Acessibilidade / Reportar erro

As Subjetividades Periféricas e os Impasses para a Descolonização da Clínica Psicológica

Peripheral Subjectivities and the challenges for Decolonizing Psychological Clinic

Las Subjetividades Periféricas y los Obstáculos a la Descolonización de la Clínica Psicológica

Resumo

Pode a clínica psicológica escutar as subjetividades periféricas? A partir dessa problematização, o presente estudo teórico se propõe a pensar a relação entre clínicas psicológicas e subjetividades periféricas, aquelas vidas que estão afastadas dos diversos centros: políticos, sociais, econômicos, étnico-raciais, de gênero e sexualidades etc. Marcadas por relações de exclusão, opressões e precarizações, as subjetividades periféricas são vistas como produtos de processos de colonização que se atualizam em estratégias mais sofisticadas, investindo além do corpo biológico e alcançando os processos de subjetivação em suas múltiplas faces. Ao mesmo tempo, também são vistas como sujeitas, cujos processos de dessubjetivação dessa produção de território existencial terrificante expressam linhas de resistência crítica e inventiva que contornam um espaço fora do centro não como lugar de sujeição, mas de politização do corpo e afirmação da vida. O estudo aponta para a irrupção da fixidez teórico-metodológica e aposta na invenção de uma clínica que pensa a partir de onde os pés pisam, e da experimentação dos contextos e das vidas que se propõe cuidar, produzindo uma dupla tarefa de descolonização: da psicologia clínica ainda carregada de discursos e práticas colonizantes e das subjetividades que são produtoras e produtos de processos de opressão e exclusão.

Palavras-chave:
Clínica; Colonização; Subjetividades Periféricas; Descolonização

Abstract

Can psychological clinic listen to peripheral subjectivities? From this problematic, this theoretical study reflects on the relationship between psychological clinics and peripheral subjectivities-lives that are removed from the various centers: political, social, economic, racial-ethnic, gender and sexualities, etc. Marked by exclusion, oppression, and precariousness, peripheral subjectivities are seen as products of colonization processes that are reiterated by more sophisticated strategies, going beyond the biological body and reaching the subjectivation processes in its multiple facets. Simultaneously, they are seen as subjects, whose desubjectivation processes of this terrifying existential territory production express critical and inventive resistances that outline a peri-space not as a place of subjection, but of politicization of the body and affirmation of life. The study argues in favor of dismantling theoretical-methodological fixity and inventing a clinic rooted on experimentation of the contexts and lives it proposes to care for, engendering a double decolonization: of clinical psychology still laden with colonizing discourses and practices and of subjectivities that produce and are products of oppression and exclusion.

Keywords:
Clinic; Colonization; Peripheral Subjectivities; Decolonization

Resumen

¿Puede la clínica psicológica escuchar las subjetividades periféricas? Desde esta problematización, este estudio se propone pensar la relación entre clínicas psicológicas y subjetividades periféricas, aquellas vidas que están apartadas de todos los centros: políticos, sociales, económicos, étnico-raciales, de género y sexualidades, etc. Marcadas por relaciones de exclusión, opresiones, precarizaciones, estas subjetividades periféricas son producto de los procesos de colonización que se actualizan en estrategias más sofisticadas que, más allá del cuerpo biológico, invisten en los procesos de subjetivación y sus múltiplos rostros. Al mismo tiempo, son agentes cuyos procesos de subjetivación de esta producción de territorio existencial petrificante exprimen líneas de resistencia crítica e inventiva que contornan el margen del centro no como espacio de sujeción, sino como espacio de politización del cuerpo y afirmación de la vida. El estudio realizado apunta a la necesidad de ruptura con los aportes teórico-metodológicos rígidos y apuesta en la invención de una clínica que piensa desde su fundamentación, y de la experimentación de los contextos y vidas que buscan cuidar, lo que produce una doble tarea de descolonización: de la psicología clínica aún marcada por las prácticas de colonialidad y de las subjetividades que son productoras y producto de los procesos de opresión y exclusión.

Palabras clave:
Clínica; Colonización; Subjetividades periféricas; Descolonización

Antes de Cristo e depois de Cristo?

Ao mesmo tempo em que saudamos nossa ancestralidade, pedimos licença aos povos das diásporas negra e indígena para que possamos iniciar esta introdução, falando da contribuição de outros povos à Psicologia e às psicologias. Por falta de conhecimento das culturas de nossos antepassados, herança de epistemicídios e da colonialidade epistemológica produzida pelo Ocidente, fomos levados(as) a repetir que os gregos, na antiguidade, eram mais evoluídos que outros povos. Isso se deve não só à difusão da cultura grega em torno da filosofia, da psicologia, da economia, da política, da justiça e da religião, mas também à invenção da democracia e das cidades-estados (polis) no período arcaico (Neves, 2022Neves, D. (2022). Grécia antiga. Brasil Escola. https://brasilescola.uol.com.br/historiag/grecia-antiga.htm
https://brasilescola.uol.com.br/historia...
), apesar da exclusão de crianças, mulheres e pessoas escravizadas por dívidas de guerras, e das invasões e formação de colônias gregas.

A partir do século XV, com o começo da institucionalização do Estado racial (Foucault, 2010Foucault, M., (2010). Aula de 17 de março de 1976. In M. Foucault, Em defesa da sociedade (2a ed., pp. 201-222). WMF Martins Fontes.), inicia-se, dentro e fora das fronteiras do continente europeu, uma produção de subjetividade marcada pela individuação crística (Glissant, 2021Glissant, E. (2021). Poética da relação. Bazar do Tempo.), cujos processos de subjetivação nada têm a ver com as narrativas sobre a compaixão e a humanidade de Cristo. Pelo contrário, sua universalização representou um corte determinante, haja vista que essa identidade-raiz, e tal como a concebe Glissant (2009)Glissant, E. (2009). Introdução a uma poética da diversidade (2a ed.). UFJF., não veio ao encontro de outras raízes culturais, veio apagá-las e fixá-las em um território terrificante tratando de matar identidades rizomáticas que não representavam “para si uma terra como território, a partir de onde se projeta para novos territórios, mas como um local em que ‘se dá com’ em vez de ‘com-pre(e)nder’” (Glissant, 2021Glissant, E. (2021). Poética da relação. Bazar do Tempo. p. 174). Tal colonização afetará grosseira, violenta e abruptamente as subjetividades negras e indígenas, que foram despossuídas de seus modos de existência, enquanto seus territórios foram transformados em colônias europeias na África e nas Américas. Os processos advindos dessa produção colonial-capitalística (Rolnik, 2018Rolnik, S. (2018). Esferas da insurreição: Notas para uma vida não cafetinada. n-1 edições.) nos atravessam de tal forma que nos acostumamos a reproduzir uma narrativa histórica a partir de um regime de verdades imposto pelos analisadores “antes de Cristo (a.C.)” e “depois de Cristo (d.C.)” e pelo ideal da modernidade.

