é a clínica universitária, sendo necessária uma estrutura para a prática que esteja além do enquadre clássico psicanalítico. Uma das limitações institucionais que interferem no contrato terapêutico é o do tempo que é restrito na clínica-escola (pelo tempo determinado de estágio). Assim, a prática em exercício nessa dimensão aproxima-se muito mais do trabalho de entrevista preliminar do que de análise propriamente dita. Outra questão trazida que diferencia da análise tradicional é a isenção do pagamento, já que a população atendida é de uma classe menos favorecida e/ou da comunidade acadêmica. Por fim, a autora considera que mesmo com tais atravessamentos, há a possibilidade de transmissão da psicanálise na universidade se houver uma preocupação em deixar um espaço para o singular de cada caso a ser atendido, evitando o convite ao jogo dual das regras e contratos e procurando alcançar de outras formas o processo de transferência.

Maia e Pinheiro (2011)Maia, M. V. C. M., Pinheiro, N. N. B. (2011). Um psicanalista fazendo outra coisa: reflexões sobre setting na psicanálise ext. Psicologia: Ciência e Profissão, 31(3), 656-667. https://doi.org/10.1590/S1414-98932011000300016
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propõem uma reflexão sobre a estrutura da clínica de base psicanalítica a partir do relato de dois casos acompanhados pelas autoras, sendo um na clínica-escola e outro em um ambulatório geral de Psicologia em um hospital. No caso da clínica-escola é descrita uma situação em que um atendimento acaba acontecendo fora do consultório, na área externa da clínica; também é relatado o manejo feito para lidar com essa possibilidade de setting . No ambulatório geral de Psicologia, o atendimento acaba sendo feito na varanda por impossibilidade de usar a sala original. Tais situações levam as autoras a discutir a possibilidade de um fazer psicanálise num setting diferenciado, definido por elas de extramuros. Com isso, as autoras redescrevem os aspectos dessa clínica, pensando numa prática a partir de uma nova lógica que alargue os horizontes, sem restringi-la a questões de lugar ou de regras técnicas, mas que parta de uma ética que sustente a complexidade desse novo espaço. Espaço esse que não deve se sobrepor ao campo teórico utilizado, mas que deve ser pensado como um suporte material para que novas narrativas aconteçam.

Os estudos de Sei e Paiva (2011)Sei, M. B., Paiva, M. L. S. C. (2011). Grupo de supervisão em Psicologia e a função de holding do supervisor. Psicologia Ensino & Formação, 2(1), 9-20. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2177-20612011000100002&lng=pt&tlng=pt
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e Zanetti e Guimarães (2014)Zanetti, S. A. S., Guimarães, J. A. (2014). O sonho de um supervisor em uma clínica-escola: contribuições da psicanálise contemporânea. Revista da SPAGESP, 15(1), 79-94. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-29702014000100007&lng=pt&tlng=pt
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apresentados a seguir, discutem novas possibilidades de atuação na supervisão a partir de conteúdos teóricos de base psicanalítica, também caracterizando o supervisor enquanto participante ativo no processo de formação de psicólogos.

Sei e Paiva (2011)Sei, M. B., Paiva, M. L. S. C. (2011). Grupo de supervisão em Psicologia e a função de holding do supervisor. Psicologia Ensino & Formação, 2(1), 9-20. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2177-20612011000100002&lng=pt&tlng=pt
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, apresentam o conceito de holding de Winnicott como estratégico na supervisão, que deve envolver o manejo das angústias e dos sofrimentos dos estagiários. O supervisor, nesse caso, é apresentado como alguém que oferece um ambiente suficientemente bom ao estagiário, tal como o da função materna, já que além de ser um norteador da prática, é alguém que lida com as questões emocionais que possam emergir dos estagiários a partir da sua atuação. Uma importante discussão do texto é relativa à forma como esse estagiário chega ao processo de supervisão, que ainda pautado numa ideia de ensino-aprendizagem, apresenta-se passivo na relação com o supervisor, o que dificulta a possibilidade de desenvolver um raciocínio clínico mais liberto dos possíveis apontamentos do supervisor sobre os casos que desenvolve. O holding como mecanismo da supervisão, nessa situação, colaboraria para promoção de uma abertura ao estagiário, para que o mesmo consiga desenvolver sua identidade profissional a partir de um efetivo exercício autônomo do conhecimento, e com isso ir construindo sua independência profissional. As discussões construídas pelas autoras partem da experiência em grupos de supervisão realizados em serviços-escola de Psicologia. Esses casos ilustram situações em que o exercício do holding colaborou com a redução das angústias dos estagiários e ao mesmo tempo com a formação desse estudante. Conclui-se que o supervisor possui uma grande importância para a qualificação do estudante de graduação em Psicologia. Para exercer tal função, o supervisor precisa ser um profissional qualificado com experiências que o ajudem a apreender os sentimentos que possam permear o grupo de estagiários.

