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Persistência de endossulfam e seu metabólito sulfato de endossulfam em condições de campo e laboratório

Persistence of endosulfan and its metabolite endosulfan sulfate under field and laboratory conditions

Resumos

Objetivou-se, neste trabalho, avaliar a persistência e a lixiviação de endossulfam no campo e sua degradação e formação do metabólito sulfato de endossulfam em condições de laboratório. Visando ao experimento da persistência e à lixiviação no campo, amostras de solo até a profundidade de 100 cm foram coletadas aos 0, 41, 74 e 125 dias após aplicação. Em laboratório amostras de solo nas profundidades de 0-30 e 50-70 cm foram incubadas a 30 ± 2 ºC e 80% da capacidade de campo e os resíduos de endossulfam e sulfato de endossulfam foram quantificados em função do tempo para ajuste dos modelos de cinética de primeira ordem e do modelo bifásico. Observou-se, no campo, que o endossulfam não lixiviou para menos de 10 cm de profundidade e houve uma rápida dissipação resultando em uma quantidade remanescente no perfil do solo (100 cm) inferior a 1% da dose aplicada aos 41 dias após a aplicação. Em laboratório os valores de TD50 para o endossulfam variaram de 17 a 26 dias e para o sulfato de endossulfam de 26 a 59 dias. O modelo de degradação bifásico mostrou-se superior ao de cinética de primeira ordem para descrever a degradação do endossulfam em laboratório.

degradação; meia-vida; lixiviação; dissipação


This study aimed to evaluate endosulfan leaching and persistence in the field as well as its degradation and formation of the metabolite endosulfan sulfate under laboratory conditions. For the persistence experiment and leaching in the field, soil samples until 100 cm depth were collected at 0, 41, 74, and 125 days after application. In the laboratory, soil samples of 0-30 cm and 50-70 cm depth were incubated at 30 ± 2 ºC and 80% field capacity and endosulfan residues were quantified as a function of time for adjusting the first order kinetics and biphasic models. In the field, it was observed that endosulfan did not leach beyond 10 cm depth and there was a rapid dissipation resulting in a quantity in the soil profile (100 cm) less than 1% of the applied dose at 41 days after application. In laboratory TD50 values for endosulfan ranged from 17 to 26 days and endosulfan sulfate 26-59 days. The biphasic decay model was superior to the first-order kinetics to describe the degradation of endosulfan in the laboratory.

degradation; half-life; leaching; dissipation


GESTÃO E CONTROLE AMBIENTAL

Persistência de endossulfam e seu metabólito sulfato de endossulfam em condições de campo e laboratório

Persistence of endosulfan and its metabolite endosulfan sulfate under field and laboratory conditions

Rômulo P. Scorza JúniorI; André A. FrancoI; Leila C. K. MoraesII

IEmbrapa Agropecuária Oeste, CP 449, CEP 79804-970, Dourados, MS. Fone: (67) 3416-9772. E-mail: romulo.scorza@embrapa.br; aandradefranco@gmail.com

IIUEMS, CP 351, CEP 79804-970, Dourados, MS. Fone: (67) 3902-2686. E-mail: leilackm@uems.br

RESUMO

Objetivou-se, neste trabalho, avaliar a persistência e a lixiviação de endossulfam no campo e sua degradação e formação do metabólito sulfato de endossulfam em condições de laboratório. Visando ao experimento da persistência e à lixiviação no campo, amostras de solo até a profundidade de 100 cm foram coletadas aos 0, 41, 74 e 125 dias após aplicação. Em laboratório amostras de solo nas profundidades de 0-30 e 50-70 cm foram incubadas a 30 ± 2 ºC e 80% da capacidade de campo e os resíduos de endossulfam e sulfato de endossulfam foram quantificados em função do tempo para ajuste dos modelos de cinética de primeira ordem e do modelo bifásico. Observou-se, no campo, que o endossulfam não lixiviou para menos de 10 cm de profundidade e houve uma rápida dissipação resultando em uma quantidade remanescente no perfil do solo (100 cm) inferior a 1% da dose aplicada aos 41 dias após a aplicação. Em laboratório os valores de TD50 para o endossulfam variaram de 17 a 26 dias e para o sulfato de endossulfam de 26 a 59 dias. O modelo de degradação bifásico mostrou-se superior ao de cinética de primeira ordem para descrever a degradação do endossulfam em laboratório.

