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Psicanálise na Assistência Social em Fortaleza-CE: Um Estudo sobre as Medidas Socioeducativas

Psychoanalysis in Social Assistance in Fortaleza - Ceará: A Study about Socio-educational Measures

El Psicoanálisis en la Asistencia Social en Fortaleza-CE: Un Estudio sobre las Medidas Socioeducativas

Resumo

Este artigo pretende apresentar alguns encontros e diálogos da psicanálise com o Sistema Único de Assistência Social (Suas), amparados na escuta e na pesquisa sobre a prática profissional dos psicanalistas no acompanhamento de jovens em cumprimento de medidas socioeducativas. O Suas representa um importante campo de atuação e de contribuições tanto na assistência direta aos usuários quanto na elaboração de novas tecnologias psicossociais. Cabe destacar a presença da psicanálise como linha teórica norteadora desse debate, que se organiza em torno dos encontros entre psicanálise, assistência social e medidas socioeducativas, no contexto da realidade do adolescente em conflito com a lei na cidade de Fortaleza. Concluímos que, embora as instituições apresentadas não sejam a princípio parte do campo tradicional da psicanálise, o psicanalista pode contribuir para o trabalho com esses jovens com sua escuta singular, seu posicionamento ético e seu rigor teórico. Sua atuação pode colaborar, assim, para que o cidadão de direitos e o sujeito da psicanálise sejam acolhidos e contemplados nas políticas públicas de Assistência Social.

Palavras-chave:
Psicanálise; Suas; Adolescentes; Medidas socioeducativas; Fortaleza

Abstract

This essay seeks to present possible encounters and dialogues between psychoanalysis and the Brazilian Unified System for Social Assistance (SUAS), based on the practice of listening and on the research concerning psychoanalysts’ professional procedures when working with adolescents following socio-educative measures. The SUAS is an important field of action and contribution for psychology professionals, both in the direct assistance to the users and in the development of new psychosocial technologies. Psychoanalysis is the guiding theoretical line for this discussion, which organizes itself based on the association of psychoanalysis, the work of social assistance, and socio-educational measures, in the context of youngsters in conflict with the law in the municipality of Fortaleza, capital of Ceará. We conclude that, even though the discussed institutions are not traditionally linked to the field of psychoanalysis, psychoanalysts may contribute to the work with these adolescents with their individual attention, ethical positioning, and theoretical rigor. These professionals may, thus, be an important asset in the appropriate reception and support to the citizens and psychoanalytical subjects of Social Assistance public policies.

Keywords:
Psychoanalysis; Brazilian Unified System for Social Assistance; Adolescents; Socio-educational measures; Fortaleza

Resumen

Este artículo pretende presentar algunos encuentros y diálogos de la psicoanálisis con el “Sistema Único de Assistencia Social” (SUAS), apoyados en la escucha y la investigación sobre práctica profesional de los psicoanalistas en el acompañamiento de jóvenes en cumplimiento de medidas socioeducativas. Para la Psicología, el SUAS representa un importante campo de actuación y de contribuciones tanto en la asistencia directa a los usuarios cuanto en la elaboración de nuevas tecnologías psicosociales. Cabe destacar la presencia del psicoanálisis como línea teórica de ese debate, que se organiza en torno a los encuentros entre psicoanálisis, asistencia aocial y medidas socioeducativas, en el contexto de la realidad del adolescente en conflicto con la ley en la ciudad Fortaleza. Concluimos que, aunque las instituciones presentadas no sean previamente el campo tradicional del psicoanálisis, el psicoanalista puede contribuir para el trabajo con esos jóvenes con su escucha singular, su posicionamiento ético y su rigor teórico. Su actuación puede colaborar, así, para que el ciudadano de derechos y el sujeto del psicoanálisis sean acogidos y contemplados en las políticas públicas de Asistencia Social.

Palabras clave:
Psicoanálisis; SUAS; Adolescentes; Medidas socioeducativas; Fortaleza

Introdução

A Assistência Social, juntamente com as políticas de Saúde e Previdência Social, compõe o Sistema de Seguridade Social previsto na Constituição Federal de 1988Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. (5 out. 1988). Diário Oficial da União. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/con...
. A Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), que regulamenta seus objetivos e ações, bem como a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), orientam sua implantação em todo o território nacional, transformando o que era uma prática assistencialista e caritativa em política de Estado fundada na noção de direito e da dignidade humana (Lei n. 7.742, 1993Lei n. 7.742, de 20 de março de 1989. (21 mar. 1993). Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS). Autoriza o Poder Executivo a abrir créditos adicionais até o limite de NCz$ 21.561.393.549,00 (vinte e um bilhões, quinhentos e sessenta e um milhões, trezentos e noventa e três mil, quinhentos e quarenta e nove cruzados novos) e dá outras providências. Diário Oficial da União . http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8742.html
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEI...
; Secretaria Nacional de Assistência Social [SNAS], 2004Secretaria Nacional de Assistência Social. (26 out. 2004). Resolução CNAS n. 145, de 15 de outubro de 2004. Aprova a Política Nacional de Assistência Social. Diário Oficial da União . http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Normativas/PNAS2004.pdf
http://www.mds.gov.br/webarquivos/public...
).

A década de 1980, marcada pela abertura política e pela crescente organização da sociedade civil, assiste a uma forte corrente de engajamento e pressão em relação às políticas sociais no Brasil, ocorrendo uma articulação dos movimentos sociais, principalmente no campo da assistência social (Santana, Silva, & Silva, 2013Santana, E. P. de, Silva, J. A. dos S., & Silva, V. S. da. (2013). Histórico da política de assistência social: Uma construção lenta e desafiante, do âmbito das benesses ao campo dos direitos sociais [Trabalho apresentado]. VI Jornada Internacional de Políticas Públicas, São Luís, MA, Brasil.). Embora recente em sua estruturação, a política de assistência social apresenta uma sofisticada organização que institui níveis de complexidade em função de índices de vulnerabilidade em que se encontram famílias ou indivíduos, mais especificamente em função da qualidade e consistência das redes sociofamiliares com as quais essas pessoas podem contar em momentos de dificuldade determinados por eventuais infortúnios ou fragilidades que irrompem em algumas fases da vida.

Os serviços se organizam em dois eixos: Proteção Social Básica e Proteção Social Especial (PSE). A Proteção Social Básica se caracteriza como a principal “porta de entrada” da assistência social e tem como objetivo a prevenção de situações de risco, o desenvolvimento de potencialidades, bem como o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários dos sujeitos em situação de vulnerabilidade e em risco social no território. Desempenha papel central no território onde se situa por oferecer a principal estrutura física de determinadas localidades e por ser a primeira frente de enfrentamento às situações de vulnerabilidade - conceito referente não apenas às situações de fragilidade, mas também aos recursos pessoais e familiares de resistência a essas situações - e risco, aqui compreendido como diversas formas de privação, violências, negligências e baixa capacidade de reação. Os serviços da proteção social básica são executados no Centro de Referência em Assistência Social (Cras), que “atua com famílias e indivíduos em seu contexto comunitário, visando a orientação e o convívio sócio familiar” (SNAS, 2004Secretaria Nacional de Assistência Social. (26 out. 2004). Resolução CNAS n. 145, de 15 de outubro de 2004. Aprova a Política Nacional de Assistência Social. Diário Oficial da União . http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Normativas/PNAS2004.pdf
http://www.mds.gov.br/webarquivos/public...
, p. 35).

