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Qualidade da água em uma microbacia hidrográfica do Rio Piracicaba, SP

Water quality in a small catchment of Piracicaba River, SP

Resumos

A microbacia do Ribeirão dos Marins, afluente do Rio Piracicaba, é importante ao município de Piracicaba, São Paulo, haja vista que concentra a maior área de produção de hortaliças, as quais são irrigadas com as águas do ribeirão. Com o objetivo de avaliar a qualidade da água, coletaram-se amostras de fevereiro a dezembro de 2005 em sete pontos ao longo do ribeirão, considerando-se o uso e ocupação do solo. As variáveis de qualidade de água analisadas foram: físicas e químicas: sedimentos em suspensão, pH, condutividade elétrica, alcalinidade, turbidez, potássio, cálcio, magnésio, cobre, ferro, manganês, zinco, sódio, fósforo, sulfato, cloreto, nitrogênio amoniacal e nitrato. As análises foram realizadas no Laboratório de Ecologia do Instituto de Estudos Florestais e no Laboratório de Água do Departamento de Engenharia Rural, ambos pertencentes à ESALQ-USP. Os resultados obtidos foram comparados com a Resolução nº 357 de 17 março de 2005, do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) que estabelece a classificação das águas brasileiras. As águas do ribeirão dos Marins apresentaram-se fora do padrão estabelecido pela Resolução 357/2005 do CONAMA, para a irrigação de hortaliças.

recursos hídricos; irrigação; hortaliças


The Marins creek watershed is important to the Piracicaba municipal district because it concentrates a large area of horticultural production, which is irrigated with the creek water. With the aim to evaluate the water quality, samples were collected from February to December 2005 at seven points along the creek according to land use. The parameters of quality analyzed were physical and chemical: suspended sediments, pH, electrical conductivity, alkalinity, turbidity, potassium, calcium, magnesium, copper, iron, manganese, zinc, sodium, phosphorus, sulfate, chloride, ammonia nitrogen, and nitrate. The analyses were made at the Ecology Laboratory of Forest Studies Institute and Water Laboratory at the Rural Engineering Department, both belonging to the Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo. The results were compared with the Brazilian legislation (Resolution nº 357 of March 17, 2005 of National Concil of Environment) which establishes the Brazilian water classification. The Marins water did not meet the limits established by the Brazilian legislation to irrigate the horticultural production.

water resources; irrigation; horticultural


MANEJO DE SOLO, ÁGUA E PLANTAS

Qualidade da água em uma microbacia hidrográfica do Rio Piracicaba, SP1 1 Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor, apresentada à ESALQ/USP

Water quality in a small catchment of Piracicaba River, SP

Ariovaldo A. T. LucasI; Marcos V. FolegattiII; Sérgio N. DuarteII

IDoutor em Ecologia Aplicada - ESALQ/USP, Av. Pádua Dias 111, CP 09, CEP 13418-900, Piracicaba, SP, Fone: (19) 3429-4217, E-mail: a.lucas06@fulbrightmail.org

IIESALQ/USP, Fone: (19) 3429-4217, E-mail: mvfolega@esalq.usp.br; snduarte@esalq.usp.br

RESUMO

A microbacia do Ribeirão dos Marins, afluente do Rio Piracicaba, é importante ao município de Piracicaba, São Paulo, haja vista que concentra a maior área de produção de hortaliças, as quais são irrigadas com as águas do ribeirão. Com o objetivo de avaliar a qualidade da água, coletaram-se amostras de fevereiro a dezembro de 2005 em sete pontos ao longo do ribeirão, considerando-se o uso e ocupação do solo. As variáveis de qualidade de água analisadas foram: físicas e químicas: sedimentos em suspensão, pH, condutividade elétrica, alcalinidade, turbidez, potássio, cálcio, magnésio, cobre, ferro, manganês, zinco, sódio, fósforo, sulfato, cloreto, nitrogênio amoniacal e nitrato. As análises foram realizadas no Laboratório de Ecologia do Instituto de Estudos Florestais e no Laboratório de Água do Departamento de Engenharia Rural, ambos pertencentes à ESALQ-USP. Os resultados obtidos foram comparados com a Resolução nº 357 de 17 março de 2005, do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) que estabelece a classificação das águas brasileiras. As águas do ribeirão dos Marins apresentaram-se fora do padrão estabelecido pela Resolução 357/2005 do CONAMA, para a irrigação de hortaliças.