Palavra-chave: degradação, meia-vida, lixiviação, dissipação

ABSTRACT

This study aimed to evaluate endosulfan leaching and persistence in the field as well as its degradation and formation of the metabolite endosulfan sulfate under laboratory conditions. For the persistence experiment and leaching in the field, soil samples until 100 cm depth were collected at 0, 41, 74, and 125 days after application. In the laboratory, soil samples of 0-30 cm and 50-70 cm depth were incubated at 30 ± 2 ºC and 80% field capacity and endosulfan residues were quantified as a function of time for adjusting the first order kinetics and biphasic models. In the field, it was observed that endosulfan did not leach beyond 10 cm depth and there was a rapid dissipation resulting in a quantity in the soil profile (100 cm) less than 1% of the applied dose at 41 days after application. In laboratory TD50 values for endosulfan ranged from 17 to 26 days and endosulfan sulfate 26-59 days. The biphasic decay model was superior to the first-order kinetics to describe the degradation of endosulfan in the laboratory.

Key words: degradation, half-life, leaching, dissipation

Introdução

Informações sobre o comportamento ambiental de agrotóxicos são de fundamental importância para avaliar sua periculosidade ambiental e, desta forma, o potencial de contaminação dos recursos naturais. Os principais processos relacionados ao comportamento ambiental de agrotóxicos são a lixiviação, escoamento superficial, volatilização, sorção e degradação (Köhne et al., 2009). A degradação é relevante para atenuação dos níveis de resíduos de um agrotóxico no solo e se refere ao seu processo de transformação em moléculas menores, de forma biótica ou abiótica tornando-os, na maioria dos casos, moléculas menos tóxicas (Oliveira & Brighenti, 2011).

A persistência de um agrotóxico no solo é representada pelo seu valor de meia-vida (TD50) que corresponde ao tempo necessário, em dias, para degradação de 50% da dose inicial aplicada. Quanto menor o valor de TD50 mais rápida é a degradação de um agrotóxico e, portanto, menor sua persistência. Os valores de TD50 são estimados com base em modelos matemáticos que descrevem a cinética de degradação de agrotóxicos, sendo o de cinética de primeira ordem o mais utilizado (Aldworth & Jackson, 2008). No entanto, alguns agrotóxicos têm apresentado comportamento de degradação do tipo bifásico, caracterizado por uma fase mais rápida seguida de uma mais lenta. Diversos modelos matemáticos têm sido utilizados para descrever a degradação bifásica (Gustafson & Holden, 1990; Guidance, 2010). As principais razões para comportamento bifásico da degradação de agrotóxicos em solos, são a diminuição da sua concentração na fase líquida ao longo do tempo devido aos processos de sorção e difusão em condições de não equilíbrio (Pignatello, 2000), diminuição da atividade microbiana nos solos incubados ao longo do tempo em razão da disponibilidade limitada de fontes de carbono e nutrientes e variabilidade espacial em nível microscópico das taxas de degradação (Gustafson & Holden, 1990). O valor de TD50 é utilizado para classificação da periculosidade ambiental de um agrotóxico. Assim, sua estimativa deve ser feita de forma bastante criteriosa e fundamentada, o que exige a escolha adequada e correta do modelo matemático a ser utilizado para descrever a cinética de degradação.

