Introdução
O setor têxtil vem exercendo importante posição no cenário da economia brasileira visto a grande escala em sua produção; contudo, também é significativo o grande volume de efluentes (líquidos, sólidos e gasosos) gerado por este setor (Souza & Rosado, 2009).
Um dos principais problemas encontrados pelo setor têxtil está na remoção dos corantes sintéticos de seus efluentes; estima-se que em aproximadamente 20 t ano-1 de corantes consumidos pela indústria têxtil cerca de 20% são descartados como efluentes; o principal motivo desta perda está relacionado à incompleta fixação do corante à fibra do tecido, durante o processo de tingimento (Kunz et al., 2002; Dallago & Smaniotto, 2005).
Entre os corantes de maior aplicabilidade destaca-se a classe dos reativos, que se caracterizam por apresentar, em sua estrutura, um ou mais grupamentos –N = N– ligados a sistemas aromáticos conferindo-lhe maior estabilidade química (Kunz et al., 2002).
Nesta classe se encontra o azul de metileno, um corante catiônico muito empregado na indústria têxtil no tingimento de tecidos de algodões e lãs porém quando não tratado de forma adequada o lançamento não controlado em rios e lagos afeta não só a transparência das águas mas também limita a passagem de radiação solar diminuindo a atividade fotossintética natural provocando alterações na biota aquática e originando toxicidade aguda e crônica desses ecossistemas (Kunz et al., 2002; Silva & Oliveira, 2012).
Em virtude de sua aplicação extensiva e seu efeito tóxico causado sobre a biota aquática, torna-se necessário um tratamento prévio de seus despejos antes do lançamento em corpos receptores; desta forma, novas tecnologias vem sendo estudadas a fim de se minimizar tais riscos (Kunz et al., 2002; Dallago & Smaniotto, 2005).
O método da adsorção vem sendo muito empregado no tratamento desses efluentes corados devido ao seu baixo custo e facilidade de operação; esta técnica se baseia na remoção desses contaminantes pela interação entre o corante com algum material adsorvente (Gonçalves et al., 2007).
Entre os materiais adsorventes com grande capacidade absortiva está o carvão ativado, em virtude das suas propriedades únicas, incluindo estrutura porosa e elevada área de superfície. Entretanto apresenta, como desvantagem, alto custo em sua produção (Ajmal et al., 2000; Asadullah et al., 2010).
Desta forma, abre-se espaço para pesquisas de novos materiais adsorventes como materiais biológicos e subprodutos agrícolas visando à substituição do carvão ativado (Ozsoy & Kumbur, 2006). Em busca de novos materiais adsorventes este trabalho visa à utilização de resíduos do palmito pupunha o qual possui uma demanda nacional de 100000 t ano-1, representando 18% do mercado deste produto no Brasil. Com características únicas, como produtividade precoce, a produção do palmito pupunha gera grande quantidade de biomassa (bainha, folhas, nervuras) propícia à utilização nos processos de adsorção (Chaimsohn, 2000; Salvado et al., 2012).
Outro produto agroindustrial que merece destaque é o milho, destinado desde a alimentação humana e animal até indústrias de alta tecnologia. O Brasil é o terceiro maior produtor mundial de milho e, diferentemente de outros grãos, sua produção é voltada para o abastecimento do mercado interno. A alimentação animal representa a maior parte do consumo desse cereal, isto é, cerca de 70% no mundo (EMBRAPA, 2012). Desta forma, optou-se para a utilização da palha de milho em busca de um novo material adsorvente em razão de sua grande disponibilidade e baixo custo.
Diante do exposto este trabalho tem, como objetivo, avaliar a adsorção do corante azul de metileno utilizando, como material adsorvente, os resíduos agroindustriais como a palha de milho e a bainha do palmito pupunha, ambos in natura.
