Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação da Relação entre Eventos Traumáticos Infantis e Comportamentos Autolesivos em Adolescentes

Evaluation of the Relationship between Childhood Traumatic Events and Self-injurious Behavior in Adolescents

Evaluación de la relación entre eventos traumáticos infantiles y comportamiento autolesivo en adolescentes

Resumo

Esta pesquisa teve como objetivo verificar a relação entre eventos traumáticos (ET) na infância e a ocorrência de comportamentos autolesivos em adolescentes. Os instrumentos utilizados foram o Questionário sobre Traumas na Infância (QUESI) e o Inventário de Autolesão Deliberada - reduzido (IAD-r). Participaram 494 estudantes do ensino médio de ambos os sexos e idade entre 15 e 18 anos (M = 16,4). Destes, 58,5% afirmaram ter sofrido abuso emocional de forma recorrente e 19,0% e 59,5% assumiram já ter sofrido abuso sexual e físico, respectivamente. Quanto à prática de autolesão, 65,0% revelaram já ter se engajado em comportamentos autolesivos. De acordo com a análise de Regressão Logística Binomial, todos os tipos de ET exibiram associação significativa com a prática de comportamentos autolesivos. A análise de moderação a respeito da interação entre a ocorrência de ET infantis e a prática de autolesão revelou ausência de moderação pelo sexo e pela idade. Porém, quanto ao abuso físico, o efeito de moderação da idade apresentou significância estatística limítrofe e indicou que os adolescentes mais novos, de 15 e 16 anos, que sofreram este tipo de abuso na infância, foram mais susceptíveis à prática autolesiva. Portanto, as altas taxas de ET e de autolesão encontradas nesta pesquisa revelam a gravidade do problema. Espera-se que esta investigação possa contribuir para a elaboração de intervenções para prevenção e controle dos fatores de risco que acometem a população infanto-juvenil.

Palavras-chave:
Experiências traumáticas; Autolesão; Infância; Adolescência; Psicologia da Saúde

Abstract

This research aimed to verify the relationship between traumatic events (TE) in childhood and the occurrence of self-injurious behavior in adolescents. The instruments used were the Childhood Trauma Questionnaire (QUESI) and the Deliberate Self-Injury Inventory - reduced (IAD-r). The sample was composed of 494 high school students of both genders and aged between 15 and 18 years old (M = 16.4). Of those, 58.5% declared to have suffered recurring emotional abuse and 19.0% declared to have suffered sexual abuse and 59.5% physical abuse. Regarding the practice of self-harm, 65.0% reported having already engaged in self-injurious behaviors. According to the Binomial Logistic Regression analysis, all types of TE were associated with the practice of self-injurious behaviors. The moderation analysis between the occurrence of childhood TE and self-injury showed no moderation by sex or age. However, regarding physical abuse, the moderating effect of age showed borderline statistical significance and indicated that younger adolescents, 15 and 16 years old, who suffered this type of abuse in childhood, were more susceptible to self-injurious behavior. Therefore, the high rates of TE and self-injury found in this research reveal the seriousness of the problem. It is hoped for this investigation to contribute to the development of interventions to prevent and control risk factors that affect children and adolescents.

Keywords:
Traumatic experiences; Self-injury; Childhood; Adolescence; Health Psychology

Resumen

Esta investigación tuvo como objetivo verificar la relación entre eventos traumáticos (ET) en la infancia y la ocurrencia de conductas autolesivas en adolescentes. Los instrumentos utilizados fueron el Cuestionario de Trauma Infantil (QUESI) y el Inventario de Autolesiones Deliberadas -reducido (IAD-r). Participaron 494 estudiantes de la secundaria, de ambos sexos y con edades entre 15 y 18 años (M = 16,4). De estos, el 58,5% afirmaron haber sufrido maltrato emocional de forma recurrente, el 19,0% dijeron haber sufrido maltrato sexual y el 59,5%, maltrato físico. En cuanto a la práctica de la autolesión, el 65,0% informaron haber realizado conductas autolesivas. El análisis de Regresión Logística Binomial mostró que todos los tipos de ET tuvieron una asociación significativa con la práctica de conductas autolesivas. El análisis de la moderación respecto a la interacción entre la ocurrencia de ET infantil y la práctica de la autolesión reveló una ausencia de moderación por sexo o edad. En cuanto al maltrato físico, el efecto moderador de la edad mostró una significación estadística marginal e indicó que los adolescentes más jóvenes, de 15 y 16 años, que sufrieron este tipo de maltrato en la infancia, son más susceptibles a la práctica de autolesiones. Por lo tanto, las altas tasas de ET y autolesiones encontradas en esta investigación revelan la gravedad del problema. Se espera que esta investigación contribuya con el desarrollo de intervenciones para la prevención y control de los factores de riesgo que afectan a niños y adolescentes.

Palabras clave:
Experiencias traumáticas; Autolesivo; Infancia; Adolescencia; Psicología de la Salud

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) considera que a adolescência tem duração dos 12 aos 18 anos (Lei nº 8.069, 1990Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. (1990, 24 de julho). Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Presidência da República. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Lei...
). Já para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 1997Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE]. (1997). Crianças e adolescentes: Indicadores sociais. IBGE. https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=7128
https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php...
), a adolescência tem início aos 10 anos e término aos 20 anos de idade. A definição do tempo cronológico que marca o período da adolescência incita discussões, pois se sabe que a forma de conceber e compreender essa fase pode variar de cultura para cultura. No entanto, para a maioria das culturas, o início da adolescência está relacionado com o início da puberdade (Figueiredo, Maior, Sousa, Ribeiro, & Cordeiro, 2018Figueiredo, A., Maior, M. V., Sousa, S., Ribeiro, E., & Cordeiro, L. (2018). Comportamentos de risco em adolescentes: estudo exploratório centrado nas diferenças entre rapazes e raparigas. Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente, 9(2), 93-102. http://revistas.lis.ulusiada.pt/index.php/rpca/article/view/2713
http://revistas.lis.ulusiada.pt/index.ph...
).

A partir da puberdade acontecem diversas mudanças com o adolescente. Dentre as alterações que costumam ocorrer nessa fase, estão as mudanças cognitivas. O desenvolvimento cognitivo do adolescente é fundamental para determinar o seu engajamento em comportamentos que são favoráveis ou prejudiciais a sua saúde. Além disso, é comum que os adolescentes interpretem determinados eventos do presente ou do passado como extremamente dolorosos e sofram em demasia por sentirem as emoções de forma muito intensa (Figueiredo et al., 2018Figueiredo, A., Maior, M. V., Sousa, S., Ribeiro, E., & Cordeiro, L. (2018). Comportamentos de risco em adolescentes: estudo exploratório centrado nas diferenças entre rapazes e raparigas. Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente, 9(2), 93-102. http://revistas.lis.ulusiada.pt/index.php/rpca/article/view/2713
http://revistas.lis.ulusiada.pt/index.ph...
). A adolescência é um período marcado por mudanças significativas e de maior vulnerabilidade cognitiva e emocional, sendo que o adolescente pode se tornar mais propenso a sofrer com os efeitos de eventos adversos e pode estar mais predisposto a se engajar em comportamentos prejudiciais, como os comportamentos autolesivos (Ministério da Saúde, 2008Ministério da Saúde. (2008). Saúde do adolescente: competências e habilidades. Ministério da Saúde. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_adolescente_competencias_habilidades.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
; Proaño, 2018Proaño, V. J. C. (2018). La relación entre experiencias de trauma infantil y comportamiento de riesgos suicida. Revista Médica Electrónica Portales Medicos, 6(1), 1-9. https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/psiquemag/article/view/148/140
https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/ps...
).

Quando uma pessoa vivencia um ou mais eventos traumáticos (ET), ela está em risco de sofrer trauma psicológico (TP). Neste ponto, é possível afirmar que ET são fortes indicadores da presença de TP. Por ET, entende-se que são acontecimentos que representam ameaça à integridade física e mental da pessoa ou de terceiros e que têm potencial de provocar grande abalo físico, moral ou mental, além de sintomas psicopatológicos (American Psychiatric Association [APA], 2014American Psychiatric Association [APA]. (2014). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5th ed.). APA.). Um ET pode desencadear TP quando a pessoa percebe o evento como sendo ameaçador, horrível e/ou catastrófico, e quando tal evento é capaz de provocar medo intenso e sobrecarregar o indivíduo emocionalmente (Moraes, Rocha, 2017Moraes, L. S. K., & Rocha, F. N. (2017). Resiliência no Trauma - a possibilidade de manejo na Terapia Cognitivo-Comportamental. Revista Mosaico, 8(1), 3-10. https://doi.org/10.21727/rm.v8i1.910
https://doi.org/https://doi.org/10.21727...
). Pode-se dizer que TP diz respeito a uma condição psicológica que teve origem em experiências estressantes do passado que foram temidas e avaliadas pelo indivíduo como negativas, mas que se manifesta no presente, gerando lembranças dolorosas e causando diversos prejuízos adaptativos.