O endossulfam (1,4,5,6,7,7-hexachloro-8,9,10-trinorborn-5-en-2,3-ylenebis methylene) sulfite é um inseticida acaricida do grupo do organoclorados, utilizado para o controle de pragas nas culturas de soja, algodão, café e cana-de-açúcar, por meio de pulverização sobre as folhas ou incorporação ao solo. O principal metabólito do endossulfam no solo após sofrer oxidação microbiológica, é o sulfato de endossulfam (Kennedy et al., 2001), que é altamente tóxico aos organismos aquáticos (Leonard et al., 2001) além de apresentar maior toxicidade aos seres humanos que o próprio endossulfam. Diante disto, o governo brasileiro determinou a proibição de seu uso a partir de 31 de julho de 2013 (ANVISA, 2010).

Desta forma, objetivou-se: i) avaliar a lixiviação e a persistência do endossulfam em um Latossolo Vermelho distrófico em condições de campo em Ponta Porã, MS, tal como sua degradação em condições de laboratório; ii) avaliar a cinética de formação e a degradação do metabólito sulfato de endossulfam em condições de laboratório e iii) avaliar diferentes modelos matemáticos para descrever a cinética de degradação do endossulfam e a formação/degradação do metabólito sulfato de endossulfam.

Material e Métodos

O experimento de lixiviação e persistência do endossulfam no campo foi instalado na Fazenda Experimental da Embrapa Agropecuária Oeste em Ponta Porã, MS (22º 33' 13,4" S; 55º 38' 53,3" O), em uma área de 900 m2. O solo da área é classificado como Latossolo Vermelho distrófico típico de textura média (Santos et al., 2006). O período experimental compreendeu de 19/12/2008 a 23/04/2009. A aplicação do endossulfam foi realizada no dia 19/12/2008 utilizando-se um pulverizador acoplado ao trator com barra de 14 m e bicos do tipo leque, espaçados 50 cm com vazão de 320 L ha-1. A dose aplicada de endossulfam foi de 350 g i.a. ha-1, recomendada para controle de percevejos na cultura da soja. Amostras de solo para quantificação dos resíduos de endossulfam foram coletadas nas profundidades de 0-10 cm, 10-30 cm, 50-70 cm e 70-100 cm aos 0 (19/12/2008), 41 (29/01/2009), 74 (03/03/2009) e 125 (23/04/2009) dias após aplicação. Em cada data de amostragem foram sorteadas quatro parcelas de 9 m2, representando cada quadrante da área experimental, para a coleta das amostras de aproximadamente 200 g as quais foram armazenadas em freezer a -20 ºC durante 25 dias até a análise.

