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Lodo de esgoto e fertilizante mineral sobre parâmetros do solo e de plantas de trigo

Sewage sludge and mineral fertilizer effect on soil and wheat crop parameters

Resumos

Para avaliar o lodo de esgoto alcalinizado (LEA), como complemento da adubação mineral instalou-se, em junho de 1997, um experimento em vasos com a cultura do trigo, cultivar BR 35, em casa de vegetação no Setor de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Paraná, em Curitiba, PR, no qual se empregou o fatorial 5 x 5, combinando 0, 25, 50, 75 e 100% da adubação mineral recomendada para a cultura, com 0, 2,5, 5,0, 7,5 e 10,0 Mg ha-1 do LEA em base seca. O LEA, aplicado ao solo vinte dias antes da semeadura e adubação mineral do trigo, elevou o pH acima da neutralidade. A saturação por bases, capacidade de troca de cátions e teores de P, K, Ca, Cu e Zn aumentaram, enquanto o Mn e H+Al diminuíram. O LEA afetou negativamente os parâmetros morfológicos e a matéria seca das plantas e ainda elevou os teores de K, N, Mg, Cu e Zn da parte aérea do trigo, enquanto o fertilizante os reduziu, indicando efeito de concentração e diluição, respectivamente. A elevação do pH do solo reduziu a disponibilidade de Mn para o trigo, danificando a cultura.

biossólido alcalino; fertilidade do solo; micronutrientes; nutrição de plantas; Triticum durum L


In order to evaluate the effect of an alkaline sewage sludge (ASS) as a supplement for soil chemical fertilization, an experiment with wheat crop was carried out in greenhouse. The experimental design was a 5 x 5, combining 5 rates of chemical fertilizers (0, 25, 50, 75 and 100% of rates recommended at planting) with 5 rates of dried ASS (0, 2.5, 5.0, 7.5 and 10.0 Mg ha-1). The ASS, applied 20 days before seeding, raised the soil pH above neutral. Base saturation, cation exchange capacity and the contents of P, K, Ca, Cu and Zn were increased by the ASS application, whereas the contents of Mn and H+Al were decreased. The ASS negatively affected the morphological parameters and the dry-matter yield and increased the contents of K, N, Mg, Cu and Zn in wheat plants, whereas the fertilizer application provided opposite results, suggesting the effect of concentration and dilution for the ASS and fertilizer, respectively. The increased soil pH reduced the Mn availability to wheat plants, resulting in crop damage.

alkaline biosolid; soil fertility; pH; micronutrients; yield wheat


MANEJO DE ÁGUA E SOLO

Lodo de esgoto e fertilizante mineral sobre parâmetros do solo e de plantas de trigo

Sewage sludge and mineral fertilizer effect on soil and wheat crop parameters

Wagner A. ChueiriI; Beatriz M. SerratII; Jonathan BieleIII; Nerilde FavarettoII

IEngenheiro Agrônomo, Mestre em Ciência do Solo. Rua Tibagi, 294, sala 808, CEP 80060-110, Curitiba, PR. Fone: (41) 3223-0584. E-mail: wagner.chueiri@bunge.com

IIDSEA/UFPR, Rua dos Funcionários 1540, Cabral, CEP 80035-050, Curitiba, PR. Fone: (41) 3350-5638; 3350-5609. E-mail: nfavaretto@ufpr.br; bmserrat@ufpr.br

IIIDE/UFPR. Ed. da Administração, 3.andar, CP 19081, CEP 81531-990, Jardim das Américas, Curitiba, PR. Fone: (41) 3364-3006. E-mail: m4273@terra.com.br