Não obstante, não deixamos de afirmar que a origem da psicologia científica tal qual nos fora ensinada nas universidades é grega e que as primeiras tentativas de sistematização de uma Psicologia estão relacionadas a sua interface com a Filosofia e com a Religião (Bock, Furtado, & Teixeira, 2001Bock, A. B. M., Furtado, O., & Teixeira, M. L. T. (2001). Psicologias: Uma introdução ao estudo de psicologia (13a. ed.). Saraiva.). Entre os séculos XVII e XVIII, a psicologia ocidental herdou da filosofia a função de cuidar da alma ou da mente. Ao alinhar-se a uma perspectiva filosófica positivista, no século XIX, a chamada psicologia moderna irá afirmar-se, inicialmente, como uma disciplina da norma e, logo, como ciência do controle, capaz de acessar a verdade da natureza humana, ora por meio de experimentos baseados em hipóteses e relações quantificáveis, ora por meio de diálogos semelhantes à confissão e à proliferação de discursos sobre as contradições do humano consigo mesmo e sobre os conflitos entre normal e psicopatológico, anormal e adaptado ou organizado (Foucault, 2002Foucault, M. (2002). Ditos e escritos Vol. 1 - Problematização do sujeito: Psicologia, psiquiatria e psicanálise. Forense Universitária.). Porém, o surgimento da psicanálise e as reflexões de Freud (Foucault, 2002Foucault, M. (2002). Ditos e escritos Vol. 1 - Problematização do sujeito: Psicologia, psiquiatria e psicanálise. Forense Universitária.) sobre o inconsciente, entre o final do século XIX e início do século XX, contribuíram para um retorno da psicologia à filosofia e para sua aproximação à literatura e às artes. Essa interface acrescenta à Psicologia, enquanto ciência e profissão, a problemática do corpo e da subjetividade, reintroduzindo a questão da vida e da finitude, a análise dos modos de existência, a questão do sujeito e das relações “com seu meio, o grupo ao qual ele pertence, a sociedade na qual está envolvido, a cultura na qual ele e seus ancestrais não deixaram de pensar” (Foucault, 2002Foucault, M. (2002). Ditos e escritos Vol. 1 - Problematização do sujeito: Psicologia, psiquiatria e psicanálise. Forense Universitária., p. 223).

Colonialismo e a construção de psicologias da colonização

No início do século XX, no Brasil, já existiam técnicas de seleção profissional, avaliação e exames de admissão escolar, laboratórios de psicologia experimental, psicológicos, pedagógicos e psicopedagógicos, mas ainda eram desprovidos da regulamentação da profissão de psicóloga(o), que só ocorreu com a promulgação da Lei n° 4.119, de 1962 (Bock et al., 2001Bock, A. B. M., Furtado, O., & Teixeira, M. L. T. (2001). Psicologias: Uma introdução ao estudo de psicologia (13a. ed.). Saraiva.; Centofanti, 1982Centofanti, R. (1982). Radecki e a psicologia no Brasil. Psicologia: Ciência e Profissão , 3(1), 2-48. https://doi.org/10.1590/S1414-98931982000100001
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
; Rosa, 2018Rosa, H. L. R. S. (2018). Existe uma psicologia brasileira? Uma reflexão historiográfica sobre o estabelecimento da Psicologia no Brasil. Mnemosine, 14(2), 2-24. https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/mnemosine/article/view/41680
https://www.e-publicacoes.uerj.br/index....
). Enquanto no Brasil, entre os anos 1960 e 1970, a ciência e a profissão se afirmavam como uma psicologia voltada, inicialmente, para a elite, nos Estados Unidos surgia com o “trabalho de psicólogos negros como Wade Nobles e Na’im Akbar a Black Psychology como sendo a construção de teorias e práticas em psicologia clínica tendo como referência as subjetividades negras e a ancestralidade africana” (Veiga, 2021Veiga, L. M. (2021). Clínica do impossível: Linhas de fuga e de cura. Telha., p. 84).

Não obstante, antes de a psicologia se tornar disciplina da norma e antes de vir a se constituir como ciência e profissão, no Brasil, já havia se instituído a psicologia da colonização do outro, o outro diferente do ideal de homem europeu, portanto, destituído de humanidade, inteligência. Essa psicologia chegou ao território pindorâmico1 1 Antônio Bispo dos Santos (2015), o Nego Bispo, utiliza a expressão pindorâmicos a partir do tupi-guarani para se referir aos territórios da região denominada pela colonização de América do Sul. no século XVI, por meio de invasores, sequestradores e colonizadores portugueses, espanhóis, franceses e holandeses. Pode-se dizer que se tratava não da psicologia como ciência, e sim de uma forma cultural (Foucault, 2002Foucault, M. (2002). Ditos e escritos Vol. 1 - Problematização do sujeito: Psicologia, psiquiatria e psicanálise. Forense Universitária.); forma de escravização das subjetividades indígenas e africanas, sequestradas para que fossem submetidas a explorações, etnocídios e genocídios durante a expropriação das riquezas, dos saques e da criação dos primeiros latifúndios.

O esquecimento dessa psicologia da colonização, parte da pré-história da Psicologia como ciência e profissão, se configura como um erro histórico. Esse erro, ainda hoje, dificulta o reconhecimento das contradições internas, das divergências e das disputas ideológicas e políticas em torno da ciência, como também dificulta a construção de um projeto ético-político para a profissão que possa dar suporte à competência técnica e ao compromisso da(o) profissional nas decisões para além da ação como cidadã(o), sendo “coparticipante de um projeto ético-político que se articule com projetos societários mais amplos. E, nesse caso, evidentemente, estamos nos referindo a projetos societários que apontem a transformação estrutural da sociedade capitalista - e não a sua manutenção” (Yamamoto, 2012Yamamoto, O. H. (2012). 50 anos de profissão: Responsabilidade social ou projeto ético-político? Psicologia: Ciência e Profissão , 32(esp.), 6-17. https://doi.org/10.1590/S1414-98932012000500002
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
, p. 15).

Para tanto, não se pode negligenciar a urgência ético-política permanente e a necessária problematização de uma produção de subjetividade que se inscreveu, ao longo de mais de cinco séculos, no inconsciente colonial-capitalístico (Rolnik, 2018Rolnik, S. (2018). Esferas da insurreição: Notas para uma vida não cafetinada. n-1 edições.), afetando não só as subjetividade periféricas, ao buscar a todo custo torná-las servis, mas também as subjetividades cêntricas, para que elas continuem se considerando mais humanas que os outros, e possam reproduzir a narrativa de mais evoluídas intelectual e culturalmente. Tal processo tinha como fator subjacente uma narrativa das pessoas negras e indígenas como ameaçadoras da integridade física, emocional e da propriedade privada, justificando o ódio e a violência, afinal a criação do inimigo se constitui como subterfúgio para a guerra (Kilomba, 2019Kilomba, G. (2019). Memórias da plantação: Episódios de racismo cotidiano. Cobogó.; Mbembe, 2018Mbembe, A. (2018). Crítica da razão negra. n-1 edições.).

Trata-se de uma herança do processo de colonização e do racismo epistêmico em todas as fases de estruturação do capitalismo, que se caracteriza pela reprodução social e institucional de valores e signos da cultura europeia e da modernidade para que a filósofa Susana de Castro (2020Castro, S. (2020). Condescendência: Estratégia pater-colonial de poder. In H. B. Holanda (Org.), Pensamento feminista hoje: Perspectivas decoloniais (pp. 141-152). Bazar do Tempo.) diz que “o sociólogo peruano Aníbal Quijano criou a expressão ‘colonialidade do poder’” (pp. 143-144). Ela também afirma que a feminista María Lugones “amplia a noção de colonialidade do poder para incorporar a questão da interseccionalidade entre raça e gênero” (p. 147) e complementa: “descolonizar nosso pensamento significa justamente abandonar as categorias de análise dicotômicas típicas de um modelo de pensamento eurocêntrico, tais como ‘civilizado/não civilizado’, ‘natural/racional’, ‘homem/mulher’, ‘hetero/homo’, ‘superior/inferior’” (p. 149).