A metodologia de extração dos resíduos de endossulfam total, que correspondeu ao somatório dos isômeros α e β e do seu metabólito sulfato de endossulfam no solo, foram adaptadas de Corrêa et al. (2003). Para a extração 50 g de solo foram pesados em um erlenmeyer de 500 mL, com tampa, no qual se adicionaram 150 mL de acetona, mantendo-os sob agitação por uma hora; em seguida, os erlenmeyers foram deixados em repouso durante duas horas, para decantação. Uma alíquota de 6 mL do sobrenadante foi retirada e transferida para um balão volumétrico e só então passada em um funil contendo Na2SO4 para retenção de água; posteriormente, toda a acetona foi evaporada através de rotaevaporador e os resíduos (endossulfam e sulfato de endossulfam) presentes no balão foram transferidos para colunas de sílica gel 60 (1,5 cm de diâmetro interno, 8 cm de comprimento e 1,0 g de sílica gel) com o objetivo de purificação do extrato; para isto, os resíduos foram dissolvidos em hexano e transferidos para a coluna em três lavagens sucessivas de 5 mL. A eluição do endossulfam e seu metabólito sulfato de endossulfam na coluna de sílica foram feitos utilizando-se a mistura hexano:acetato de etila (7:3), por meio de duas lavagens com 5 mL. Todo o eluado foi evaporado em rotaevaporador e elevado para volume final de 4 mL em acetona. Todas as amostras foram filtradas em filtro 0,45 µm antes da injeção no cromatógrafo. As quantificações do endossulfam e seu metabólito sulfato de endossulfam foram feitos em um cromatógrafo gasoso Varian (modelo CP 3800) operando com detector de captura de elétrons, coluna CP-SIL 5 CB-MS (30 m x 0,25 mm x 0,25 µm 100% dimetilpolisiloxano) e amostrador automático. As condições de operação do cromatógrafo foram: fluxos do gás de arraste (N2) de 1 mL min-1 e "make-up" de 30 mL min-1; temperatura de 220 e 320 ºC, respectivamente, para injetor e detector; temperaturas da coluna programadas para 100 ºC (1 min), rampa de 10 ºC min-1 até 150 ºC mantida por 1 min, rampa de 13 ºC min-1 mantida durante 1 min, rampa de 15 ºC min-1 até 200 ºC mantida por 1 min, rampa de 20 ºC min-1 até 230 ºC mantida por 1 min, rampa de 25 ºC min-1 até 260 ºC, mantida por 1 min, rampa de 30 ºC min-1 até 280 ºC mantida por 1 min, rampa de 30 ºC min-1 até 300 ºC mantida por 0,5 min e modo de injeção do tipo "split/splitless". Os padrões analíticos do endossulfam alfa, beta e sulfato de endossulfam foram adquiridos da AccuStandard® e tinham pureza de 99,7, 97,5 e 99,3%, respectivamente. Prepararam-se as curvas analíticas utilizando-se seis concentrações no intervalo de 0,001 a 0,1 µg mL-1 e se obtendo valores de R2 entre 0,9895 a 0,9916. Para os testes de eficiência dos procedimentos analíticos para extração e quantificação dos resíduos de endossulfam α, β e sulfato de endossulfam utilizaram-se três níveis de fortificação (0,02; 0,1 e 2 µg g-1) em triplicata, obtendo-se recuperações de 99, 101 e 115%, respectivamente, com coeficientes de variação entre 2,3 e 7,4%. O limite de quantificação de endossulfam total e de sulfato de endossulfam foi de 0,002 µg g-1 de solo.

Para o experimento de degradação do endossulfam e formação do metabólito sulfato de endossulfam em condições de laboratório, oito amostras de solo foram coletadas nas profundidades de 0-30 e 50-70 cm, ao acaso, em área vizinha à área onde se realizou o experimento de lixiviação e a persistência no campo. Após a coleta as amostras correspondentes a cada profundidade foram misturadas e homogeneizadas e em seguida secadas ao ar e na sombra, trituradas em moinho e peneiradas em malha de 2 mm. Os valores de pH (água), matéria orgânica (g kg-1), areia (g kg-1) e argila (g kg-1) foram de 5,2; 16; 762 e 194 para 0-30 cm e de 5,0; 8; 729 e 244 para 50-70 cm de profundidade, respectivamente. Para incubação 50 g de solo seco foram pesados e adicionados em copos de vidro (200 mL). Alíquotas (30 µL) da solução de trabalho de endossulfam total foram adicionadas separadamente ao solo, em cada copo, de modo a fornecer 30 µg de endossulfam total em cada copo; esta quantidade corresponde à dose recomendada para controle de percevejos na cultura da soja; no total, 36 copos foram preparados, correspondentes a três repetições para cada data de amostragem (0, 11, 19, 29, 43 e 63 dias após aplicação) em cada profundidade. Os copos foram fechados na parte superior com papel alumínio contendo seis furos com vista a manter a condição aeróbica. As amostras foram incubadas em incubadoras tipo BOD com temperatura controlada de 30 ± 2 ºC, na ausência de luz e umidade correspondente a 80% da capacidade de campo (CC). Os valores de umidade volumétrica correspondentes a 80% da CC para 0-30 cm e 50-70 cm de profundidade foram, respectivamente, de 0,23 e 0,22 cm3 cm-3. A umidade nas amostras foi mantida em 80% da CC por meio da adição periódica de água ultrapura com auxílio de uma balança até atingir o peso desejado em cada copo. A metodologia de extração e a quantificação dos resíduos de endossulfam e sulfato de endossulfam foram semelhantes às descritas anteriormente.