Palavras-chave: recursos hídricos, irrigação, hortaliças

ABSTRACT

The Marins creek watershed is important to the Piracicaba municipal district because it concentrates a large area of horticultural production, which is irrigated with the creek water. With the aim to evaluate the water quality, samples were collected from February to December 2005 at seven points along the creek according to land use. The parameters of quality analyzed were physical and chemical: suspended sediments, pH, electrical conductivity, alkalinity, turbidity, potassium, calcium, magnesium, copper, iron, manganese, zinc, sodium, phosphorus, sulfate, chloride, ammonia nitrogen, and nitrate. The analyses were made at the Ecology Laboratory of Forest Studies Institute and Water Laboratory at the Rural Engineering Department, both belonging to the Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo. The results were compared with the Brazilian legislation (Resolution nº 357 of March 17, 2005 of National Concil of Environment) which establishes the Brazilian water classification. The Marins water did not meet the limits established by the Brazilian legislation to irrigate the horticultural production.

Key words: water resources, irrigation, horticultural

INTRODUÇÃO

No início do novo milênio o grande desafio da humanidade é conviver com a baixa disponibilidade de água causada pelo uso excessivo e poluição dos corpos hídricos. Uma forma de se conhecer a qualidade da água é fazer uso do monitoramento para obter informações necessárias ao gerenciamento e ações de intervenções para recuperação ou preservação dos mananciais garantindo a sustentabilidade dos ecossistemas.

Uma das principais causas da baixa disponibilidade hídrica se relaciona às ações antrópicas sem planejamento do uso e ocupação do solo nas bacias hidrográficas, as quais causam a poluição da água. Entende-se por poluição da água a alteração de suas características por quaisquer ações ou interferências, sejam elas naturais ou provocadas pelo homem. Essas alterações podem produzir impactos estéticos, fisiológicos - distúrbios em organismos aquáticos causados pela variação de amônia - ou ecológicos. O conceito de poluição da água tem-se tornado cada vez mais amplo em função de maiores exigências com relação à conservação e ao uso racional dos recursos hídricos (Braga et al., 2002).

A poluição das águas nas bacias hidrográficas tem, como origem, fontes, dentre as quais se destacam: efluentes domésticos, efluentes industriais e carga difusa urbana e agrícola (CETESB, 2005). Segundo Ongley (1996), a fonte não pontual, também conhecida como difusa, é proveniente de um conjunto de atividades humanas para as quais os poluentes não têm um ponto óbvio para entrada nos corpos hídricos. Como consequência das atividades urbanas e agrícolas, a concentração de nutrientes (NO-3, PO-4) e metais traços (Cu, Cd, Pb, Zn, Cr, Ni e Hg) em sedimentos e águas superficiais, tem excedido as recomendações para proteção dos ecossistemas aquáticos. Quando da necessidade de estudos específicos de qualidade de água em determinados trechos de rios ou reservatórios, com vistas a diagnósticos mais detalhados, outras variáveis podem vir a ser determinadas, tanto em função do uso e ocupação do solo na bacia contribuinte, atuais ou preteridos, quanto pela ocorrência de algum evento excepcional na área em questão (CETESB, 2005).

A avaliação da qualidade da água poderá ser feita pela composição dos resultados obtidos das amostras com os padrões de qualidade estabelecidos para a classe em que está enquadrado o manancial. No Brasil, a classificação das águas em relação à qualidade requerida para seus usos preponderantes, foi estabelecida pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente em 1986 com a Resolução nº 20, atualmente substituída pela Resolução nº 357, de 17 de março de 2005 (CONAMA, 2005), sendo muito utilizada para comparar o nível de qualidade das águas brasileiras para os diversos usos, inclusive o uso na irrigação. De acordo com Peters & Ward (2003), os dados de qualidade da água devem conduzir para informações de relevância para o manejo dos recursos hídricos.