RESUMO

Para avaliar o lodo de esgoto alcalinizado (LEA), como complemento da adubação mineral instalou-se, em junho de 1997, um experimento em vasos com a cultura do trigo, cultivar BR 35, em casa de vegetação no Setor de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Paraná, em Curitiba, PR, no qual se empregou o fatorial 5 x 5, combinando 0, 25, 50, 75 e 100% da adubação mineral recomendada para a cultura, com 0, 2,5, 5,0, 7,5 e 10,0 Mg ha-1 do LEA em base seca. O LEA, aplicado ao solo vinte dias antes da semeadura e adubação mineral do trigo, elevou o pH acima da neutralidade. A saturação por bases, capacidade de troca de cátions e teores de P, K, Ca, Cu e Zn aumentaram, enquanto o Mn e H+Al diminuíram. O LEA afetou negativamente os parâmetros morfológicos e a matéria seca das plantas e ainda elevou os teores de K, N, Mg, Cu e Zn da parte aérea do trigo, enquanto o fertilizante os reduziu, indicando efeito de concentração e diluição, respectivamente. A elevação do pH do solo reduziu a disponibilidade de Mn para o trigo, danificando a cultura.

Palavras-chave: biossólido alcalino, fertilidade do solo, micronutrientes, nutrição de plantas, Triticum durum L

ABSTRACT

In order to evaluate the effect of an alkaline sewage sludge (ASS) as a supplement for soil chemical fertilization, an experiment with wheat crop was carried out in greenhouse. The experimental design was a 5 x 5, combining 5 rates of chemical fertilizers (0, 25, 50, 75 and 100% of rates recommended at planting) with 5 rates of dried ASS (0, 2.5, 5.0, 7.5 and 10.0 Mg ha-1). The ASS, applied 20 days before seeding, raised the soil pH above neutral. Base saturation, cation exchange capacity and the contents of P, K, Ca, Cu and Zn were increased by the ASS application, whereas the contents of Mn and H+Al were decreased. The ASS negatively affected the morphological parameters and the dry-matter yield and increased the contents of K, N, Mg, Cu and Zn in wheat plants, whereas the fertilizer application provided opposite results, suggesting the effect of concentration and dilution for the ASS and fertilizer, respectively. The increased soil pH reduced the Mn availability to wheat plants, resulting in crop damage.

