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Estoque de energia na biomassa e no ar do dossel de Vochysia divergens Pohl

Energy storage in the biomass and air of the canopy of Vochysia divergens Pohl

Resumos

A variação da energia armazenada na biomassa e no ar do dossel pode ser estimada por meio de medidas da temperatura da biomassa e do ar e da distribuição da biomassa, constituindo-se um componente significativo do balanço de energia. Apesar de que estimativas acuradas desse componente do balanço de energia são de difícil obtenção e normalmente desprezadas nos cálculos, sobretudo em análises de períodos longos. Colaborando com a compreensão do fechamento do balanço de energia existente na floresta, este trabalho estimou o estoque de energia disponível na biomassa por meio de dados micrometeorológicos em uma floresta de Vochysia divergens Pohl no Pantanal, em 2007. O armazenamento de energia na biomassa e no ar do dossel foi superior na estação chuvosa em relação à seca; entretanto, a diferença entre o valor máximo e mínimo horário foi maior durante a estação seca. Os valores de armazenamento de energia na biomassa e no ar do dossel em floresta de V. divergens no Pantanal foram, em 2007, similares à energia armazenada em outras florestas tropicais.

área alagada; balanço de energia; inundação; Pantanal; sazonalidade


The variation of the storage energy in the biomass and in the air of the canopy can be estimated by measuring biomass and air temperature and biomass distribution being a significant component of energy balance. Nevertheless, accurate estimates of this component of energy balance are difficult to obtain and usually neglected in the calculations, especially in analysis of long periods. To understand the energy balance in the forest, this study estimated the energy stored in biomass using micrometeorological data in a forest monodominant Vochysia divergens Pohl in Pantanal in 2007. The energy stored in the biomass and in the air of the canopy (S) was higher in rainy season than in dry season, however, the difference between maximum and minimum values was higher during the dry season. The values of S in V. divergens forest in Pantanal in 2007 were similar to storage energy in the other tropical forests.

wetland; energy balance; flooding; Pantanal; seasonality


METEOROLOGIA E CLIMATOLOGIA AGRÍCOLA

Estoque de energia na biomassa e no ar do dossel de Vochysia divergens Pohl

Energy storage in the biomass and air of the canopy of Vochysia divergens Pohl

Luciana SanchesI; Ludymilla B. da SilvaII; Suzy D. de LimaIII; Osvaldo A. PereiraIV; Flair J. Carrilho S.V; José de S. NogueiraVI

IDepartamento de Engenharia Sanitária e Ambiental/UFMT. Cuiabá, MT. E-mail: lsanches@ufmt.br

IIPrograma de Pós-graduação em Física Ambiental, Instituto de Física/UFMT. Cuiabá, MT. E-mail: ludymillab@gmail.com (Autor correspondente)

IIIDepartamento de Engenharia Sanitária e Ambiental/UFMT. Cuiabá, MT. E-mail: suzydarley@hotmail.com

IVPrograma de Pós-graduação em Física Ambiental, Instituto de Física/UFMT. Cuiabá, MT. E-mail: osvaldo_fu@yahoo.com.br

VPrograma de Pós-graduação em Física Ambiental, Instituto de Física/UFMT. Cuiabá, MT. E-mail: flasosa@msn.com

VIPrograma de Pós-graduação em Física Ambiental, Instituto de Física/UFMT. Cuiabá, MT. E-mail: nogueira@ufmt.br

RESUMO

A variação da energia armazenada na biomassa e no ar do dossel pode ser estimada por meio de medidas da temperatura da biomassa e do ar e da distribuição da biomassa, constituindo-se um componente significativo do balanço de energia. Apesar de que estimativas acuradas desse componente do balanço de energia são de difícil obtenção e normalmente desprezadas nos cálculos, sobretudo em análises de períodos longos. Colaborando com a compreensão do fechamento do balanço de energia existente na floresta, este trabalho estimou o estoque de energia disponível na biomassa por meio de dados micrometeorológicos em uma floresta de Vochysia divergens Pohl no Pantanal, em 2007. O armazenamento de energia na biomassa e no ar do dossel foi superior na estação chuvosa em relação à seca; entretanto, a diferença entre o valor máximo e mínimo horário foi maior durante a estação seca. Os valores de armazenamento de energia na biomassa e no ar do dossel em floresta de V. divergens no Pantanal foram, em 2007, similares à energia armazenada em outras florestas tropicais.