No município de Piracicaba, São Paulo, um dos maiores problemas ambientais nas bacias hidrográficas está relacionado à qualidade e quantidade de água pois, de acordo com Ferraz et al. (2001) a Bacia do Rio Piracicaba é uma das mais degradadas do País devido à elevada taxa de ocupação urbana, do desenvolvimento industrial e intensa atividade agrícola. As principais culturas permanentes correspondem à fruticultura, com destaque para o citrus; nas temporárias predominam a cana-de-açúcar e a olericultura, enquanto o milho se constitui em séria ameaça ao ecossistema, devido ao aumento dos riscos de perda de solo por erosão, em virtude das práticas inadequadas e pelo emprego de altas doses de fertilizantes e defensivos agrícolas afetando, também, a qualidade da água. Na Microbacia do Ribeirão dos Marins a situação não é diferente, visto que exploração intensiva de recursos, lançamento de esgoto urbano e industrial, atividades agrícolas e florestais, vêm causando desequilíbrio no seu ecossistema terrestre e aquático, alterando a qualidade e a quantidade de água, razão por que se objetivou, com este estudo, avaliar a qualidade da água na Microbacia do Ribeirão dos Marins, município de Piracicaba, São Paulo, utilizada na produção agricultura irrigada de hortaliças.

MATERIAL E MÉTODOS

Descrição da área de estudo

A descrição da área de estudo foi obtida nos trabalhos de Casagrande (2005) e no projeto da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento de Piracicaba (SEMA, 2003). A microbacia de drenagem do ribeirão dos Marins, afluente do rio Piracicaba por sua margem esquerda, está localizada inteiramente no município de Piracicaba, entre as coordenadas 22° 47' e 22° 49' de latitude sul e 48° 47' e 48° 49' de longitude oeste, com área aproximada de 5.844 ha; as atividades econômicas são heterogêneas, com áreas dominadas por agricultura e outras por indústrias; a microbacia hidrográfica do ribeirão dos Marins é um exemplo típico deste padrão de uso e ocupação do solo da região. As atividades econômicas estão relacionadas com a agropecuária, principalmente com o cultivo de cana-de-açúcar, hortaliças e criação de gado de corte, leite, caprinos, ovinos e equinos (SEMA, 2003).

O clima da região, segundo a classificação de Koeppen, é do tipo mesotérmico, Cwa, isto é, subtropical úmido com estiagem no inverno (junho a setembro), cujas chuvas do mês mais seco não atingem 30 mm e a temperatura do mês mais quente é superior a 22 °C, enquanto a do mês mais frio é inferior a 18 °C. A precipitação anual média é de aproximadamente 1300 mm. Cerca de 70% do volume de precipitação ocorrem no verão (dezembro a março), situação característica de clima tropical; em termos geomorfológicos, a bacia está localizada em terrenos sedimentares, que formam a Depressão Periférica.

O uso intensivo da microbacia na produção agropecuária vem causando danos ambientais e a presença de um aterro sanitário que atendia à comunidade de Piracicaba, agravando a situação dos recursos hídricos da microbacia.

A Tabela 1 apresenta os valores referentes à rede de drenagem e às propriedades dimensionais da Microbacia Hidrográfica do Ribeirão dos Marins; o maior comprimento foi obtido da distância que acompanha o vale principal, entre a foz e o ponto extremo sobre a linha do divisor de águas; a maior largura foi obtida da distância correspondente à linha que corta transversalmente o vale principal; obteve-se o comprimento do curso d'água principal da somatória dos segmentos correspondentes ao canal principal, ou seja, o comprimento do curso principal da nascente ao exutório; determinou-se o comprimento total da rede pela somatória dos segmentos correspondentes ao canal principal e tributários; o perímetro da bacia representa a linha do divisor de águas que circunda a bacia; a área da bacia compreende a área delimitada pelo divisor de águas e a densidade de drenagem é a relação entre o comprimento total dos rios da bacia, dados em quilômetros e a respectiva área em quilômetros quadrados.