O trabalho de Zanetti e Guimarães (2014)Zanetti, S. A. S., Guimarães, J. A. (2014). O sonho de um supervisor em uma clínica-escola: contribuições da psicanálise contemporânea. Revista da SPAGESP, 15(1), 79-94. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-29702014000100007&lng=pt&tlng=pt
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apresenta a experiência de uma docente que utiliza o próprio material psíquico onírico em sua prática de supervisão clínica em um serviço-escola, pautando-se em referenciais psicanalíticos contemporâneos. Pensando no processo de supervisão, as autoras discutem o exercício desse trabalho dentro do campo da psicanálise, relatando a necessidade de ir além de estratégias didáticas, utilizando-se da escuta do sintoma do supervisionando diante do caso clínico. A teoria e a técnica psicanalítica devem andar juntas nesse processo, sempre utilizando uma comunicação clara das possíveis interpretações feitas pelo supervisor à luz da teoria e disponibilizando um espaço para que o estagiário possa ir se apropriando da técnica. A experiência de que se baseia o artigo, fala do relato de uma estudante na supervisão clínica, que acabou por ocasionar um sonho na supervisora, e, a partir desse material onírico, gerar interpretações sobre o caso. Esse sonho funcionou como disparador para se pensar os norteadores da prática de um supervisor clínico psicanalítico. Logo, além da supervisão ser um espaço para falar de uma técnica, também se faz necessário pensar no setting que se estabelece nesse encontro, em que falar de materiais psíquicos também contribui para o exercício clínico. Os autores concluem que tal procedimento pode ser uma estratégia em supervisão para aprofundar o aprendizado do estudante, através dos significados obtidos na sua experiência psicanalítica, tanto na relação com o cliente como com o supervisor.

Relatos de procedimentos

Gonçalves e Peres (2012)Gonçalves, C. O., Peres, V. L. A. (2012). O psicodrama na universidade: contribuições morenianas à psicoterapia em uma clínica-escola. Revista Brasileira de Psicodrama, 20(1), 71-92. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-53932012000100007&lng=pt&tlng=pt
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propõem um diálogo a partir da prática de estágio 1 e 2 de uma clínica-escola, com as contribuições de J. L. Moreno à psicoterapia. O artigo trata de um estudo de caso único em supervisão que utiliza o método psicodramático, sendo descritos os procedimentos técnicos e seus embasamentos teóricos diante da experiência do estagiário, pela visão do supervisor. O caso “Clara” enfatiza a relação do terapeuta e cliente como forma de expressão estética/dinâmica da clínica. Diante das reflexões dos autores que indicam uma polarização entre behaviorismo e psicanálise na formação psicoterápica do psicólogo, o psicodrama é apresentado como alternativa a este cenário, recomendando-o para a formação em Psicologia.

A pesquisa de Marturano et al. (2014)Marturano, E. M., Silvares, E. F. M., Oliveira, M. S. (2014). Serviços-escola de psicologia: seu lugar no circuito de permuta do conhecimento. Temas em Psicologia, 22(2), 457-470. https://doi.org/10.9788/TP2014.2-15
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apresenta um circuito de permuta do conhecimento no qual a universidade e comunidade se articulam, sendo mediado pelos serviços-escola. Tal esquema possibilita a integração de ensino, pesquisa e extensão, tarefas da universidade, bem como de resolução de possíveis problemas da comunidade. A pesquisa científica tem papel fundamental no circuito por possuir um potencial de contribuição no aprimoramento de práticas de atendimentos, e também para a formação do psicólogo, sendo ela quem deflagra o circuito. São analisados três serviços-escola a partir dos resultados de pesquisas produzidas pelos mesmos, para verificar suas estruturas e atuações em relação ao proposto pelo circuito de permuta dos autores. Em suas considerações finais, os autores argumentam em defesa do fortalecimento da pesquisa nos serviços-escola, citando como é privilegiado o espaço desse serviço na construção do conhecimento. Também é pontuada a relevância da revisão periódica das práticas correntes para aperfeiçoamento do funcionamento do serviço e de testar as práticas de atendimento de forma empírica antes de utilizá-las. Os autores concluem que a imersão do estagiário em uma cultura de valorização da integração entre pesquisa e prática, parece ser um requisito fundamental para uma equilibrada articulação no tríplice aspecto do serviço-escola.