Experiências traumáticas e, inclusive, TP podem ocorrer em qualquer idade. No entanto, a população infanto-juvenil é exposta com maior frequência a situações traumáticas. No Brasil, por exemplo, crianças e adolescentes são as principais vítimas de violência (Soares, Depaoli, Lentsck, Soares, Birolim, & Higarashi, 2017Soares, L. G., Depaoli, L. B., Lentsck, M. H., Soares, L. G., Birolim, M. M., & Higarashi, I. H. (2017). Violações por violência de direitos fundamentais de crianças e adolescentes. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, 18(6), 734-741. https://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000600005
https://doi.org/https://doi.org/10.15253...
). Quando TP ocorre na infância, seus efeitos podem se estender para outras fases da vida como a adolescência e a idade adulta. De acordo com a teoria do ecobiodesenvolvimento de Shonkoff (2012Shonkoff, J. P. (2012). Leveraging the biology of adversity to address the roots of disparities in health and development. Proceedings of the National Academy of Science of the United States of America, 109, 17302-17307. https://doi.org/10.1073/pnas.1121259109
https://doi.org/https://doi.org/10.1073/...
), crianças que vivenciam experiências adversas de forma contínua podem desenvolver respostas fisiológicas ao estresse tóxico, prejudiciais ao desenvolvimento, e apresentar problemas desenvolvimentais. Essas crianças, devido à ação do cortisol, podem ter o sistema nervoso afetado, o que acaba prejudicando a atividade do sistema imunológico e de processos cognitivos como a memória, além de interferir no funcionamento emocional e na aprendizagem da criança a curto, médio e longo prazo (Branco & Linhares, 2018Branco, M. S. S., & Linhares, M. B. M. (2018). The toxic stress and its impact on development in the Shonkoff’s Ecobiodevelopmental Theorical approach. Estudos de Psicologia (Campinas), 35(1), 89-98. https://doi.org/10.1590/1982-02752018000100009
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
; Shonkoff, Richter, van der Gaag, & Bhutta, 2012Shonkoff, J. P., Richter, L., van der Gaag, J., & Bhutta, Z. A. (2012). An integrated scientific framework for child survival and early childhood development. Pediatrics, 129(2), 460-472. https://doi.org/10.1542/peds.2011-0366
https://doi.org/https://doi.org/10.1542/...
).

As experiências traumáticas mais comuns à fase da infância normalmente estão relacionadas aos maus-tratos, que podem ser acidentais ou intencionais. Quando os maus-tratos são realizados de forma acidental, o agressor não tem a intenção de fazer mal à criança e, nestes casos, a violência acontece por descuido, por impossibilidade de proteger a criança ou dificuldade para fornecer o que ela necessita para viver de forma digna. Já no caso dos maus-tratos intencionais, o agressor realiza a violência na intenção de machucar a vítima ou de obter algum benefício por meio dela sem se importar com as consequências negativas que o ato poderá implicar na vida da criança (Soares et al., 2017Soares, L. G., Depaoli, L. B., Lentsck, M. H., Soares, L. G., Birolim, M. M., & Higarashi, I. H. (2017). Violações por violência de direitos fundamentais de crianças e adolescentes. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, 18(6), 734-741. https://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000600005
https://doi.org/https://doi.org/10.15253...
).

Essas experiências traumáticas comuns à fase da infância podem ser classificadas em violência física, violência psicológica, violência sexual, negligência e abandono. A violência física consiste no uso da força física para machucar o outro de forma intencional. Esse tipo de violência resulta ou tem uma alta probabilidade de ocasionar danos à saúde, sobrevivência, desenvolvimento ou dignidade da pessoa. A violência física contra a criança pode ser realizada de forma direta com chutes, tapas, socos, beliscões etc., ou, de forma indireta, com castigos que resultem em danos físicos como deixar a criança sem água para beber ou alimento, propositalmente, ou impedir a criança de dormir (Silva, Carvalho, 2017Silva, S. R., & Carvalho, E. R. (2017). A atuação do Conselho Tutelar com crianças e adolescentes vítimas de violência. Revista Eletrônica Organizações e Sociedade, 6(6), 126-137. https://doi.org/10.29031/ros.v6i6.306
https://doi.org/https://doi.org/10.29031...
; Soares et al., 2017Soares, L. G., Depaoli, L. B., Lentsck, M. H., Soares, L. G., Birolim, M. M., & Higarashi, I. H. (2017). Violações por violência de direitos fundamentais de crianças e adolescentes. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, 18(6), 734-741. https://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000600005
https://doi.org/https://doi.org/10.15253...
). A violência psicológica ocorre quando o agressor se comporta, com frequência, de modo a rebaixar ou negar o modo de ser da criança, causando sofrimento e gerando danos a sua autoestima, a sua identidade ou ao seu desenvolvimento (Silva, Assumpção, 2018Silva, P. C. M., & Assumpção, A. A. (2018). Relação entre violência psicológica e depressão em mulheres: revisão narrativa. Pretextos - Revista da Graduação em Psicologia da PUC Minas, 3(6), 102-115. http://periodicos.pucminas.br/index.php/pretextos/article/view/18408
http://periodicos.pucminas.br/index.php/...
). Assim, a violência psicológica contra a criança pode consistir na privação de afeto, humilhações, intimidações, ameaças e agressões verbais, tais como insultos e xingamentos que tenham como objetivo principal envergonhar, pressionar e censurar a criança (Ferreira, Porto, 2018Ferreira, S., & Porto, D. (2018). Combate à violência contra crianças e adolescentes: desafio para a sociedade brasileira. Revista Bioética, 26(1), 7-11. https://doi.org/10.1590/1983-80422018261000
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
).

Violência sexual diz respeito a qualquer comportamento de natureza sexual que é realizado sem o consentimento de uma das partes (Decker, Wood, Ndinda, Yenokyan, Sinclair, Maksud, Ross, Omondi, Ndirangu, 2018Decker, M. R., Wood, S. N., Ndinda, E., Yenokyan, G., Sinclair, J., Maksud, N., Ross, B., Omondi, B., & Ndirangu, M. (2018). Sexual violence among adolescent girls and young women in Malawi: a cluster-randomized controlled implementation trial of empowerment self-defense training. BMC Public Health, 18(1), 1341-1352. https://doi.org/10.1186/s12889-018-6220-0
https://doi.org/https://doi.org/10.1186/...
; Vaner, Narciso, & Langoni, 2013Vaner, L., Narciso, J., & Langoni, R. C. (2013). Lei Maria da Penha: Lei nº 11.340/2006. [Apresentação de trabalho]. 1º Semana Científica do Curso de Direito da Unitri, Uberlândia, Minas Gerais, Brasil.). A violência sexual pode ocorrer mediante contato físico (por meio de toques, carícias, sexo oral, masturbação ou relações com penetração) ou sem contato físico (o que engloba ligações telefônicas com teor sexual, voyeurismo, imagens pornográficas, assédio sexual e exibicionismo) (Magni, Correa, 2016Magni, A. C. C., & Correa, J. J. (2016). Infância e violência sexual: um olhar sobre a vulnerabilidade da criança. Revista Pleiade, 10(19), 53-60. https://pleiade.uniamerica.br/index.php/pleiade/article/view/324/440
https://pleiade.uniamerica.br/index.php/...
). O tipo de violência sexual mais frequente entre crianças e adolescentes é o abuso sexual, que diz respeito ao abuso da sexualidade de uma criança ou adolescente para praticar qualquer ato de natureza sexual de maneira forçada (Ministério da Saúde, 2008Ministério da Saúde. (2008). Saúde do adolescente: competências e habilidades. Ministério da Saúde. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_adolescente_competencias_habilidades.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
; Soares et al., 2017Soares, L. G., Depaoli, L. B., Lentsck, M. H., Soares, L. G., Birolim, M. M., & Higarashi, I. H. (2017). Violações por violência de direitos fundamentais de crianças e adolescentes. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, 18(6), 734-741. https://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000600005
https://doi.org/https://doi.org/10.15253...
). Outros tipos de violência sexual comuns no período infanto-juvenil são o estupro de vulnerável e a exploração sexual. O estupro de vulnerável é considerado o tipo mais grave de violência sexual, na qual o agressor usa de força física, violência psicológica, constrange e ameaça a vítima com menos de 14 anos para obter qualquer vantagem sexual. A exploração sexual consiste no aproveitamento dos que têm menos de 18 anos de idade para fins sexuais na intenção de obter lucros, objetos de valor ou outros elementos de troca (Ferreira, Porto, 2018Ferreira, S., & Porto, D. (2018). Combate à violência contra crianças e adolescentes: desafio para a sociedade brasileira. Revista Bioética, 26(1), 7-11. https://doi.org/10.1590/1983-80422018261000
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
; Soares et al., 2017Soares, L. G., Depaoli, L. B., Lentsck, M. H., Soares, L. G., Birolim, M. M., & Higarashi, I. H. (2017). Violações por violência de direitos fundamentais de crianças e adolescentes. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, 18(6), 734-741. https://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000600005
https://doi.org/https://doi.org/10.15253...
).