Key words: alkaline biosolid, soil fertility, pH, micronutrients, yield wheat

INTRODUÇÃO

O último censo demográfico mostra que 81,2% da população brasileira vivem em áreas urbanas (IBGE, 2001), indicando a necessidade do aumento da eficiência das áreas agrícolas na produção de alimentos. Esta população urbana produz constantemente grandes quantidades de dejetos que, em escala variada, são coletados pelo sistema de esgoto sanitário das cidades. O esgoto urbano, quando submetido a tratamento adequado, gera o chamado "lodo de esgoto" ou biossólido, o qual é produzido em 66 municípios do Estado do Paraná, na quantidade de 15.782,2 Mg ano-1 (Andreoli et al., 1998), e é passível de disposição agrícola depois de submetido a desinfecção, através de processos específicos. Em alguns trabalhos se tem avaliado essa alternativa de disposição. Bettiol et al. (1983), verificaram que o lodo de esgoto digerido (pH = 6,03) em dose equivalente a 9,0 Mg ha-1 em base seca, pode ser utilizado como fonte de nutrientes para o milho (Zea mays) e arroz (Orizae sativa), pois não existe diferença estatisticamente significativa se comparado com os tratamentos que receberam fertilização mineral recomendada. Berton et al. (1989), trabalhando com lodo anaerobicamente digerido em doses equivalentes a 0, 40 e 80 Mg ha-1 em base seca, concluíram aumento significativo na produção de matéria seca e na absorção de N, P, Ca, Mg e Zn pelas plantas de milho em todos os solos, nas duas doses. O lodo ainda proporcionou aumento do pH, do teor de matéria orgânica, dos teores de Ca, Mg e K trocáveis e do teor de P extraível em H2SO4 0,05N, além da redução ou eliminação do Al trocável, nos cinco solos estudados, após 15 dias da sua aplicação. Rawajfih & Gharaibeh (1990), cultivando trigo (Triticum durum L.) durante 60 dias em vasos preenchidos com mistura de lodo seco (pH em H2O = 7,0) e solo calcário (pH em H2O = 8,0) nas proporções de 1:8, 1:6, 1:4, 1:2, 1:1, 2:1 e 4:1, constataram que a mistura 1:8 aumentou significativamente o crescimento das plantas de trigo em relação à testemunha com ausência de lodo. A proporção 1:6 não teve efeito significativo enquanto as demais misturas apresentaram efeito supressivo sobre o desenvolvimento do trigo. Em trabalho com lodo de esgoto de várias origens, Sloan & Basta (1995) usaram, em experimento de incubação, três solos fortemente ácidos, com os seguintes tratamentos: calcário, lodo alcalino estabilizado, lodo anaeróbio não alcalinizado e N-viro#, verificando que, em geral, o pH dos solos aumentou linearmente com as doses dos produtos aplicados, para os três solos estudados. Os tratamentos promoveram redução do teor de Mn em solução e também do Al solúvel, com exceção do lodo anaeróbio não alcalinizado, cuja redução atingiu níveis inferiores ao limite de detecção (< 0,4 mol L-1). A especiação mostrou que a atividade do Al3+ foi reduzida para níveis não tóxicos (< 10 mmol L-1). Nas condições do Estado do Paraná, Favaretto et al. (1997) conduziram experimento em campo, com a cultura do milho, utilizando 32, 64 e 96 Mg ha-1 de lodo úmido alcalinizado, produzido na ETE-Belém, comparando-o com a adubação mineral recomendada, cujos resultados indicaram não haver diferenças de produtividade entre a adubação mineral e qualquer dose de lodo e, ainda, que o lodo reduziu a acidez potencial do solo e aumentou os teores de P, Ca + Mg e V%, mas não afetou significativamente o pH nem teores de K, C e CTC a pH 7,0 do solo.

Com o presente trabalho, objetivou-se testar a aplicação do LEA em complemento à adubação mineral de plantas de trigo (Triticum aestivum), em solo previamente corrigido, avaliando-se os parâmetros químicos do solo e nutricionais da cultura. Espera-se que, devido à sua composição química, o LEA possa aportar nutrientes ao solo e substituir parte do fertilizante mineral, sendo aplicado na pré-semeadura do trigo.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi conduzido em casa de vegetação do Setor de Ciências Agrárias da UFPR, em Curitiba, PR. O solo foi coletado na camada de 0 a 20 cm (IAPAR, 1996), no campo experimental da Cooperativa Agropecuária Batavo Ltda., situado no km 121 da Rodovia PR 151, em Ponta Grossa, PR (25º 20' S; 50º 20' W), classificado como Latossolo Vermelho distrófico (LVd), (EMBRAPA, 1999). Realizou-se a caracterização química do solo (Tabela 1) de acordo com metodologia proposta por Pavan et al. (1992) para análise de rotina, enquanto a determinação dos micronutrientes se baseou na metodologia de Lindsay & Norvell (1978), empregando-se o extrator DTPA-TEA.

O solo apresentou densidade aparente de 1,54 kg dm-3, a qual foi determinada pelo método do anel volumétrico e granulometria composta por 780 g kg-1 de areia, 85 g kg-1 de silte e 135 g kg-1 de argila, determinada pelo método do densímetro (EMBRAPA, 1997).

O lodo de esgoto alcalinizado (LEA) foi produzido em sistema aeróbio, pela Companhia de Saneamento do Paraná - SANEPAR, em sua Estação de Tratamento de Esgotos Belém (ETE-Belém), situada em Curitiba, PR. A análise química do lodo foi realizada pelo Instituto de Tecnologia do Paraná - TECPAR (Tabela 2), cujos elementos, Cd, Cr, Zn, Cu, Ni, Pb, Ca e Mg, foram determinados de acordo com CETESB (1977) e o Hg por metodologia desenvolvida pelo TECPAR (Instituto de Tecnologia do Paraná). Definiram-se os teores de N(total), P(total), P(CNA), K(água), pH, matéria orgânica total e cinzas, segundo LANARV (1988); somente o teor de Mn não o foi, porém o teor médio para o lodo de esgoto do Paraná, adotado para o presente trabalho, é de 225 mg kg-1 (Pigozzo et al., 1998).