A PSE se divide em média e alta complexidades e objetiva o acompanhamento dos sujeitos em situação de risco por algum tipo de violência e/ou violação de direitos. Os serviços dessa proteção estão em estreita articulação com o Sistema de Garantia de Direitos (SGD), que vincula tais serviços ao sistema jurídico (que compreende o Ministério Público, o Judiciário e a Defensoria Pública) e seus respectivos conselhos, incluindo, além dos conselhos diretamente ligados ao sistema de justiça, os conselhos tutelares e de direito (como os Conselhos Municipais de Direito da Criança e do Adolescente). Na PSE de média complexidade, os serviços são ofertados nos Centros de Atenção Especializados em Assistência Social (Creas). Estes centros são constituídos por equipes multidisciplinares que assistem casos envolvendo exploração sexual e violência, abandono, maus-tratos psíquicos e/ou físicos, trabalho infantil e toda e qualquer outra forma de violação de direitos. Os técnicos do Creas também atuam no acompanhamento a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa.

Os Creas são unidades estatais que têm como foco de atenção as famílias e indivíduos que se encontram em situações de risco pessoal e social e, aliados a outras políticas, atuam no enfrentamento à violência. Também cabe aos Creas acompanhar os adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto, conforme orientações do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase, 2006), em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Lei n. 8.069, 1990Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. (16 jul. 1990). Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
).

No entanto, é necessário que seja demarcada uma diferença. Nos Cras, os sujeitos, a princípio, estão à procura de algum benefício e garantia de direitos. Já os Creas, que neste trabalho representam as medidas em meio aberto e nas unidades de semiliberdade, atendem adolescentes que ali estão por determinação judicial. Essa realidade convoca o psicanalista a ser inventivo, criativo e perspicaz para que consiga ouvir aquilo que o sujeito nem sempre poderá dizer pelo fato de que, nesse contexto, tudo o que ele disser poderá ser usado contra ele.

Na PSE de alta complexidade são ofertados serviços em instituições de acolhimento que possibilitem a garantia de proteção integral para os indivíduos em situação de ameaça e/ou violação de direitos que, por algum motivo, precisem ser retirados da convivência familiar e comunitária.

Considera-se que a assistência social, enquanto política pública de proteção social destinada a promover o acesso a bens e serviços, direciona-se, sobretudo, à grande parcela da população que se encontra em vulnerabilidade social pela dificuldade de acesso a alimentação, moradia, saneamento básico, saúde, educação, trabalho, renda, esporte e lazer. Assim, constitui-se como estratégia de proteção social diante da violação dos direitos básicos de cidadania. Para a Psicologia, o Suas representa um importante campo de atuação e de contribuições tanto na assistência direta aos usuários quanto na elaboração de novas tecnologias psicossociais.

Nessa perspectiva, este estudo pretende apresentar alguns encontros e diálogos da psicanálise com o Sistema Único de Assistência Social (Suas) amparados na prática profissional dos psicólogos no acompanhamento de jovens em cumprimento de medidas socioeducativas.

O Suas e as possibilidades de inserção do psicanalista

De acordo com o Conselho Federal de Psicologia (CFP, CFESS, 2007Conselho Federal de Psicologia & Conselho Federal de Serviço Social. (2007). Parâmetros para atuação de assistentes sociais e psicólogos(as) na Política de Assistência Social. http://www.cfess.org.br/arquivos/CartilhaFinalCFESSCFPset2007.pdf
http://www.cfess.org.br/arquivos/Cartilh...
), existem diversas possibilidades de atuação dos profissionais de psicologia nas Políticas Públicas de Assistência Social, pois por meio da intersetorialidade se criam espaços para intervenção no trabalho de proteção social. Em resposta a isso, o Sistema de Conselhos de Psicologia (federal e regionais) criou, em 2006, o Centro de Referências Técnicas em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop), para promover a qualificação da atuação profissional de psicólogas(os) que atuam nas diversas políticas públicas.

O posicionamento do CFP legitima e consolida a atuação do(a) psicólogo(a) nas políticas públicas e se alinha a discussões como a do presente texto, que discute o trabalho fruto da inserção, observação, investigação e pesquisa de psicólogas (pesquisadoras e servidora pública) na assistência social. As autoras, alocadas tanto na Proteção Social Básica (Cras), quanto na Especial (média e alta complexidade), relatam aqui fragmentos de atendimentos realizados nos equipamentos citados, bem como em Unidade de Semiliberdade.

A população da cidade de Fortaleza, quinta maior do país, segundo dados do IBGE (2017)Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2017). Síntese de indicadores sociais: Uma análise das condições de vida da população brasileira., é de quase nove milhões de pessoas. Dessas, mais de 60% vivem em situação de notória precariedade em todos os sentidos, porcentagem que supera a média nacional de 38,1% (Diário do Nordeste, 2017Diário do Nordeste. (20 dez. 2017). 63,1% da população de Fortaleza vive nas piores condições de vida, diz IBGE. https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/metro/63-1-da-populacao-de-fortaleza-vive-nas-piores-condicoes-de-vida-diz-ibge-1.1867965
https://diariodonordeste.verdesmares.com...
). Esses dados denunciam o grau de vulnerabilidade social em que vive a maioria das pessoas nesta capital nordestina. Segundo dados da Prefeitura de Fortaleza, o município conta com 27 Cras e 15 entidades conveniadas para a realização do Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (Paif). Já para PSE, a Prefeitura disponibiliza seis Creas.

Nos documentos e diretrizes sobre a atuação do psicólogo na política de assistência social, não são encontrados orientações e encaminhamentos no quesito “oferta de atendimentos” àqueles que buscam alguma ajuda nestes equipamentos. Mesmo que em tais orientações não se fale em atendimentos, o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) descreve a atuação técnica na assistência como capaz de proporcionar escuta qualificada individual e em grupo (CNAS, 2009Conselho Nacional de Assistência Social (25 nov. 2009). Resolução n. 109, de 11 de novembro de 2009. Aprova a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. Diário Oficial da União.). Essa oportunidade, portanto, possibilita a inserção da psicologia e do psicólogo e, por conseguinte, da psicanálise nesse campo, em que pese o cargo ser de psicólogo e não de psicanalista.

Diante desse quadro, norteamo-nos pela seguinte questão: o que pode a psicanálise na assistência social? Como sustentar o espaço para a singularidade, em um domínio marcado pela lógica do “para todos”, da universalização e da homogeneização? Como garantir que o indivíduo seja considerado como sujeito?

Buscando responder a essa questão, Cabral (2018Cabral, C. R. B. (2018). O que pode o psicanalista na Assistência Social? Considerações a partir da escuta de adolescentes [Dissertação de mestrado, Universidade de Fortaleza]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.) em dissertação intitulada O que pode o psicanalista na assistência social? Considerações a partir da escuta de adolescentes, desenvolveu estudos acerca de como o psicanalista pode pensar suas possibilidades no campo social. A referida pesquisa escolheu o Cras como local de trabalho, reconhecido por proporcionar, na maioria das vezes, o primeiro contato entre a população e os órgãos públicos, na medida em que parte da procura dos usuários pelo equipamento se dá por demanda espontânea ou busca ativa realizada pelos profissionais, não havendo nenhuma determinação judicial que obrigue os adolescentes a frequentarem o serviço.