Selecionaram-se os pontos de coleta de água (Figura 1) considerando-se: a contribuição dos pequenos tributários formadores do ribeirão dos Marins; a localização de propriedades de hortaliças e outros tipos de uso e ocupação do solo (chácaras de recreação, olarias, aterro sanitário etc.).


A água amostrada mensalmente em 2005 teve nesses pontos, os parâmetros avaliados de acordo com American Public Health Association, APHA (1995), os quais foram físicos e químicos, ou seja, sedimentos em suspensão com período de amostragem de fevereiro a julho, totalizando 6 análises, pH com período de amostragem entre fevereiro e dezembro, perfazendo 10 análises, condutividade elétrica, alcalinidade, turbidez, potássio, cálcio, magnésio, cobre, ferro, manganês, zinco, sódio, fósforo, sulfato, cloreto, nitrogênio amoniacal e nitrato.O oxigênio dissolvido foi medido de maio a agosto, com uma sonda, no momento de coleta das amostras. A análise da variável sedimentos em suspensão foi feita durante seis meses no Laboratório de Ecologia do Instituto de Estudos Florestais; após este período as análises passaram a ser feitas no Laboratório de Água do Departamento de Engenharia Rural, que não analisava sedimentos. Quanto à variável coliforme fecais, os laboratórios não estavam equipados para as análises e não havia recursos para enviar as amostras a outros laboratórios.

Analisaram-se os dados de qualidade da água utilizando-se ferramentas da estatística descritiva constando de valores mínimo, máximo e médio à análise de variância, para verificar se havia diferença entre os locais de coleta de amostra de água e, quando foi constada diferença significativa entre os locais, aplicou-se o teste de Tukey a nível de 5% de probabilidade, identificando-se os locais que diferiram estatisticamente entre si. Os valores dos resultados das análises de água foram comparados com os padrões recomendados pelo CONAMA (2005), água doce classe 2, e com a classificação proposta por Ayres & Westcot (1985) para se caracterizar a qualidade da água na microbacia do ribeirão dos Marins.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A água está se tornando escassa, não apenas em áreas áridas ou propensas à seca mas, também, em regiões onde a chuva é abundante; considera-se escassez de água a quantidade de recursos disponíveis e sua qualidade, considerando-se a degradação, o que leva a baixa disponibilidade de água para usos preponderantes (Pereira et al., 2002).

Pode-se verificar, na Figura 2, os valores mensais da média histórica, 30 anos, o total histórico e os valores de precipitação mensais e totais do ano de 2005, período de coleta, revelando a distribuição temporal irregular, caracterizando um período seco de abril a novembro, especialmente porque 2005 se configurou como um ano em que a precipitação total (1070 mm) ficou 18% abaixo do total da média histórica (1272 mm); contudo, o mês de maio, com precipitação de 160 mm, apresentou uma precipitação muito acima da média histórica de 55 mm; resultado oposto foi observado para o mês de fevereiro que, historicamente, apresenta alta precipitação (181 mm) mas, para o ano de 2005, a precipitação foi de 66 mm.


A precipitação tem fundamental importância para a manutenção da qualidade e quantidade da água, quando seu regime é regular, evitando a escassez e diluindo a concentração de poluentes nos rios, além de produzir o escoamento superficial e subsuperficial, que carregam sedimentos e nutrientes para águas superficiais e subterrâneas. Neste estudo, quando se comparou o período seco com o período úmido, não se observou diferença estatística significativa entre os períodos para a variável qualidade da água.