Negligência se trata da incapacidade dos responsáveis pela criança de prestar os cuidados básicos que são necessários para que ela viva com saúde e dignidade, tais como alimentação, higiene, educação, cuidados médicos, vestuário e moradia. Ou seja, a negligência contra a criança consiste na falha em prover, quando se tem recursos disponíveis, o seu desenvolvimento saudável e o seu bem-estar (Stoltenborgh, Bakermans-Kranenburg, & Van Ijzendoorn, 2013Stoltenborgh, M., Bakermans-Kranenburg, M. J., & van Ijzendoorn, M. H. (2013). The neglect of child neglect: a meta-analytic review of the prevalence of neglect. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, 48(3), 345-355. https://doi.org/10.1007/s00127-012-0549-y
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
). A negligência pode ser classificada em física, emocional e educacional. Quando as necessidades físicas da pessoa não são atendidas, pode-se dizer que ela está sofrendo negligência. O não fornecimento de roupas limpas, nutrição adequada e higiene pessoal são exemplos de negligência física. A negligência emocional ocorre quando as necessidades emocionais da pessoa não são atendidas e pode incluir a incapacidade de oferecer afeto. A negligência educacional ocorre quando os responsáveis falham em fornecer a supervisão necessária para garantir a educação da criança, como permitir que ela se ausente com frequência das aulas escolares sem justificativa (Stoltenborgh et al., 2013Stoltenborgh, M., Bakermans-Kranenburg, M. J., & van Ijzendoorn, M. H. (2013). The neglect of child neglect: a meta-analytic review of the prevalence of neglect. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, 48(3), 345-355. https://doi.org/10.1007/s00127-012-0549-y
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
). O abandono acontece quando as pessoas responsáveis pelo cuidado, pela guarda ou vigilância da criança se ausentam. O abandono pode ser classificado em físico ou afetivo. O abandono físico consiste em desassistir a criança de moradia, não assegurar seu bem-estar material, a integridade de sua vida e a manutenção da sua saúde (Correa, 2019Correa, F. C. (2019). O preço do afeto: a responsabilidade civil pelo abandono afetivo. Anales de la Facultad de Ciencias Juridicas y Sociales de la Universidad Nacional de La Plata, 49(16), 31-56. https://doi.org/10.24215/25916386e002
https://doi.org/https://doi.org/10.24215...
; Thums, Fonseca, 2016Thums, G., & Fonseca, A. C. C. (2016). Abandono: um problema moral ou penal? Revista da Faculdade de Direito da FMP, 11, 74-94. https://revistas.fmp.edu.br/index.php/FMP-Revista/article/view/24.
https://revistas.fmp.edu.br/index.php/FM...
). Já o abandono afetivo diz respeito ao não provimento de afeto (Correa, 2019Correa, F. C. (2019). O preço do afeto: a responsabilidade civil pelo abandono afetivo. Anales de la Facultad de Ciencias Juridicas y Sociales de la Universidad Nacional de La Plata, 49(16), 31-56. https://doi.org/10.24215/25916386e002
https://doi.org/https://doi.org/10.24215...
).

A exposição a ET pode colocar em risco a integridade física e psicológica do indivíduo. Há evidências de que viver situações traumáticas tem relação com o retardo no desenvolvimento cognitivo, motor e de linguagem, problemas no sono, instabilidade emocional, fobias, depressão, insegurança, comportamentos evitativos e comportamentos agressivos com outros e consigo mesmo (Figueiredo, Dell’aglio, Silva, Souza, & Argimon, 2013Figueiredo, A. L., Dell’aglio, J. C., Silva, T. L., Souza, L. D., & Argimon, I. L. (2013). Trauma infantil e sua associação com transtornos do humor na vida adulta: uma revisão sistemática. Psicologia em Revista, 19(3), 480-496. https://doi.org/10.5752/P.1678-9563.2013v19n3p480
https://doi.org/https://doi.org/10.5752/...
). Também há evidências de que uma das consequências negativas dos ET infantis é o envolvimento em comportamentos autolesivos, um fenômeno que tem chamado atenção mais recentemente, alcançando status de questão de saúde pública (Ministério da Saúde, 2008Ministério da Saúde. (2008). Saúde do adolescente: competências e habilidades. Ministério da Saúde. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_adolescente_competencias_habilidades.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
; Proaño, 2018Proaño, V. J. C. (2018). La relación entre experiencias de trauma infantil y comportamiento de riesgos suicida. Revista Médica Electrónica Portales Medicos, 6(1), 1-9. https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/psiquemag/article/view/148/140
https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/ps...
).

Os comportamentos autolesivos podem ser definidos como sendo a imposição de danos e/ou de dor, de forma deliberada, a tecidos corporais, com ou sem intenção suicida (Nock, 2009Nock, M. K. (2009). Why do people hurt themselves? New insights into the nature and functions of self-injury. Current Directions in Psychological Science, 18(2), 78-83. https://doi.org/10.1111/j.1467-8721.2009.01613.x
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
; Nock, Prinstein, & Sterba, 2009Nock, M. K., Prinstein, M., & Sterba, S. (2009). Revealing the form and function of self-injurious thoughts and behaviors: a real-time ecological assessment study among adolescents and young adults. Journal of Abnormal Psychology , 118(4), 816-827. https://doi.org/10.1037/a0016948
https://doi.org/https://doi.org/10.1037/...
). Nock (2009)Nock, M. K. (2009). Why do people hurt themselves? New insights into the nature and functions of self-injury. Current Directions in Psychological Science, 18(2), 78-83. https://doi.org/10.1111/j.1467-8721.2009.01613.x
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
propôs um modelo integrativo de explicação para a autolesão, que considera visões de diversas abordagens e defende que tal comportamento resulta da combinação de vários fatores sociais e pessoais. Ainda de acordo com Nock (2009)Nock, M. K. (2009). Why do people hurt themselves? New insights into the nature and functions of self-injury. Current Directions in Psychological Science, 18(2), 78-83. https://doi.org/10.1111/j.1467-8721.2009.01613.x
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
, tais fatores podem influenciar não apenas o início da prática autolesiva como podem contribuir para que ela se mantenha.

O comportamento autolesivo mais comum é o corte na pele (cutting), mas outros tipos comuns desse comportamento são bater, arranhar e queimar a si mesmo. Também podem ser consideradas práticas autolesivas: utilizar substâncias químicas para ferir a própria pele, fazer uso de drogas ilícitas na intenção de se autoagredir e ingerir uma quantidade de medicação muito acima do que foi prescrito pelo médico ou da dose terapêutica recomendada (Nock, 2010Nock, M. K. (2010). Self-injury. Annual Review of Clinical Psychology, 6, 339-363. https://doi.org/10.1146/annurev.clinpsy.121208.131258
https://doi.org/https://doi.org/10.1146/...
; Proaño, 2018Proaño, V. J. C. (2018). La relación entre experiencias de trauma infantil y comportamiento de riesgos suicida. Revista Médica Electrónica Portales Medicos, 6(1), 1-9. https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/psiquemag/article/view/148/140
https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/ps...
). No que diz respeito à região, os braços, as mãos, os pulsos, as coxas e a barriga são as regiões mais afetadas (Nock, 2009Nock, M. K., Prinstein, M., & Sterba, S. (2009). Revealing the form and function of self-injurious thoughts and behaviors: a real-time ecological assessment study among adolescents and young adults. Journal of Abnormal Psychology , 118(4), 816-827. https://doi.org/10.1037/a0016948
https://doi.org/https://doi.org/10.1037/...
, 2010Nock, M. K. (2010). Self-injury. Annual Review of Clinical Psychology, 6, 339-363. https://doi.org/10.1146/annurev.clinpsy.121208.131258
https://doi.org/https://doi.org/10.1146/...
).

O comportamento autolesivo é mais comum entre adolescentes em comparação a outras faixas etárias. Mais especificamente, em todo o mundo, a autolesão tem sido mais praticada por indivíduos que têm entre 12 e 14 anos de idade (Fonseca, Silva, Araújo, & Botti, 2018Fonseca, P. H. N. D., Silva, A. C., Araújo, L. M. C. D., & Botti, N. C. L. (2018). Autolesão sem intenção suicida entre adolescentes. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 70(3), 246-258. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672018000300017
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
; Nock, 2010Nock, M. K. (2010). Self-injury. Annual Review of Clinical Psychology, 6, 339-363. https://doi.org/10.1146/annurev.clinpsy.121208.131258
https://doi.org/https://doi.org/10.1146/...
). Acredita-se que isso ocorre porque os adolescentes ainda não conseguem manejar de forma eficaz as próprias emoções, executando a autolesão numa tentativa de se adaptarem às situações que interpretam como estressantes (Santos & Faro, 2018Santos, L. C. S., & Faro, A. (2018). Aspectos conceituais da conduta autolesiva: uma revisão teórica. Psicologia em Pesquisa, 12(1), 5-14. https://doi.org/10.24879/201800120010092
https://doi.org/https://doi.org/10.24879...
; Zappe & Dell’Aglio, 2016Zappe, J. G., & Dell’Aglio, D. D. (2016). Adolescência em diferentes contextos de desenvolvimento: risco e proteção em uma perspectiva longitudinal. Psico, 47(2), 99-110. https://doi.org/10.15448/1980-8623.2016.2.21494
https://doi.org/https://doi.org/10.15448...
).

Além disso, entre adolescentes, o comportamento autolesivo pode ter a função de fornecer alívio temporário frente a sintomas psicopatológicos, de agir como um mecanismo de autorregulação interna face a estados emocionais e cognitivos negativos ou mesmo como uma tentativa de influenciar o comportamento de outros (Nock, Prinstein, & Sterba, 2009Nock, M. K., Prinstein, M., & Sterba, S. (2009). Revealing the form and function of self-injurious thoughts and behaviors: a real-time ecological assessment study among adolescents and young adults. Journal of Abnormal Psychology , 118(4), 816-827. https://doi.org/10.1037/a0016948
https://doi.org/https://doi.org/10.1037/...
). Um dos motivos que levam adolescentes a se autolesionarem diz respeito ao desejo de atrair atenção para si ou de receber cuidados. Além disso, aqueles que têm dificuldade para pedir ajuda ou de expressar seus sentimentos por meio da fala podem recorrer a autolesão como uma forma de sinalizar que necessitam de ajuda ou de comunicar suas dores emocionais (Jacobson & Batejan, 2014Jacobson, C. M., & Batejan, K. (2014). Comprehensive theoretical models of nonsuicidal self-injury. In M. K. Nock (Ed.), The Oxford handbook of suicide and self-injury (pp. 308-320). Oxford University Press.; Nock & Prinstein, 2004Nock, M. K., & Prinstein, M. J. (2004). A functional approach to the assessment of self-mutilative behavior. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 72, 885-890. https://doi.org/ 10.1037/0022-006X.72.5.885
https://doi.org/https://doi.org/ 10.1037...
).