Durante a pesquisa, observou-se que os adolescentes que, a priori, deveriam frequentar o Cras se estivessem ali cadastrados, insistiam em retornar ao serviço mesmo com todas as ações direcionadas a eles suspensas. Portanto, durante a pesquisa/intervenção, os adolescentes procuravam o Cras mesmo que nenhuma atividade lhes fosse ofertada. O Cras pareceu significar um ponto de referência, fazendo-nos pensar sobre o que os vinculava à instituição.

A partir da escuta dos adolescentes, pode-se constatar que o movimento de transferência em relação ao equipamento, aos funcionários e à pesquisadora mantinha os adolescentes no Cras. Percebeu-se que, como a equipe de profissionais do Cras não tinha uma escuta orientada pela ética da psicanálise, não reconhecia essa transferência, tampouco fazia uso desse importante operador analítico como instrumento de trabalho. No entanto, mesmo que a equipe de profissionais, de nível superior ou não, não estivesse advertida sobre a transferência (inconsciente), ela era inevitável e, mais do que isso, estava implicada diretamente na permanência dos adolescentes no Cras.

Considerando ainda a dinâmica transferencial, foi possível localizar um vínculo de transferência entre os adolescentes e a pesquisadora, cuja posição, norteada pela ética da psicanálise, possibilitou a localização dos diferentes vínculos e transferências entre adolescentes, a instituição e profissionais e, ainda, a utilização desse fenômeno como ferramenta de intervenção.

Apesar de a atuação do Cras não ser a priori do campo da psicanálise, defendemos que o psicanalista pode contribuir com sua escuta singular, seu posicionamento ético e rigor teórico. Sua função no Cras é a de escutar o sujeito do inconsciente, nomeado também como sujeito do desejo. Não se trata apenas do sujeito de direitos das Políticas Públicas Sociais, mas ele também está incluso.

A pesquisa ofereceu como resultados a percepção da transferência, mas também a compreensão das dificuldades de acolhida da psicanálise no campo da assistência social, pois ainda que o atendimento individual seja garantido por lei, como a política da assistência social não diferencia o trabalho do assistente social e do psicólogo, este encontra grande dificuldade para trabalhar com o caso a caso, com o um a um, visto que é normalmente priorizado o trabalho coletivo dentro das ações, projetos e programas.

Podemos, ainda, mencionar o embaraço da crença no trabalho do psicanalista associado à ideia do divã. Caberá ao psicanalista, portanto, realizar atendimentos fora do setting convencional da psicanálise e promover interlocução com a equipe do Cras a fim de esclarecer sobre a ética que norteia o trabalho da psicanálise. Na instituição, em momentos oportunos, o profissional deverá apresentar aos demais membros o que é e o que faz a psicanálise, uma vez que ela trabalha com o conceito de sujeito do desejo, um norteamento ético que possibilita, então, o assumir-se como sujeito e protagonista da sua história por conhecer e sustentar seus desejos e escolhas. Busca-se garantir, assim, que o trabalho se dirija ao sujeito do desejo em um campo no qual prevalece o sujeito de direitos.

Desse modo, atender às necessidades dos usuários sem deixá-los em uma categoria estigmatizada pela pobreza pode ser uma das contribuições da psicanálise. O técnico advertido, alicerçado em sua orientação ética, utiliza esse vínculo para que ocorra a transferência. Segundo Rena, a partir do pensamento de Freud, “a transferência deve ser reconhecida como tal e por ela devemos operar. Desconsiderá-la pode significar problemas futuros” (Rena, 2009Rena, A. C. C. B. (2009). Do vínculo à transferência: Uma contribuição da psicanálise à prática de acompanhamento de famílias. Pesquisas e Práticas Psicossociais, 4(1), 84-95. http://www.seer.ufsj.edu.br/index.php/revista_ppp/article/view/511/475
http://www.seer.ufsj.edu.br/index.php/re...
, p. 92). Pode-se pensar que o trabalho do analista seria, então, produzir o deslocamento da necessidade para que esta não se esgote em si mesma e possa se transformar em demanda de um sujeito.

Assim, na assistência social voltada para a infância e a adolescência, a psicanálise pode se colocar em posição de escuta do sujeito com sua demanda (L. C. Teixeira, 2014Teixeira, L. C. (2014). O sujeito adolescente e a intervenção psicanalítica: Notas a partir de um caso clínico. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 17(3 Suppl.) , 797-804. https://doi.org/10.1590/1415-4714.2014v17n3-Suppl.p797.19
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), que ultrapassa a pessoa assegurada por direitos (Castro, 2014Castro, X. (2014). El sujeto del psicoanálisis: más allá de la dicotomía individuo-sociedad. Revista Affectio Societatis, 11(21), 103-121.). Assim, a clínica institucional (Lebrun, 2009Lebrun, J.-P. (2009). Clínica da instituição: O que a Psicanálise contribuiu para a vida coletiva. CMC Editora.) considera o sujeito, sua palavra e sua história, bem como a história da instituição. Por esse viés teórico, a ação da psicanálise é escutar o sofrimento humano, detendo-se ao caso a caso, pois “permanentemente aplicada ao particular, ela lida com exceções. É dessa forma que o terapeuta implicado com o seu ato se aplica em fazer existir o inconsciente” (Cottet, 2005Cottet, S. (2005). Efeitos terapêuticos na clínica contemporânea. In A. B. Freire, A. L. L. Holck, A. Bastos, S. Cottet & T. C. dos Santos (Org.), Efeitos terapêuticos na psicanálise aplicada (pp. 11-40). Contra Capa., p. 35).

Para Moreira, Oliveira e Costa (2018Moreira, J. de O., Oliveira, N., & Costa, E. (2018). A. Psicanálise e pesquisa científica: O pesquisador na posição de analisante. Revista Tempo Psicanalítico, 50(2), 119-142. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-48382018000200007&lng=pt
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), a escuta psicanalítica é possível também em contextos que ultrapassam a circunscrição do setting terapêutico, produzindo efeitos de ressignificação e deslocamentos em cenários submetidos a enquadramentos institucionais como o dos atendimentos realizados nos equipamentos da assistência social. Para essas autoras, o sujeito do inconsciente não é cativo de espaços físicos ou simbólicos e se expressa por meio da enunciação, comprometendo-se exclusivamente com a transferência.

Freud denominava como “psicanálise aplicada” o uso da psicanálise fora do contexto da clínica, demarcando uma separação entre a teoria psicanalítica e sua aplicação clínica. No universo pós-freudiano, o termo é utilizado para nomear a aplicação da psicanálise aos fenômenos sociais, políticos e culturais, em contraposição à psicanálise pura, destinada à teoria psicanalítica e sua aplicação na prática clínica. . . . Ainda acerca da aplicação da psicanálise aos fenômenos sociais, Enriquez (2005) assegura essa articulação ao afirmar que a psicanálise consiste em uma ciência dos “processos inconscientes que se desenrolam não apenas no indivíduo isolado, mas também nos grupos, nas instituições, nas produções do espírito (Moreira et al., 2018Moreira, J. de O., Oliveira, N., & Costa, E. (2018). A. Psicanálise e pesquisa científica: O pesquisador na posição de analisante. Revista Tempo Psicanalítico, 50(2), 119-142. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-48382018000200007&lng=pt
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, p. 7).

A psicanálise em extensão não corresponde ao aniquilamento da metodologia técnica desenvolvida por essas instituições, tampouco a uma “improvisação” do consultório psicanalítico. A psicanálise aplicada refere-se a uma escuta clínica articulada a intervenções que pressupõem um cálculo ampliado, abrangente, mas que, necessariamente, sustenta o saber do sujeito. Assim, a posição do analista na cena institucional é sempre surpreendente.