Qualidade da água

A análise de variância permitiu verificar que as variáveis de qualidade da água: oxigênio dissolvido, nitrato, amônia, fósforo total, potássio, sódio e condutividade elétrica da água, se diferenciaram significativamente a 5% de probabilidade, pelo teste F. Constada a diferença, aplicou-se o teste de Tukey (p > 0,05) para identificar que locais de coleta diferiram entre si. As Tabelas 2 e 3 apresentam o resumo estatístico da análise de variância e os valores médios, seguidos do resultado do teste de Tukey.

Para qualquer uso, a qualidade da água deve apresentar um nível aceitável que não implique em prejuízo à atividade para a qual é destinada.

Comparando-se os resultados obtidos com o padrão estabelecido pela Resolução nº 357 do CONAMA (2005), limites para água doce classe 2, observa-se que algumas variáveis, como o nitrato (NO-3) no ponto 3 (P3), nitrogênio amoniacal (N-NH3) nos pontos 3 e 4 (P3 e P4), ferro (Fe2+) do ponto 1 ao 7 (P1-P7), cobre (Cu2+) do ponto 1 ao 7 (P1-P7), oxigênio dissolvido (OD) do ponto 2 ao 7 (P2-P7) e cor dos pontos 1, 3 e 4 (P1, P3 e P4) não apresentam qualidade compatível com a norma estabelecida pela Resolução nº 357 (CONAMA, 2005) para classificação de água classe 2; no caso do N-NH3, o valor determinado no mês de outubro (45,9 mg L-1) no ponto 3 está muito acima do limite da Resolução nº 357 do CONAMA (2005) (2 mg L-1); este ponto se localiza no ribeirão das Pedras, afluente do ribeirão dos Marins, pela margem direita e abaixo do aterro sanitário e do cemitério de animais, situados na MBHRM, empreendimentos que apresentam grande potencial de degradação da qualidade da água na bacia.

Observa-se, na Figura 3A, que o PO4- apresentou valores superiores aos estabelecidos do CONAMA (2005); somente os valores mínimos em P1 e P2 (0,02 e 0,38 mg L-1 ) se enquadraram no padrão.






O magnésio, de acordo com o limite de 0 a 120 mg L-1, apresentado por Ayers & Westcot (1985) para qualidade da água de irrigação, ficou acima nos pontos 5, 6 e 7 para os valores máximos de 123,9, 142,1 e 160,4 mg L-1, respectivamente, enquanto para o potássio, os valores máximos e mínimos do ponto 1 ao 7 ficaram acima de 0 a 2 mg L-1, valores estabelecidos pelos mesmos autores.

Os íons ferro (Figura 3B) e cobre apresentaram valores superiores ao estabelecido do CONAMA (2005) enquanto o pH (Figura 3C) e o zinco se apresentaram dentro do limite estabelecido pela Resolução, para águas de classe 2. A cor foi outra variável de qualidade que apresentou valores máximos acima da Resolução; já para a CEa, os valores máximos ficaram acima do que estabeleceram Ayers & Westcot (1985) para qualidade da água de irrigação.

Em P3 e P4, o NO3- (Figura 3D) apresentou valores máximos bem acima do permitido do CONAMA (2005), sendo que em P3 o valor chega a duas vezes mais em relação a P4, porém vale ressaltar que esses pontos se localizavam próximos a potenciais fontes poluidoras, aterro sanitário (P3) e fonte pontual de esgoto doméstico (P4). Quando o N-NH3 (Figura 3E) é observado, nota-se a mesma tendência nos pontos 3 e 4 acompanhados dos pontos 5, 6 e 7; a mesma inferência pode ser feita sobre as prováveis causas do aumento de N-NH3 em P3 e P4; potenciais fontes de poluição, sempre que os demais pontos se localizavam na área de maior concentração de hortas, podem ter recebido influência antrópica das atividades agrícolas praticadas nas hortas que podem ter contribuído com o aumento de N-NH3 por lixiviação ou pela erosão do solo proveniente dessas áreas, que aumentam o aporte de poluentes no ribeirão dos Marins.