Nessa perspectiva de problematização da descolonização da Psicologia, encontramos convergência, em uma entrevista com a psicóloga Ana Bock (2010Bock, A. B. M. (2010). A psicologia como profissão: Entrevista com Ana Bock. Psicologia: Ciência e Profissão, 30(esp), 246-271. https://doi.org/10.1590/S1414-98932010000500013
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
) sobre os 50 anos da ciência e profissão, celebrados em 2012, em que afirmava: “Não passa pela cabeça - ainda - da maioria dos psicólogos, que nossa psicologia é uma psicologia branca, masculina, europeia ou americana” (p. 252). Nessa entrevista, a autora se pergunta: Onde está o sujeito da psicologia? Ele é indígena? Negro? Mulher periférica? “Será que posso usar os meus recursos teóricos que foram criados na Europa branca para entender o dinamismo psíquico do índio [sic]? Servem?” (p. 252).

Meireles, Feldmann, Cantares, Nogueira e Guzzo (2019Meireles, J., Feldmann, M., Cantares, T. S., Nogueira, S. G., & Guzzo, R. S. L. (2019). Psicólogas brancas e relações étnico-raciais: Em busca de formação crítica sobre a branquitude. Pesquisas e Práticas Psicossociais, 14(3), e3181. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ppp/v14n3/09.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ppp/v14n3/...
) citam um documento do Conselho Federal de Psicologia (CFP) referente a “uma pesquisa realizada com 1.331 psicólogas, em que uma das questões se referiu à raça, conforme os critérios do IBGE. Os resultados não surpreendem ao revelar que 67% das psicólogas se autodeclararam brancas, 25% pardas, e apenas 3% pretas, 3% amarelas e 1% indígenas” (Meireles et al., 2019Meireles, J., Feldmann, M., Cantares, T. S., Nogueira, S. G., & Guzzo, R. S. L. (2019). Psicólogas brancas e relações étnico-raciais: Em busca de formação crítica sobre a branquitude. Pesquisas e Práticas Psicossociais, 14(3), e3181. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ppp/v14n3/09.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ppp/v14n3/...
, p. 3).

Apesar do avanço das políticas públicas de acesso à universidade e mesmo com os processos de interiorização da psicologia e dos cursos de formação de psicólogas(os) entre 2003 e 2015, e mesmo a pesquisa do CFP (Lhullier, 2013Lhullier, L. A. (Org.). (2013). Quem é a psicóloga brasileira? Mulher, psicologia e trabalho. Conselho Federal de Psicologia.) não incluindo mulheres trans e travestis, os dados expressam os processos de exclusão das subjetividades periféricas em relação à ciência e à profissão.

O presente estudo não é sobre a história da Psicologia no Brasil, tampouco sobre a história das psicologias preta e indígena que ainda estão para ser reconhecidas pela ciência e profissão, nos cursos de formação e também nos diversos setores de atuação da(o) psicóloga(o). Trata-se de um ensaio sobre clínica e subjetividades periféricas, oriundo de uma dissertação vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Delta do Parnaíba (PPGPsi/UFDPar).

A partir do questionamento da pensadora Spivak (2010Spivak, G. C. (2010). Pode o subalterno falar? Editora da UFMG.), que dá título ao seu livro: Pode o subalterno falar?, propomos outro questionamento: Pode a clínica escutar as subjetividades periféricas?

Partimos dessa problematização acerca do modo como se produz essa escuta com as subjetividades periféricas, sobretudo no que diz respeito à discussão das clínicas da colonialidade do pensamento psicológico por meio da reprodução/repetição de lentes epistemológicas eurocêntricas importadas para o Brasil na condição de universais, desconsiderando especificidades geográficas e históricas, étnico-raciais, de gênero e sexualidades, classe, entre outras.

Aqui, não iremos fazer a problematização das psicologias, tampouco uma revisão sistemática das adjetivações da clínica. Adiantamos que não se trata de ampliar a escuta surda (Baptista, 1999Baptista, L. A. (1999). A cidade dos sábios: Reflexões sobre a dinâmica social nas grandes cidades. Summus.), deslocando uma abordagem psicológica de um espaço para outro por meio da reprodução das mesmas técnicas e avaliações psicológicas. Tampouco se trata de, simplesmente, adjetivar a clínica, meramente porque se relatam experiências interprofissionais no âmbito do “com-pre(e)nder” e de uma “escuta compartilhada” apenas entre profissionais, no máximo tomando o outro como colaborador.

Baptista (1999Baptista, L. A. (1999). A cidade dos sábios: Reflexões sobre a dinâmica social nas grandes cidades. Summus., 2000Baptista, L. A. (2000). A fábrica de interiores: A formação psi em questão. Eduff., 2009Baptista, L. A. (2009). O veludo, o vidro e o plástico: Desigualdade e diversidade na metrópole. Eduff.) nos relata experiências a partir de experimentações cartográficas e faz análises (macro e micropolítica) que nos fazem ver como a clínica que devém do racismo institucional e do colonialismo das ciências psicológicas produz uma escuta surda das subjetividades periféricas (sujeitos atendidos durante estágios de estudantes de psicologia, pessoas com sofrimento psíquico e em situação de rua, travestis, migrantes estrangeiros…). O autor aponta para a necessidade de dessubjetivação dos enquadres e das técnicas psi e para a importância da produção de processos de subjetivação singulares conectados à sensibilidade e à vida.

Subjetividades periféricas

Do grego antigo περιφέρεια (peri + ferein), periférico será utilizado aqui como referência ao que está afastado do centro, dos diversos centros: topológicos, epistêmicos, políticos, econômicos, sociais, étnico-raciais, de gênero e sexualidade. No que se refere à topografia, atualmente o caráter “afastamento do centro” em termos dos estudos das urbanidades não tem sido suficiente para a explicação das periferias, pois há muitos locais que estão afastados do centro geográfico e não são considerados periferias, como o caso do massivo movimento de criação de condomínios distantes do centro como uma espécie de criação de outros centros. Por outro lado, nas ruas dos grandes centros há uma periferia constituída por malocas2 2 Modo como as pessoas em situação de rua se identificam em alguns lugares do Brasil. que ocupam o centro geográfico, à revelia das tentativas de invisibilização. Assim, mais do que aspectos puramente ligados à distância do centro geográfico, as periferias são caracterizadas por processos de opressão para diversas vidas em territórios de existência rural, urbano, rurbano ou do campo, da floresta e das águas.

Não obstante, coexistem processos de subjetivação e dessubjetivação dessa produção de território existencial terrificante, processos de subjetivação singulares cujas linhas de resistência crítica e inventiva contornam um fora do centro não como lugar de sujeição, mas como lugar de politização do corpo e afirmação das subjetividades periféricas, ora por meio da arte e das microinsurgências, ora por meio de aquilombamentos e ocupação dos espaços arquitetônicos que não foram instituídos para esses corpos. Quando uma travesti se anuncia como mulher preta e periférica, não o faz necessariamente porque more em um dado espaço de exceção do campo jurídico-político cisheteronormativa, mas também como uma escolha ético-política de ocupação do lugar de pertencimento a uma cidade subjetiva que a maioria das travestis ocupam, literalmente, como sobreviventes. Para escutar essas subjetividades periféricas sobreviventes, faz-se necessário compor essa cidade subjetiva e devir trans (não no sentido de identificação nem de transição de gênero, mas de transvaloração) para reconhecer que seus corpos não só correm risco de viver, mas também se conectam a “uma rede de fluídos, dos corpos dos outros, … [revelando] como vivemos nossas vidas através das vidas dos outros” (Pereira, 2020Pereira, B. (2020). A comunidade das sobreviventes contra a sobrevivência dos heróis. n -1 edições. https://www.n-1edicoes.org/textos/38
https://www.n-1edicoes.org/textos/38...
, p. 9).