Palavras–chave: área alagada, balanço de energia, inundação, Pantanal, sazonalidade

ABSTRACT

The variation of the storage energy in the biomass and in the air of the canopy can be estimated by measuring biomass and air temperature and biomass distribution being a significant component of energy balance. Nevertheless, accurate estimates of this component of energy balance are difficult to obtain and usually neglected in the calculations, especially in analysis of long periods. To understand the energy balance in the forest, this study estimated the energy stored in biomass using micrometeorological data in a forest monodominant Vochysia divergens Pohl in Pantanal in 2007. The energy stored in the biomass and in the air of the canopy (S) was higher in rainy season than in dry season, however, the difference between maximum and minimum values was higher during the dry season. The values of S in V. divergens forest in Pantanal in 2007 were similar to storage energy in the other tropical forests.

Keyword: wetland, energy balance, flooding, Pantanal, seasonality

INTRODUÇÃO

O Pantanal é uma das maiores áreas alagáveis contínuas do mundo, cuja área é de aproximadamente 160.000 km2 (Harris et al., 2005; Mesquita et al., 2013) dos quais 30% de sua área são cobertos por florestas inundáveis (Cunha & Junk, 2004) como, por exemplo, florestas com monodominânica de Vochysia divergens Pohl (Vochysiaceae) localmente chamada Cambará, espécie perenefólia, pioneira e sensível à variabilidade interanual da precipitação (Arieira & Cunha, 2006).

A espécie V. divergens é altamente adaptada à inundação e capaz de expandir sua distribuição nos períodos úmidos e limitada durante as secas plurianuais, além de possuir baixa tolerância a eventos de fogo frequentes no Pantanal durante a seca. Considerando que as extensas áreas planas de campos naturais favorecem a pecuária, principal atividade econômica desta região (Junk & Cunha, 2005) a espécie V. divergens se torna importante visto que, como espécie pioneira, se expande rapidamente colonizando áreas de pastagens e compondo formações monodominantes (Cunha & Junk, 2004). Neste contexto, a substituição de pastos e bosques por florestas monodominantes de V. divergens tem potencial para alterar caracterísicas físicas e biogeoquímicas dos ecossistemas que compõem o Pantanal como, por exemplo, mudanças na dinâmica sazonal da evapotranspiração (Huxman et al., 2005; Scott et al., 2006; Sanches et al., 2011; Curado et al., 2014) e no armazenamento de energia nos ecossistemas alterados principalmente pelo fato de que áreas alagáveis tropicais constituem um tipo especial de zonas úmidas caracterizadas por uma estação seca e molhada pronunciada, o que determina sua dinâmica de inundação (Girard, 2011).

Tendo em vista que a partição de energia disponível entre os fluxos de calor latente e sensível possui dinâmicas distintas em ecossistemas florestais e de pastagem, uma vez que nas florestas a maior quantidade de energia disponível é destinada à evapotranspiração (fluxo de calor latente) e uma pequena quantidade para aquecer o ar (fluxo de calor sensível) enquanto que nas pastagens a transferência de energia para a atmosfera ocorre equitativamente pelos fluxos de calor latente e sensível no período seco e, predominantemente, pelo fluxo de calor latente durante a estação chuvosa (Galvão & Fisch, 2000). A partir das alterações provocadas pela colonização de áreas de pastagens pela espécie Vochysia divergens Pohl, o balanço de radiação e energia pode sofrer mudanças com magnitudes ainda não totalmente conhecidas. Neste contexto, as dificuldades associadas aos estudos em ecossistemas florestais estão relacio-nadas à realização das medidas; em sistemas tropicais, por exemplo, há escassez de medições diretas de variáveis, como evaporação (Schwerdtfeger et al., 2014) e, em contrapartida, da estimativa do fechamento do balanço de energia (McCaughey et al., 1997; Barr et al., 2006; Wilson et al., 2002).