Experiência no uso de recurso fílmico no acolhimento de calouros de Psicologia é o objeto do trabalho de Santeiro et al. (2014)Santeiro, T. V., Santeiro, F. R. M., Souza, A. M. O., Juiz, A. P. M., Rossato, L. (2014). Processo grupal mediado por filmes: espaço e tempo para pensar a Psicologia. Revista da SPAGESP, 15(1), 95-111. Recuperado, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-29702014000100008&lng=pt&tlng=pt
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. Explanam sobre a função facilitadora do cinema no processo de aprendizagem para o estudante, por ser um instrumento que metaforiza situações e manifestações humanas. O projeto procurou colaborar na formação do psicólogo apresentando uma alternativa para viver a Psicologia Clínica e seus instrumentais que extrapolasse a sala de aula e as práticas de estágio supervisionado. O procedimento utilizado foi o de apresentação e discussão dos filmes no espaço do serviço-escola com os estudantes tendo como ponto de vista teórico, o uso da técnica de grupos operativos. É importante destacar que os conteúdos expressos espontaneamente pelo grupo eram mediados pela equipe coordenadora para manter o foco consonante com as diretrizes do projeto político-pedagógico do curso de Psicologia, sendo mais direcionado à ênfase curricular em processos clínicos. Os autores concluem que tal exercício de compartilhamento dos estudantes mediado por profissionais, tendo como consequência a escuta e trocas empáticas entre os integrantes, pode ser um recurso auxiliar no processo de formação do psicólogo, assim como, em última instância inspirar vertentes possíveis de atuação clínica para o estudante.

Referências à supervisão e supervisor

O trabalho de revisão bibliográfica de Amaral et al. (2012)Amaral, A.E. V., Luca, L., Rodrigues, T. C., Leite, C. A., Lopes, F. L., & Silva, M. A. (2012). Serviços de psicologia em clínicas-escola: revisão de literatura. Boletim de Psicologia, 62(136), 37-52. Recuperado de: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0006-59432012000100005&lng=pt&tlng=pt
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apresenta publicações científicas sobre o funcionamento e as experiências dos serviços-escola de Psicologia no Brasil de 2000 a 2010. Partindo do percurso da Psicologia enquanto formação profissional, o artigo evidencia a importância do serviço-escola para a formação do psicólogo, assim como, para a população atendida. Foram encontrados 45 trabalhos online e depois organizados em seis categorias por área de concentração, sendo elas: A representação social do psicólogo e papel do supervisor de estágio; A descrição da clientela; Atendimento ao aluno; Triagem; Serviços diferenciados e Abordagens; e Atendimento infantil. Na categoria sobre o papel do supervisor de estágio, o trabalho de Silvares e Pereira (2005, citado por Amaral et al., 2012Amaral, A.E. V., Luca, L., Rodrigues, T. C., Leite, C. A., Lopes, F. L., & Silva, M. A. (2012). Serviços de psicologia em clínicas-escola: revisão de literatura. Boletim de Psicologia, 62(136), 37-52. Recuperado de: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0006-59432012000100005&lng=pt&tlng=pt
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) evidencia na sua conclusão o que compõe o trabalho do supervisor, como sendo: acompanhamento dos atendimentos realizados pelos alunos, promoção de condições para a realização do trabalho clínico dentro da instituição e colaborar para que o aluno desenvolva suas habilidades, seja na prática clínica como na produção de conhecimento científico. A partir das publicações encontradas por Amaral et al. (2012)Amaral, A.E. V., Luca, L., Rodrigues, T. C., Leite, C. A., Lopes, F. L., & Silva, M. A. (2012). Serviços de psicologia em clínicas-escola: revisão de literatura. Boletim de Psicologia, 62(136), 37-52. Recuperado de: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0006-59432012000100005&lng=pt&tlng=pt
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, destacamos nas conclusões das autoras no que se refere às estratégias político-pedagógicas, o desafio do serviço-escola em articular as necessidades da formação acadêmica com as necessidades sociais, entre ensino e extensão. Além disso, mesmo sendo encontradas uma grande variedade de formas de atendimentos, abordagens e tipos de clientelas atendidas, as autoras indicam que há uma limitação em relação à quantidade de publicações sobre o tema, sendo um fator de dificuldade para o aperfeiçoamento de propostas, bem como o avanço na área.