A partir do que Fanon (2020Fanon, F. (2020). Pele negra, máscaras brancas. Ubu.) chama de “sociogenia”, é possível pensar a subjetividade indissociável dos processos e projetos sociais, históricos e políticos que coadunam na sua constituição, fora do lastro do discurso individualizante de uma suposta subjetividade intrapsíquica. Assim, torna-se indispensável compreender quais processos sociais, históricos e políticos constituem as subjetividades periféricas no Brasil.

Para tal tarefa, é fundamental analisar marcadores históricos, a saber: o Colonialismo, que não agiu apenas na submissão de territórios originários nas Américas e na África a invasões e assaltos, mas também produziu uma categorização de humanidade baseada em aspectos raciais e geográficos. O processo de Colonização forjou como humano, belo, verdadeiro, e digno o branco europeu (Césaire, 2020Césaire, A. (2020). Discurso sobre o colonialismo. Veneta.; Fanon, 2020Fanon, F. (2020). Pele negra, máscaras brancas. Ubu.).

Assim, a Colonização não submeteu apenas os corpos não-brancos (sobretudo negros e indígenas) ao trabalho forçado, mas também suas mentes a um processo de violência, negação, subserviência em uma realidade que se afirmava a partir da construção do conceito de raça, em que os não-brancos foram situados na condição de outro não identificado, carregando consigo as categorias da negatividade do mundo branco-europeu: não-humano, não-belo, não-sujeito, não-dotado de alma, não-saber, não-ser, tendo inclusive a sua razão, enquanto fundamento da humanidade para a filosofia da época, questionada (Fanon, 2020Fanon, F. (2020). Pele negra, máscaras brancas. Ubu.; Mbembe, 2018Mbembe, A. (2018). Crítica da razão negra. n-1 edições.).

O não-ser que aponta Fanon (2020Fanon, F. (2020). Pele negra, máscaras brancas. Ubu.) situa a(o) negra(o) e (a)o indígena a uma condição de ausência de ontologia, pela sua condição social de não-ser, seja pela via da animalização ou pela inexistência de psique que a Igreja assinalou e que, segundo Santos (2015Santos, A. B. (2015). Colonização, quilombos: Modos e significações. Editora INCTI-UnB.), possibilitava uma espécie de coisificação passível de qualquer atitude sobre eles. Negros e Indígenas não tinham/têm apenas que sobreviver e alcançar um ser, mas sê-los em um universo branco que, além de deslegitimar e até negar sua existência, operava/opera sua eliminação simbólica, econômica e material por meio de estratégias plurais.

O Colonialismo e sua atualização enquanto colonialidade de poder, saber e ser promovem, de maneira concomitante, a construção de um centro ontológico, econômico, político, social, cultural, e epistemológico a partir de marcadores étnico-raciais, de classe, gênero e sexualidade etc., endossado uma subjetividade como modelo, norma, razão universal: a Subjetividade Centro. O centro se constitui (com toda ênfase ao pronome “se” enquanto pronome reflexivo, porque são é o centro que se constitui tal qual centro) de maneira narcísica, por criar um modelo racial, social, subjetivo, e epistêmico, em que apenas ele se encaixa, como afirma Kilomba (2019Kilomba, G. (2019). Memórias da plantação: Episódios de racismo cotidiano. Cobogó.).

Essa racionalidade etnocêntrica vocifera: “Tudo aquilo que não sou Eu (subjetividade centro) é um outro, um estranho”. Como afirma Spivak (2010Spivak, G. C. (2010). Pode o subalterno falar? Editora da UFMG.), o Ocidente sempre demonstrou interesse em constituir uma dupla condição “o sujeito do Ocidente-Ocidente como Sujeito” (p. 25), forjando com seu monólogo epistêmico inquestionável as subjetividades periféricas como efeitos colaterais da humanidade.

Mbembe (2018Mbembe, A. (2018). Crítica da razão negra. n-1 edições.) situa que o pensamento europeu (de que a Psicologia ainda se baseia em grande parte) se inclinou a abordar a identidade distante de lógicas de “copertencimento” entre diferentes modos de vida em um mesmo mundo, mas a partir de uma relação autorreferente do “mesmo com o mesmo”, ancorando a relação eu-outro a uma redução do ser à cor da pele para definir o que chamou de raça, sendo que no Brasil apenas o outro é racializado negro: o “negro da terra” (Jecupé, 2002Jecupé, K. W. (2002). Oré awé roiru’ama: Todas as vezes que dissemos adeus (2a ed.). Triom., p. 21). e o negro do atlântico.

Hooks opera com a relação sujeito x objeto afirmando que sujeitas(os) são aquelas(es) que são capazes de ter o direito de definir suas próprias realidades, enquanto os objetos têm suas realidades definidas de fora. E é de fora que recebem os comandos linguísticos, imagéticos, políticos e sociais de que estes não pertencem ao centro, logo devem ser postos para fora (Kilomba, 2019Kilomba, G. (2019). Memórias da plantação: Episódios de racismo cotidiano. Cobogó.).

Mbembe (2018Mbembe, A. (2018). Crítica da razão negra. n-1 edições.) nomeia esse processo como “alterocídio”, como um modo de constituir o outro não como um semelhante, mas sim como um objeto ameaçador, um inimigo que põe em risco a integridade do centro, por isso consideram justificável condená-lo à correção, sujeição, adestramento e até à morte.

O afastamento do centro cria, tanto em termos geográficos quanto no que diz respeito às subjetividades, não apenas uma condição de diferenciação do modelo imposto como universal, normal e correto, mas também um distanciamento de oportunidades a partir de uma dinâmica de desigualdades, uma depreciação da vida em sua potência.

Esse cenário de depreciação, desigualdade e violência é sustentado por racionalidades que tentam forjar as subjetividades periféricas como um outro-ameaçador, um ser intrusivo que quer e pode ameaçar a integridade física e emocional, a propriedade privada, a família do centro. Esse cenário se coaduna com o que Oyěwùmí (2021Oyěwùmí, O. (2021). A invenção das mulheres: Construindo um sentido africano para os discursos ocidentais de gênero. Bazar do Tempo.) aponta ao situar diferença e hierarquia ancoradas por um primado supostamente biológico da raça, em que os diferentes eram alocados em uma condição de “degeneração”, inferioridade genética, desvio do original e das normas e condutas.

Na direção da compreensão da complexidade da subjetividade e suas formas de vivência e opressão, feministas negras como Crenshaw (2002Crenshaw, K. (2002). Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Estudos Feministas, 10(1), 171-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
), Akotirene (2019Akotirene, C. (2019). Interseccionalidade. Pollen.), e Collins e Bilge (2020Collins, P. H., & Bilge, S. (2020). Interseccionalidade. Boitempo.) operam com o conceito de Interseccionalidade como modo de compreender as intersecções de modos de vida e opressão que entrecruzam elementos de raça, classe, gênero e sexualidades, geração, deficiência, nacionalidade, entre outros. Enquanto ferramenta analítica permite uma análise apurada de processos específicos e singularidades, em contraposição à construção de explicações universais para fenômenos marcados pela multiplicidade e singularidades fundamentais.

O processo de universalização das subjetividades centro e desconsideração das particularidades das subjetividades periféricas marcam significativamente a Psicologia no Brasil, cuja base tem sido, majoritariamente, influenciada pelo pensamento europeu e norte-americano. A partir desse processo, analisaremos a relação da Clínica Psicológica com as Subjetividades Periféricas.