A autolesão entre adolescentes também pode se dar por contágio. Eles podem imitar o comportamento autolesivo ao observar que este pode resultar em benefícios, como o recebimento de afeto, ou se quem pratica a autolesão é visto como alguém com uma posição social superior (Favazza, 1989Favazza, A. R. (1989). Why patients mutilate themselves. Hospital and Community Psychiatry, 40(2), 137-145. https://doi.org/10.1176/ps.40.2.137
https://doi.org/https://doi.org/10.1176/...
). Adolescentes também podem cometer autolesão por influência dos amigos, reproduzindo a ação realizada pelos pares, muitas vezes para se sentirem pertencentes a algum grupo (Nock & Prinstein, 2005Nock, M. K., & Prinstein, M. J. (2005). Contextual features and behavioral functions of self-mutilation among adolescents. Journal of Abnormal Psychology, 114, 140-146. https://doi.org/10.1037/0021-843X.114.1.140
https://doi.org/https://doi.org/10.1037/...
).

Os prejuízos associados à prática de comportamentos autolesivos são vários. Um deles é o risco de morte, pois, ainda que a pessoa não se autolesione com a intenção de cometer suicídio, pode ocorrer morte por acidente. Um ato de autolesão como o cutting, por exemplo, pode levar à morte acidental quando a pessoa atinge uma artéria ao provocar cortes profundos em seu pulso (Nock, 2009Nock, M. K. (2009). Why do people hurt themselves? New insights into the nature and functions of self-injury. Current Directions in Psychological Science, 18(2), 78-83. https://doi.org/10.1111/j.1467-8721.2009.01613.x
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
). A prática de comportamentos autolesivos também pode provocar marcas e cicatrizes, gerar sentimentos negativos como vergonha e culpa, isolamento, abuso de substâncias e desencadear transtornos mentais comuns (Nock et al., 2009Nock, M. K., Prinstein, M., & Sterba, S. (2009). Revealing the form and function of self-injurious thoughts and behaviors: a real-time ecological assessment study among adolescents and young adults. Journal of Abnormal Psychology , 118(4), 816-827. https://doi.org/10.1037/a0016948
https://doi.org/https://doi.org/10.1037/...
; Plener, Schumacher, Munz, & Groschwitz, 2015Plener, P. L., Schumacher, T. S., Munz, L. M., & Groschwitz, R. C. (2015). The longitudinal course of non-suicidal self-injury and deliberate self-harm: a systematic review of the literature. Borderline Personality Disorder and Emotion Dysregulation, 2(2), 1-11. https://doi.org/10.1186/s40479-014-0024-3
https://doi.org/https://doi.org/10.1186/...
).

Como um todo, vê-se que experiências traumáticas infantis e comportamentos autolesivos estão relacionados a diversos prejuízos para a saúde física e mental e são considerados problemas de saúde pública. Além disso, esses problemas afetam, principalmente, o público infanto-juvenil, o qual se configura como um público mais vulnerável. Enfim, frente à necessidade de se dar mais atenção aos problemas psicológicos e comportamentais que acometem crianças e adolescentes e de investigar melhor sobre a sua manifestação, a presente pesquisa teve como objetivo verificar a relação entre ET na infância e a ocorrência de comportamentos autolesivos em adolescentes.

Método

Participantes

Participaram 494 estudantes do ensino médio de cinco escolas de Aracaju - Sergipe, sendo três públicas e duas privadas. Quanto à localização das escolas, estavam situadas em diferentes regiões da cidade: uma das escolas privadas estava no centro, a outra escola privada na zona sul e as escolas públicas em diferentes bairros da zona norte da cidade. O tipo de escola e região onde as escolas estavam situadas pode servir como um indicador da situação socioeconômica dos estudantes. Escolas particulares localizadas nos bairros da zona sul ou do centro usualmente são frequentadas por estudantes de condição socioeconômica mais elevada em comparação aos estudantes das escolas públicas dos bairros da zona norte de Aracaju (IBGE, 2020Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE]. (2020). Mapas do Brasil - Desigualdade socioeconômica. IBGE. https://atlasescolar.ibge.gov.br/mapas-atlas/mapas-do-brasil/desigualdade-socioeconomica.html
https://atlasescolar.ibge.gov.br/mapas-a...
).

A coleta de dados ocorreu em setembro de 2019 em período diurno (manhã e tarde). Quanto ao método de recrutamento dos participantes, a pesquisa foi de caráter acidental e se deu por conveniência. Os critérios de inclusão foram estar na sala de aula no momento da aplicação dos questionários de pesquisa e ter entregado no dia da pesquisa o termo de anuência assinado pelos pais. Os critérios de exclusão foram não ser aluno do ensino médio e possuir incapacidade neurológica ou psiquiátrica (autodeclarada) que inviabilizasse a participação na pesquisa devido a comprometimento cognitivo que pudesse dificultar a compreensão dos itens dos questionários, das instruções para pesquisa ou mesmo entendimento a respeito dos objetivos da participação no estudo.

Instrumentos

Questionário sociodemográfico. Instrumento aplicado para a obtenção de informações sobre o adolescente, tais como idade (em anos), sexo (masculino ou feminino) e tipo de escola na qual estava estudando no momento da pesquisa (pública ou privada).

Questionário sobre Traumas na Infância (QUESI). O QUESI tem como objetivo mensurar diversas formas de violência ocorridas durante a infância e adolescência. Brodski, Zanon e Hutz (2010Brodski, S. K., Zanon, C., & Hutz, C. S. (2010). Adaptação e validação do questionário sobre traumas na infância (QUESI) para uma amostra não clínica. Avaliação Psicológica, 9(3), 499-501. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v9n3/v9n3a17.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v9n3/v...
) realizaram a validação do QUESI para o contexto brasileiro utilizando uma amostra não clínica. Os autores constataram que a versão proposta por eles possui validade fatorial e índices de consistência interna satisfatórios. Essa versão do QUESI contém três fatores: abuso emocional, abuso físico e abuso sexual. Ao todo, são 21 itens voltados para adolescentes a partir dos 12 anos de idade e para adultos. O modelo de resposta da escala é Likert de cinco pontos, no qual “1” significa que nunca ocorreu, “2” significa que ocorreu poucas vezes, “3” significa que ocorreu às vezes, “4” significa que ocorreu muitas vezes e “5” significa que ocorreu sempre. Por meio da soma de todos os itens da escala é possível obter um escore total, mas escores por fator também podem ser obtidos, somando-se os itens de cada fator separadamente (Brodski et al., 2010Brodski, S. K., Zanon, C., & Hutz, C. S. (2010). Adaptação e validação do questionário sobre traumas na infância (QUESI) para uma amostra não clínica. Avaliação Psicológica, 9(3), 499-501. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v9n3/v9n3a17.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v9n3/v...
).

Inventário de Autolesão Deliberada (IAD-r). Para a mensuração dos comportamentos autolesivos foi utilizado o Inventário de Autolesão Deliberada (IAD-r) (Menezes & Faro, no preloMenezes, M. S., & Faro, A. (No prelo). Tradução e validade psicométrica do deliberate self-harm inventory (DSHI-s). Psico-USF.). O IAD-r consiste na tradução para o português da versão simplificada do Deliberate Self-Harm Inventory (DSHI-s) (Lundh, Karim, & Quilisch, 2007Lundh, L. G., Karim, J., & Quilisch, E. V. A. (2007). Deliberate self harm in 15 year old adolescents: a pilot study with a modified version of the Deliberate Self Harm Inventory. Scandinavian Journal of Psychology, 48(1), 33-41. https://doi.org/10.1111/j.1467-9450.2007.00567.x
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
). Além da tradução, também foram realizadas adaptações transculturais e a validação do IAD-r que revelou ser um instrumento com boas propriedades psicométricas. O IAD-r é unifatorial e possui 15 itens de formato Likert com quatro opções de resposta (“nunca”, “uma vez”, “mais que uma vez” ou “muitas vezes”). O escore total é calculado a partir da soma das pontuações em todos os itens. Quanto mais alta for a pontuação, maior gravidade do comportamento autolesivo.

Procedimentos éticos

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) com seres humanos da Universidade Federal de Sergipe (UFS) (CAAE: 10257918.1.0000.5546). Antes da coleta dos dados, uma vez tendo sido aprovado o projeto e mediante a permissão das escolas, a autorização dos pais dos adolescentes foi solicitada, de modo que as cartas de anuência aos pais ou responsáveis foram entregues aos estudantes. Responderam à pesquisa apenas os estudantes que levaram o termo de anuência assinado no dia da coleta, atestando a concordância dos pais em participar da pesquisa. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi apresentado, explicado e entregue durante a coleta de dados antes da distribuição dos questionários. Aqueles que demonstraram desinteresse em responder o questionário ou os que se recusaram a assinar o TCLE foram liberados de participar da pesquisa. Os estudantes responderam os questionários individualmente, porém a aplicação se deu de forma coletiva nas salas de aula. Psicólogos e estudantes de psicologia, previamente treinados, auxiliaram na condução da coleta de dados.

Análise de dados

A análise dos dados foi conduzida por meio do programa Statistical Package for the Social Science v20 (SPSS versão 20). Foram feitas análises exploratórias no intuito de verificar os pressupostos dos testes estatísticos, além de análises descritivas para obter os escores finais das escalas, frequências, médias e desvios-padrão.

Quanto à categorização das variáveis, os participantes que responderam 0 (zero) para todos os itens do DSHI-s foram incluídos no grupo “ausência de comportamentos autolesivos”, já os que atingiram escore maior ou igual a 1 compuseram o grupo “presença de comportamentos autolesivos”. Para avaliação dos ET infantis, a partir do escore médio obtido em cada fator do QUESI foram criadas três variáveis dicotômicas: abuso emocional, abuso físico e abuso sexual.

  • No fator abuso emocional, o primeiro grupo foi constituído pelos participantes que obtiveram pontuação abaixo de 1 no escore médio, ou seja, por aqueles que nunca sofreram este tipo de abuso ou que o sofreram numa frequência ou intensidade muito baixas. Já para o segundo grupo deste fator foram alocados os adolescentes que pontuaram acima de 1.