Dissolvido, o oxigênio (OD) é um dos constituintes mais importantes dos recursos hídricos e um dos mais usados na avaliação da qualidade em razão de estar diretamente relacionado com os tipos de organismos que podem sobreviver em um corpo d'água. No geral, ao longo do tempo e espaço somente os pontos 1 e 2 estiveram dentro do limite estabelecido do CONAMA (2005). O maior valor de oxigênio dissolvido (OD) 6,80 mg L-1 O2 ocorreu em junho, no ponto 1, ao passo que o menor se deu em agosto 0,76 mg L-1 O2 no ponto 3.

A Tabela 4 mostra o resultado das variáveis de qualidade da água para os períodos seco e úmido. As variáveis que apresentaram diferença estatística significativa a 5% de probabilidade, foram apenas o cálcio, no ponto 3, e turbidez, nos pontos 1 e 7; para as demais variáveis, quando comparadas com o padrão estabelecido por Ayers & Westcot (1985) para qualidade de água para irrigação, o potássio apresentou valor acima do limite recomendado de 0 a 2 mg L-1, para os dois períodos, seco e úmido, enquanto o nitrato mostrou restrição de uso, de acordo com o padrão estabelecido apenas no ponto 3 no período seco.

No que se refere à condutividade elétrica, que é um parâmetro de qualidade importante para fins de irrigação e avaliação indireta da salinidade, somente o ponto 3 não se enquadrou no limite estabelecido por Ayers & Westcot (1985) durante o período seco; os demais pontos tiveram, em ambos os períodos, a CEa dentro do limite máximo estabelecido; o período seco indicou maior valor médio em relação ao período úmido, exceto para o ponto 4.

Apesar de outras variáveis de qualidade da água não terem apresentado diferença significativa entre os períodos seco e úmido, não significa que as mesmas não sofrem influência da quantidade de precipitação em uma bacia hidrográfica. Em um estudo de qualidade da água, Vanzela (2004) encontrou diferença entre os períodos seco e úmido, para as variáveis: turbidez, com tendência de aumento durante o período chuvoso; pH, com aumento durante o período seco; ferro, com aumento no período chuvoso; oxigênio dissolvido, com aumento da concentração durante o período seco; cálcio, com concentrações maiores durante o período seco e dureza total, com concentração pouco superior durante o período seco. Brito et al. (2005) observaram aumento significativo do pH, na bacia hidrográfica do rio Salitre, no período das chuvas, a medida em que se afastava das nascentes e passava pela área irrigada relacionando este aumento às atividades agrícolas implementadas na área, porém não se pode inferir a mesma observação para a MBHRM (Microbacia Hidrográfica do Ribeirão dos Marins), devido a fatores como a diferença na formação geológica e ao não aumento do pH ao longo da rede de drenagem da MBHRM, apesar da presença de atividades agrícolas, além das bacias serem de tamanhos diferentes e condições climáticas distintas.

Brito et al. (2006), utilizaram técnicas de análise multivariada na classificação das fontes hídricas superficiais da bacia hidrográfica do rio Salitre, localizada na Bahia, com nascente na Chapada Diamantina e deságue no rio São Francisco e verificou que, de 13 pontos amostrados no rio Salitre e seus afluentes, apenas dois foram classificados como C1 e sete como C2, com base na Resolução n. 20 de 1986, do CONAMA, no período sem chuvas; o autor relaciona esta variação na qualidade da água à influência das atividades agrícolas, como a irrigação intensivamente praticada nessa bacia, sendo também favorecida pela ocorrência da redução da vazão do rio Salitre, Bahia, no período sem chuvas, proporcionando maior concentração de solutos nas águas.