Em função do tempo e para cada profundidade, os valores das quantidades remanescentes de endossulfam total foram ajustados ao modelo de cinética de primeira ordem e ao modelo bifásico (Gustafson & Holden, 1990). Para tal, utilizou-se o programa Sigma Plot® versão 12.2 pelo método do ajuste de regressão não linear. O modelo de cinética de primeira ordem é dado pela Eq. 1.

em que:

C - quantidade remanescente de endossulfam total no solo, %

C0 - quantidade inicial aplicada, %

k - taxa de degradação do endossulfam total, d-1

t - tempo de incubação, dias

O modelo bifásico é dado pela Eq. 2.

em que:

α - parâmetro adimensional

β - parâmetro, d-1

Em função do tempo no solo, os dados da quantidade do metabólito sulfato de endossulfam (cinética de formação e degradação) foram ajustados ao modelo de cinética de primeira ordem (Richter et al., 1996) dado pela Eq. 3:

em que:

Csul - concentração de sulfato de endossulfam no solo, µg g-1

C0_sul - concentração inicial de sulfato de endossulfam no solo, µg g-1

ksul - taxa de degradação de sulfato de endossulfam, d-1

Para o ajuste dos dados da quantidade do metabólito sulfato de endossulfam em função do tempo no solo, utilizou-se o programa KinGUI 2 (Meyer, 2012).

A qualidade do ajuste dos dados observados aos dois modelos foi realizada com base na análise visual, no erro do teste chi-quadrado - Erro χ2 (Guidance, 2010), na significância dos parâmetros pelo teste t a 5% e na análise dos resíduos padronizados (Neter et al., 1996). O teste chi-quadrado indica se o modelo é apropriado para descrever os dados observados testando se as diferenças entre os valores observados e os preditos são devidas ao acaso. Ante a possibilidade dos dois modelos testados serem considerados apropriados pelo teste chi-quadrado, utilizou-se o Erro χ2 sendo que, quanto menor seu valor menor também será a incerteza assumida pelo modelo nos valores observados considerando-se que tenha passado pelo teste chi-quadrado. Assim, o modelo que apresentar menor valor do Erro χ2 é considerado mais robusto para descrever os dados observados (Guidance..., 2010).

Os valores de TD50 e do tempo para degradação de 90% da dose inicial aplicada (TD90) para o endossulfam e sulfato de endossulfam, após ajuste ao modelo de cinética de primeira ordem, foram obtidos pelas Eqs. 4 e 5, respectivamente.

Já os valores de TD50 e TD90 para o endossulfam, após ajuste ao modelo bifásico foram obtidos por:

Resultados e Discussão

A quantidade média recuperada de endossulfam total logo após aplicação no campo foi, em 19/12/2008, de 1.095,6 ± 120,6 µg kg-1 de solo, indicando uma recuperação de 94% (baseada na quantidade aplicada de 1.166 µg kg-1). Observou-se, com base nas amostragens aos 41, 74 e 125 dias após aplicação, que as concentrações de endossulfam na camada de 0-10 cm de profundidade, foram de 8,85 ± 4,12; 4,31 ± 2,00 e 9,24 ± 6,48 µg kg-1 de solo, respectivamente. O endossulfam não foi observado nas camadas abaixo de 10 cm de profundidade indicando sua baixa lixiviação para as condições edafoclimáticas estudadas. Essas quantidades presentes no solo aos 41, 74 e 125 dias após aplicação representam menos de 1% da quantidade aplicada evidenciando a rápida dissipação do endossulfam no campo. Na última data de amostragem (125 dias), observou-se um valor da quantidade remanescente de endossulfam total no solo (9,24 µg kg-1) superior ao das datas anteriores; no entanto, esperava-se um decréscimo da concentração total em função do tempo; esta discrepância se deve, possivelmente, à variabilidade espacial nas concentrações de endossulfam no solo pois se espera que este efeito seja mais pronunciado para as concentrações menores. Corrêa et al. (2003) observaram, em condições de campo em Piracicaba, SP, que o endossulfam não lixiviou abaixo de 20 cm de profundidade e atribuíram este fato às características lipofílicas do endossulfam (KOC > 5700 mL g-1), o que proporciona sua alta afinidade pelas partículas do solo. Da mesma forma, Laabs et al. (2000) observaram que o α-endossulfam ficou imóvel no solo após aplicação em uma área agrícola de Mato Grosso.