O experimento foi conduzido em vasos com capacidade de 9,3 L e os tratamentos equivaleram às doses de 0, 2,5, 5,0, 7,5 e 10,0 Mg ha-1 de LEA em base seca. As doses de fertilizante mineral foram 0, 25, 50, 75 e 100% da dose de N, P2O5 e K2O (15, 30 e 45 kg ha-1, respectivamente) recomendada para a cultura do trigo (OCEPAR, 1995) com base nos resultados da análise química do solo.

A mistura solo-LEA foi realizada em homogeneizador elétrico, adicionando-se o LEA diluído gradualmente, até atingir a dose correspondente a cada tratamento. Para as adições gradativas utilizaram-se 0,811, 1,623, 2,435 e 3,247 g de LEA em base seca para cada kg de solo seco correspondendo, respectivamente, às doses de 2,5, 5,0, 7,5 e 10,0 Mg ha-1; após o preenchimento, os vasos foram mantidos em umidade próxima à capacidade de campo, durante 20 dias, até o plantio do trigo. A aplicação do fertilizante (mistura microgranulada da fórmula 4-14-8, complementada com KCl e (NH4)4SO4 ) foi realizado no sulco aberto ao longo do diâmetro do vaso, a 8 cm de profundidade e, ao longo do sulco já coberto, 10 orifícios eqüidistantes, com profundidade de 3 cm, foram feitos, nos quais se depositaram as sementes de trigo, cultivar BR 35, cujo ciclo e porte são intermediários, já tratadas com fungicida triadimenol a 40 g para cada 100 kg de sementes; apenas as três plantas mais vigorosas foram conduzidas.

O solo misturado ao LEA foi amostrado antes da aplicação do fertilizante em seis pontos aleatórios, ao longo de toda a profundidade do vaso. As análises químicas de rotina e dos micronutrientes Cu, Fe, Mn e Zn, basearam-se nas metodologias propostas por Pavan et al. (1992) e Lindsay & Norvell (1978), respectivamente, enquanto as avaliações das plantas foram feitas no estádio fenológico 10.1 da escala de Feeks & Large (Large, 1954), determinando-se o diâmetro do colmo, estatura e matéria seca (peso constante a 65 ºC). Os teores de P, Ca, Mg, K, Cu, Fe, Mn e Zn no tecido vegetal (parte aérea) foram analisados através da metodologia descrita por Perkin & Elmer (1973). Realizou-se a determinação do N através do método do semi-micro Kjeldahl (Sarruge & Haag, 1974).

Os dados de solo foram submetidos à análise de regressão para se testar a significância dos modelos linear simples (y = a + bx) e quadrático (y = a + bx + cx2). Os modelos foram plotados com seus respectivos intervalos de predição (Charnet et al., 1999). Para as avaliações de planta foram feitas regressões usando-se as duas variáveis independentes ou co-variadas (lodo e fertilizante mineral) e uma variável dependente, para produzir a superfície de resposta, dada pela equação de resposta simples, ou seja, univariada (Charnet et al., 1999). O nível de significância usado nas análises foi de 5%. Precedendo-se as análises, as co-variadas foram submetidas a transformação canônica (Montgomery, 1997) para uniformizar seus respectivos valores nos eixos dos gráficos de superfície de resposta. Com vistas a executar a transformação, tomou-se o valor central de cada escala, que foi o subtraendo de qualquer valor da mesma e, ao mesmo tempo o divisor do resultado da subtração, como mostram as seguintes equações:

lodo = (Lodo - 5)/5 e fert = (Fertilizante - 50)/50

Para ambas as co-variadas, o resultado final foi: -1,0; -0,5; 0; 0,5 e 1. Devido a essas transformações todas as equações que acompanham os modelos deverão ter os valores de x ou y (no caso das superfícies de resposta) substituídos pelos valores transformados (-1 a 1) caso se queira calcular o valor de uma variável dependente qualquer. A avaliação da correlação entre duas variáveis dependentes sob efeito simultâneo do fertilizante e lodo, foi feita empregando-se a análise de variância de resposta múltipla - MANOVA (Johnson & Wichern, 1998). O teste de significância da MANOVA foi o Lambda de Wilks (Montgomery, 1997).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A avaliação do solo aos 20 d após a aplicação do LEA, mostrou elevação do pH, da saturação por bases (V%) e dos teores de P e Ca, enquanto o Mn e H+Al tiveram seus teores reduzidos (Figura 1).


A CTC e os teores de K, Cu e Zn, também aumentaram em função da dose de LEA aplicada. Devido aos baixos coeficientes de determinação (r2) do modelo matemático, esses e seus respectivos níveis de significância estão apresentados na Tabela 3.

A elevação do pH do solo, em função da aplicação do LEA, também foi observada por Berton et al. (1989), Brown & Brush (1992), Sloan & Basta (1995). Em virtude do LEA ser um material altamente alcalino e de reatividade elevada, o aumento do pH e cfonseqüente redução da acidez potencial (H+Al), ocorreram em curto intervalo de tempo mesmo se tratando de um solo com baixa acidez. Meyer (1998) verificou que o efeito corretivo do LEA é praticamente imediato atingindo, com freqüência, os valores máximos de pH após um dia da aplicação. O Ca é o nutriente que se encontra em maior quantidade no LEA (Tabela 2); portanto, a elevação de seus teores no solo e o aumento da saturação por bases (V%) foram condizentes com as doses crescentes aplicadas. A adição do LEA propiciou a elevação do teor de P no solo; todavia, considerando-se a concentração desse elemento no biossólido, conclui-se que os teores obtidos na análise de solo ficaram aquém daqueles potencialmente possíveis; este fato pode estar relacionado aos elevados valores de pH do solo que, além de alterar a solubilidade dos compostos com P, interferem na eficiência do extrator Mehlich1 (Novais & Smyth, 1999). Os teores de Mg, C e Fe não foram afetados pelo LEA, após 20 dias da aplicação.

O C orgânico total (20,3%), presente no LEA, não aumentou significativamente o teor de C no solo, semelhante ao resultado obtido por Favaretto et al. (1997); no entanto, Melo et al. (1994) obtiveram aumentos não apenas do C orgânico, mas também da CTC do solo, aos 77 dias após a aplicação, de 32,0 Mg ha-1 de lodo de esgoto em base seca, dose esta três vezes superior à máxima dose empregada no presente trabalho. Mesmo não ocorrendo aumento significativo no teor de C orgânico no solo, o lodo promoveu o aumento significativo da CTC a pH 7,0, podendo estar relacionado à característica dos ácidos húmicos que compõem sua fração orgânica.

O Mn foi o único micronutrientre cujo teor foi significativamente reduzido com a aplicação do LEA (Figura 1C); este comportamento está relacionado à grande sensibilidade desse elemento à elevação do pH, formando compostos muito pouco solúveis quando os valores de pH em água se aproximam de 6,4 (Lindsay & Norvell, 1978). Embora o pH inicial do solo já apresentasse valor elevado (6,2 em CaCl2 0,01 M), somente nas maiores doses de LEA é que se observaram baixos níveis de Mn extraível (DTPA-TEA) no solo.

O LEA afetou negativamente algumas características morfológicas do trigo e a produção de matéria seca, enquanto o fertilizante exerceu efeito benéfico sobre os mesmos parâmetros (Figura 2) indicando que, apesar de adicionar nutrientes ao solo, o LEA deverá ter sua aplicação controlada; esta observação corrobora a decisão atual da Companhia de Saneamento do Paraná - SANEPAR, em definir a dose de LEA em função do poder corretivo (PROSAB, 1999).