Material e Métodos
Os resíduos agroindustriais utilizados neste trabalho foram obtidos na região de Toledo-PR. Para a realização dos experimentos os adsorventes foram mantidos em estufa com temperatura controlada a 60 °C durante aproximadamente 24 h. Os materiais foram triturados e peneirados (peneira Bertel, 42 mesh) a fim de se obter uma granulometria mais homogênea.
A caracterização dos materiais foi realizada utilizando-se o infravermelho com transformada de Fourier (FTIR, Shimadzu); para a identificação dos grupamentos químicos também se utilizou a microscopia eletrônica de varredura (MEV) com a finalidade de se avaliar a morfologia da superfície das amostras.
Para avaliar a carga da superfície dos adsorventes realizou-se o potencial de carga zero (PHpcz) segundo metodologia proposta por Boas et al. (2012).
As análises de adsorção em função do pH e tempo foram realizadas utilizando-se 50 mL do corante em concentração de 100 mg L-1 para cada resíduo, as quais foram agitadas com 0,5 g de resíduo em um agitador orbital. Para avaliar a adsorção do corante em função do pH, foram realizadas medidas em uma faixa de pH variando de 3 a 11 por 24 h. As medidas de cinética de adsorção foram realizadas em um intervalo de tempo que variou de 1 a 1440 min. Após definido o tempo, foram realizados experimentos de isoterma de adsorção para avaliar a capacidade de adsorção em função da concentração do corante. As medidas foram feitas em um intervalo de concentração de azul de metileno variando de 10 a 2000 mg L-1, com tempo de agitação de 6 h. Ambas as análises foram feitas em pH 7,0.
Todas as medidas foram realizadas em batelada e duplicata sendo que, ao final de cada experimento, o líquido sobrenadante foi filtrado, diluído e analisado utilizando-se um espectrofotômetro Shimadzu UV-1601PC. Para as análises estatísticas (média e desvio padrão) foi utilizando o software BIOESTAT.
Os dados obtidos foram usados para calcular a quantidade de corante adsorvido por grama do resíduo (qeq), Eq. 1.
em que:
C0 - concentração inicial do azul de metileno em solução, mg L-1;
Ceq - concentração em equilíbrio do azul de metileno em solução, mg L-1; e
V - volume da solução, L; M - massa seca do adsorvente em solução, mg L-1.
Resultados e Discussão
O fenômeno da adsorção ocorre devido à presença de grupos funcionais que constituem o material adsorvente; utilizou-se, então, o infravermelho para identificar esses grupos. A Figura 1 apresenta o espectro de infravermelho obtido para os resíduos da palha de milho e palmito pupunha.
Observa-se a presença de uma banda larga e forte em 3402 cm-1, que pode estar atribuída ao alongamento vibracional da ligação da hidroxila (O-H); a região 2920 cm-1 indica um alongamento vibracional da ligação (C-H). Picos em 1740, 1421 e 1151 cm-1 são referentes ao alongamento vibracional da ligação dos grupos carbonilas (C-O). Segundo a literatura, a banda em 1730 cm-1 ocorre para o grupo carbonila presentes em éster e no grupamento carboxila (Vullo, 2003). As fortes bandas em 1054 cm-1 confirmam a presença de polissacarídeos (Özcan et al., 2005). Assim, pode-se confirmar a presença de grupamentos hidroxila, carbonila e grupos carboxílicos, em ambos os resíduos, os quais são os principais responsáveis pela interação do azul de metileno com os materiais adsorventes. Foi verificada, também, a superfície dos adsorventes utilizando-se a microscopia eletrônica de varredura (MEV) podendo-se observar que a superfície dos adsorventes se apresenta irregular. Na Figura 2 é possível visualizar que os adsorventes possuem grande superfície de contato podendo favorecer a adsorção do corante presente em solução.