A rápida dissipação do endossulfam no campo observada neste estudo se deveu, possivelmente, à sua volatilização e ao escoamento superficial nos primeiros dias após a aplicação. Nos primeiros 41 dias após a aplicação o endossulfam se concentrava na camada superficial do solo e a temperatura média máxima do ar observada neste período foi de 32 ºC com precipitação total igual a 233 mm. Estudos têm mostrado evidências de volatilização intensa de agrotóxicos em condições tropicais brasileiras (Laabs et al., 2000; Nogueira et al., 2012; Scorza Júnior & Regitano, 2012). Laabs et al. (2000) observaram TD50 para α-endossulfam igual a 2,5 dias após sua aplicação em condições de campo em Mato Grosso. Este pequeno valor de TD50 indica uma rápida dissipação do α-endossulfam logo após a aplicação que, provavelmente, foi causada por sua rápida volatilização em virtude das altas temperaturas da região. A presença de resíduos de agrotóxicos em amostras de água da chuva tem sido utilizada para demonstrar a volatilização desses compostos em países de clima temperado (Dubus et al., 2000; Vogel et al., 2008; Gish et al., 2011) e tropical (Laabs et al., 2002; Nogueira et al., 2012), inclusive com relatos da presença do endossulfam (Scheyer et al., 2005; Nogueira et al., 2012). Kennedy et al. (2001) observaram volatilização de 70% do endossulfam após sua aplicação na cultura do algodoeiro, na Austrália.

Observa-se um comportamento de degradação similar do endossulfam para ambas as profundidades, não evidenciando grande influência da diferença dos atributos físicos e químicos das diferentes profundidades (Figura 1). O ajuste das quantidades remanescentes de endossulfam em função do tempo ao modelo de cinética de primeira ordem foi satisfatório, resultando em baixos valores de Erro χ2 e iguais a 6,3 para 0-30 cm e 7,6 para 50-70 cm de profundidade (Tabela 1). Entretanto, o ajuste ao modelo bifásico de Gustafson & Holden (1990) resultou em valores de Erro χ2 iguais a 2,6 para 0-30 cm e 7,0 para 50-70 cm de profundidade, que são inferiores aos obtidos para o modelo de cinética de primeira ordem (Tabela 2). Esses valores inferiores de Erro χ2 para o modelo bifásico indicam sua superioridade quando comparado com o modelo de cinética de primeira ordem para descrever a degradação do endossulfam no solo e as condições estudadas. Todos os parâmetros estimados de ambos os modelos testados, foram estatisticamente significativos pelo teste t (P < 0,05) conforme Tabelas 1 e 2, além de mais de 90% dos resíduos padronizados se situarem no intervalo entre 2 e -2.