  • No fator abuso sexual, a primeira categoria foi composta pelos participantes que pontuaram igual a zero no escore médio deste fator, ou seja, pelos que afirmaram nunca ter sido vítimas de abuso sexual, já os que pontuaram acima de 0, revelando já ter sofrido este tipo de violência, compuseram o segundo estrato.

  • No fator abuso físico, um dos estratos foi formado por aqueles adolescentes que exibiram escore igual a zero e o outro estrato por aqueles que pontuaram acima de zero.

  • Cabe destacar que a variável abuso emocional foi categorizada a partir de um ponto de corte diferente dos demais, pois foi percebido que, ao contrário dos outros dois fatores, a primeira opção de resposta na maioria dos itens do fator abuso emocional não refletia agressões mais graves.

Em seguida, foi realizada uma análise de Regressão Logística Binomial, de modo que a variável comportamento autolesivo foi classificada como variável dependente (VD) e as variáveis abuso emocional, abuso sexual e abuso físico foram adicionadas ao modelo como variáveis independentes/explicativas (VIs). Também foi realizada uma análise de moderação a fim de verificar a interação entre a ocorrência de ET na infância e a prática de comportamentos autolesivos a depender do sexo (masculino ou feminino) e da idade (mais novos de 15 ou 16 anos ou mais velhos de 17 ou 18 anos) dos participantes. Esta análise foi conduzida no SPSS, utilizando-se o PROCESS (versão 3.4) (Darlington, Hayes, 2016Darlington, R. B., & Hayes, A. F. (2016). Regression analysis and linear models: concepts, applications, and implementation. Guilford Publications.).

Resultados

A idade dos participantes variou de 15 a 18 anos (M = 16,4; DP = 0,98), sendo que 54,7% (n = 270) eram do sexo feminino e 45,3% (n = 224) do sexo masculino. Pouco mais da metade dos adolescentes eram estudantes do ensino público (53,4%, n = 264) e 46,6% (n = 230) de escolas particulares. No que diz respeito a série escolar, 34,6% (n = 171) estavam cursando o primeiro ano do ensino médio, 39,7% (n = 196) estavam no segundo e 25,7% (n = 127) no terceiro ano.

No que se refere à ocorrência de ET durante a infância na amostra pesquisada, a pontuação média da amostra no escore total do QUESI foi igual a 17,6 (DP = 11,82) e a pontuação média para o escore médio (ou seja, o resultado dentro da escala de resposta da pesquisa, que variou de 0 a 4) foi igual a 2,8 (DP = 0,84). Dos participantes, 58,5% (n = 289) afirmaram ter sofrido abuso emocional de forma recorrente, 19,0% (n = 94) ter sofrido abuso sexual e 59,5% (n = 294) ter sido vítima de abuso físico na infância. Quanto à prática de comportamentos autolesivos, 35,0% (n = 173) dos adolescentes informaram nunca ter praticado autolesão, ao passo que 65,0% (n = 321) revelaram já ter se engajado em comportamentos autolesivos pelo menos uma vez.

Tabela 1
Estatística descritiva do Questionário Sobre Traumas na Infância (QUESI), do Inventário de Autolesão Deliberada e ocorrência de abuso em adolescentes (n = 494, Sergipe, Brasil).

Na análise de Regressão Logística (Tabela 2), o modelo obtido apresentou indicadores satisfatórios e foi capaz de prever corretamente aproximadamente 70% dos casos. Todos os tipos de ET analisados exibiram associação significativa com a prática de comportamentos autolesivos no modelo de regressão. Os adolescentes que sofreram abuso emocional na infância exibiram aproximadamente duas vezes (OR = 2,4) mais chances de praticar autolesão em comparação àqueles que nunca sofreram este tipo de experiência traumática (p < 0,001). Aqueles que sofreram abuso sexual apresentaram quase duas vezes (OR = 1,9) mais chances de se engajarem em comportamentos autolesivos em comparação aos que não foram expostos a esse tipo de violência (p = 0,019). Os participantes que sofreram abuso físico também apresentaram quase duas vezes (OR = 1,8) mais chances de se engajarem em comportamentos autolesivos em comparação aos que nunca sofreram abuso físico (p = 0,002).

Tabela 2
Resultado da regressão logística para comportamentos autolesivos.

A partir dos resultados da análise de moderação, viu-se que as interações entre a prática de autolesão e a vivência de experiências traumáticas na infância [abuso emocional (p = 0,242; b = 0,459; t = 1,170), abuso sexual (p = 0,299; b = 0,610; t = 1,038) e abuso físico (p = 0,896; b = 0,051; t = 0,131)] não se mostraram moderadas pelo sexo. A variável idade também não exibiu efeito de moderação na interação entre autolesão e abuso emocional (p = 0,251; b = 0,454; t = -1,149) e sexual (p = 0,279; b = 0,615; t = -1,082). No entanto, o efeito de moderação da variável idade sobre a interação entre comportamento autolesivo e ter sofrido abuso físico na infância apresentou significância estatística limítrofe e indicou que os adolescentes mais novos (de 15 e 16 anos) que sofreram este tipo de abuso na infância podem se mostrar mais propensos à prática de autolesão (p = 0,064; b = 0,718; t = -1,851).

Discussão

Este estudo buscou verificar a relação entre ET infantis e a ocorrência de comportamentos autolesivos em adolescentes. Quanto à vivência de experiências traumáticas na infância, quase a metade dos participantes desta pesquisa revelou nunca ter sofrido abuso emocional ou ter sofrido numa frequência e intensidade muito baixas, ao passo que pouco mais da metade afirmou ter sofrido abuso emocional de forma recorrente. Quanto aos outros tipos de abuso, aproximadamente um em cada cinco adolescentes assumiu ter sido vítima de abuso sexual e a maioria indicou ter sofrido abuso físico pelo menos algumas vezes durante a infância. Ao comparar a frequência com os resultados de outros estudos (Baiden, Stewart, & Fallon, 2017Baiden, P., Stewart, S. L., & Fallon, B. (2017). The role of adverse childhood experiences as determinants of non-suicidal self-injury among children and adolescents referred to community and inpatient mental health settings. Child abuse & neglect, 69, 163-176. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2017.04.011
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
), nota-se que os adolescentes investigados nesta pesquisa revelaram mais alta vulnerabilidade em termos de abuso infantil. Constatou-se que a maioria (cerca de dois terços) dos adolescentes que participaram da pesquisa revelou já ter se engajado em comportamentos autolesivos pelo menos uma vez na vida. Em outros estudos, a ocorrência destes comportamentos tem sido verificada em torno de um terço nesse público (Baiden et al., 2017Baiden, P., Stewart, S. L., & Fallon, B. (2017). The role of adverse childhood experiences as determinants of non-suicidal self-injury among children and adolescents referred to community and inpatient mental health settings. Child abuse & neglect, 69, 163-176. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2017.04.011
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
; Preyde, Watkins, Carter, Lazure, White, Penney, Ashbourne, Cameron, Frensch, 2012Preyde, M., Watkins, H., Csuzdi, N., Carter, J., Lazure, K., White, S., Penney, R., Ashbourne, G., Cameron, G., Frensch, K. (2012). Non-suicidal self-injury and suicidal behaviour in children and adolescents accessing residential or intensive home-based mental health services. Journal of the Canadian Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 21(4), 270-281. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3490528/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
). Deste modo, a taxa de autolesão encontrada nesta pesquisa se mostrou bem acima das evidenciadas em outras pesquisas.

Todos os tipos de ET na infância analisados nesta pesquisa exibiram associação significativa com a prática de comportamentos autolesivos no modelo de regressão, corroborando o que tem sido evidenciado na literatura (Baiden et al., 2017Baiden, P., Stewart, S. L., & Fallon, B. (2017). The role of adverse childhood experiences as determinants of non-suicidal self-injury among children and adolescents referred to community and inpatient mental health settings. Child abuse & neglect, 69, 163-176. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2017.04.011
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
; Proaño, 2018Proaño, V. J. C. (2018). La relación entre experiencias de trauma infantil y comportamiento de riesgos suicida. Revista Médica Electrónica Portales Medicos, 6(1), 1-9. https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/psiquemag/article/view/148/140
https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/ps...
). Constatou-se que, em geral, os adolescentes tiveram de duas a duas vezes e meia mais chances de praticar autolesão em comparação àqueles que nunca sofreram estes tipos de experiências traumáticas durante a infância. Sobre isso, sabe-se que detectar os fatores de risco para a prática de autolesão é fundamental para o desenvolvimento de intervenções mais efetivas entre os adolescentes, o que se soma ao fato de que a literatura já vem apontando tais experiências adversas na infância como estando entre os fatores de risco mais consistentes para o desenvolvimento de comportamentos autolesivos (Baiden et al., 2017Baiden, P., Stewart, S. L., & Fallon, B. (2017). The role of adverse childhood experiences as determinants of non-suicidal self-injury among children and adolescents referred to community and inpatient mental health settings. Child abuse & neglect, 69, 163-176. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2017.04.011
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
; Franzke, Wabnitz, & Catani, 2015Franzke, I., Wabnitz, P., & Catani, C. (2015). Dissociation as a mediator of the relationship between childhood trauma and nonsuicidal self-injury in females: a path analytic approach. Journal of Trauma & Dissociation, 16(3), 286-302. https://doi.org/10.1080/15299732.2015.989646
https://doi.org/https://doi.org/10.1080/...
).