O estudo de Sousa e Padovani (2015)Sousa, C. R., Padovani, R. C. (2015). Supervisão em terapias cognitivo-comportamentais: Trilhando outros caminhos além do serviço-escola. Psico-USF, 20(3), 461-470. https://doi.org/10.1590/1413-82712015200308
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apresenta uma proposta de modelo para transmissão da Terapia cognitiva comportamental (TCC) no espaço do serviço-escola e em instituições públicas de saúde, partindo da vertente da Psicologia Clínica. Os autores citam as mudanças atuais nos dispositivos que organizam a formação de psicólogos alinhados com as recentes conquistas no âmbito social do país. Diante disso, discutem a necessidade de renovação nos modelos tanto de ensino-aprendizagem como de clínica tradicional. Outra importante vertente teórica abordada é a articulação feita da TCC com a perspectiva da integralidade do cuidado, levando-se em conta a necessidade de se estruturarem novas habilidades terapêuticas para adaptar-se ao contexto da rede pública de saúde. O ensino da TCC nas universidades é generalista, por isso, não se espera que especialistas sejam formados nesse espaço, mas sim, que seja estimulado o desenvolvimento de competências e habilidades básicas e específicas ao longo do curso. Em relação ao estágio, sua estrutura por ser dentro do serviço-escola e fora dele, é considerada pelos autores um fator de ruptura ao modelo tradicional de formação, já que também proporciona ao estudante uma possível vivência numa equipe multiprofissional, o que contribui para o entendimento da perspectiva de integralidade do ser. Os supervisores desses estagiários atuam na adequação da técnica do TCC com os aspectos psicológicos do contexto social no qual o paciente se encontra, o que não feito, pode cair num tecnicismo descompromissado com a integralidade do cuidado. Os autores, a partir desses embasamentos, propõem um modelo que discute o desenvolvimento de competências e habilidade específicas da TCC. Adaptado por Kuyken, Beck e Dudley (2010, citado por Sousa e Padovani, 2015Sousa, C. R., Padovani, R. C. (2015). Supervisão em terapias cognitivo-comportamentais: Trilhando outros caminhos além do serviço-escola. Psico-USF, 20(3), 461-470. https://doi.org/10.1590/1413-82712015200308
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), o modelo de Bennet-Levy (2006, citado por Sousa e Padovani, 2015Sousa, C. R., Padovani, R. C. (2015). Supervisão em terapias cognitivo-comportamentais: Trilhando outros caminhos além do serviço-escola. Psico-USF, 20(3), 461-470. https://doi.org/10.1590/1413-82712015200308
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) possui três processos de aprendizagem, Declarativo (saber que), Procedimental (saber como) e Reflexivo . A construção do artigo segue apresentando a estrutura do estágio e algumas situações em consonância com esses três processos durante a supervisão dos estagiários. No início do estágio deve-se fortalecer o processo declarativo por meio de leituras técnicas complementares além das da graduação. Já o processo procedimental foi possibilitado pelas discussões de caso e do role-play, pois nesses momentos eram feitos relatos verbais das vivências no equipamento de saúde, assim como, formas de compreensão dos problemas e suas possíveis intervenções a partir da TCC. É válido destacar, que os autores se dedicaram a falar das dificuldades que os estagiários tiveram durante as atividades realizadas, como elas estavam de acordo com cada nível do processo de aprendizagem e também como os supervisores interviram nesses momentos. Por fim, os autores argumentam que o processo de aprendizagem, do “saber que” para o “saber como”, precisa ser construído de forma colaborativa entre estagiários e supervisores. Além disso, esses atores, possuem um compromisso com a transformação da rede saúde, a partir do momento em que se empenham em trazer novas formas de intervenções qualificadas e contextualizadas. O modelo de ensino-aprendizagem neste artigo é apontado como uma importante etapa na formação de psicólogos, por ampliar a discussão do assunto, mesmo que ainda seja necessário investir mais com pesquisas sistemáticas na área.

Três artigos referenciam sua produção na relação com a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia (Anpepp). Trata-se dos trabalhos apresentados a seguir de Fernandes et al. (2015)Fernandes, L. F. B., Miyazaki, M. C. O. S., Silvares, E. F. M. (2015). Caracterização da supervisão em um centro formador de Psicologia da Saúde. Estudos de Psicologia (Campinas), 32(3), 499-509. https://dx.doi.org/10.1590/0103-166X2015000300014
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, Gauy et al. (2015). E o de Oliveira-Monteiro, Herzberg, Oliveira e Silvares (2013).

A publicação de Oliveira-Monteiro et al. (2014), promove reflexões em relação à supervisão ética em Psicologia. Para introduzir a discussão, os autores apresentam os aspectos legais e éticos vigentes no Brasil que envolvem a supervisão de estágios. São indicados, também, os campos de interação que o estagiário possui no percurso formativo, sendo nomeados de interação direta quando envolve o desenvolvimento da sua formação profissional e interação indireta quando relacionado ao que o estagiário percebe e comunica sobre o serviço prestado à comunidade. O supervisor, diante desses campos, possui diversas funções que perpassam aspectos éticos. Tais aspectos são indicados como possivelmente problemáticos ou desafiantes quando a supervisão acadêmica é realizada em grupo com os estagiários, o que mesmo com suas contribuições no partilhar das experiências e perspectivas feitas entre eles, pode inibi-los afetando o relato do momento vivido com o cliente. Assim, seja através de uma omissão intencional dos fatos, uma mentira ou por uma exposição da situação a partir de uma percepção parcial e/ou pouco realista dos fenômenos, muitas vezes isso ocorre pelo receio de possíveis críticas a determinadas atitudes do estagiário. Como fonte para discussão, um recorte da pesquisa intitulada “O atendimento psicológico nas clínicas-escola: convergências atuais” da Anpepp foi feito em relação aos aspectos éticos na supervisão. A partir das respostas dos supervisionandos são destacadas algumas situações problemáticas, como a vergonha e insegurança do estagiário no momento do seu relato de caso, a falta de tempo para apresentar o caso, além de ações de intolerância, desrespeito, desentendimento e falta de diálogo por parte do supervisor. Os autores referem instituições internacionais que oferecem cursos de formação de supervisores/orientadores de acordo com as especificidades da realidade cultural de cada lugar. Diante disso, o estudo problematiza a falta de limites claros em relação à função dos envolvidos na supervisão clínica, porém, ao mesmo tempo, considera que uma total uniformização da tarefa de supervisionar dificilmente acontecerá ou talvez nem seja desejável, sendo a principal necessidade aprimorar a formação do supervisor, podendo ser feita com programas autorizados e processos contínuos de avaliação e revisão das legislações e códigos de ética vigentes.