Os valores de TD50 do endossulfam estimados com base no modelo de cinética de primeira ordem, foram de 20 dias para 0-30 cm e 26 dias para 50-70 cm de profundidade (Tabela 1). Esses valores são inferiores aos reportados por PPDB (2011) que variaram entre 28 e 50 dias para solos incubados a 20 ºC. Como neste estudo os solos foram incubados a 30 ºC, os menores valores de TD50 se deveram, quando comparados com os de PPDB (2011) possivelmente a uma degradação mais rápida devido à temperatura mais elevada. Já os valores de TD50 estimados com base no modelo bifásico foram de 17 dias para 0-30 cm e 23 dias para 50-70 cm de profundidade (Tabela 2). De maneira geral, os valores de TD50 estimados com base no modelo bifásico foram inferiores aos obtidos pelo modelo de cinética de primeira ordem, evidenciando a necessidade da escolha correta e com base em critérios estatísticos de um modelo de degradação para estimativa dos valores de TD50. Com base no modelo de cinética de primeira ordem, as estimativas de TD90 foram de 65 dias para 0-30 cm e 86 dias para 50-70 cm de profundidade (Tabela 1); apesar disto, esses valores foram bem superiores quando estimados pelo modelo bifásico e iguais a 132 dias para 0-30 cm e 143 dias para 50-70 cm de profundidade (Tabela 2). Observa-se que houve tendência do modelo bifásico estimar valores superiores da quantidade remanescente de endossulfam para ambas as profundidades quando comparado ao modelo de cinética de primeira ordem, para as últimas datas de amostragem (Figura 1). Com isto, são esperados valores superiores de TD90 para o modelo bifásico devido à menor taxa de diminuição das concentrações remanescentes de endossulfam para este modelo para tempo superiores a 50 dias. Salienta-se que estimativas de TD90 em experimentos de degradação em que a concentração do agrotóxico na última data de amostragem foi superior a 10% da dose inicial aplicada, devem ser interpretadas com cautela já que uma predição de valores por modelos matemáticos fora do intervalo estudado pode ser perigosa.

A conversão de endossulfam em sulfato de endossulfam foi mais rápida na profundidade de 0-30 cm quando comparada a 50-70 cm de profundidade, sendo as maiores concentrações observadas aos 43 dias após aplicação do endossulfam para ambas as profundidades (Figura 2). Os ajustes das concentrações de sulfato de endossulfam em função do tempo para ambas as profundidades, ao modelo de cinética de primeira ordem, resultaram em valores de Erro χ2 iguais a 15,4 para 0-30 cm e 17,7 para 50-70 cm de profundidade (Tabela 3). Os valores de ksul para as duas profundidades foram estatisticamente significativos pelo teste t (P < 0,05), conforme a Tabela 3, além de mais de 90% dos resíduos padronizados se situarem no intervalo entre 2 e -2. Os valores de TD50 e TD90 para o sulfato de endossulfam foram, respectivamente, de 59 e 195 dias para 0-30 cm e 26 e 87 dias para 50-70 cm de profundidade (Tabela 3). Assim, observa-se uma degradação mais rápida do metabólito sulfato de endossulfam na camada mais profunda do solo (50-70 cm). Silva et al. (2010) avaliaram a influência da umidade, temperatura e profundidade do solo na degradação do sulfato de endossulfam em solos incubados provenientes de uma região agrícola de Mato Grosso e observaram valores de TD50 entre 6 a 88 dias. A degradação mais rápida de sulfato de endossulfam na camada mais profunda do solo, conforme constatado neste estudo, também foi observada por Silva et al. (2010). É provável que esta degradação mais rápida na camada mais profunda do solo tenha sido favorecida pelo maior teor de argila quando comparada com a superfície, o que pode favorecer o processo denominado hidrólise catalisada pela argila (Awasthi & Prakash, 1997).


Conclusões

1. No campo, o endossulfam apresentou baixa lixiviação com profundidade máxima de 10 cm e uma baixa persistência para as condições edafoclimáticas estudadas.

2. Os valores de TD50 para o endossulfam nas duas profundidades estudadas, variaram de 17 a 26 dias e para o sulfato de endossulfam, de 26 a 59 dias.

3. O modelo bifásico de degradação mostrou-se superior para descrever os dados de degradação de endossulfam em laboratório, quando comparado ao de primeira ordem.

Agradecimentos

Ao CNPq, pelo auxílio financeiro (processos nº 471517/2007-0 e nº 551696/2007-9).

Literatura Citada

Protocolo 148.12 – 06/07/2012

Aprovado em 03/05/2013

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Jun 2013
  • Data do Fascículo
    Jul 2013

Histórico

  • Recebido
    06 Jul 2012
  • Aceito
    03 Maio 2013
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