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Engenho e temperamentos nos catálogos e no pensamento da Companhia de Jesus nos séculos XVII e XVIII

Ingenio y temperamentos en los catalogos y en el pensamiento de la Compañia de Jesús en los siglos XVII y XVIII

Understanding and temperament in the catalogues and thoughts of the Society of Jesus in the 17th and 18th centuries

Ingenio site et temperaments dans les catalogues et dans la pensee de la Compagne de Jesus pendant les siecles XVII e XVIII

Resumos

O artigo visa entender as relações entre a potência psíquica do "engenho", algumas qualidades temperamentais específicas e as funções a serem exercidas pelo indivíduo possuidor destas características delineadas nos Catálogos da Companhia de Jesus ao longo dos séculos XVII e XVIII. Evidencia a presença destas associações como lugar-comum na literatura jesuítica da época, a importância do engenho como qualidade exigida para exercer ministérios relevantes na Ordem, e necessidade do indivíduo possuir uma complexão física adequada a estas exigências.

Saber dos jesuítas; temperamentos; engenho


El artículo tiene por objetivo comprender las relaciones entre la potencia psíquica del "ingenio", algunas cualidades temperamentales específicas y las funciones a ser ejercidas por el individuo que posee estas características establecidas en los Catálogos de la Compañía de Jesús durante los siglos XVII y XVIII. Se evidencia la presencia de estas asociaciones como lugar común en la bibliografía jesuita de la época, la importancia del ingenio como cualidad exigida para ejercer los ministerios relevantes en la Orden, y la necesidad del individuo poseer una complexión física de acuerdo con las exigencias.

Saber de los jesuitas; temperamentos; ingenio


The purpose of this article is to understand the psychic strength of the "understanding", some specific temperament features and the functions the individual with those features was supposed to perform, outlined in the Society of Jesus Catalogues throughout the 17th and 18th centuries. It evidences these associations as a common place in the Jesuit literature of that period, the importance of the understanding as a feature required to work in relevant ministries of the Order, and the need for individuals to have an appropriate physical complexion for these requirements.

Jesuit knowledge; temperaments; undestanding


Cet article a le but de comprendre les rapports entre la puissance psychique de "l'ingéniosité", quelques qualités tempéramentales spécifiques et les fonctions à être exercées par l'individu détenteur de ces caractéristiques tracées dans les Catalogues de la Compagnie de Jésus au cours des siècles XVII et XVIII. On met en évidence la présence de ces associations comme lieu commun dans la littérature jésuitique de l'époque, l'importance de l'ingéniosité en tant que qualité exigée pour réaliser les ministères de l'Ordre , et la nécessité de l'individu avoir un ensemble physique adéquat à ces exigences.

Savoir des jésuites; tempéraments; engéniosité


MEDICINA DA ALMA

ARTIGO

Engenho e temperamentos nos catálogos e no pensamento da Companhia de Jesus nos séculos XVII e XVIII* * Pesquisa realizada com apoio da Fapesp.

Ingenio y temperamentos en los catalogos y en el pensamiento de la Compañia de Jesús en los siglos XVII y XVIII

Ingenio site et temperaments dans les catalogues et dans la pensee de la Compagne de Jesus pendant les siecles XVII e XVIII

Understanding and temperament in the catalogues and thoughts of the Society of Jesus in the 17th and 18th centuries

Marina Massimi

RESUMO

O artigo visa entender as relações entre a potência psíquica do "engenho", algumas qualidades temperamentais específicas e as funções a serem exercidas pelo indivíduo possuidor destas características delineadas nos Catálogos da Companhia de Jesus ao longo dos séculos XVII e XVIII. Evidencia a presença destas associações como lugar-comum na literatura jesuítica da época, a importância do engenho como qualidade exigida para exercer ministérios relevantes na Ordem, e necessidade do indivíduo possuir uma complexão física adequada a estas exigências.

Palavras-chave: Saber dos jesuítas, temperamentos, engenho

RESUMEN

El artículo tiene por objetivo comprender las relaciones entre la potencia psíquica del "ingenio", algunas cualidades temperamentales específicas y las funciones a ser ejercidas por el individuo que posee estas características establecidas en los Catálogos de la Compañía de Jesús durante los siglos XVII y XVIII. Se evidencia la presencia de estas asociaciones como lugar común en la bibliografía jesuita de la época, la importancia del ingenio como cualidad exigida para ejercer los ministerios relevantes en la Orden, y la necesidad del individuo poseer una complexión física de acuerdo con las exigencias.