Ecologicamente, os efeitos negativos de algumas variáveis são: alta concentração de sedimentos, o que afeta os processos fotossintéticos com a redução da penetração da luz no corpo d'água e contribui com o aporte de defensivos agrícolas resultante do escoamento superficial da área cultivada que prejudicam o desenvolvimento da comunidade bentônica; a cor é um indicativo da presença de substâncias, geralmente orgânicas; salinidade, a qual é composta de bicarbonatos, cloretos, sulfatos e outros íons do solo, sendo que o teor de cloreto pode ser um indicativo de poluição por esgoto doméstico, no caso do ponto 3; magnésio e cálcio estão intimamente ligados com a dureza da água e à ocorrência de precipitação, formando carbonatos, o que pode ocasionar aumento de sódio na solução do solo.

De acordo com do CONAMA (2005) para uma água de classe 2, que pode ser usada para abastecimento humano após tratamento convencional, irrigação de hortaliças, plantas frutíferas e de parques, jardins, campos de esporte e lazer, somente a turbidez e o pH se apresentaram dentro dos limites estabelecidos pela Resolução, enquanto as outras variáveis tiveram um ou mais pontos fora do padrão estabelecido.

Destaca-se o comportamento do nitrato na rede de drenagem MBHRM: valores máximos 41,2 e 12,6 mg L-1 nos meses de setembro e abril para os pontos 3 e 4, respectivamente; esses valores, de acordo com a portaria 514 do Ministério da Saúde, não são recomendados para uso no abastecimento público, o que não ocorre na microbacia; entretanto a do CONAMA (2005) prevê limite máximo de 10 mg L-1 para água doce de classe 2, que pode ser utilizada na irrigação de hortaliças, enquanto o excesso de nitrogênio causa crescimento excessivo, maturação tardia, tombamento vegetal, pouca frutificação, baixa qualidade da produção e até desequilíbrio nutricional (Ayers & Westcot, 1985).

O fósforo, ao lado do nitrogênio, é uma variável de qualidade da água importante, pois é responsável pela eutrofização dos corpos d'água. Na Figura 3D, a seguir, observa-se a variação da concentração do fósforo total ao longo do tempo em que apresentou valores acima do estabelecido pela do CONAMA (2005), indicando potencial de eutrofização no ribeirão do Marins, particularmente onde há barragens, caracterizando um ambiente lêntico. Quando a descarga do ribeirão é reduzida no período seco, pode haver prejuízo à utilização de suas águas para usos como irrigação, abastecimento urbano e industrial.

O maior valor de sódio no mês de dezembro foi de 150,0 mg L-1, sendo que este íon tem grande importância no processo de salinização dos solos agrícolas. De acordo com Ayers & Westcot (1985) essa água possui moderada restrição para uso na irrigação por superfície.

CONCLUSÕES

1. A qualidade da água se encontra fora do padrão estabelecido para uso na irrigação de hortaliças, especialmente quanto ao ferro, cobre, oxigênio dissolvido, nitrato e fósforo.

2. As variáveis de qualidade de água não apresentaram alterações significativas entre os períodos seco e úmido, com exceção do fósforo.

3. O potássio foi a principal variável acima do limite estabelecido, e condutividade elétrica; o ponto 3 foi o único que apresentou restrição de uso para irrigação.

AGRADECIMENTOS

Aos produtores de hortaliças da bacia do ribeirão dos Marins. À Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", da Universidade de São Paulo, Departamento de Engenharia Rural, pela oportunidade de desenvolvimento do trabalho, e ao curso de Pós-Graduação Ecologia Aplicada - Interunidades - ESALQ/CENA, pela realização do curso.

Ao Programa Internacional de Bolsas de Pós-Graduação da Fundação Ford - IFP e à sua coordenação, pela equipe da Fundação Carlos Chagas, pela concessão da bolsa de estudo, e à Comissão Fulbright Brasil, pela concessão da bolsa "sanduíche".

Ao Conselho Nacional de Pesquisa - edital CT-Hidro (CNPq) pela concessão do auxílio pesquisa.

LITERATURA CITADA

Protocolo 177.08 - 16/09/2008 - Aprovado em 18/04/2010

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  • 1
    Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor, apresentada à ESALQ/USP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Set 2010
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