O técnico, orientado pela psicanálise, não deverá perder de vista a norma e os acordos sociais, mas seu foco é o sujeito - entendido aqui como aquele que se colocará a trabalho a partir da interpelação legal. Poderá, inclusive, partir da norma infringida e problematizar a situação de violação, mas sempre implicando os sujeitos. . . . Elas (os sujeitos) supõem saber qual será o discurso do técnico que as receberá e têm também uma fala ensaiada como resposta. Assim como criaram dispositivos para que as conversas se restrinjam à situação de violação. Portanto, é preciso que de fato exista uma cena atípica para que elas se sintam encorajadas a falar sobre si. Resumindo, devemos surpreendê-las (Rena, 2009Rena, A. C. C. B. (2009). Do vínculo à transferência: Uma contribuição da psicanálise à prática de acompanhamento de famílias. Pesquisas e Práticas Psicossociais, 4(1), 84-95. http://www.seer.ufsj.edu.br/index.php/revista_ppp/article/view/511/475
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, p. 7).

Compreendemos, portanto, que tanto a psicologia quanto a psicanálise constituem-se como campos epistemológicos de extrema importância para os operadores das políticas públicas em seu cotidiano de trabalho e na difícil tarefa de propor transformações consistentes nos contextos de vulnerabilidade. No próximo tópico demonstraremos, no entanto, que essa atuação não se dá sem conflitos ou enfrentamentos.

Contextualizando o ECA e o Sinase

No que tange ao campo das medidas socioeducativas, sabe-se que, antes da década de 1960, o órgão que legislava a situação de crianças e adolescentes em situação de rua, pobreza e exclusão, bem como daqueles que cometiam atos delituosos, era o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), cuja atuação iniciou-se em 1942. Assim, previa diferentes formas de atendimento para adolescentes infratores e para crianças carentes e abandonadas, sendo os primeiros levados aos reformatórios e às casas de correção, enquanto as crianças eram encaminhadas a patronatos agrícolas e escolas de aprendizagem de ofícios urbanos. Em decorrência das denúncias de maus-tratos, torturas e mortes, o SAM passou a ser conhecido como “SAM - sem amor ao menor’, ‘escola de crime’, ‘fábrica de criminosos’, ‘sucursal do inferno’” (Rizzini, 2011Rizzini, I. (2011). Crianças e menores: do pátrio poder ao pátrio dever: um histórico da legislação para a infância no Brasil. In I. Rizzini & F. Pilotti (Orgs.), A arte de governar crianças: A história das políticas sociais, da legislação e da assistência à infância no Brasil (3a ed., pp. 97-149). Cortez., p. 17).

Com a instauração do golpe militar de 1964, o SAM foi extinto e em seu lugar foram criadas a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (Funabem) e a Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem), com unidades alocadas em todos os estados da federação. Essas iniciativas estatais foram embasadas na Doutrina da Segurança Nacional e afirmavam que a eficácia do programa de assistência à infância e adolescência em situação de abandono ou miséria pautava-se na militarização da disciplina dos internatos e no reforço da segurança externa. Com essa metodologia de atendimento, sustentada pelo antigo Código de Menores (a Lei n. 6.697 de 1979), crianças e adolescentes, com distintas histórias, conviviam e tinham o mesmo tratamento, fossem elas abandonadas por suas famílias ou envolvidas na prática de atos infracionais.

A respeito desse método de atuação, existiam grupos com diferentes posicionamentos. O primeiro grupo, chamado menorista, defendia que o Estado deveria oferecer para crianças e adolescentes apenas medidas de proteção e, portanto, não punitivas. Havia um segundo grupo que entendia a medida socioeducativa, aplicada aos adolescentes infratores, como puramente pedagógica, os neomenoristas. Por fim, outras pessoas que não polarizavam tão radicalmente as intervenções legais com os adolescentes e as crianças, identificavam uma quota de hibridismo entre o sancionatório e o pedagógico. Essa perspectiva está, inclusive, presente no ECA (Lei n. 8.069, 1990Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. (16 jul. 1990). Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
), que sustenta um discurso pedagógico das medidas socioeducativas; contudo, na prática, verifica-se frequentemente uma precarização do caráter pedagógico e, por vezes, uma violação do caráter garantista, que situação característica do modelo penal (Costa, 2006Costa, A. C. G. da. (2006). As bases éticas da ação socioeducativa: Referências normativas e princípios norteadores. Secretaria Especial dos Direitos Humanos.; Santiago, 2014Santiago, M. C. G. (2014). Avaliação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo no Centro de Semiliberdade Mártir Francisca, em Fortaleza-CE: Alguma luz no fim do túnel? [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Ceará]. Repositório Institucional UFC. ).

Esse histórico permitiu que novas políticas públicas fossem criadas para que houvesse um modo distinto de direcionar as condutas referentes. Nessa perspectiva, foram criadas, de um lado, medidas socioeducativas aplicáveis em razão do cometimento de ato infracional e, de outro, medidas protetivas aplicáveis em casos de violação de direitos das crianças e dos adolescentes.

Diante dessa realidade, a Constituição Federal de 1988Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. (5 out. 1988). Diário Oficial da União. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
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propiciou reflexões a partir das quais foi efetivada a Doutrina da Proteção Integral de crianças e adolescentes no ordenamento jurídico brasileiro, trazendo, então, novas perspectivas ao tratamento dispensado a esses sujeitos. Essa nova abordagem orienta-se no sentido do amparo, da assistência e da inclusão social de crianças e adolescentes, que passam a ser considerados sujeitos de direitos em condição peculiar de “pessoa em desenvolvimento”. Dessa forma, os anos 1990 tornaram-se um marco na mudança de paradigma, que evolui da “doutrina da situação irregular” para a “doutrina da proteção integral”, incidindo diretamente nas políticas públicas destinadas a crianças e adolescentes. Constata-se um movimento que se organiza nacionalmente envolvendo diversos campos profissionais que, aliados a diversos movimentos sociais, militavam na defesa dos direitos da criança e do adolescente, especialmente na formulação de uma lei de execução das medidas socioeducativas (M. de L. T. Teixeira, 2006Teixeira, M. de L. T. (2006). Evitar desperdícios de vida. In Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente, Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República & Associação Brasileira de Magistrados e Promotores da Infância e da Juventude (Orgs.), Justiça, adolescente e ato infracional: Socioeducação e responsabilização. Ilanud.). Se antes os adolescentes eram tomados como incapazes submetidos às intervenções do Estado, agora eles terão que responder por seu ato, dentro das condições que lhes são ofertadas.

A inserção da psicologia na assistência social é um registro de que, para o resgate e a reconstrução de histórias de vida, a subjetividade é importante (S. M. Teixeira, 2010Teixeira, S. M. (2010). Trabalho interdisciplinar no CRAS: Um novo enfoque e trato à pobreza? Textos & Contextos, 9(2), 286-297. http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fass/article/viewFile/7032/5781
http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/...
). Ademais, mesmo que a assistência social seja um campo de atuação do psicólogo, é preciso considerar uma visão interdisciplinar, no sentido de marcar o trabalho do psicólogo como saber da psique (e patologias associadas) e o do assistente social como da ordem da dimensão socioeconômica (Andrade & Romagnoli, 2010Andrade, L. F. de, & Romagnoli, R. C. (2010). O psicólogo no CRAS: uma cartografia dos territórios subjetivos. Psicologia: Ciência e Profissão, 30(3), 604-619. https://doi.org/10.1590/S1414-98932010000300012
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
).