Uma conclusão geral em referência a isto refere-se ao armazenamento de energia na biomassa que pode constituir um componente significativo do saldo de radiação em ecossistemas florestais durante períodos específicos. Poucos são os estudos que tratam da estimativa de armazenamento de calor na biomassa (Moore & Fisch, 1986; McCaughey & Saxton, 1988; Meesters & Vugts, 1996; Michiles & Gielow, 2008). Isto porque a estimativa da energia estocada na biomassa se torna complexa devido à variação de temperatura no dossel e no caule, o que requer um grande número de sensores (McCaughey & Saxton, 1988; Oliphant et al., 2004; Barr et al., 2006; Roupsard et al., 2006) ou um quadro matemático sofisticado (Moore & Fisch, de 1986; Meesters & Vugts , 1996). Inicialmente os estudos sobre o balanço de energia em áreas de florestas não consideravam o termo de armazenamento de energia na biomassa (S) em razão da complexidade de sua medida porém o armazenamento de energia na biomassa pode ser potencialmente importante, sobremaneira em vegetação densa e alta.

Moore & Fisch (1986) descreveram um método a partir do qual as mudanças no armazenamento de energia pela biomassa podem ser estimadas a partir de medidas da umidade e da temperatura do ar e também da biomassa. Este modelo foi calibrado para a área de floresta de terra firme da Amazônia (Reserva Ducke) associado com informações da estrutura e distribuição da biomassa. Objetivou-se, neste trabalho, quantificar o estoque de energia na biomassa e no ar na altura do dossel (S) em floresta de V. divergens no Pantanal Mato-grossense durante 2007.

MATERIAL E MÉTODOS

A região está localizada no centro do continente Sul-Americano. O estudo foi conduzido no nordeste do Pantanal, aproximadamente a 160 km de Cuiabá e 60 km de Poconé, Mato Grosso, Brasil (16° 39' 50" S e 56° 47' 50" O). A área experimental está situada dentro da Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN SESC – Pantanal. A vegetação é constituída por formação mono dominante de Vochysia divergens Pohl com altura do dossel variando entre 28 a 30 m. O solo foi classificado como Gleissolo Háplico TA Distrófico típico. O clima é do tipo Aw conforme classificação climática de Köppen, com uma estação seca (junho a novembro) e uma estação chuvosa (dezembro a maio). A precipitação média anual é aproximadamente 1.400 mm, com precipitação máxima em janeiro e mínima em julho. As inundações ocorrem durante a estação chuvosa visto que, devido à paisagem plana, o padrão de inundação no interior do Pantanal é fortemente influenciado pela precipitação local.

Nesta área (Figura 1) conhecida como Pantanal do município de Poconé, as inundações são superficiais até cerca de 2 m de profundidade. Durante o período de seca e em virtude das planícies baixas, muitos dos lagos de várzea são desconectados do canal do rio (Cunha & Junk, 2004).


O limite em cor vermelha externo é a bacia do Paraguai e o contorno em cor rosa é o limite do Pantanal Mato-grossense Medições contínuas de variáveis meteorológicas foram realizadas por sensores instalados em uma torre de 33,7 m de altura entre janeiro a dezembro de 2007, conforme Tabela 1.

Os sensores micrometeorológicos e de medição de fluxo de calor no solo estavam conectados a um sistema de controle e registro acoplado a um multiplexador (AM 16 Cambpell Scientific Inc. Logan UT USA®) alimentado por um conjunto de baterias mantidas carregadas por meio de paineis solares (SP 65 Cambpell Scientific Inc. Logan UT USA®). As médias dos dados coletados foram armazenadas a cada 15 min em um datalogger (MM900 ELE International Bedfordshire UK®) e transferidas para o disco rígido de um computador, a cada quinze dias. Os dados de precipitação foram medidos no posto da RPPN-SESC Pantanal de Porto Cercado distante aproximadamente 15 km da torre micrometeorológica. O estoque de energia na biomassa e no ar na altura do dossel (S) abaixo da torre foi estimado segundo a equação de Moore & Fisch (1986) de acordo com a Eq. 1.

em que:

δTr - variação horária da temperatura do ar acima do dossel

δqr - mudança horária da umidade do ar acima do dossel, oK

δTr* - diferença de temperatura do ar acima do dossel defasado em 1 h, oK, g kg-1

O processo de advecção foi desprezado considerando-se que o movimento da água era muito lento.