A clínica e as subjetividades periféricas

Segundo Tavares e Trad (2021Tavares, J. S. C., & Trad, L. A. B. (2021). Racismo e saúde mental: Subsídios para uma clínica socialmente contextualizada. In I. R. Barbosa, K. M. Aiquoc, & T. A. Souza (Orgs.), Raça e saúde: Múltiplos olhares sobre a saúde da população negra no Brasil (pp. 169-180). EDUFRN.),a clínica exercida no campo da saúde mental no Brasil é baseada na construção de critérios teóricos, diagnósticos e formas de tratamento baseados na população branca como norma, padrão de definição de saúde e doença. Para as autoras, a centralização do exercício da clínica na branquitude enquanto definidor de processos produz e reproduz sofrimento para as subjetividades que fogem a essas determinações.

A partir da experiência dos norte-africanos com médicos europeus, Fanon (2020Fanon, F. (2020). Pele negra, máscaras brancas. Ubu.) apresenta teses importantes para compreender os impasses da clínica com subjetividades periféricas: na tese 1, o autor aponta que os médicos europeus desconfiavam da realidade da doença dos negros norte-africanos, o que se justifica na tese 2, que afirma que o médico europeu constrói suas análises a partir de um a priori constituído pelas teorias do profissional, o que faz com que os pacientes sejam alocados em um quadro pré-concebido por suas teorias. Indubitavelmente, os manuais clínicos, em sua maioria euro-americanos, não conseguem dar conta de uma experiência de sofrimento própria dos processos de subjetivação e sofrimento referentes a nossa realidade, fazendo com que as subjetividades periféricas sejam escutadas a partir de arcabouços teóricos que direcionam escutas a detectar problemas preexistentes em outros contextos e subjetividades.

S. Nogueira (2019Nogueira, S. (2019). Libertação, descolonização e africanização da psicologia: Breve introdução à psicologia africana. Edufscar.) afirma que as Psicologias de base eurocêntrica têm servido em sua maioria para a construção de um projeto de colonização, opressão e dominação de subjetividades que não se encaixam em seus modelos. Para além da diversidade epistemológica que embasa a formação em Psicologia no Brasil, ainda assistimos uma formação eminentemente protagonizada por autoras(es) europeus tornados universais em seus modelos de interpretação (Veiga, 2021Veiga, L. M. (2021). Clínica do impossível: Linhas de fuga e de cura. Telha.).

No entanto, esses saberes circunscritos em aparatos geográficos, históricos, econômicos, étnico-raciais oriundos de pesquisas e análises produzidas com as subjetividades de cada contexto (sendo em sua maioria afinadas com o que estamos chamando de subjetividade centro) são transformadas em espécies de modelos universais a serem aprendidos-aplicados nas análises clínicas, recebendo nomes como abordagem psicológica, linha teórica, entre outros.

Esses modelos universais têm como referência uma espécie de subjetividade inodora, insípida e incolor (Almeida, 2019Almeida, S. (2019). Racismo estrutural. Pollen.), que supostamente se constitui como uma substância psicológica pura, dissociada de processos sociais, políticos e econômicos, ou enxergam esses processos como meros elementos acessórios, sem considerar sua fundamental centralidade na produção de subjetividades (Guattari & Rolnik, 1986Guattari, F., & Rolnik, S. (1986). Micropolítica: Cartografias do desejo. Graal.).

A partir das influências de Haraway (1995Haraway, D. (1995). Saberes localizados: A questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, (5) 7-41. https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/1773
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/in...
), essa suposição de uma análise universal, objetiva e neutra que se constitui de maneira uniforme em termos epistemológicos, éticos e técnicos se mostra impossível, pois para a autora todo saber é localizado, porque partiu de uma experiência inscrita em um contexto que não pode ser desconsiderado em nome de uma tentativa de universalização.

Um dos processos complexos do encontro das Subjetividades Periféricas com as Psicologias Clínicas de base epistemológica europeia-estadunidense é a análise baseada em teorias produzidas em outros cenários geográficos, históricos, étnico-raciais, de gênero e sexualidade, classe etc., diferentes do contexto das subjetividades periféricas, afinal tem sido comum uma aplicação das práticas clínicas baseadas nessas teorias, desconsiderando as especificidades de subjetividades periféricas em nome de uma suposta universalização que permite a importação dessas linhas teóricas.

Guattari e Rolnik (1986Guattari, F., & Rolnik, S. (1986). Micropolítica: Cartografias do desejo. Graal.) compreendem a subjetividade distante de suas concepções mais comuns ancoradas em uma natureza humana, intrapsíquica e fechada em si. O conceito de processos de subjetivação se situa no nível dos processos de produção de modos de sentir, perceber e agir em uma relação entre processos macropolíticos e micropolíticos, coletivos e individuais, desejantes e políticos que funcionam de maneira indissociável em um regime de atravessamento e coprodução.

A partir do entrecruzamento dessa concepção de subjetividade do Guattari com o conceito de Sociogênese de Fanon (2020Fanon, F. (2020). Pele negra, máscaras brancas. Ubu.), é possível perceber que as subjetividades são produzidas por redes de processos sociais, políticos e econômicos em uma relação coimbricada entre subjetividade e história. Dessa forma, as subjetividades central e periférica são produzidas por diferentes processos, produzindo desdobramentos subjetivos plurais e diferentes.

Paira sobre as clínicas um discurso muito afinado ao que Munanga (2001Munanga, K. (2001) Políticas de ação afirmativa em benefício da população negra no Brasil: Um ponto de vista em defesa de cotas. Sociedade e cultura, 4(2), 31-43. https://doi.org/10.5216/sec.v4i2.515
https://doi.org/https://doi.org/10.5216/...
) chama de Mito da Democracia Racial, a que adicionamos o Mito da Democracia Interseccional como modo de abarcar as intersecções dos modos de vida e opressão que estão relacionados com os marcadores sociais da diferença. Essa atmosfera de que todos são iguais, independentemente de cor, classe, gênero e sexualidades, diferenciando-se apenas em elementos puramente intrapsíquicos, aos quais a clínica produziria uma espécie de ortopedia mental, a partir do que afirma Foucault (2014Foucault, M. (2014). Vigiar e punir (42a ed.). Vozes.), como modo de corrigir individualmente mentes com defeito a partir de uma norma constituída.

Mesmo que as subjetividades periféricas tentem com força e insistência, sua voz não seria escutada nos espaços hegemônicos de poder e saber, porque os neocolonialismos [de que algumas clínicas são originadas e representantes] impõem a essas vidas uma condição de marginalidade e silêncio, como afirma Kilomba (2019Kilomba, G. (2019). Memórias da plantação: Episódios de racismo cotidiano. Cobogó.).

Acerca das periferias de gênero e sexualidade, Stona e Ferrari (2021Stona, J., & Ferrari, A. (2021). Gênero: Da formação a não escuta do analista. Devires.) pontuam a existência de uma espécie de purificação normativa na formação de analistas que desencadeia um silenciamento e uma não-escuta de questões que fogem ao escopo constituído das clínicas hegemônicas.

As subjetividades periféricas têm apresentado às clínicas hegemônicas uma problemática: a dificuldade/incapacidade de produzir análises que desconsiderem os processos específicos de suas vivências de exclusão, opressão e desigualdades na constituição da subjetividade. Assim, as clínicas são convocadas a se deslocar de seus lugares comuns de interpretação universal com base nas subjetividades centro, para produzir outras disposições clínicas a partir de revisões epistemológicas e metodológicas.

Em seu clássico livro Os Condenados da Terra, Fanon (1968Fanon, F. (1968). Os condenados da terra. Civilização Brasileira.) discute os efeitos na subjetividade e na saúde mental dos processos de colonização e da guerra de libertação na Argélia. A obra traz uma análise minuciosa de como processos de ordem racial, política, social, e econômica engendram modos de subjetivação e sofrimento. Inspirado em Fanon, a psicologia clínica no Brasil precisa realizar análises enquanto ciência e profissão ancoradas nos inúmeros processos de produção de sofrimento nas subjetividades, a saber: racismo, classismo, machismo, lgbtiqiafobia, capacitismo, etarismo, conflitos sobre a terra, crimes ambientais, a necropolítica como política de produção de morte deliberada por instâncias plurais (Mbembe, 2018Mbembe, A. (2018). Crítica da razão negra. n-1 edições.), encarceramento em massa etc.