Tais achados reiteram que as consequências de experiências traumáticas vividas na infância relacionadas a situações de abuso podem repercutir mesmo muito tempo depois de terem acontecido, gerando dificuldades emocionais que maximizam a propensão do adolescente de se engajar em práticas autolesivas. As ações agressivas voltadas para si, na forma de autolesão, normalmente, originam-se de sensações desagradáveis intensas provocadas pelo excesso de hormônios do estresse que são liberados ao recordar a experiência traumática (Van Der Kolk, 2020Van Der Kolk, B. (2020). O corpo guarda as marcas. Sextante.).

Também foi constatado nesta pesquisa que a associação entre os diferentes tipos de abuso e a prática de autolesão não revelou influência do sexo, ou seja, a ocorrência dos ET infantis não é capaz de distinguir a propensão de meninos e meninas à autolesão. Contudo, no que diz respeito ao efeito moderador da idade na interação entre a ocorrência de abuso físico na infância e a prática de autolesão na adolescência, foi verificada uma associação limítrofe apontando para uma tendência dos mais novos serem mais suscetíveis à prática de autolesão. Mesmo a diferença de idade entre os participantes que compuseram o grupo dos mais novos (15 e 16 anos) e dos mais velhos (17 e 18 anos) não ter sido tão significativa, o resultado da moderação pode indicar que os mais novos sofrem mais com os impactos dos abusos físicos na infância, provavelmente porque dispõem de menos recursos psicológicos para lidar com as suas consequências. Além disso, acredita-se que os adolescentes mais novos podem acabar recorrendo à autolesão devido à dificuldade de utilizar estratégias de enfrentamento adaptativas.

Diante dos resultados desta pesquisa, salienta-se a necessidade de realizar intervenções psicológicas que poderão contribuir para prevenir ou tratar os problemas que acometem a população infanto-juvenil. Sugere-se que as intervenções envolvam não somente as próprias crianças e adolescentes, mas que também alcancem seus familiares e a equipe escolar. A escola pode se configurar como um local propício para o desenvolvimento de tais intervenções, uma vez que, depois da família, ela desempenha papel fundamental na vida das crianças e dos adolescentes, pois neste ambiente eles costumam passar boa parte do seu tempo (Donat, Moura, Carvalho, & Kristensen, 2016Donat, J., Moura, T. C., Carvalho, J. D. C. N., & Kristensen, C. H. (2016). Professores e maus-tratos -uma revisão teórica sobre reconhecimento, denúncia e capacitação. Educação, 39(1), 66-73. https://doi.org/10.15448/1981-2582.2016.1.20367
https://doi.org/https://doi.org/10.15448...
; Ferreira, Côrtes, & Gontijo, 2019Ferreira, C. L. S., Côrtes, M. C. J. W., & Gontijo, E. D. (2019). Promoção dos direitos da criança e prevenção de maus tratos infantis. Ciência & Saúde Coletiva, 24(11), 3997-4008. https://doi.org/10.1590/1413-812320182411.04352018
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
).

As intervenções para prevenção e controle dos ET infantis, evidentemente, devem começar na infância. No entanto, as intervenções com adolescentes são indispensáveis, pois também é preciso minimizar os impactos dos traumas psicológicos decorrentes dos ET sofridos na infância. O trabalho de intervenção para prevenção e combate do abuso infanto-juvenil junto às crianças deve ter como objetivo principal ensinar a elas a como identificar situações de risco e abusadores em potencial, a reconhecer se estiverem vivendo situações de abuso e a desenvolver habilidades de autodefesa. No trabalho de posvenção com crianças/adolescentes vítimas de abuso pode ser ensinado às crianças e aos adolescentes a ressignificar o ET e a regular as próprias emoções de forma mais adequada (Gonçalves, Silva, 2018Gonçalves, J., & Silva, J. V. A. (2018). Terapia Cognitivo-Comportamental em situação de abuso sexual: um estudo de caso. Revista Psicologia, Diversidade e Saúde, 7(3), 423-432. https://doi.org/10.17267/2317-3394rpds.v7i3.1869
https://doi.org/https://doi.org/10.17267...
; Lima, Rocha, 2018Lima, N. C., & Rocha, H. C. (2018). Terapia cognitivo comportamental para crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual. Saúde Integral, 1(1), 34-43. http://revista.camporeal.edu.br/index.php/saudeintegral/article/view/250
http://revista.camporeal.edu.br/index.ph...
). Também é recomendável promover atividades que visem a melhora da sua autoestima e autoconfiança e a redução de sentimentos negativos como medo, vergonha e culpa.

Recomenda-se que as intervenções para prevenção ou controle da autolesão junto aos adolescentes incluam abordar o tema por meio de palestras e/ou de debates no intuito de sensibilizá-los a respeito da seriedade do assunto e de promover uma psicoeducação sobre o tema. Aspectos psicológicos que podem ser trabalhados nas intervenções com os adolescentes são: o desenvolvimento da autoestima, da assertividade, da habilidade de regular as próprias emoções e da capacidade de resolver problemas e de tolerar frustrações. Outra ação possível é ensinar aos adolescentes comportamentos substitutivos do comportamento autolesivo (Evans, Parker, Russell, Mathews, Ford, Hewitt, Scourfield, Janssens, 2019Evans, R., Parker, R., Russell, A. E., Mathews, F., Ford, T., Hewitt, G., Scourfield, J., Janssens, A. (2019). Adolescent self‐harm prevention and intervention in secondary schools: a survey of staff in England and Wales. Child and adolescent mental health, 24(3), 230-238. https://doi.org/10.1111/camh.12308
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
). É indispensável, ainda, que o profissional da psicologia atue fazendo os devidos encaminhamentos daqueles adolescentes que estiverem praticando a autolesão e até mesmo dos que apresentarem histórico de maus-tratos, pois sabe-se que estes apresentam maior risco para a prática de autolesão, conforme evidenciado por Proaño (2018Proaño, V. J. C. (2018). La relación entre experiencias de trauma infantil y comportamiento de riesgos suicida. Revista Médica Electrónica Portales Medicos, 6(1), 1-9. https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/psiquemag/article/view/148/140
https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/ps...
).

Além dos próprios adolescentes, dados de diferentes estudos reiteram que os familiares são os principais responsáveis pela proteção de crianças e adolescentes, porém, muitas vezes, são eles os perpetradores dos abusos cometidos contra os infantes (Campos, Balbuena, Fraga, & López, 2018Campos, K. F. A., Balbuena, B. N. D. L. R., Fraga, J. A. G., & López, P. I. P. (2018). Efectos de la violencia doméstica en los niveles de adaptación en adolescentes. PsicoEducativa: reflexiones y propuestas, 4(7), 48-54. https://psicoeducativa.edusol.info/index.php/rpsicoedu/article/view/89
https://psicoeducativa.edusol.info/index...
). Justamente por desempenharem esse papel de protetores e outrora de agressores é que intervenções para prevenção e controle do abuso infanto-juvenil junto aos familiares são fundamentais. Com eles podem ser realizados treinamentos com caráter psicoeducativo e voltados à orientação parental, sendo que tais treinamentos poderão auxiliá-los a identificar com mais facilidade se suas crianças/adolescentes estão sendo vítimas de abusadores e a saberem como agir em caso de suspeita ou confirmação dos abusos (Faraj, Scott, & Siqueira, 2020Faraj, S. P., Scott, J. B., & Siqueira, A. C. (2020). Escola como um espaço de prevenção da violência: um relato de experiência. Barbarói, (57), 254-273. https://doi.org/10.17058/barbaroi.v0i57.11266
https://doi.org/https://doi.org/10.17058...
).

O trabalho com a família também deve incluir psicoeducação sobre os comportamentos autolesivos para que os familiares saibam reconhecer os sinais da autolesão na adolescência e quais as maneiras mais apropriadas de intervir. As intervenções com os pais e/ou outros familiares devem ajudá-los a compreender melhor as características dessa fase do desenvolvimento e capacitá-los para que tenham mais recursos para lidar com as dificuldades emocionais dos adolescentes, contribuindo para a prevenção e para o controle da autolesão. Por fim, familiares devem ser orientados para que ajam como uma fonte de apoio e segurança para os adolescentes (Fortune, Cottrell, & Fife, 2016Fortune, S., Cottrell, D., & Fife, S. (2016). Family factors associated with adolescent self‐harm: a narrative review. Journal of Family Therapy, 38(2), 226-256. https://doi.org/10.1111/1467-6427.12119
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
; Klemera, Brooks, Chester, Magnusson, & Spencer, 2017Klemera, E., Brooks, F. M., Chester, K. L., Magnusson, J., & Spencer, N. (2017). Self-harm in adolescence: protective health assets in the family, school and community. International journal of public health, 62(6), 631-638. https://doi.org/10.1007/s00038-016-0900-2
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
).

No contexto da escola, uma das ações do psicólogo é preparar a equipe para detectar casos de crianças ou adolescentes que se encontrem em situação de risco ou que estejam vivendo em condições de maus-tratos (Faraj et al., 2020Faraj, S. P., Scott, J. B., & Siqueira, A. C. (2020). Escola como um espaço de prevenção da violência: um relato de experiência. Barbarói, (57), 254-273. https://doi.org/10.17058/barbaroi.v0i57.11266
https://doi.org/https://doi.org/10.17058...
; Hasanah, Rahayu, & Kuswardinah, 2019Hasanah, A., Rahayu, S. R., & Kuswardinah, A. (2019). The effect of parenting, teacher’s role, and peers on children’s personal safety skills in Tangerang. Public Health Perspective Journal, 4(3), 164-170. https://journal.unnes.ac.id/nju/index.php/phpj/article/viewFile/19064/9351
https://journal.unnes.ac.id/nju/index.ph...
). Essa verificação possibilitará prevenir a ocorrência do abuso ou impedir a continuidade das agressões e a escola deve ser orientada a denunciar os casos suspeitos ou confirmados de abuso contra os estudantes. Também podem ser realizadas capacitações com os professores para que eles trabalhem, de forma apropriada, junto aos estudantes, temas como abuso físico, psicológico, sexual e negligência (Ferreira et al., 2019Ferreira, C. L. S., Côrtes, M. C. J. W., & Gontijo, E. D. (2019). Promoção dos direitos da criança e prevenção de maus tratos infantis. Ciência & Saúde Coletiva, 24(11), 3997-4008. https://doi.org/10.1590/1413-812320182411.04352018
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
). As intervenções do psicólogo junto à equipe escolar devem promover uma formação a respeito da autolesão entre adolescentes e tornar a equipe capacitada para reconhecer os sinais tanto físicos quanto emocionais desta prática.