Palabras claves: Saber de los jesuitas, temperamentos, ingenio

RÉSUMÉ

Cet article a le but de comprendre les rapports entre la puissance psychique de "l'ingéniosité", quelques qualités tempéramentales spécifiques et les fonctions à être exercées par l'individu détenteur de ces caractéristiques tracées dans les Catalogues de la Compagnie de Jésus au cours des siècles XVII et XVIII. On met en évidence la présence de ces associations comme lieu commun dans la littérature jésuitique de l'époque, l'importance de l'ingéniosité en tant que qualité exigée pour réaliser les ministères de l'Ordre , et la nécessité de l'individu avoir un ensemble physique adéquat à ces exigences.

Mots clés: Savoir des jésuites, tempéraments, engéniosité

ABSTRACT

The purpose of this article is to understand the psychic strength of the "understanding", some specific temperament features and the functions the individual with those features was supposed to perform, outlined in the Society of Jesus Catalogues throughout the 17th and 18th centuries. It evidences these associations as a common place in the Jesuit literature of that period, the importance of the understanding as a feature required to work in relevant ministries of the Order, and the need for individuals to have an appropriate physical complexion for these requirements.

Key words: Jesuit knowledge, temperaments, undestanding

O corpo documental constituído pelos Catálogos Trienais, disponíveis no Arquivo da Cúria Geral da Companhia em Roma, referentes aos séculos XVI, XVII e XVIII, reveste-se de interesse para os estudos históricos em psicologia por delinear de modo claro e conciso relações entre o perfil psicossomático de cada jesuíta e a distribuição por aptidões ("talentos") dos ofícios previstos no âmbito da rede social da comunidade religiosa em suas diversas áreas e modalidades de presença missionária. Os catálogos eram redigidos pelos responsáveis de cada comunidade jesuítica, por ordem do Padre Geral da Companhia. A partir das informações proporcionadas pelos Catálogos - instrumento periódico e sistemático para o conhecimento da situação concreta da Ordem, ao longo do tempo e em todos os lugares - podia ser planejada e organizada a distribuição ou redistribuição dos membros da Companhia no tempo e no espaço, segundo critérios ideais fornecidos pelo saber da Companhia, a mentalidade de seu tempo e a demanda concreta de cada situação.

Inicialmente, tratava-se de simples listagens dos membros da Companhia (noviços e professos) presentes em cada casa, ou colégio, que deviam ser enviadas a cada três anos ao Padre Geral em Roma, para que este pudesse ter conhecimento direto do estado da Companhia no âmbito espaço-temporal de sua atuação. Nas últimas décadas do século XVI, por ordem do Padre Geral, os termos de elaboração das listas tornaram-se mais complexos e detalhados, adquirindo a estrutura definitiva de Catálogos.

Os Catálogos organizam-se em três partes: o Catálogo Primeiro, fornecendo informações acerca de cada jesuíta: nome, sobrenome, naturalidade, idade, estado de saúde, tempo de vida religiosa na Companhia, formação intelectual anterior e posterior ao ingresso na Companhia, ministérios desenvolvidos e sua duração, títulos de estudo obtidos e data dos votos definitivos. Nesse Catálogo a cada jesuíta é atribuído um número, correspondente ao nome. O Catálogo Segundo é reservado apenas à leitura do Provincial e do Padre Geral, e avalia as aptidões de cada um: é organizado por número, omitindo-se os nomes correspondentes devido ao caráter reservado dos dados apresentados. O documento fornece informações acerca do perfil de cada jesuíta, de modo tal que poderíamos defini-lo numa linguagem atual como uma espécie de perfil psicossomático dos indivíduos membros da Ordem. Com efeito, refere-se a vários aspectos psicológicos e comportamentais: o "engenho", o "juízo", a "prudência", a "experiência", o "talento", a "compleição" (ou temperamento). Apesar de ser assinado pelo Padre Provincial, normalmente é redigido pelo superior local do Colégio. O Catálogo Terceiro refere-se à situação material (numérica, econômica etc.) das casas ou colégios da Companhia nas diversas Províncias. As normas para a redação desses catálogos são fornecidas pela Formula scribendi, inserida já a partir de 1580 nas Regras da Companhia e que pode ser encontrada no Livro Terceiro dos Institutum, coletânea dos textos oficiais da Companhia de Jesus:

(33) In secundo catalogo dotes et qualitates uniuscuiusque describantur, videlicet: ingenium, iudicium, prudentia, experientia rerum, profectus in litteris, naturalis complexio et ad quae Societatis ministeria talentum habeat; quae omnia diligenter, et Deo prius commendata, et mature considerata, et omni privato affectu semoto, sincere et breviter persstringenda erunt. Et utrumque catalogum ad suum Provincialem mittant. (