Veiga (2021Veiga, L. M. (2021). Clínica do impossível: Linhas de fuga e de cura. Telha.) faz referência à presença marcante de duas mulheres negras na história da psicologia:

. . . na década de 1930 a psicanalista Virgínia Bicudo realizou uma vasta pesquisa com negros em São Paulo, que resultou na sua dissertação de mestrado Atitudes raciais de negros e mulatos em São Paulo. Nos anos 1980, a psicóloga e psicanalista brasileira Neusa Santos Souza escreveu o livro Tornar-se negro, em que fez uma releitura de conceitos fundamentais da psicanálise a partir da experiência negra. (Veiga, 2021Veiga, L. M. (2021). Clínica do impossível: Linhas de fuga e de cura. Telha., p. 84).

Entrecruzando a teoria de Deleuze e Guattari (2010Deleuze, G., & Guattari, F. (2010). O anti-Édipo: Capitalismo e esquizofrenia. Editora 34.), que afirmam que inconscientes são fabricados na relação indissociável entre desejo-político e individual-coletivo, com o pensamento da psicanalista brasileira I. Nogueira (2021Nogueira, I. (2021). A cor do inconsciente: Significações do corpo negro. Perspectiva.), em seu livro A cor do inconsciente: significações do corpo negro, podemos compreender como a sociedade marcada por cenários de desigualdades e opressões produzem redes de significações, imagens e discursos que constroem inconscientes com cor, classe, gênero e sexualidades que precisam ser consideradas em suas especificidades pelas clínicas psicológicas.

Criado em 2006 pelo sistema conselhos (Conselhos Regionais de Psicologia e Conselho Federal de Psicologia), o Centro de Referências Técnicas em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop) publica, periodicamente, referências técnicas que instruem psicólogas(os) sobre elementos metodológicos, técnicos e políticos que atravessam a atuação com subjetividades periféricas. A exemplos das Referências para Atuação nos programas de IST e AIDS (CFP, 2008Conselho Federal de Psicologia. (2008). Referências técnicas para a atuação do(a) psicólogo(a) nos Programas de DST e aids. CFP.), no sistema prisional (CFP, 2012aConselho Federal de Psicologia. (2012a). Referências técnicas para atuação das(os) psicólogas(os) no sistema prisional. CFP.) e no âmbito das medidas socioeducativas (CFP, 2010Conselho Federal de Psicologia. (2010). Referências técnicas para atuação de psicólogos no âmbito das medidas socioeducativas em unidades de internação. CFP.; 2012cConselho Federal de Psicologia. (2012c). Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) em programas de medidas socioeducativas em meio aberto. CFP.), na atenção às mulheres em situação de violência (CFP, 2012bConselho Federal de Psicologia. (2012b). Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) em programas de atenção à mulher em situação de violência. CFP.), com relações raciais (CFP, 2017Conselho Federal de Psicologia. (2017). Relações raciais: Referências técnicas para atuação de psicólogas(os). CFP.), questões relativas à terra (CFP, 2019bConselho Federal de Psicologia. (2019). Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) em questões relativas à terra. CFP.), Povos Tradicionais (CFP, 2019aConselho Federal de Psicologia. (2019). Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) com povos tradicionais. CFP.), além de notas técnicas e resoluções.

Em 60 anos de Psicologia no Brasil, a clínica se diversificou à medida que a área foi alcançando outros campos de inserção. Saiu da exclusividade do divã, do setting, do consultório para também ocupar as políticas públicas, as ruas, as periferias, as ruralidades, as comunidades indígenas, quilombolas, pesqueiras e até as plataformas digitais. Essas mudanças não representam apenas uma modificação meramente topológica, mas acenam também para o encontro com outras vidas e não apenas a burguesia, principal público da psicologia clínica em seu surgimento, como afirmam Moreira, Romagnoli e Neves (2007Moreira, J. O., Romagnoli, R. C., & Neves, E. O. (2007). O surgimento da clínica psicológica: Da prática curativa aos dispositivos de promoção da saúde. Psicologia: Ciência e Profissão , 27(4), 608-621. https://doi.org/10.1590/S1414-98932007000400004
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
).

Para as autoras, a clínica foi convocada a se desprender de suas raízes individualizantes, elitistas, higienistas para permitir que o contexto social seja alocado enquanto categoria de análise na clínica. Essa concepção se coaduna com o Código de Ética Profissional do Psicólogo, que aponta em seus Princípios Fundamentais: “III. O psicólogo atuará com responsabilidade social, analisando crítica e historicamente a realidade política, econômica, social e cultural” (CFP, 2005Conselho Federal de Psicologia. (2005). Código de Ética Profissional do Psicólogo. CFP. https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2012/07/codigo-de-etica-psicologia.pdf
https://site.cfp.org.br/wp-content/uploa...
, p. 7).

Nessa direção, cabe lembrar a frase do pensador brasileiro Frei Betto (2015Betto, F. (13 nov. 2015). Dez conselhos para os militantes de esquerda. Bancários DF. https://bancariosdf.com.br/portal/frei-betto-dez-conselhos-para-os-militantes-de-esquerda/
https://bancariosdf.com.br/portal/frei-b...
) “A cabeça pensa onde os pés pisam . . . onde o povo vive, luta, sofre, alegra-se e celebra suas crenças e vitórias” (par. 3). A Psicologia Clínica Brasileira precisa pensar onde seus pés pisam, compreender a vivência, as lutas, sofrimento e alegrias, crenças e vitórias do seu povo como modo de produzir análises coerentes com a realidade social que se insere e romper com os ciclos de importação acrítica e universalista de teorias que são reproduzidas como modelos de intervenção, desconsiderando processos específicos da nossa realidade que produzem subjetividades, formas de pensar, agir, sentir, relacionar e sofrer.

Essa aposta nada tem a ver com qualquer laterização epistemológica que recairia na escolha de um modelo teórico-metodológico ideal para as análises clínicas, mas sim com uma disposição para revisar, adaptar e construir epistemologias, metodologias a partir do encontro com as subjetividades que encontramos em nossas realidades. Afinal, se as clínicas psicológicas têm habitado cenários brasileiros e encontrado pessoas negras, indígenas, lgbtiqia+ e quilombolas em situação de rua, pesqueiras, é preciso produzir análises que sejam coerentes com essas subjetividades em vez de buscar analisá-las a partir de crivos importados como norma modelo.

Essa concepção não significa que as pessoas que configuram a subjetividade centro, homens, brancos, cisgênero, heterossexuais, ricos, citadinos, sem deficiência, não serão analisadas, mas serão analisadas enquanto subjetividade centro e não enquanto norma, modelo. As análises da masculinidade (Ambra, 2021Ambra, P. (2021). Cartografias da masculinidade. Cult.; Caetano & Silva, 2018Caetano, M., Silva, P. M., Junior. (2018). De guri a cabramacho: Masculinidades no Brasil. Lamparina.), branquitude (Carone & Bento, 2016Carone, I., & Bento, M. A. S. (2016). Psicologia social do racismo: Estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. Vozes.; Schucman, 2020Schucman, L. V. (2020). Entre o encardido, o branco e o branquíssimo: Branquitude, hierarquia e poder na cidade de São Paulo. Annablume.), da cisgeneridade (Nascimento, 2021Nascimento, L. (2021). Transfeminismo. Jandaira.; Stona & Carrion, 2021Stona, J., & Carrion, F. (2021). O cis no divã. Devires.), entre outras, precisam também ser analisadas em sua especificidade, inclusive como modo de desnaturalizar sua reprodução como modelo universal.