No tecido vegetal, os teores de P, Ca e Fe não sofreram alterações em virtude da aplicação de fertilizante e/ou LEA; já os teores de N (Figura 3A), K (Figura 3B), Mg (Figura 3C) e Cu (Figura 3D) foram significativamente reduzidos pela aplicação do fertilizante e aumentados pela aplicação do LEA. Os teores de Mn (Figura 3E) e Zn (Figura 3F) foram alterados apenas pela aplicação do LEA, sendo que o primeiro elemento teve seu teor aumentado e o segundo diminuído em função das doses crescentes do biossólido. Esses resultados indicam que o fertilizante causou efeito de diluição sobre os elementos N, K, Mg e Cu, por favorecer a produção de matéria seca em maior velocidade que a da absorção desses nutrientes, enquanto o LEA exerceu efeito de concentração sobre esses elementos, inclusive o Zn, devido à redução da matéria seca provocada, dentre outros motivos, pela limitação na absorção do Mn; este fenômeno é conhecido como efeito de Steenjberg (Malavolta et al., 1997).


O Mn foi o único elemento que teve redução em seu teor no tecido vegetal, acompanhando a redução na produção de matéria seca, pela aplicação de doses crescentes de LEA; seus teores ficaram aquém daqueles considerados adequados para a cultura do trigo (Malavolta et al., 1997), caracterizando sua deficiência no tecSido vegetal e indicando ser este o fator limitante no desenvolvimento das plantas.

Além da elevação do pH, outra possível causa da deficiência de Mn nos tecidos da planta foi o excesso de Ca na solução do solo (Lopes, 1999), provocada pela adição de LEA. As plantas que também receberam fertilizantes foram menos afetadas, podendo ter tido melhor estabelecimento inicial, inclusive do sistema radicular, melhorando o acesso ao Mn disponível. Fato relevante é que, na adubação mineral, empregaram-se duas matérias-primas que geram reação ácida nas imediações do local de aplicação - o superfosfato simples, usado na fórmula 04-14-08 (Brady, 1989), e o sulfato de amônio, favorecendo a disponibilidade do Mn que se encontrava em formas menos solúveis, o que justifica o efeito recuperador do fertilizante sobre as plantas de trigo.

CONCLUSÕES

1. O lodo de esgoto alcalinizado (pH = 11,6) após 20 dias da sua aplicação ao solo, elevou o pH acima da neutralidade, aumentou a saturação por bases, a capacidade de troca de cátions e os teores de P, K, Ca, Cu e Zn, diminui os teores de Mn e H + Al mas não afetou o carbono do solo.

2. Os parâmetros morfológicos e a matéria seca das plantas de trigo foram negativamente afetados pelo lodo de esgoto alcalinizado, enquanto o fertilizante apresentou efeito inverso.

3. Os teores de K, N, Mg, Cu e Zn no tecido vegetal do trigo foram aumentados pelo lodo, enquanto o fertilizante mineral os reduziu, indicando o efeito de concentração e diluição, respectivamente.

4. O lodo de esgoto alcalinizado reduziu a disponibilidade de Mn no solo, em função da elevação do pH, prejudicando o desenvolvimento do trigo.

LITERATURA CITADA

Protocolo 063.06 - 02/06/2006 - Aprovado em 18/05/2007

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Set 2007
    • Data do Fascículo
      Out 2007

    Histórico

    • Aceito
      18 Maio 2007
    • Recebido
      02 Jun 2006
  • Departamento de Engenharia Agrícola - UFCG Unidade Acadêmica de Engenharia Agrícola, UFCG, Av. Aprígio Veloso 882, Bodocongó, Bloco CM, 1º andar, CEP 58429-140, Campina Grande, PB, Brasil, Tel. +55 83 2101 1056 - Campina Grande - PB - Brazil
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