Para verificação da sazonalidade de desenvolvimento do dossel o índice de área foliar (IAF) do cambarazal foi estimado conforme a extensão da lei de Lambert Beer proposta por Monsi & Saeki (1953) considerando-se que a copa do dossel era aproximadamente esférica e os registros de radiação fotossinteticamente ativa (PAR) ocorreram entre 10 e 14 h, conforme a Eq. 2.

em que, IAF é o índice de área foliar, m2 m-2; I a densidade de fluxo de radiação fotossinteticamente ativa (PAR) que atinge e atravessa o dossel, μ mol m-2 d-1; Io a densidade de fluxo de PAR que atinge o topo do dossel, μ mol m-2 d-1; Ior a densidade de fluxo de PAR refletida pelo topo do dossel, μ mol m-2 d-1; k o coeficiente de extinção da radiação.

O k empregado foi estimado de acordo com o método proposto por Goudriaan (1988) que considera uma distribuição aleatória do ângulo foliar e copa esférica das plantas.

A interceptação e, consequentemente, a extinção da radiação, são dadas conforme a Eq. 3.

em que:

O - projeção média das folhas na direção do feixe solar, ângulo em graus

β - ângulo de elevação do sol em relação ao horizonte, ângulo em graus

Para uma distribuição composta do ângulo das folhas o valor médio da projeção (O) foi determinado pela integração ao longo do ângulo de distribuição das folhas (F) entre zero e π/2, simplificado conforme a Eq. 4.

em que:

F1, F2 e F3 - frequências relativas de distribuição da inclinação de folhas nas classes de 15°, 45° e 75°, respectivamente, abrangendo 30° cada uma e de distribuição esférica, F1, F2 e F3 com valores de 0,134; 0,366 e 0,5, respectivamente.Segundo Goudriaan (1988) O1 e O2 são dependentes do ângulo de elevação solar sendo aproximadamente a combinação de uma senoide e um constante limite inferior, conforme as Eqs. 5 e 6.

O valor de O3 é referente à projeção para uma distribuição esférica que, independentemente da elevação solar, deve ser igual a 0,5; a partir dessas frequências a expressão de O3 foi estimada pela Eq. 7.

O ângulo de elevação do sol em relação ao horizonte (β) foi determinado pela Eq. 8.

em que:

Z - ângulo medido em relação à vertical (zênite) ou ângulo zenital

O ângulo zenital Z depende da hora do dia, da latitude local e do período do ano e foi estimado de acordo com a Eq. 9.

em que:

φ - latitude do local de estudo, 16º 39' 50" S

δ - declinação solar, ângulo em graus

t - hora, h

to - hora do pôr-do-sol, h

Como a declinação solar varia de +23,45º no inverno a – 23,45º no verão para o Hemisfério Sul (em relação ao plano do equador) pode-se calcular a declinação solar pela Eq. 10.

em que:

J - dia juliano, d

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os valores de armazenamento de energia na biomassa e no ar do dossel (S) variaram sazonalmente com média de 26,5 W m-2 na estação chuvosa e 24,9 W m-2 na estação seca; no entanto, esta variação não foi significativa (p ≥ 0,05). Em floresta de terra firme da Amazônia (Reserva Ducke) os valores típicos de armazenamento de energia variaram entre 30 a 40 W m-2, excedendo em algumas ocasiões a 80 W m-2 (Moore & Fisch, 1986). Em geral, durante o dia os valores de S foram positivos e durante a noite, negativos (Figura 2).


A tendência do ciclo diário de S foi de aumento no início da manhã acompanhando o aquecimento da superfície pela radiação solar global alcançando valores máximos entre 7 e 11 h; logo após este horário o S diminuiu acentuadamente e acompanhou a tendência de diminuição da radiação solar global, com mínimos entre 15 e 18 h.