Fernandes et al. (2015)Fernandes, L. F. B., Miyazaki, M. C. O. S., Silvares, E. F. M. (2015). Caracterização da supervisão em um centro formador de Psicologia da Saúde. Estudos de Psicologia (Campinas), 32(3), 499-509. https://dx.doi.org/10.1590/0103-166X2015000300014
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tiveram como objetivo descrever o perfil dos supervisores em Psicologia da Saúde num hospital-escola a partir da perspectiva do supervisor e de supervisionandos em um curso de pós-graduação3 3 Decidimos manter esse artigo no levantamento bibliográfico, por entendermos que o referido hospital-escola tem atividades também com estudantes de graduação. . Os autores destacam a relevância do estudo para a criação de um corpo de conhecimentos acerca da maneira como a formação do psicólogo está sendo efetivada no Brasil. Após destacarem o percurso da Psicologia da Saúde e suas especificidades diante da Psicologia Clínica, os autores frisam a importância de uma supervisão diferenciada para o trabalho em Psicologia na área da saúde. Exemplificam que o supervisor necessita acompanhar o aprendiz no primeiro dia de trabalho, com o intuito de apresentá-lo à equipe de profissionais de saúde e realizar um atendimento no local junto com ele para encorajá-lo a participar dos atendimentos de forma mais segura e preparada. Alguns outros exemplos, como o de treinamentos de comunicação em equipes multi/interdisciplinares e de como registrar os atendimentos e intervenções também são trazidos para embasar a questão de como o trabalho tem especificidades diante de outros tipos de supervisão. Entre os resultados encontrados na pesquisa, a quantidade média de horas relativas à supervisão é referida por estagiários como 2,6 horas, e por supervisores, 3,3 horas. Outro dado apresentado foi em relação à orientação teórica que o supervisor possui, pois caracteriza qual modelo teórico é transmitido no processo de supervisão. Os tipos de abordagens foram: 17 supervisores seguindo a abordagem cognitivo-comportamental, dois a psicanalítica, um a abordagem comportamental e um o psicodrama. Destaca-se também nos resultados, a diferença da avaliação que os supervisionandos atribuíram para os seus supervisores, em comparação com a autoavaliação feita pelos próprios supervisores do seu trabalho, sendo a destes últimos, mais positiva do que a dos primeiros. Os autores discutem a necessidade de desenvolver e consolidar centros de formação para supervisores, além de formações específicas para os de Psicologia da Saúde, diante das especificidades já apresentadas desse trabalho em comparação com a realização do mesmo em outras áreas.

No artigo de Gauy et al. (2015) a atenção é dada ao perfil demográfico e profissional dos supervisores nos cursos de graduação em Psicologia. A figura do supervisor é apresentada como essencial para a formação do psicólogo, sendo sua função a de instrumentalizar o trabalho do estagiário. Dentre os resultados encontrados destaca-se, de acordo com a relevância para o presente trabalho, o tempo de formação desses supervisores e sua relação com a função de supervisor. Foi constatado pelos autores que diante da faixa etária de maior concentração dos supervisores participantes, entre 38 a 58 anos, há uma probabilidade alta deles estarem formados a um tempo suficiente para supervisionar de acordo com os requisitos de estágio feitas pelo Conselho Federal de Psicologia. Outro dado discutido é se a experiência maior de trabalho desse supervisor está de acordo com a área supervisionada. Os autores relatam que 64% dos supervisores apresentam experiência profissional em seu campo atual de supervisão – Psicologia Clínica – com média de 10 anos de atuação em psicodiagnóstico/psicoterapia. Tal resultado é problematizado no artigo em razão da predominância da atuação em Psicologia clínica na formação, mesmo com o surgimento de novas demandas para o trabalho do psicólogo, assim como, com as reformulações na grade curricular dos cursos de graduação em Psicologia. Por fim, o trabalho aponta sua importância na elaboração de diretrizes que norteiem e qualifiquem os estágios supervisionados, dando suporte aos supervisores nos âmbitos técnico, acadêmico e pedagógico.

Discussão

A produção científica sobre a formação de psicólogas em serviços-escola de Psicologia, com a ênfase em estratégias político-pedagógicas, envolve uma diversidade tanto em autoria (32 autores em 13 artigos), quanto em revistas que acolhem os estudos (dez revistas). Tal fato sinaliza que é uma temática bem recebida nas revistas. Essas publicações estão concentradas no eixo sul-sudeste do país, o que ainda é uma tendência nas produções em Psicologia de forma geral e da ciência brasileira como um todo, que entendemos como uma marca da desigualdade de investimentos financeiros, de oportunidades educacionais e de formação acadêmica entre as regiões (Costa, Costa, Lima, Seixas, Pessanha, & Yamamoto, 2012; Yamamoto, Souza, & Yamamoto, 1999).