Figura 2. Micrografia dos resíduos de palmito pupunha ampliada 800 vezes (A) e palha de milho ampliada 1200 vezes (B)
Outro fator que influencia na adsorção é a carga da superfície do adsorvente no qual o valor do pH da solução indica a propensão da superfície em ser carregada positivamente ou negativamente. Desta forma, quando o pH < pHpcz o resíduo apresentará predominância de carga superficial positiva sendo favorecida a adsorção de ânions e em pH > pHpcz a carga superficial será negativa favorecendo a adsorção de cátions (Özacar & Sengil, 2003).
Pode-se observar, na Figura 3, que o ponto de carga zero para a palha de milho e palmito pupunha foi 4,4 e 3,5, respectivamente, indicando a propensão desses resíduos em possuir carga negativa no pH de trabalho 7,0, favorecendo a adsorção do corante catiônico.

Figura 3. Determinação do potencial de carga zero (pHpcz) para o resíduo de palha de milho (■) e palmito pupunha ()
Na Figura 4 foi possível constatar que com o aumento do pH da solução a adsorção aumenta para ambos os resíduos até pH 7. Em pH mais baixo houve menor adsorção do corante devido, possivelmente, à maior concentração de íons H+ livres em solução, que são preferencialmente adsorvidos inibindo, assim, a adsorção do corante (Ajmal et al., 2000).

Figura 4. Influência do pH na adsorção do azul de metileno para os resíduos da palha de milho (■) e palmito pupunha ()
Este resultado ainda corrobora com o pHpcz o qual justifica a interação entre o adsorvato e o adsorvente em razão do caráter catiônico do corante azul de metileno com a superfície negativa dos adsorventes; desta maneira, optou-se por trabalhar em pH 7 para ambos os resíduos.
Observa-se, na Figura 5, que o equilíbrio de adsorção começa a ser atingido para ambos os resíduos a partir de 240 min, não sendo observadas variações expressivas tornando a adsorção praticamente constante. Optou-se, porém, por trabalhar com um tempo de 360 min (6 h) para garantir que o processo esteja em equilíbrio.

Figura 5. Cinética da adsorção do azul de metileno para os resíduos da palha de milho (■) e palmito pupunha ()
Nota-se ainda, para ambos os resíduos, que a velocidade de remoção foi mais rápida inicialmente em virtude da maior área de superfície disponível recobrindo toda a superfície externa, seguindo lentamente para a superfície interna do adsorvente (Carvalho et al., 2010). A rápida adsorção e o alcance de equilíbrio em curto período de tempo demonstram a eficiência dos resíduos; entretanto, pode-se observar uma adsorção maior para o resíduo de palha de milho.
Para melhor entendimento deste mecanismo e analisar os dados obtidos experimentalmente, aplicaram-se os modelos de pseudo-primeira ordem, pseudo-segunda ordem, equação de Elovich e difusão intra-partícula (Doğan et al., 2004; Kalavathy et al., 2005; Özcan et al., 2005; Pérez-Marín et al., 2007; Gerola et al., 2013). Os valores encontrados para cada modelo se encontram na Tabela 1.
Tabela 1 Parâmetros cinéticos dos modelos de pseudo 1ª ordem, pseudo 2ª, Elovich e Difusao Intra-Particula para os resíduos da palha de milho e palmito pupunha

Comparando os valores para os quatro modelos propostos na Tabela 1, observa-se que o modelo de pseudo-segunda ordem é o que melhor descreve a cinética de adsorção visto que apresentou valores de coeficiente de correlação linear (R2) 0,999 para ambos os resíduos, estando próximo de 1. Além disto, pode-se constatar que os valores de Qeq calculados para este modelo estão bem próximos aos obtidos experimentalmente (10,2 para a palha de milho e 8,13 para o palmito pupunha). Este modelo indica que a velocidade da reação é dependente da quantidade de soluto adsorvido na superfície do adsorvente e da quantidade adsorvida no equilíbrio (Ho et al., 1996).
A isoterma de adsorção mostra a relação de equilíbrio entre a quantidade de material adsorvido e a concentração na fase líquida. A forma do gráfico da isoterma auxilia na determinação do mecanismo de adsorção e pode sugerir o tipo de adsorção que ocorre entre o adsorvente e adsorbato.
Na Figura 6 pode-se observar, para o resíduo do palmito pupunha, uma isoterma do tipo L (segundo a classificação das isotermas de Giles) (Giles & Smith, 1974), a qual indica uma diminuição da disponibilidade dos sítios de adsorção quando a concentração da solução aumenta.