Em 2006, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH) e o Conanda apresentaram o Sinase (SEDH, 2006Secretaria Especial dos Direitos Humanos. (2006). Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo - SINASE. Conanda.), que, a partir de parâmetros mais objetivos, visava sistematizar o atendimento socioeducativo.

O SINASE é o conjunto ordenado de princípios, regras e critérios, de caráter jurídico, político, pedagógico, financeiro e administrativo, que envolve desde o processo de apuração de ato infracional até a execução da medida socioeducativa. Este sistema nacional inclui os sistemas estaduais, distrital e municipais, bem como todas as políticas, planos e programas específicos de atenção a esse público (SEDH, 2006Secretaria Especial dos Direitos Humanos. (2006). Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo - SINASE. Conanda., p. 22).

No âmbito das medidas socioeducativas, a legislação evidencia como motes o favorecimento do acesso às oportunidades de superação da condição de exclusão e a formação de valores positivos para participação na vida social. A ação socioeducativa que planeja ser executada junto ao adolescente autor de ato infracional visa a sua preparação para a convivência social, traduzida objetivamente no oferecimento de escolarização formal, educação profissional, atividades artísticas, culturais, práticas esportivas, assistência religiosa, abordagens sociais, psicológicas e demais atividades dirigidas ao jovem, cujo propósito é desenvolver e aprimorar os potenciais dos educandos (Costa, 2006Costa, A. C. G. da. (2006). As bases éticas da ação socioeducativa: Referências normativas e princípios norteadores. Secretaria Especial dos Direitos Humanos.).

Nesse mesmo sentido, numerosos trabalhos, tais como os de Costa (2006Costa, A. C. G. da. (2006). As bases éticas da ação socioeducativa: Referências normativas e princípios norteadores. Secretaria Especial dos Direitos Humanos.), Rosário (2010Rosário, A. B. do. (2010). Grupo de adolescentes em privação de liberdade: Circulação da palavra como possibilidade de ressignificação do ato infracional. Revista da Spagesp, 11(1), 66-76. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-29702010000100008&lng=pt
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), Guará (2011Guará, I. M. F. (2011). O estado do conhecimento sobre a intervenção socioeducativo em programas para adolescentes envolvidos em delitos [Relatório final de projeto de pesquisa docente para mestrado profissional]. Uniban.), Moreira, Souza, Rocha, Guerra e Peixoto (2014Moreira, J. de O., Souza, J. M. P. de, Rocha, P. M. da, Guerra, A. M. C., & Peixoto, M. L. V. (2014). Os desafios da aplicação das medidas socioeducativa no Brasil: Uma reflexão sobre diferentes relatos de experiências. Psychologia Latina, 5(1), 1-10.), Santiago (2014Santiago, M. C. G. (2014). Avaliação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo no Centro de Semiliberdade Mártir Francisca, em Fortaleza-CE: Alguma luz no fim do túnel? [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Ceará]. Repositório Institucional UFC. ) e Souza (2015Souza, J. M. P. de. (2015). Responsabilização do adolescente no cumprimento da medida socioeducativa: Enlaces da Psicanálise com o Direito [Tese de doutorado, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais].), reforçam que o cumprimento das medidas socioeducativas deve observar aspectos da individualidade do adolescente, levando à confrontação dele com sua história e à ressignificação de sua conduta. Esse processo demanda efetivo apoio técnico-profissional para o desenvolvimento de sua identidade e vinculações sociais que ofereçam suporte contínuo.

A assistência social atua na perspectiva da vulnerabilidade social e das situações de risco que abrange todo tipo de violação de direitos, provocando outros setores da sociedade no sentido de se debruçarem sobre essa realidade com o objetivo de apontar possíveis saídas para ela. No tocante às medidas socioeducativas de meio fechado (semiliberdade e internação), a atuação da assistência social é significativamente limitada. Há poucos profissionais da psicologia nas Unidades e, quando há, o número de adolescentes nas instituições é muito superior ao que esse serviço é capaz de atender. É comum que não se disponha de tempo para atendimentos solicitados pelos adolescentes nem para o acompanhamento preconizado pelo Sinase e pelo ECA. Além disso, a maioria dos profissionais são terceirizados, recebem baixos salários e são privados de benefícios. Trabalham com medo de rebeliões e motins, podendo ser constatada, inclusive, a presença de facções nas Unidades e presídios de Fortaleza e toda a delicadeza que essa situação exige. Daí deriva a grande dificuldade de se trabalhar na socioeducação.

No acompanhamento às medidas de meio aberto, alguns aspectos do meio fechado estão presentes, como equipes incompletas, Creas sem infraestrutura, contratação temporária dos profissionais. Encontra-se, ainda, a fragilização na rede socioeducativa que deveria assistir o adolescente em conflito com a lei como retaguarda ao trabalho desenvolvido nos equipamentos do Suas (Fórum Permanente das ONGs de Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes, 2017Fórum Permanente das ONGs de Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes. (2017). 4º Relatório de monitoramento do sistema socioeducativo do Ceará. http://www.cedecaceara.org.br/wp-content/uploads/2013/12/4-Monitoramento-SSE-final.pdf
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).

Vale salientar que o adolescente em cumprimento de medida socioeducativa deveria ser assistido por toda uma rede composta por diversas instituições, dos âmbitos da educação, saúde, justiça, trabalho etc., que ofertassem serviços de acordo com a singularidade de cada um e de sua família, como é preconizado pelo Sinase (SEDH, 2006Secretaria Especial dos Direitos Humanos. (2006). Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo - SINASE. Conanda.).

As adversidades mencionadas evidenciam uma defasagem no serviço de medidas socioeducativas, impossibilitando que as equipes técnicas promovam um serviço atrativo, de qualidade, conforme a demanda de cada adolescente, e que possam efetivar, de modo singular, os objetivos do Sinase (SEDH, 2006Secretaria Especial dos Direitos Humanos. (2006). Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo - SINASE. Conanda.). Percebe-se, então, a fragilização da rede de atendimento ao adolescente em medidas socioeducativas e de alguns eixos propostos pelo sistema.

Psicanálise, Suas e medidas socioeducativas em ação

Podemos iniciar esta seção indagando: O que a psicanálise faz no contexto do Suas? Como considerar os diferentes públicos e demandas, bem como a imposição judicial?

Freud (1996a)Freud, S. (1996a). Linhas de progresso na terapia psicanalítica (Edição standard brasileira das obras completas de Sigmund Freud, Vol. 17). Imago. (Originalmente publicado em 1919[1918]) advertiu que o tratamento psicanalítico se estenderia a todas as classes sociais e que, no futuro, o Estado proporcionaria o acesso a essa forma de tratamento similarmente ao trato dado a outras doenças, pois “a vida pesada que os espera [os mais pobres] não lhes oferece atrativo algum e a doença confere-lhes um direito a mais na assistência social” (p. 312). Essa afirmação de Freud (2016Freud, S. (2016). Prólogo à “Juventude Abandonada” de August Aichhorn. In P. C. de Souza (Trad.), O Eu e o ID, “Autobiografia” e outros textos (1923-1925) (Obras Completas, Vol. 16, pp. 347-350). Companhia das Letras. (Originalmente publicado em 1925)) está em consonância com o trabalho de August Aichhorn a respeito da possibilidade de escuta e atendimentos a crianças ditas abandonadas e sujeitos envolvidos em algum ato criminoso, infracional ou delituoso. Certamente, essa profecia freudiana se efetivou há bastante tempo, comprovam artigos, teses, dissertações e livros publicados, especialmente aqueles datados a partir de 1987. Exemplo disso é o estudo pioneiro de Isabel Marin realizado na Febem, anterior ao ECA, que visou pensar as concepções de institucionalização e as contribuições da psicanálise nesse contexto (Marin, 1999Marin, I. da S. K. (1999). FEBEM, família e identidade: o lugar do Outro (2a ed.). Editora Escuta.).