Os artigos reunidos no bloco Ensino da psicanálise pautam o clássico debate sobre a possibilidade (ou não) da transmissão da psicanálise na universidade. Entendemos que os debates argumentam na defesa de que mais importante que um setting terapêutico com estrutura física coerente com o enquadre psicanalítico, é indispensável a existência de uma ética que sustente a prática psicoterapêutica e garanta a transmissão (Maia, & Pinheiro, 2011; Marcos, 2011)Marcos, C. M. (2011). Reflexões sobre a clínica-escola, a psicanálise e sua transmissão. Psicologia Clínica, 23(2), 205-220. https://doi.org/10.1590/S0103-56652011000200013
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. Estudantes reconhecem a diferença entre o trabalho da supervisão e o da docência em sala de aula ( Marcos, 2012)Marcos, C. M. (2012). A supervisão em psicanálise na clínica escola: breve relato de uma pesquisa. Revista Mal Estar e Subjetividade, 12(3-4), 853-872. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1518-61482012000200015&lng=pt&tlng=pt
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. O trabalho de formação envolvido na transmissão da psicanálise pode, inclusive, lançar mão do material onírico da supervisora (Zanetti, & Guimarães, 2014) e deve estar sensível ao que se passa com o aprendiz (Sei, & Paiva, 2011).

Identificamos que a psicanálise tem encontrado mediações importantes para participar da formação de profissionais psi na universidade, ainda que, é importante demarcar, a formação de psicanalistas é feita fora das instituições de ensino superior, nas Escolas de Psicanálise. Consideramos que a preocupação expressa no processo de formação de psicólogas convida-nos a extrapolar os limites da transmissão da psicanálise e pensar na prática pedagógica propriamente dita. O tema, inclusive, tem sido objeto de importantes sistematizações de docentes/supervisores em atuação no país, tanto no que se refere à transmissão da psicanálise (Ballão, & Darriba, 2012), quando no que diz respeito aos diversos aspectos que envolvem a tarefa de supervisão em Psicologia e de formação de psicólogas (Silvares, Melo, & Löhr, 2016; Guimarães, & Silva, 2012), além dos desafios para a formação de profissionais de saúde (Ceccim, & Feurwerker, 2004).

A conservadora estrutura instituída entre docente e discente, na universidade, com concentração de poder e saber em um dos polos, reduz o aprendiz a receptor do conhecimento. Concordamos com Anastasiou (2015)Anastasiou, L. G. C. (2015). Ensinar, aprender, apreender e processos de ensinagem. In L. G. C. Anastasiou, & L. P. Alves, Leonir P. (orgs.) Processos de Ensinagem na Universidade - Pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. 10ª ed. Joinville, SC: Editora Univille, (16-44). que é necessário superar a lógica formal que caracteriza o ensino, cuja aquisição da memorização por parte do aprendiz é considerada como aprendizagem efetivada. Essa autora argumenta em defesa de uma lógica dialética no processo de ensinagem no qual docente e discente são atores ativos e a atividade reflexiva por parte do discente é condição para se aprender. Referência ainda no campo formal da educação que nos auxiliaria nessa necessária revisão da dimensão pedagógica da formação de psicólogos é disponibilizada pela obra do educador Paulo Freire. A atividade dialógica que deve orientar a relação docente-discente exige de educadores posicionamento ético-político distinto do que preconiza a lógica formal de ensino; deve ser caracterizada pela comunicação e não a extensão de conhecimentos de um polo a outro (Freire, 1997). Estudos que tematizem a dimensão pedagógica da tarefa formativa em Psicologia merecem ser realizados, na direção de avançarmos no debate em tela.

No bloco de produções sobre relato de procedimentos, o uso de recursos fílmicos na sensibilização de estudantes para a ênfase curricular processos clínicos ( Santeiro et al., 2014Santeiro, T. V., Santeiro, F. R. M., Souza, A. M. O., Juiz, A. P. M., Rossato, L. (2014). Processo grupal mediado por filmes: espaço e tempo para pensar a Psicologia. Revista da SPAGESP, 15(1), 95-111. Recuperado, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-29702014000100008&lng=pt&tlng=pt
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) parece ser uma interessante estratégia de se trabalhar pedagogicamente numa perspectiva que inclua estudantes como atores do processo e não apenas receptores. Relatos como este poderiam ocupar mais espaço nas publicações sobre formação, pois possibilitam trocas significativas de experiências entre educadores no desafio de formação de psicólogos.