No entanto, a análise das subjetividades periféricas em sua pluralidade e especificidade, considerando elementos da interseccionalidade (Akotirene, 2019Akotirene, C. (2019). Interseccionalidade. Pollen.; Collins & Bilge, 2020Collins, P. H., & Bilge, S. (2020). Interseccionalidade. Boitempo.; Crenshaw, 2002Crenshaw, K. (2002). Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Estudos Feministas, 10(1), 171-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
) se coloca como ético-política de uma dupla tarefa de descolonização: da clínica de sua condição de colonizada-colonizante (Nobles, 2009Nobles, W. W. (2009). Sakhu Sheti: Retomando e reapropriando um foco psicológico afrocentrado. In E. L. Nascimento (Org.), Afrocentricidade: Uma abordagem epistemológica inovadora (pp. 277-298). Selo Negro.; S. Nogueira, 2019Nogueira, S. (2019). Libertação, descolonização e africanização da psicologia: Breve introdução à psicologia africana. Edufscar.), que produz análises com base em epistemologias europeias e estadunidenses e subjetividades-centro universalizadas, desconsiderando especificidades dos marcadores sociais da diferença, e das subjetividades que são produtoras e/ou vítimas de processos de opressão plurais que se atualizam em um contexto colonial-capitalístico (Rolnik, 2018Rolnik, S. (2018). Esferas da insurreição: Notas para uma vida não cafetinada. n-1 edições.).

Considerações finais: des-centrar escutas/periferizar análises

Não adianta querer, tem que ser, tem que O mundo é diferente [do atlântico] pra cá (Racionais Mc’s, 2002Racionais MC’s. (2002). Da ponte pra cá [música]. In Nada como um dia após o outro dia. Boogie Naipe.)

Reconhecer que nossas Psicologias estão inseridas na “Améfrica Ladina … enquanto sistema etnogeográfico de referência” (Gonzalez, 2020Gonzalez, L. (2020). Por um feminismo afro-latino-americano: Ensaios, intervenções e diálogos. Zahar., pp. 134-135) constitui a oportunidade de recusa da negação, silenciamento e colonização das plurais miríades de seres, saberes, cores das(os) amefricanas(os) que existem e resistem, mesmo sendo postas(os) à margem das oportunidades de vida digna e no alvo das relações de opressão, desigualdade, adoecimento e morte. Portanto, a afirmação de uma clínica que pense com os pés onde pisa se constitui como tarefa que transcende o primado epistemológico, a partir do questionamento da relação entre as vidas, narrativas, histórias que escutamos e as teorias que embasam nossas práticas; posto que também aponta para um primado ético-político de respeito radical das diferenças em contraposição à normatopolítica em suas veias psicologizantes e medicalizantes.

A pluralidade do território brasileiro se verte na pluralidade das subjetividades, a lembrar das diferentes linhas das encruzilhadas que as constituem. Esse cenário requer o questionamento, a revisão das referências teórico-metodológicas de nossas clínicas em consonância da criação de outros ethos, outras disposições clínicas para dar conta de escutar as realidades mentais, sociais, territoriais que constituem o trabalho da Psicologia.

Então quando nos referimos à interface entre clínica e subjetividades periféricas a que escuta estamos nos referindo? Trata-se de uma aposta em uma clínica em que o coletivo e o comum podem emergir de uma poética da relação em que a escuta se dá com e não para os outros (Glissant, 2021Glissant, E. (2021). Poética da relação. Bazar do Tempo.). Quando a aposta nessa clínica se faz com a escuta das subjetividades periféricas, podemos nos aproximar de uma interface com as epistemologias dos parentes e de outras epistemologias decoloniais; por exemplo, por meio de uma ética dos processos de devir comum na poética da relação com os não indígenas e com os outros humanos e os outros mais que humanos: encantadas, encantados, a terra, o céu, a natureza e a força das águas, do vento, da floresta e dos animais… “Memórias que se agrupam para tentar encontrar o si mesmo de cada um e a importância das raízes ancestrais neste ‘si mesmo’” (Jecupé, 2002Jecupé, K. W. (2002). Oré awé roiru’ama: Todas as vezes que dissemos adeus (2a ed.). Triom., p. 13).

Em suma, não há como escutar-analisar subjetividades periféricas com ouvidos-lentes baseadas nas subjetividades centro como modelo. A clínica psicológica precisa assumir sua necessidade de analisar as especificidades das subjetividades periféricas, alocando componentes fundamentais na constituição das subjetividades que, nesses 60 anos de regulamentação de profissão, têm sido negligenciados ou menosprezados por muitas psicologias em nome da crença de uma ilusória democracia interseccional que desconsidera cores, etnias, gêneros e sexualidades, lugares, idades e enxergam apenas mentes transparentes. Assim, este ensaio convoca psicólogas(os) a revisitarem as noções de subjetividade universal para enxergar as subjetividades que habitam os territórios que estamos inseridos.