Também é pertinente sensibilizar a equipe para que possam identificar possíveis problemas inerentes ao ambiente da escola que estejam causando ou agravando o comportamento autolesivo nos adolescentes, por exemplo o bullying, e sugerir formas de atenuar ou resolver tais problemas. Ao mesmo tempo, é oportuno enfraquecer o preconceito e a estigmatização por parte da própria equipe com relação àqueles estudantes dos quais já se tem conhecimento que são praticantes da autolesão e estimular o acolhimento desses estudantes. Outra ação do psicólogo deve ser orientar os educadores para que, ao observar os sinais da autolesão ou tomar conhecimento de alguns casos, relatem esses comportamentos para a família e para os órgãos competentes da rede de proteção às crianças e aos adolescentes (Evans et al., 2019Evans, R., Parker, R., Russell, A. E., Mathews, F., Ford, T., Hewitt, G., Scourfield, J., Janssens, A. (2019). Adolescent self‐harm prevention and intervention in secondary schools: a survey of staff in England and Wales. Child and adolescent mental health, 24(3), 230-238. https://doi.org/10.1111/camh.12308
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
; Klemera et al., 2017Klemera, E., Brooks, F. M., Chester, K. L., Magnusson, J., & Spencer, N. (2017). Self-harm in adolescence: protective health assets in the family, school and community. International journal of public health, 62(6), 631-638. https://doi.org/10.1007/s00038-016-0900-2
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
).

Como umas das limitações desta pesquisa, aponta-se a impossibilidade de generalização dos resultados devido ao método de amostragem ter sido por conveniência, requerendo cautela na extrapolação dos achados. Para estudos futuros, recomenda-se utilizar métodos de amostragem probabilísticos. Outra limitação desta pesquisa é que não foi investigado sobre as diferenças socioeconômicas entre os participantes, nem sobre o uso de substâncias por parte deles. Tais informações permitiriam conhecer melhor as condições que tornam os adolescentes mais vulneráveis tanto a situações traumáticas na infância como ao comportamento autolesivo, o que fica como sugestão para novas pesquisas.

Embora nesta pesquisa o efeito moderador da idade na interação entre ET na infância e comportamentos autolesivos em adolescentes tenha apresentado significância limítrofe, acredita-se que tal resultado pode indicar que quanto menor for a idade do adolescente que foi exposto a ET na infância, maior é a sua propensão para cometer autolesão. Deste modo, tendo em vista que tal afirmação se trata apenas de uma hipótese, recomenda-se que pesquisas posteriores a esta investiguem também o efeito moderador da idade junto a adolescentes do ensino fundamental maior, além do ensino médio, pois acredita-se que nesta população tal efeito pode revelar significância estatística.

Por fim, vale fazer uma observação quanto às características dos instrumentos existentes para avaliação de ET na infância. Tais escalas, de forma geral, incluindo a que foi utilizada nesta pesquisa (QUESI), não avaliam o trauma psicológico em si, mas sim a ocorrência de ET, ainda que a maioria utilize no título a expressão “traumas psicológicos” em vez de “eventos traumáticos” ou termos sinônimos. Assim, é conveniente que pesquisadores busquem desenvolver escalas para avaliar a presença de traumas psicológicos e não apenas a ocorrência de ET.