Sentimos falta, por outro lado, no relato sobre o psicodrama como abordagem psicoterápica (Gonçalves, & Peres, 2012), de descrições e debates sobre o que se passa com a estudante-estagiária ao realizar os atendimentos, ainda que entendamos que este não tenha sido o objetivo do artigo. Ao concentrar sua argumentação na defesa do psicodrama como alternativa ao binarismo behaviorismo versus psicanálise, os autores se mantêm no clássico campo da Psicologia Clínica, quase como se disputassem ocupar um dos polos do binarismo. A tarefa dirigida à Psicologia na atualidade tem sido como responder às novas demandas que surgem de campos emergentes de atuação (Ferreira Neto, 2004, 2011; Yamamoto, & Oliveira, 2010). Esperamos que publicações que revisitem as clássicas abordagens em Psicologia Clínica, indagando-as como campo teórico-metodológico diante das novas demandas da sociedade, ocupem mais espaço nos periódicos e, por conseguinte, contribuam na formação de psicólogos.

O sofisticado circuito que envolve pesquisa-ensino-extensão (Maturano et al., 2014) informa-nos sobre relações institucionais que envolvem o serviço-escola em sua tarefa formativa e, por conseguinte, compartilha o uso de estratégias políticas além das técnicas na formação de psicólogos. O referido artigo diferencia-se dos demais por compartilhar macroestratégias de formação, o que avaliamos como extremamente importante como expressão do compromisso para a construção de respostas significativas às demandas de formação de psicólogos. Não raramente temos nos submetido à sobrecarga de trabalho e ao ativismo que envolve a rotina de respostas às demandas, sem apreciação adequada da rotina do trabalho, o que nos leva à sobreimplicação, fenômeno que pode comprometer a qualidade de nosso trabalho (Coimbra, & Nascimento, 2012; Monceau, 2008)Monceau, G. (2008). Implicação, sobreimplicação e implicação profissional. Fractal Revista de Psicologia, 20(1), 19-26. https://doi.org/10.1590/S1984-02922008000100007
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.

Além disso, destacamos que ao articular o serviço-escola aos pilares ensino-pesquisa-extensão, a publicação ( Marturano et al., 2014Marturano, E. M., Silvares, E. F. M., Oliveira, M. S. (2014). Serviços-escola de psicologia: seu lugar no circuito de permuta do conhecimento. Temas em Psicologia, 22(2), 457-470. https://doi.org/10.9788/TP2014.2-15
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) é sugestiva de prestígio dirigido às práticas profissionais ali realizadas. Instituições de Ensino Superior têm convivido com a desvalorização do campo da aplicação (extensão) em oposição ao campo da produção e transmissão de conhecimento (pesquisa e ensino). Tal situação expressa-se, por exemplo, na avaliação de títulos desde a seleção de docentes para carreira de magistério superior, passando pelos processos de avaliação para progressão salarial e até os editais de financiamento. À atividade profissional têm sido atribuídos pesos muito inferiores às atividades de magistério e pesquisa, na avaliação global do candidato docente.

Quanto à produção científica referente à supervisão e supervisor, diversos elementos merecem discussão. A Psicologia Clínica ainda se constitui em área prioritária de trabalho e supervisão de psicólogas (Gauy et al., 2015). Além disso, os serviços-escola convivem com o desafio de articular necessidades de formação acadêmica e demandas da população, tanto no que se refere ao ensino quanto à extensão ( Amaral et al., 2012Amaral, A.E. V., Luca, L., Rodrigues, T. C., Leite, C. A., Lopes, F. L., & Silva, M. A. (2012). Serviços de psicologia em clínicas-escola: revisão de literatura. Boletim de Psicologia, 62(136), 37-52. Recuperado de: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0006-59432012000100005&lng=pt&tlng=pt
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). Esse cenário é sugestivo do descompasso entre definições institucionais-legais previstas, por exemplo, nas Diretrizes Curriculares Nacionais (Resolução nº 5/2011; Resolução nº 8/2004) e as efetivas transformações na rotina de cursos de graduação em Psicologia na direção de incorporar mudanças em suas práticas formativas.

A recomendação de que os cursos de graduação em Psicologia devem promover uma formação para a atuação em diferentes contextos (Resolução nº 5/2011; Resolução nº 8/2004), considerando as necessidades sociais e os direitos humanos, está na pauta da Psicologia há décadas (Cury, & Ferreira Neto, 2014), mas mudanças institucionais mobilizam movimentos de avanços e recuos e, portanto, convivemos com um quadro ainda caracterizado pela concentração da área de Psicologia Clínica.

Bernardes (2012)Bernardes, J. S. (2012). A formação em Psicologia após 50 anos do Primeiro Currículo Nacional da Psicologia: alguns desafios atuais. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(num. esp.), 216-231. https://doi.org/10.1590/S1414-
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ao problematizar desafios das mudanças curriculares, questiona a indicação das Diretrizes (Resolução nº 5/2011), que em seu Art. 12 sugere que as ênfases curriculares podem ser definidas a partir dos campos de atuação já considerados na história da Psicologia. Ora, questiona o autor, tal indicação reflete a reprodução do que já existia. “As reformas curriculares [...] estão repletas de substituições de áreas de conhecimentos (ou campos de aplicação/atuação) para ênfases curriculares” (p. 221). Um esforço maior por parte de educadores e instituições de ensino parece ser necessário para construir mediações entre o preconizado e o Currículo propriamente dito. Além disso, revisão sistemática do que fora definido merece ser assumida pelas instituições de ensino superior.