O valor máximo positivo de S ocorreu na estação chuvosa, em dezembro, com 32,72 W m-2 aproximadamente às 7 h e o mínimo em outubro, com 23,07 W m-2 às 16 h 30 min enquanto que na estação seca o maior pico positivo ocorreu em junho chegando a 29,73 W m-2 às 10 h 45 min e o pico negativo de 30,74 W m-2 às 16 h 30 min neste mesmo mês. Os valores máximos e mínimos ocorreram em horários de transição, como após o nascer do sol e antes do pôr-do-sol, respectivamente, e também após os eventos de precipitação que permitem verificar a importância do componente S no balanço de energia da superfície em períodos com menor intensidade na incidência de radiação solar global. O atraso na ocorrência do pico máximo positivo em junho em relação a dezembro, foi ocasionado por fatores decorrentes das estações do ano, outono e inverno (20 de março a 20 de junho e 21 de junho a 22 de setembro, respectivamente) em que uma das características dessas estações é a queda da temperatura devido à variação anual do ciclo da radiação solar global.

Basicamente, a variação em S se deve à energia armazenada na biomassa, na coluna de ar dentro do dossel, no solo e na água acumulada sobre a superfície do solo, durante o período de inundação. O dossel da vegetação (altura média do dossel de 28 m) atenuou a entrada da radiação solar motivo pelo qual no período de inundação a absorção de energia térmica pela água não foi relativamente superior à atmosfera, embora a maior quantidade de vapor de água no ar durante a estação chuvosa tenha contribuído no aumento da capacidade térmica do ar, o que pode ser constatado nas menores amplitudes entre os valores mínimos e máximos de S, nesta estação. Em floresta de V. divergens no Pantanal Mato-grossense, Sanches et al. (2010) utilizaram, ao avaliar o armazenamento de calor em elementos do dossel (folhas, caules, troncos de árvores) e na água parada durante o período de inundação, dados de temperatura do ar obtidos próximo ao topo da copa (33,7 m) e próximo à superfície do solo (1 cm) de acordo com a metodologia abordada por Tanner (1960). Os autores relatam valores muito baixos de energia armazenada na biomassa do dossel que foram consistentes com baixos valores de fluxo de calor no solo presumivelmente causados pelo IAF e consistentemente altos, indicando que a maior parte da PAR foi absorvida pelas folhas superiores no dossel sugerindo que o fluxo de energia nas camadas mais baixas do dossel e na água acumulada sobre o solo, era pequeno.

Mudanças na temperatura do ar são usadas para calcular as mudanças de temperatura da água e, portanto, o armazenamento de calor na água em áreas úmidas/alagadas, como descrito por Shoemaker et al. (2005). Em alguns estudos realizados em áreas alagadas (wetlands) considerou-se que as mudanças no armazenamento de calor da água foram maiores que as mudanças no armazenamento de energia na biomassa e no ar dentro do dossel (Bidlake et al., 1996; German, 2000) haja vista que a capacidade térmica da água é quase o dobro da capacidade térmica da vegetação, solo e matéria orgânica. Em estudos mencionados por Bidlake et al. (1996) e German (2000) que estudam o armazenamento de energia em áreas alagadas, a vegetação deve ser mencionada de vez que, diferentemente da vegetação do presente estudo, a vegetação possuía menor porte e se encontrava completamente alagada no período de inundação.

Variáveis micrometeorológicas, como temperatura do ar, saldo de radiação, umidade do solo e outros, influenciam no padrão do armazenamento de energia na biomassa. As Figuras 3 e 4 apresentam o padrão horário mensal da temperatura do ar, umidade relativa do ar, do saldo de radiação e da velocidade do vento.

Em média, a temperatura foi superior na estação seca em relação à chuvosa, com máximo em setembro e mínimo em maio, respectivamente. A amplitude entre valores máximos e mínimos diários na temperatura do ar foi superior nos meses de junho e agosto e menor em janeiro e fevereiro, acompanhando as tendências de variação diária da umidade relativa do ar.