Referências

  • American Psychiatric Association [APA]. (2014). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5th ed.). APA.
  • Baiden, P., Stewart, S. L., & Fallon, B. (2017). The role of adverse childhood experiences as determinants of non-suicidal self-injury among children and adolescents referred to community and inpatient mental health settings. Child abuse & neglect, 69, 163-176. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2017.04.011
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2017.04.011
  • Branco, M. S. S., & Linhares, M. B. M. (2018). The toxic stress and its impact on development in the Shonkoff’s Ecobiodevelopmental Theorical approach. Estudos de Psicologia (Campinas), 35(1), 89-98. https://doi.org/10.1590/1982-02752018000100009
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1590/1982-02752018000100009
  • Brodski, S. K., Zanon, C., & Hutz, C. S. (2010). Adaptação e validação do questionário sobre traumas na infância (QUESI) para uma amostra não clínica. Avaliação Psicológica, 9(3), 499-501. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v9n3/v9n3a17.pdf
    » http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v9n3/v9n3a17.pdf
  • Campos, K. F. A., Balbuena, B. N. D. L. R., Fraga, J. A. G., & López, P. I. P. (2018). Efectos de la violencia doméstica en los niveles de adaptación en adolescentes. PsicoEducativa: reflexiones y propuestas, 4(7), 48-54. https://psicoeducativa.edusol.info/index.php/rpsicoedu/article/view/89
    » https://psicoeducativa.edusol.info/index.php/rpsicoedu/article/view/89
  • Correa, F. C. (2019). O preço do afeto: a responsabilidade civil pelo abandono afetivo. Anales de la Facultad de Ciencias Juridicas y Sociales de la Universidad Nacional de La Plata, 49(16), 31-56. https://doi.org/10.24215/25916386e002
    » https://doi.org/https://doi.org/10.24215/25916386e002
  • Darlington, R. B., & Hayes, A. F. (2016). Regression analysis and linear models: concepts, applications, and implementation. Guilford Publications.
  • Decker, M. R., Wood, S. N., Ndinda, E., Yenokyan, G., Sinclair, J., Maksud, N., Ross, B., Omondi, B., & Ndirangu, M. (2018). Sexual violence among adolescent girls and young women in Malawi: a cluster-randomized controlled implementation trial of empowerment self-defense training. BMC Public Health, 18(1), 1341-1352. https://doi.org/10.1186/s12889-018-6220-0
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1186/s12889-018-6220-0
  • Donat, J., Moura, T. C., Carvalho, J. D. C. N., & Kristensen, C. H. (2016). Professores e maus-tratos -uma revisão teórica sobre reconhecimento, denúncia e capacitação. Educação, 39(1), 66-73. https://doi.org/10.15448/1981-2582.2016.1.20367
    » https://doi.org/https://doi.org/10.15448/1981-2582.2016.1.20367
  • Evans, R., Parker, R., Russell, A. E., Mathews, F., Ford, T., Hewitt, G., Scourfield, J., Janssens, A. (2019). Adolescent self‐harm prevention and intervention in secondary schools: a survey of staff in England and Wales. Child and adolescent mental health, 24(3), 230-238. https://doi.org/10.1111/camh.12308
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1111/camh.12308
  • Favazza, A. R. (1989). Why patients mutilate themselves. Hospital and Community Psychiatry, 40(2), 137-145. https://doi.org/10.1176/ps.40.2.137
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1176/ps.40.2.137
  • Faraj, S. P., Scott, J. B., & Siqueira, A. C. (2020). Escola como um espaço de prevenção da violência: um relato de experiência. Barbarói, (57), 254-273. https://doi.org/10.17058/barbaroi.v0i57.11266
    » https://doi.org/https://doi.org/10.17058/barbaroi.v0i57.11266
  • Ferreira, C. L. S., Côrtes, M. C. J. W., & Gontijo, E. D. (2019). Promoção dos direitos da criança e prevenção de maus tratos infantis. Ciência & Saúde Coletiva, 24(11), 3997-4008. https://doi.org/10.1590/1413-812320182411.04352018
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1590/1413-812320182411.04352018
  • Ferreira, S., & Porto, D. (2018). Combate à violência contra crianças e adolescentes: desafio para a sociedade brasileira. Revista Bioética, 26(1), 7-11. https://doi.org/10.1590/1983-80422018261000
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1590/1983-80422018261000
  • Figueiredo, A. L., Dell’aglio, J. C., Silva, T. L., Souza, L. D., & Argimon, I. L. (2013). Trauma infantil e sua associação com transtornos do humor na vida adulta: uma revisão sistemática. Psicologia em Revista, 19(3), 480-496. https://doi.org/10.5752/P.1678-9563.2013v19n3p480
    » https://doi.org/https://doi.org/10.5752/P.1678-9563.2013v19n3p480
  • Figueiredo, A., Maior, M. V., Sousa, S., Ribeiro, E., & Cordeiro, L. (2018). Comportamentos de risco em adolescentes: estudo exploratório centrado nas diferenças entre rapazes e raparigas. Revista de Psicologia da Criança e do Adolescente, 9(2), 93-102. http://revistas.lis.ulusiada.pt/index.php/rpca/article/view/2713
    » http://revistas.lis.ulusiada.pt/index.php/rpca/article/view/2713
  • Fonseca, P. H. N. D., Silva, A. C., Araújo, L. M. C. D., & Botti, N. C. L. (2018). Autolesão sem intenção suicida entre adolescentes. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 70(3), 246-258. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672018000300017
    » http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672018000300017
  • Fortune, S., Cottrell, D., & Fife, S. (2016). Family factors associated with adolescent self‐harm: a narrative review. Journal of Family Therapy, 38(2), 226-256. https://doi.org/10.1111/1467-6427.12119
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1111/1467-6427.12119
  • Franzke, I., Wabnitz, P., & Catani, C. (2015). Dissociation as a mediator of the relationship between childhood trauma and nonsuicidal self-injury in females: a path analytic approach. Journal of Trauma & Dissociation, 16(3), 286-302. https://doi.org/10.1080/15299732.2015.989646
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1080/15299732.2015.989646
  • Gonçalves, J., & Silva, J. V. A. (2018). Terapia Cognitivo-Comportamental em situação de abuso sexual: um estudo de caso. Revista Psicologia, Diversidade e Saúde, 7(3), 423-432. https://doi.org/10.17267/2317-3394rpds.v7i3.1869
    » https://doi.org/https://doi.org/10.17267/2317-3394rpds.v7i3.1869
  • Hasanah, A., Rahayu, S. R., & Kuswardinah, A. (2019). The effect of parenting, teacher’s role, and peers on children’s personal safety skills in Tangerang. Public Health Perspective Journal, 4(3), 164-170. https://journal.unnes.ac.id/nju/index.php/phpj/article/viewFile/19064/9351
    » https://journal.unnes.ac.id/nju/index.php/phpj/article/viewFile/19064/9351
  • Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE]. (1997). Crianças e adolescentes: Indicadores sociais. IBGE. https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=7128
    » https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=7128
  • Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE]. (2020). Mapas do Brasil - Desigualdade socioeconômica. IBGE. https://atlasescolar.ibge.gov.br/mapas-atlas/mapas-do-brasil/desigualdade-socioeconomica.html
    » https://atlasescolar.ibge.gov.br/mapas-atlas/mapas-do-brasil/desigualdade-socioeconomica.html
  • Jacobson, C. M., & Batejan, K. (2014). Comprehensive theoretical models of nonsuicidal self-injury. In M. K. Nock (Ed.), The Oxford handbook of suicide and self-injury (pp. 308-320). Oxford University Press.
  • Klemera, E., Brooks, F. M., Chester, K. L., Magnusson, J., & Spencer, N. (2017). Self-harm in adolescence: protective health assets in the family, school and community. International journal of public health, 62(6), 631-638. https://doi.org/10.1007/s00038-016-0900-2
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1007/s00038-016-0900-2
  • Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. (1990, 24 de julho). Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Presidência da República. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm
    » http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm
  • Lima, N. C., & Rocha, H. C. (2018). Terapia cognitivo comportamental para crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual. Saúde Integral, 1(1), 34-43. http://revista.camporeal.edu.br/index.php/saudeintegral/article/view/250
    » http://revista.camporeal.edu.br/index.php/saudeintegral/article/view/250
  • Lundh, L. G., Karim, J., & Quilisch, E. V. A. (2007). Deliberate self harm in 15 year old adolescents: a pilot study with a modified version of the Deliberate Self Harm Inventory. Scandinavian Journal of Psychology, 48(1), 33-41. https://doi.org/10.1111/j.1467-9450.2007.00567.x
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1111/j.1467-9450.2007.00567.x
  • Magni, A. C. C., & Correa, J. J. (2016). Infância e violência sexual: um olhar sobre a vulnerabilidade da criança. Revista Pleiade, 10(19), 53-60. https://pleiade.uniamerica.br/index.php/pleiade/article/view/324/440
    » https://pleiade.uniamerica.br/index.php/pleiade/article/view/324/440
  • Menezes, M. S., & Faro, A. (No prelo). Tradução e validade psicométrica do deliberate self-harm inventory (DSHI-s). Psico-USF.
  • Ministério da Saúde. (2008). Saúde do adolescente: competências e habilidades. Ministério da Saúde. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_adolescente_competencias_habilidades.pdf
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_adolescente_competencias_habilidades.pdf
  • Moraes, L. S. K., & Rocha, F. N. (2017). Resiliência no Trauma - a possibilidade de manejo na Terapia Cognitivo-Comportamental. Revista Mosaico, 8(1), 3-10. https://doi.org/10.21727/rm.v8i1.910
    » https://doi.org/https://doi.org/10.21727/rm.v8i1.910
  • Nock, M. K. (2009). Why do people hurt themselves? New insights into the nature and functions of self-injury. Current Directions in Psychological Science, 18(2), 78-83. https://doi.org/10.1111/j.1467-8721.2009.01613.x
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1111/j.1467-8721.2009.01613.x
  • Nock, M. K. (2010). Self-injury. Annual Review of Clinical Psychology, 6, 339-363. https://doi.org/10.1146/annurev.clinpsy.121208.131258
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1146/annurev.clinpsy.121208.131258
  • Nock, M. K., & Prinstein, M. J. (2004). A functional approach to the assessment of self-mutilative behavior. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 72, 885-890. https://doi.org/ 10.1037/0022-006X.72.5.885
    » https://doi.org/https://doi.org/ 10.1037/0022-006X.72.5.885
  • Nock, M. K., & Prinstein, M. J. (2005). Contextual features and behavioral functions of self-mutilation among adolescents. Journal of Abnormal Psychology, 114, 140-146. https://doi.org/10.1037/0021-843X.114.1.140
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1037/0021-843X.114.1.140
  • Nock, M. K., Prinstein, M., & Sterba, S. (2009). Revealing the form and function of self-injurious thoughts and behaviors: a real-time ecological assessment study among adolescents and young adults. Journal of Abnormal Psychology , 118(4), 816-827. https://doi.org/10.1037/a0016948
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1037/a0016948
  • Plener, P. L., Schumacher, T. S., Munz, L. M., & Groschwitz, R. C. (2015). The longitudinal course of non-suicidal self-injury and deliberate self-harm: a systematic review of the literature. Borderline Personality Disorder and Emotion Dysregulation, 2(2), 1-11. https://doi.org/10.1186/s40479-014-0024-3
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1186/s40479-014-0024-3
  • Preyde, M., Watkins, H., Csuzdi, N., Carter, J., Lazure, K., White, S., Penney, R., Ashbourne, G., Cameron, G., Frensch, K. (2012). Non-suicidal self-injury and suicidal behaviour in children and adolescents accessing residential or intensive home-based mental health services. Journal of the Canadian Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 21(4), 270-281. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3490528/
    » https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3490528/
  • Proaño, V. J. C. (2018). La relación entre experiencias de trauma infantil y comportamiento de riesgos suicida. Revista Médica Electrónica Portales Medicos, 6(1), 1-9. https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/psiquemag/article/view/148/140
    » https://revistas.ucv.edu.pe/index.php/psiquemag/article/view/148/140
  • Santos, L. C. S., & Faro, A. (2018). Aspectos conceituais da conduta autolesiva: uma revisão teórica. Psicologia em Pesquisa, 12(1), 5-14. https://doi.org/10.24879/201800120010092
    » https://doi.org/https://doi.org/10.24879/201800120010092
  • Shonkoff, J. P. (2012). Leveraging the biology of adversity to address the roots of disparities in health and development. Proceedings of the National Academy of Science of the United States of America, 109, 17302-17307. https://doi.org/10.1073/pnas.1121259109
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1073/pnas.1121259109
  • Shonkoff, J. P., Richter, L., van der Gaag, J., & Bhutta, Z. A. (2012). An integrated scientific framework for child survival and early childhood development. Pediatrics, 129(2), 460-472. https://doi.org/10.1542/peds.2011-0366
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1542/peds.2011-0366
  • Silva, P. C. M., & Assumpção, A. A. (2018). Relação entre violência psicológica e depressão em mulheres: revisão narrativa. Pretextos - Revista da Graduação em Psicologia da PUC Minas, 3(6), 102-115. http://periodicos.pucminas.br/index.php/pretextos/article/view/18408
    » http://periodicos.pucminas.br/index.php/pretextos/article/view/18408
  • Silva, S. R., & Carvalho, E. R. (2017). A atuação do Conselho Tutelar com crianças e adolescentes vítimas de violência. Revista Eletrônica Organizações e Sociedade, 6(6), 126-137. https://doi.org/10.29031/ros.v6i6.306
    » https://doi.org/https://doi.org/10.29031/ros.v6i6.306
  • Soares, L. G., Depaoli, L. B., Lentsck, M. H., Soares, L. G., Birolim, M. M., & Higarashi, I. H. (2017). Violações por violência de direitos fundamentais de crianças e adolescentes. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, 18(6), 734-741. https://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000600005
    » https://doi.org/https://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000600005
  • Stoltenborgh, M., Bakermans-Kranenburg, M. J., & van Ijzendoorn, M. H. (2013). The neglect of child neglect: a meta-analytic review of the prevalence of neglect. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, 48(3), 345-355. https://doi.org/10.1007/s00127-012-0549-y
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1007/s00127-012-0549-y
  • Thums, G., & Fonseca, A. C. C. (2016). Abandono: um problema moral ou penal? Revista da Faculdade de Direito da FMP, 11, 74-94. https://revistas.fmp.edu.br/index.php/FMP-Revista/article/view/24
    » https://revistas.fmp.edu.br/index.php/FMP-Revista/article/view/24
  • Van Der Kolk, B. (2020). O corpo guarda as marcas. Sextante.
  • Vaner, L., Narciso, J., & Langoni, R. C. (2013). Lei Maria da Penha: Lei nº 11.340/2006. [Apresentação de trabalho]. 1º Semana Científica do Curso de Direito da Unitri, Uberlândia, Minas Gerais, Brasil.
  • Zappe, J. G., & Dell’Aglio, D. D. (2016). Adolescência em diferentes contextos de desenvolvimento: risco e proteção em uma perspectiva longitudinal. Psico, 47(2), 99-110. https://doi.org/10.15448/1980-8623.2016.2.21494
    » https://doi.org/https://doi.org/10.15448/1980-8623.2016.2.21494

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    31 Dez 2020
  • Aceito
    15 Jun 2021
Conselho Federal de Psicologia SAF/SUL, Quadra 2, Bloco B, Edifício Via Office, térreo sala 105, 70070-600 Brasília - DF - Brasil, Tel.: (55 61) 2109-0100 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: revista@cfp.org.br