Referências

  • Akotirene, C. (2019). Interseccionalidade. Pollen.
  • Almeida, S. (2019). Racismo estrutural. Pollen.
  • Ambra, P. (2021). Cartografias da masculinidade. Cult.
  • Baptista, L. A. (1999). A cidade dos sábios: Reflexões sobre a dinâmica social nas grandes cidades. Summus.
  • Baptista, L. A. (2000). A fábrica de interiores: A formação psi em questão. Eduff.
  • Baptista, L. A. (2009). O veludo, o vidro e o plástico: Desigualdade e diversidade na metrópole. Eduff.
  • Betto, F. (13 nov. 2015). Dez conselhos para os militantes de esquerda. Bancários DF. https://bancariosdf.com.br/portal/frei-betto-dez-conselhos-para-os-militantes-de-esquerda/
    » https://bancariosdf.com.br/portal/frei-betto-dez-conselhos-para-os-militantes-de-esquerda/
  • Bock, A. B. M. (2010). A psicologia como profissão: Entrevista com Ana Bock. Psicologia: Ciência e Profissão, 30(esp), 246-271. https://doi.org/10.1590/S1414-98932010000500013
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1590/S1414-98932010000500013
  • Bock, A. B. M., Furtado, O., & Teixeira, M. L. T. (2001). Psicologias: Uma introdução ao estudo de psicologia (13a. ed.). Saraiva.
  • Caetano, M., Silva, P. M., Junior. (2018). De guri a cabramacho: Masculinidades no Brasil. Lamparina.
  • Carone, I., & Bento, M. A. S. (2016). Psicologia social do racismo: Estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. Vozes.
  • Castro, S. (2020). Condescendência: Estratégia pater-colonial de poder. In H. B. Holanda (Org.), Pensamento feminista hoje: Perspectivas decoloniais (pp. 141-152). Bazar do Tempo.
  • Centofanti, R. (1982). Radecki e a psicologia no Brasil. Psicologia: Ciência e Profissão , 3(1), 2-48. https://doi.org/10.1590/S1414-98931982000100001
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1590/S1414-98931982000100001
  • Césaire, A. (2020). Discurso sobre o colonialismo. Veneta.
  • Collins, P. H., & Bilge, S. (2020). Interseccionalidade. Boitempo.
  • Conselho Federal de Psicologia. (2005). Código de Ética Profissional do Psicólogo. CFP. https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2012/07/codigo-de-etica-psicologia.pdf
    » https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2012/07/codigo-de-etica-psicologia.pdf
  • Conselho Federal de Psicologia. (2008). Referências técnicas para a atuação do(a) psicólogo(a) nos Programas de DST e aids. CFP.
  • Conselho Federal de Psicologia. (2010). Referências técnicas para atuação de psicólogos no âmbito das medidas socioeducativas em unidades de internação. CFP.
  • Conselho Federal de Psicologia. (2012a). Referências técnicas para atuação das(os) psicólogas(os) no sistema prisional. CFP.
  • Conselho Federal de Psicologia. (2012b). Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) em programas de atenção à mulher em situação de violência. CFP.
  • Conselho Federal de Psicologia. (2012c). Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) em programas de medidas socioeducativas em meio aberto. CFP.
  • Conselho Federal de Psicologia. (2017). Relações raciais: Referências técnicas para atuação de psicólogas(os). CFP.
  • Conselho Federal de Psicologia. (2019). Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) com povos tradicionais. CFP.
  • Conselho Federal de Psicologia. (2019). Referências técnicas para atuação de psicólogas(os) em questões relativas à terra. CFP.
  • Crenshaw, K. (2002). Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Estudos Feministas, 10(1), 171-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
  • Deleuze, G., & Guattari, F. (2010). O anti-Édipo: Capitalismo e esquizofrenia. Editora 34.
  • Fanon, F. (1968). Os condenados da terra. Civilização Brasileira.
  • Fanon, F. (2020). Pele negra, máscaras brancas. Ubu.
  • Foucault, M. (2002). Ditos e escritos Vol. 1 - Problematização do sujeito: Psicologia, psiquiatria e psicanálise. Forense Universitária.
  • Foucault, M., (2010). Aula de 17 de março de 1976. In M. Foucault, Em defesa da sociedade (2a ed., pp. 201-222). WMF Martins Fontes.
  • Foucault, M. (2014). Vigiar e punir (42a ed.). Vozes.
  • Glissant, E. (2009). Introdução a uma poética da diversidade (2a ed.). UFJF.
  • Glissant, E. (2021). Poética da relação. Bazar do Tempo.
  • Gonzalez, L. (2020). Por um feminismo afro-latino-americano: Ensaios, intervenções e diálogos. Zahar.
  • Guattari, F., & Rolnik, S. (1986). Micropolítica: Cartografias do desejo. Graal.
  • Haraway, D. (1995). Saberes localizados: A questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, (5) 7-41. https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/1773
    » https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/view/1773
  • Jecupé, K. W. (2002). Oré awé roiru’ama: Todas as vezes que dissemos adeus (2a ed.). Triom.
  • Kilomba, G. (2019). Memórias da plantação: Episódios de racismo cotidiano. Cobogó.
  • Lhullier, L. A. (Org.). (2013). Quem é a psicóloga brasileira? Mulher, psicologia e trabalho. Conselho Federal de Psicologia.
  • Mbembe, A. (2018). Crítica da razão negra. n-1 edições.
  • Meireles, J., Feldmann, M., Cantares, T. S., Nogueira, S. G., & Guzzo, R. S. L. (2019). Psicólogas brancas e relações étnico-raciais: Em busca de formação crítica sobre a branquitude. Pesquisas e Práticas Psicossociais, 14(3), e3181. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ppp/v14n3/09.pdf
    » http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ppp/v14n3/09.pdf
  • Moreira, J. O., Romagnoli, R. C., & Neves, E. O. (2007). O surgimento da clínica psicológica: Da prática curativa aos dispositivos de promoção da saúde. Psicologia: Ciência e Profissão , 27(4), 608-621. https://doi.org/10.1590/S1414-98932007000400004
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1590/S1414-98932007000400004
  • Munanga, K. (2001) Políticas de ação afirmativa em benefício da população negra no Brasil: Um ponto de vista em defesa de cotas. Sociedade e cultura, 4(2), 31-43. https://doi.org/10.5216/sec.v4i2.515
    » https://doi.org/https://doi.org/10.5216/sec.v4i2.515
  • Nascimento, L. (2021). Transfeminismo. Jandaira.
  • Neves, D. (2022). Grécia antiga. Brasil Escola. https://brasilescola.uol.com.br/historiag/grecia-antiga.htm
    » https://brasilescola.uol.com.br/historiag/grecia-antiga.htm
  • Nobles, W. W. (2009). Sakhu Sheti: Retomando e reapropriando um foco psicológico afrocentrado. In E. L. Nascimento (Org.), Afrocentricidade: Uma abordagem epistemológica inovadora (pp. 277-298). Selo Negro.
  • Nogueira, I. (2021). A cor do inconsciente: Significações do corpo negro. Perspectiva.
  • Nogueira, S. (2019). Libertação, descolonização e africanização da psicologia: Breve introdução à psicologia africana. Edufscar.
  • Oyěwùmí, O. (2021). A invenção das mulheres: Construindo um sentido africano para os discursos ocidentais de gênero. Bazar do Tempo.
  • Pereira, B. (2020). A comunidade das sobreviventes contra a sobrevivência dos heróis. n -1 edições. https://www.n-1edicoes.org/textos/38
    » https://www.n-1edicoes.org/textos/38
  • Racionais MC’s. (2002). Da ponte pra cá [música]. In Nada como um dia após o outro dia. Boogie Naipe.
  • Rolnik, S. (2018). Esferas da insurreição: Notas para uma vida não cafetinada. n-1 edições.
  • Rosa, H. L. R. S. (2018). Existe uma psicologia brasileira? Uma reflexão historiográfica sobre o estabelecimento da Psicologia no Brasil. Mnemosine, 14(2), 2-24. https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/mnemosine/article/view/41680
    » https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/mnemosine/article/view/41680
  • Santos, A. B. (2015). Colonização, quilombos: Modos e significações. Editora INCTI-UnB.
  • Schucman, L. V. (2020). Entre o encardido, o branco e o branquíssimo: Branquitude, hierarquia e poder na cidade de São Paulo. Annablume.
  • Spivak, G. C. (2010). Pode o subalterno falar? Editora da UFMG.
  • Stona, J., & Carrion, F. (2021). O cis no divã. Devires.
  • Stona, J., & Ferrari, A. (2021). Gênero: Da formação a não escuta do analista. Devires.
  • Tavares, J. S. C., & Trad, L. A. B. (2021). Racismo e saúde mental: Subsídios para uma clínica socialmente contextualizada. In I. R. Barbosa, K. M. Aiquoc, & T. A. Souza (Orgs.), Raça e saúde: Múltiplos olhares sobre a saúde da população negra no Brasil (pp. 169-180). EDUFRN.
  • Veiga, L. M. (2021). Clínica do impossível: Linhas de fuga e de cura. Telha.
  • Yamamoto, O. H. (2012). 50 anos de profissão: Responsabilidade social ou projeto ético-político? Psicologia: Ciência e Profissão , 32(esp.), 6-17. https://doi.org/10.1590/S1414-98932012000500002
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1590/S1414-98932012000500002
  • 1
    Antônio Bispo dos Santos (2015)Santos, A. B. (2015). Colonização, quilombos: Modos e significações. Editora INCTI-UnB., o Nego Bispo, utiliza a expressão pindorâmicos a partir do tupi-guarani para se referir aos territórios da região denominada pela colonização de América do Sul.
  • 2
    Modo como as pessoas em situação de rua se identificam em alguns lugares do Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    23 Maio 2022
  • Aceito
    24 Maio 2022
Conselho Federal de Psicologia SAF/SUL, Quadra 2, Bloco B, Edifício Via Office, térreo sala 105, 70070-600 Brasília - DF - Brasil, Tel.: (55 61) 2109-0100 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: revista@cfp.org.br