Figura 6. Isoterma da adsorção do azul de metileno para os resíduos da palha de milho (■) e palmito pupunha ()
Também é possível observar que a superfície do resíduo da palha de milho apresentou maior afinidade pelo soluto adsorvido indicando uma isoterma do tipo H (Carvalho et al., 2010). Desta forma, notou-se maior eficiência para o resíduo da palha de milho (102,8 mg g-1), apresentando capacidade de adsorção duas vezes maior que o resíduo do palmito pupunha (50,9 mg g-1).
No intuito de investigar a isoterma de adsorção os dados experimentais apresentados na Figura 6 foram ajustados aos modelos matemáticos: Langmuir, Freundlich, DubinineRadushkevich (DER) e Temkin (Temkin & Pyzhev, 1940; Kalavathy et al., 2005; Massocatto et al., 2013). Os valores obtidos para os parâmetros dos modelos em ambos resíduos se encontram na Tabela 2.
Tabela 2 Parâmetros dos modelos de Langmuir, Freundlich, Temkin e Dubinine (DER) para adsorção do azul de metileno para o resíduo da palha de milho e palmito pupunha

Analisando os valores da Tabela 2 pode-se dizer que o sistema de adsorção obedece aos modelos de Langmuir e Freundlich para os resíduos da palha de milho e palmito pupunha, apresentando valores para o coeficiente de correlação linear (R2) próximos de 1.
Os valores de qm (capacidade máxima de adsorção) e b (intensidade adsorvida) obtidos por Langmuir comprovam a melhor eficiência para o resíduo da palha de milho devido, possivelmente, à maior disponibilidade de grupos carboxilas presentes neste resíduo.
Esses resultados indicam que apesar dos resíduos apresentarem basicamente a mesma composição: celulose, hemicelulose e lignina, as quantidades podem variar dependendo do resíduo, sendo que esses compostos podem favorecer o processo de adsorção. Esses componentes incluem compostos orgânicos (alcoois, ésteres, esteroides e outros) e inorgânicos ou compostos minerais (Santos et al., 2012).
Dentre os resíduos apresentados neste estudo o de palha de milho apresenta maior quantidade em porcentagem de celulose, hemicelulose e lignina em sua estrutura (Aguiar, 2010; Duprat, 2012), favorecendo a adsorção, fato este que corrobora com o resultado obtido pela isoterma de adsorção que demonstra a eficiência da palha de milho em adsorver praticamente duas vezes a mais que o palmito.
Além comparando a capacidade máxima de adsorção do azul de metileno dos resíduos apresentados neste estudo com outros materiais adsorventes, como: bagaço de cana (qm = 31,79 mg g-1); casca de arroz (qm = 40,58 mg g-1); casca de banana (qm = 20,80 mg g-1) e casca de laranja (qm = 18,60 mg g-1) (Silva & Oliveira, 2012; Vadivelan & Kumar, 2005; Annadurai et al., 2002), constatou-se que os materiais que apresentaram maior capacidade foram a palha de milho (qm = 102,8 mg g-1) e o palmito pupunha (qm = 50,96 mg g-1).
Conclusões
1. O pH 7,0 apresentou melhor resposta na adsorção para ambos os resíduos.
2. No ensaio cinético o equilíbrio foi atingindo a partir de 240 min para os dois resíduos estudados e o modelo que melhor descreveu este sistema foi o pseudo segunda-ordem.
3. Os modelos de Langmuir e Freundlich foram os que se adequaram melhor apresentando valores de correlação linear próximos a 1, para ambos os resíduos estudados.
4. Os resíduos possuem boas propriedades adsortivas podendo ser utilizados como material alternativo na remoção do corante azul de metileno.