No contexto das instituições, aqui tomadas como o campo da assistência social, concorda-se com Paula e Paiva (2015Paula, F. O. Q. de, & Paiva, J. de. (2015). Possibilidades de atuação do psicanalista no Centro de Referência de Assistência Social. Vínculo, 12(1), 41-50. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1806-24902015000100007&lng=pt&tlng=pt
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, p. 45), que argumentam que a prática psicanalítica feita na instituição é aquela que se dá em um espaço previamente marcado pelo coletivo, o que, contudo, não impede que a “prática da psicanálise continue dando lugar para o que não incluí no campo social e do direito possa comparecer no circuito da fala e no campo da linguagem”.

Mas o que pode ser feito a partir da escuta qualificada, orientada pela psicanálise? Não há dúvidas de que o vínculo transferencial estabelecido entre os sujeitos e as pesquisadoras possibilitou o trabalho de pesquisa. Freud (1996b)Freud, S. (1996b). Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise (Edição standard brasileira das obras completas de Sigmund Freud, Vol. 12). Imago. (Originalmente publicado em 1912) já havia dito que a transferência é ao mesmo tempo a mola mestra e um empecilho ao tratamento. É preciso manejo adequado e preciso, haja vista a presença significativa de atos e repetições cometidos pelos sujeitos atendidos. Comumente o sujeito direciona ao trabalhador da assistência e às pesquisadoras o mesmo modo de funcionamento subjetivo que adota nas demais relações. Coube às pesquisadoras demarcar suas posições destinando outro lugar ao que lhes era destinado, ou seja, devolvendo aos sujeitos tais conteúdos, a fim de que pudessem se apropriar de sua demanda, sua queixa e seu ato, de sua posição de sujeito do inconsciente.

Inicialmente é necessário que o sujeito acredite que o profissional sabe algo sobre ele. Caso isso não aconteça, não lhe dirigirá, não demandará. A construção teórica de Lacan (1964/2008)Lacan, J. (2008). O Seminário: Livro 11: Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Jorge Zahar. (Originalmente publicado em 1964) acerca do “suposto saber” aprofunda o conceito da transferência. Na busca de saber sobre si a partir do outro, o sujeito encontrará o desejo do analista que subverterá essa lógica e possibilitará que este sujeito extraia algum saber sobre suas questões. Desse modo, o analista toma “as demandas do sujeito como pontos a trabalhar, desdobrar, localizar sua causa e revelar sua verdade” (Guerra, Otoni, & Penna, 2015Guerra, A. M. C., Otoni, M. S., & Penna, P. D. M. (2015). O (de) novo sempre vem: sobre a transferência e a repetição nos espaços de fala de jovens sob medida judicial. In A. M. C. Guerra, M. S. Otoni & P. D. M. Penna (Orgs.), Direito e Psicanálise II: O adolescente em foco (pp. 113-130). Editora CRV., p. 119).

Essas considerações nos convocam à apresentação de outras duas pesquisas também realizadas em instituições cearenses no Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicanálise, Cultura e Subjetividade (LAEpCUS) na pós-graduação em Psicologia da Universidade de Fortaleza (Unifor), acerca da escuta de psicanalistas em tratamento a adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas na capital cearense.

Na pesquisa de doutorado realizada em uma Unidade Socioeducativa de Semiliberdade, intitulada Escuta e narrativas clínicas em uma instituição de cumprimento de medida socioeducativa: adolescência, tempo e responsabilização subjetiva, Rodrigues (2017Rodrigues, S. W. D. M. (2017). Escuta e narrativas clínicas em uma instituição de cumprimento de medida socioeducativa: Adolescência, tempo e responsabilização subjetiva [Tese de doutorado, Universidade de Fortaleza]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.) buscou colher narrativas clínicas referentes ao ato, ao tempo e à adolescência de jovens em cumprimento de medida de semiliberdade. Nesse espaço de semiprivação, a atuação da pesquisadora, orientada pela psicanálise, se deu na observação do cotidiano da instituição e do trabalho dos técnicos, bem como no acompanhamento de rotinas como refeições, reuniões, atividades escolares, oficinas de pinturas e de serigrafia.

Foi importante circular pelos espaços e entre os adolescentes para que uma diferença fosse demarcada: a psicanalista não fazia parte da instituição; estava ali para escutá-los. No período de 18 meses de visitas semanais foi possível atender a adolescentes por meio da construção dos casos clínico-institucionais, em que a angústia, o sofrimento, a divisão e a posição subjetiva dos adolescentes consistiram bases das intervenções. Acreditamos, portanto, que a escuta clínica orientada pela psicanálise é o ponto crucial que assegura e demarca a contribuição da psicanálise no campo da assistência social, especialmente nesse contexto. Pela via da escuta do desejo e do inconsciente do sujeito, o analista passa a ser, para este sujeito, um depositário de suas questões singulares que, muitas vezes, não são endereçadas aos técnicos da instituição.

A pesquisadora presenciou o desfecho do cumprimento da medida de vários dos adolescentes atendidos. Alguns retomaram a vida construindo alternativas diferentes para o futuro, como o caso do André1 1 Nome fictício para resguardar o anonimato do sujeito. (17 anos), que cumpriu a medida de semiliberdade por cinco meses em decorrência de um assalto realizado em um ônibus. O adolescente, no tempo de cumprimento da medida, retomou os estudos, participou de oficinas profissionalizantes, conseguiu reatar, ainda que precariamente, os vínculos com a família e ingressou no coral de uma igreja. Em sua avaliação, o tempo que passou ali permitiu a ele várias aprendizagens: “Hoje vejo a vida com outros olhos, aprendi a respeitar as pessoas e minha família, consigo olhar pras lojas e não ter aquela vontade doida de comprar as coisas, sabe. Aprendi na dor, viu, tia?”. Inicialmente, André recebera do juiz a determinação de cumprir a medida por seis meses, mas, diante de seu comportamento, a equipe optou pelo pedido de progressão da medida que foi acatada judicialmente.

Há, entretanto, outro lado. Muitos outros, diferentemente do que aconteceu com André, escolheram retomar a criminalidade, seu posto na facção criminosa, e vislumbravam até mesmo a possibilidade de continuar matando, como relata um desses adolescentes: “Tudo o que mais gostava era de fazer roleta russa e ver o caba se urinando, adorava ver as pessoas se borrando de medo. É assim mesmo, faço porque eu gosto e ainda quero continuar fazendo” (Antônio2 2 Nome fictício para resguardar o anonimato do sujeito. , 15 anos). Sua presença na semiliberdade já era fruto de regressão de uma medida de internação cumprida durante nove meses por roubos, furtos e homicídio. Aos finais de semana, quando ia para a casa de sua família, sempre se envolvia em assaltos para pagar a droga que voltara a usar. Para ele, era impossível ter outra vida: “Pago o que tiver que pagar pra viver na destruição, na desgraça e no crime. Se tiver que morrer cedo, tá de boa também”.