Embora docentes apresentem-se favoráveis às mudanças propostas pelas DCN não os impede, por exemplo, de conviver com dúvidas e dificuldades de compreensão, dentre outros aspectos, sobre “como deveriam ser/acontecer os estágios básicos bem como a implantação dos serviços [-escola] de psicologia” (Poppe, & Batista, 2012, p. 994).

Entendemos, é importante registrar, que mudanças podem estar ocorrendo nos Cursos de Graduação em Psicologia e, não necessariamente, têm ocupado espaço em publicações científicas. Dois aspectos mencionados acima subsidiam esse raciocínio. A ausência de partilha de macroestratégias formativas que parece tendência no referido campo e a sobrecarga de trabalho que se impõe a educadores. Consideramos que a recepção por parte de revistas científicas de publicações que tematizem esforços institucionais para mudanças na formação, em muito contribuirá para dinamizar o importante debate em foco.

Outro aspecto que merece atenção no debate sobre supervisão de estágios é a necessidade de dedicarmos maior atenção ao que se passa com o estagiário. Pesquisas que encontraram significativas incongruências na avaliação de supervisores e supervisionandos para atividades que ambos participam ( Fernandes et al., 2015Fernandes, L. F. B., Miyazaki, M. C. O. S., Silvares, E. F. M. (2015). Caracterização da supervisão em um centro formador de Psicologia da Saúde. Estudos de Psicologia (Campinas), 32(3), 499-509. https://dx.doi.org/10.1590/0103-166X2015000300014
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), bem como preocupantes posturas do estagiário, como omissão e mentira no momento da supervisão (Oliveira-Marinho et al., 2014) evidenciam a complexidade da relação supervisor-estagiário e a indispensável atenção a ela no debate sobre formação de psicólogas. Entendemos que essa relação precisa escapar da lógica formal de transmissão de conhecimento, tal como reivindica a transmissão da psicanálise.

Considerações finais

Identificamos na produção científica sobre estratégias formativas em serviços-escola de Psicologia diversos desafios, em especial, considerando as demandas da sociedade e as próprias Diretrizes Curriculares (Resolução nº 5/2011; Resolução nº 8/2004).

A expressiva presença da área da Psicologia Clínica na formação dos psicólogos nos serviços-escola, com destaque para a prática da psicoterapia como a atividade mais referenciada, leva-nos a concluir que a histórica segregação entre clínica e social (Ferreira Neto, 2004; 2011) parece ainda orientar as práticas profissionais de estagiários.

É digno de nota que poucos artigos consideraram a opinião dos estudantes diante da sua própria formação. Escutá-los é levar em conta como estão vivenciando as possíveis estratégias construídas para a formação deles. Estudos que atentem para o que se passa com estagiários poderiam evitar a centralização do poder/saber nas mãos dos docentes-supervisores. Publicações que tematizem o trabalho do supervisor na relação com o estagiário também merecem ganhar espaço em revistas científicas, o que contribuirá para o debate em questão.

Não identificamos, nas produções científicas estudadas, referências à dimensão mais política das estratégias formativas, o que poderia ser comunicado, por exemplo, pela partilha de estratégias institucionais dos serviços-escola na articulação com outras instituições, bem como sobre o modo como organizam e produzem seus trabalhos nos serviços-escola. Além disso, não identificamos qualquer experiência formativa em atividade nos serviços-escola que o articule, por exemplo, aos campos que mais acolhem trabalhadores de Psicologia, na atualidade, o SUS (Spink, & Matta, 2010) e o SUAS (Macedo, Souza, Carvalho, Magalhães, Souza, & Dimenstein, 2011).

A escassez de informações sobre as estratégias políticas e a ausência de relação com outros serviços de atenção à população, não deve ser compreendida como não existência dessas situações. O que podemos supor é que tais temáticas não foram objeto de sistematização e produção científica. Com otimismo, acreditando que tais experiências existam, contudo, não as ter expostas à comunidade científica pode nos deixar mais distante da necessária revisão quanto s equivocadas separações entre clínica e social (Ferreira Neto, 2004, 2011) e entre clínica e política ( Benevides, 2005Benevides, R. (2005). A psicologia e o sistema único de saúde: quais interfaces? Psicologia & Sociedade, 17(2), 21-25. https://doi.org/10.1590/S0102-71822005000200004
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  • 1
    Utilizaremos indistintamente feminino e masculino ao longo do texto.
  • 2
    A busca pelo termo serviço-escola não nos apresentou resultados satisfatórios. Considerando que a alteração dos termos, proposição das DCN, ainda está em curso e ainda não está refletida na produção científica sobre o assunto, decidimos usar como termo de busca clínica-escola.
  • 3
    Decidimos manter esse artigo no levantamento bibliográfico, por entendermos que o referido hospital-escola tem atividades também com estudantes de graduação.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    22 Nov 2017
  • Aceito
    03 Jan 2020
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