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De forma diferente, o padrão horário do saldo de radiação (Rn) apresentou maior amplitude na estação chuvosa enquanto as menores amplitudes ocorreram na estação seca, com exceção no mês de agosto. Inicialmente, o estoque de energia na biomassa e no ar na altura do dossel (S) não apresentou correlação significativa com o saldo de radiação (Rn) nem com a velocidade do vento (u) e S, (p > 0,05); porém, ao se utilizar a análise de correlação cruzada de Pearson entre os dados de S e as variáveis meteorológicas, foi possível observar uma correlação significativa entre S e o Rn, sendo o coeficiente de correlação máximo (rmáx = 0,83, p < 0,05) com tempo de defasagem de 2 h 15 min, que constitui o tempo de resposta de S para as mudanças de condições do Rn. Em geral, o padrão no comportamento horário da velocidade do vento foi similar ao Rn, com valores superiores na estação seca; entretanto, com menores amplitudes devido à intermitência do vento ao longo do dia enquanto que na estação chuvosa a amplitude entre máximos e mínimos foi maior com picos entre 10 e 14 h e nos outros períodos do dia as velocidades foram predominantemente mais baixas em relação à estação seca.

O vento contribui para diminuir a resistência à transferência de energia da biomassa para a atmosfera e no período chuvoso, quando ocorreu tendência de decréscimo da velocidade do vento, os valores horários de S aumentaram; contudo, esta relação não foi estatisticamente significativa. A inundação constitui fator perturbador para muitas espécies; mesmo assim, a espécie V. divergens possui tolerância aos efeitos da inundação, e isso pode ser verificado pelos valores do índice de área foliar (IAF) representados, passível de ser constatado na Figura 5, que foi de apenas 20% menor na estação chuvosa em referência à seca, com médias de 3,0 m2 m-2 (estação chuvosa) e 3,8 m2 m-2 (estação seca).


A inundação ocorreu de janeiro a maio/2007 (estação chuvosa) com nível que alcançou 625 mm em março, e em dezembro/2007 (estação chuvosa) iniciou o ciclo de inundação novamente (Sanches et al., 2010).A sazonalidade no IAF na floresta monodominante de V. divergens também foi verificada em uma floresta de transição entre a Amazônia e o Cerrado no norte de Mato Grosso (Pinto Júnior et al., 2011 ). Vourlitis & Rocha (2010) consideram que as áreas invadidas por V. divergens são susceptíveis a menor variação no nível d'água e, em geral, maior evapotranspiração, tendo em vista que essa vegetação apresenta uma profundidade maior de raízes e um IAF significativamente mais elevado em relação às pastagens ou matas que elas substituem pela sua colonização.

CONCLUSÕES

1. O armazenamento de energia na biomassa e no ar do dossel (S) foi maior durante a estação chuvosa quando o saldo de radiação também foi superior.

2. O padrão horário do armazenamento de energia na biomassa e no ar do dossel permitiu verificar a importância desse componente no balanço de energia da superfície no início da manhã, em que S apresentou valores máximos.

3. Os valores do armazenamento de energia na biomassa e no ar do dossel em floresta de V. divergens no Pantanal em 2007 foram similares aos de outras florestas tropicais.

4. Dentre as variáveis meteorológicas somente o saldo de radiação apresentou correlação temporal significativa com o armazenamento de energia na biomassa e no ar do dossel.

5. O índice de área foliar foi 20% superior na estação seca em relação à estação chuvosa.

AGRADECIMENTOS

Ao suporte financeiro do Conselho Nacional de Desenvol-vimento Científico e Tecnológico (CNPq) por meio de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração (PELD) Pantanal Norte - Fluxos regionais e globais de massa e energia, registro 012/CAP/2006 e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato Grosso (FAPEMAT) através da bolsa PIBIC/ UFMT/FAPEMAT.

LITERATURA CITADA

Protocolo 149.13 – 08/05/2013

Aprovado em 11/04/2014

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2014
  • Data do Fascículo
    Set 2014

Histórico

  • Recebido
    08 Maio 2013
  • Aceito
    11 Abr 2014
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