Lacan (1950/1998Lacan, J. (1998). A Ciência e a Verdade. In Escritos. Jorge Zahar. (Originalmente publicado em 1950), p. 873) afirma que “por nossa posição de sujeito, sempre somos responsáveis”. Essa máxima lacaniana orienta o analista no sentido de jamais dar conselhos, buscar a remissão dos sintomas, induzir conduta pertinente aos padrões sociais etc. Nessa perspectiva, o que deve ser feito é contribuir para que o sujeito tenha consciência de seus atos, demandas e escolhas, assuma-se como responsável por seu mal-estar e busque sua verdade e a causa que orienta seu desejo, jamais determinando sua conduta. Caberá ao analista escutar e intervir no discurso dos sujeitos, relativizando, questionando e favorecendo a percepção do sujeito sobre si mesmo. Objetivamente, é preciso fazer com que o sujeito consiga expressar-se sobre o que deseja para sua vida, sabendo que terá que lidar com consequências que lhe recairão a partir de seus atos. Ou seja, é imprescindível que o sujeito seja advertido para as consequências de suas escolhas, o que é bem diferente de domesticação; o analista, então, conduz o tratamento, jamais o sujeito.

Nas instituições, frequentemente se ouve que a realização de atividades ditas burocráticas consome grande parte do tempo dos profissionais. Por outro lado, quase nunca se realizam procedimentos considerados de grande importância, como a organização de dados cadastrais dos adolescentes e a elaboração do Plano Individual de Atendimento (PIA), dispositivo previsto em lei (Lei n. 12.594, 2012Lei n. 12.594, de 18 de janeiro de 2012. (19 jan. 2012). Institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional; e altera as Leis nºs 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente); 7.560, de 19 de dezembro de 1986, 7.998, de 11 de janeiro de 1990, 5.537, de 21 de novembro de 1968, 8.315, de 23 de dezembro de 1991, 8.706, de 14 de setembro de 1993, os Decretos-Leis nºs 4.048, de 22 de janeiro de 1942, 8.621, de 10 de janeiro de 1946, e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Diário Oficial da União .) que permite a formalização da medida socioeducativa. O PIA deve ser feito com participação do adolescente a fim de resguardar sua singularidade, elaborando-se, assim, projetos de vida concernentes àquilo que o adolescente deseja para seu futuro. Por esse trabalho não ser realizado de forma sistemática, muito pouco se sabe sobre os adolescentes, que geralmente não falam, não participam; apenas cumprem uma ordem de um juiz, contando os dias e os minutos para esse tempo findar - isso quando não descumprem a medida.

Observamos, portanto, que há um fosso que impede que o adolescente se aproprie do cumprimento da medida como ator e protagonista. Quando se nega ao adolescente esse direito, é subtraída dele a oportunidade de falar sobre si e do que gosta, de aprender coisas novas e de construir outras formas de existência. Resumidamente, a elaboração do PIA é uma ferramenta importantíssima que pode ser uma das portas de entrada do psicanalista em instituições totais, especialmente na internação e semiliberdade. Pode-se dizer, ainda, que, além de haver obrigação técnica de seu preenchimento, o PIA é um direito do adolescente. Como argumentam Moreira, Albuquerque, Rocha, Rocha e Vasconcelos (2015Moreira, J. de O., Albuquerque, B. S. de, Rocha, B. F., Rocha, P. M. da, & Vasconcelos, M. A. M. (2015). Plano Individual de Atendimento (PIA) na perspectiva dos técnicos da semiliberdade. Serviço Social & Sociedade, (122), 341-356. https://doi.org/10.1590/0101-6628.026
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, p. 253), “parece-nos fundamental sublinhar que o PIA pode ser uma possibilidade de dar voz ao adolescente, de oferecer um lugar de sujeito de sua história”.

As duas pesquisas citadas (Cabral, 2018Cabral, C. R. B. (2018). O que pode o psicanalista na Assistência Social? Considerações a partir da escuta de adolescentes [Dissertação de mestrado, Universidade de Fortaleza]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.; Rodrigues, 2017Rodrigues, S. W. D. M. (2017). Escuta e narrativas clínicas em uma instituição de cumprimento de medida socioeducativa: Adolescência, tempo e responsabilização subjetiva [Tese de doutorado, Universidade de Fortaleza]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.) articulam a psicanálise com o Suas, refletindo sobre as possíveis contribuições das ferramentas clínicas da psicanálise na condução dos casos. Na pesquisa de mestrado intitulada Referência subjetiva significativa e adolescente em cumprimento de medida socioeducativa: uma escuta clínica, Sena (2017Sena, R. V. (2017). Referência subjetiva significativa e adolescente em cumprimento de medida socioeducativa: Uma escuta clínica [Dissertação de mestrado, Universidade de Fortaleza]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.) buscou analisar os efeitos da presença ou ausência de referências subjetivas significativas para os adolescentes na execução da medida socioeducativa de liberdade assistida. A pesquisadora, na época da pesquisa, técnica da equipe do Serviço de Proteção Social a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto, realizou o acompanhamento de adolescentes que cumpriam medidas de liberdade assistida (LA), através de atendimentos ao adolescente e aos familiares, incluindo a elaboração do PIA e atividades de grupo, durante o período de seis meses.

No decorrer da realização da pesquisa, por meio da escuta aos adolescentes em cumprimento da LA, Sena (2017Sena, R. V. (2017). Referência subjetiva significativa e adolescente em cumprimento de medida socioeducativa: Uma escuta clínica [Dissertação de mestrado, Universidade de Fortaleza]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.) identificou as figuras de referências subjetivas significativas dos adolescentes, ou seja, pessoas às quais os adolescentes estão vinculados e que são reconhecidas como apoio emocional e psíquico pelos próprios jovens. Esse apoio seria um “agarramento a uma âncora, representado num objeto protetor e provedor” (Zimerman, 2008Zimerman, D. (2008). Vocabulário Contemporâneo de Psicanálise. Artmed., p. 38).

No caso do adolescente Ulisses3 3 Nome fictício para resguardar o anonimato do sujeito. , a figura de referência identificada foi seu pai. Por meio do acompanhamento realizado, verificou-se como Ulisses pôde ressignificar o modo como lidava com a figura paterna. A imagem que o adolescente tinha do pai, construída e fortalecida por sua mãe, era de um pai carinhoso, presente e acolhedor. O pai de Ulisses era um grande traficante do território onde a família residia e faleceu quando o adolescente tinha dois anos de idade. Após esse fato, o tráfico passou a ser comandado por seu tio. Ulisses já traficara anteriormente. A partir da escuta, o adolescente pôde, possivelmente, vislumbrar um caminho diferente da prática de ato infracional, rompendo aparentemente com a herança familiar e social de violência, relatando sua vontade de ingressar no exército: “Na polícia, tem os bons e os ruins. Tem os policiais criminosos. No exército, não. A pessoa honra a farda”. Expressou, ainda, sua esperança de um dia ser um trabalhador.

Com isso, mediante o reconhecimento de uma referência subjetiva significativa para o adolescente em cumprimento de medida socioeducativa e a elaboração da imagem idealizada dessa figura, por meio de uma escuta da singularidade que posicione o adolescente como sujeito de sua história, acredita-se na possibilidade de o adolescente fortificar esses vínculos subjetivos e, por meio disso, construir novas formas de enlaçamento social, considerando o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários como um dos objetivos da medida socioeducativa. Ressalta-se a importância da análise dos vínculos subjetivos de cada adolescente para que esse fortalecimento possa ocorrer de forma única e singular.

Para concluir: psicanálise e a aposta no sujeito nas políticas de assistência social

O campo da assistência social em Fortaleza, articulado às medidas socioeducativas, é bastante amplo, assim como heterogêneo é o público que o procura. Para atuar nesse campo, ou seja, para acompanhar os jovens em cumprimento de medidas socioeducativas na assistência social, é necessário que se tenha a clareza de que não se deve adotar atitudes paternalistas que contribuam para a permanência dos sujeitos na condição de vítima. É necessário reconhecer que o sujeito sofre e, então, acolhê-lo no sentido de contribuir para que ele trabalhe em direção a uma elaboração e tomada de nova posição que esteja em consonância com seu desejo. Deve-se lembrar, entretanto, como foi alertado por Freud (1996b)Freud, S. (1996b). Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise (Edição standard brasileira das obras completas de Sigmund Freud, Vol. 12). Imago. (Originalmente publicado em 1912), que o psicanalista jamais poderá transformar alguém de acordo com seus ideais ou decidindo por eles.

As generalizações presentes na lógica das políticas públicas apagam as diferenças e colocam os sujeitos num grupo de iguais. Nesse contexto, para operar segundo a ética da psicanálise é fundamental o um a um, isto é, tratar cada adolescente, mesmo que emaranhado pelas questões culturais às quais deve responder, como sujeito de desejo, e seu ato infracional, como pensado a partir da aposta em sua implicação subjetiva.

Um grande obstáculo diz respeito à dificuldade enfrentada pelos profissionais na realização de algumas atividades, como os grupos e as visitas domiciliares, devido ao controle e à rivalidade das facções nos territórios. Tais desafios fazem com que alguns adolescentes rivais não possam permanecer no mesmo espaço e algumas visitas não sejam realizadas. Quanto às facções criminosas no Ceará, ressalta-se que “1/3 dos capturados suspeitos de ataques criminosos no Ceará são adolescentes . . . O cenário é grave e expõe a fragilidade na proteção na proteção a crianças e adolescentes, principalmente das periferias, em se envolverem com o crime” (Tribuna do Ceará, 2019Tribuna do Ceará. (17 jan. 2019). Adolescentes são ameaçados de morte por facções. https://tribunadoceara.com.br/noticias/segurancapublica/adolescentes-sao-ameacados-de-morte-por-faccoes-para-fazer-ataques-na-onda-de-terror/
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). As facções criminosas, no Ceará, têm dominado e transformado as formas de violência, incidindo sobre a vida dos adolescentes de periferia e em situação de vulnerabilidade social, para quem as políticas públicas não desempenham o papel de proteção e segurança (Paiva, 2019Paiva, L. F. S. (2019). “Aqui não tem gangue, tem facção”: As transformações sociais do crime em Fortaleza, Brasil. Caderno CRH, 32(85), 165-184. https://doi.org/10.9771/ccrh.v32i85.26375
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). Interessante a discussão acerca do aspecto gregário das facções criminosas a partir da psicologia das massas de Freud, especialmente quanto ao recrutamento de jovens (Shimizu, 2011Shimizu, B. (2011). Solidariedade e gregarismo nas facções criminosas: Um estudo criminológico à luz da psicologia das massas [Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP. http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-31072012-092234/pt-br.php
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).

Outro entrave está relacionado à efetivação da política socioeducativa e da articulação de sua rede, cuja falha dificulta, frequentemente, a execução das propostas contidas no Sinase e a concretização dos almejos singulares de cada adolescente, ocorrendo, assim, muitas vezes, uma massificação do atendimento. Isso evidencia a defasagem dos serviços que serviriam para acompanhar os adolescentes cumpridores de medidas socioeducativas, mesmo com as férteis mudanças implementadas com a criação da Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo do Governo do Estado do Ceará (Seas), em 2016, em relação à capacitação de socioeducadores e à reorganização das instituições, equipamentos e dispositivos.

Entende-se que, via transferência, o psicanalista pode escutar o sofrimento psíquico dos sujeitos que utilizam os serviços do Cras, do Creas e das Unidades de Semiliberdade, reconhecendo que o que irá orientá-lo é a ética psicanalítica, e não o setting de uma clínica tradicional. Nesse contexto, o psicanalista deverá sustentar o desejo do sujeito em meio às diversas dificuldades que surgem nesses campos, como a falta de infraestrutura, as situações de extrema vulnerabilidade dos territórios e a presença das facções criminosas e sua lógica perversa. Por essa razão, os três trabalhos de pesquisa discutidos neste estudo buscaram corroborar as proposições da psicanálise que reconhecem na transferência um importante dispositivo que opera no sentido de levar o sujeito a se envolver com aspectos subjetivos e implicações de suas escolhas.

As pesquisas Escuta e narrativas clínicas em uma instituição de cumprimento de medida socioeducativa: adolescência, tempo e responsabilização subjetiva (Rodrigues, 2017Rodrigues, S. W. D. M. (2017). Escuta e narrativas clínicas em uma instituição de cumprimento de medida socioeducativa: Adolescência, tempo e responsabilização subjetiva [Tese de doutorado, Universidade de Fortaleza]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.), O que pode o psicanalista na assistência social? Considerações a partir da escuta de adolescentes (Cabral, 2018Cabral, C. R. B. (2018). O que pode o psicanalista na Assistência Social? Considerações a partir da escuta de adolescentes [Dissertação de mestrado, Universidade de Fortaleza]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.) e Referência subjetiva significativa e adolescente em cumprimento de medida socioeducativa: uma escuta clínica (Sena, 2017Sena, R. V. (2017). Referência subjetiva significativa e adolescente em cumprimento de medida socioeducativa: Uma escuta clínica [Dissertação de mestrado, Universidade de Fortaleza]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.), ratificam a importância da construção de dispositivos clínico-institucionais, a partir da psicanálise, que possam nortear intervenções que tenham a escuta do singular como base do trabalho no campo das políticas públicas.

Dessa maneira, “cada vez más el psicoanálisis construye y aporta elementos epistemológicos, conceptuales, metodológicos y éticos para pensar lo que ocurre a nivel social, para reflexionar y actuar sobre los síntomas sociales” (Rodríguez & Camacho, 2018Rodríguez, A., & Camacho, M. A. M. (2018). Psicoanálisis e institución. Sobre la aplicación del psicoanálisis en dispositivos institucionales. Revista Affectio Societatis , 15(8), 196-227. https://doi.org/10.17533/udea.affs.v15n28a09
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, p. 197). Conclui-se que, embora as instituições apresentadas não sejam por excelência o campo tradicional da psicanálise, o psicanalista pode contribuir, com sua escuta singular, seu posicionamento ético e seu rigor teórico, para que o cidadão de direitos e o sujeito da psicanálise sejam acolhidos e contemplados nas políticas públicas de assistência social.

Referências

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  • 1
    Nome fictício para resguardar o anonimato do sujeito.
  • 2
    Nome fictício para resguardar o anonimato do sujeito.
  • 3
    Nome fictício para resguardar o anonimato do sujeito.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    02 Dez 2019
  • Aceito
    18 Nov 2020
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