Institutum

, v. III, 1893, p. 45)

À luz da Psicologia Filosófica e da Medicina da época, é possível esclarecer a significação atribuída às categorias utilizadas pelos autores dos Catálogos para rotular o perfil de cada jesuíta. Com efeito, os conceitos de engenho, juízo, prudência, experiência das coisas, são empregados na filosofia aristotélicotomista, especialmente na Ética a Nicômaco, texto amplamente retomado no Ocidente nos séculos XVI e XVII, e integram o conjunto das potências psíquicas superiores referentes às operações cognitivas. O rótulo complexão natural, por sua vez, é derivado da tradicional teoria médica humoralista, de origem grega e transmitida e apropriada pela cultura medieval e renascentista de várias formas e segundo diversas interpretações (Klibansky, Panofsky, Saxl, 1983). No século XVI, deve-se ao médico espanhol Huarte de San Juan, o estabelecimento, no modelo da República platônica, de correlações entre o conceito de engenho, a estrutura temperamental dos indivíduos e a organização política das funções, no Examen de Ingenios redigido em 1594 (1989). O objetivo do escritor, médico e docente da Universidade de Alcalá, era a melhoria da república através da utilização racional de seus "engenhos", levando em conta também o perfil fisiológico e temperamental dos membros do corpo social. Possivelmente este texto tenha sido conhecido e difundido na Companhia de Jesus e tenha diretamente influenciado a composição da estrutura dos Catálogos, visando análogo escopo de melhoria e eficiência do corpo social da comunidade religiosa.

Neste artigo, abordaremos apenas o significado de um dos termos utilizados: "entendimento" e as relações com a categoria "temperamento", buscando compreender sua inserção e significação nos Catálogos à luz da literatura jesuítica da época.

Nos escritos do Inácio encontramos o uso freqüente do termo espanhol entendimiento que, conforme aponta Calveras (1958) no Glossário dos Exercícios Espirituais, assume para o fundador, várias significações:

1. Faculdad de pensar: a) actua en los ejercicios, pensando y entendiendo con la gracia oculta, o ilustrado especialmente. B) no partido, en muchas cosas, actúa mas libremente, c) concurre a la consolación con causa precedente, y forma por el proprio discurso propósitos y pareceres en el tiempo siguiente a la consolación, d) lo alzamos a Dios, o en soberbia, e) debemos ocuparlo convenientemente durante la comida, f) entrega total a Dios. 2. Seso. (Calveras, 1958, p. 426)

A importância da qualidade do engenho no âmbito da Companhia é evidenciada nas Constituições: ao descrever as regras para o Exame geral de Admissão, afirma-se que um defeito na qualidade do engenho constitui-se motivo para recusar a admissão na Ordem: "ingenii defectus est impedimentum secundarium ad Societatem". (Examen c. 5, n. 3, II, 17)

Com efeito, possuir um bom engenho é tido como necessário para a atuação de um jesuíta, já que a esta característica são associados ministérios tais como o do governo, da oratória, do estudo e do ensino.

Um importante nexo entre a qualidade do engenho e as funções de um jesuíta no âmbito da Companhia é estabelecido nos Decreta Congregationis VII elaborados pelo Padre Geral Múzio Vitelleschi, onde se afirma que:

Ad Theologiam vero scholasticam audiendam nemo admittatur, qui mediocritatem in Philosophia non superaverit, ut nimirum eam cum satisfactione tueri possit; nisi praeclara ad gubernandum aunt concionandum talenta in mediocri quoppiam aliud viderentur exigere, nulla Provinciali dispensandi cum quoquam facultate relicta. (

Institutum

, v. 1, p. 328)

A relação entre engenho, arte da retórica e ofício do pregador é assinalada pelo mestre jesuíta português Cipriano Soares, cujo manual de retórica - baseado em Aristóteles, Cícero, Quintiliano - constituiu-se em fonte básica para a formação dos pregadores nos colégios da Companhia: o capítulo oitavo do pequeno tratado é dedicado a este tema.1 1 . Natura igitur primum, atque ingenium, ad dicendo, vim affert maximam: neque vero scriptoribus artis ratio dicendi, et via, sed natura desuit, nam animi, atque ingenii celeres quidam motus esse debent, qui ad exocogitandum acuti, ad explicandum, ornandumque sint uberes et ad memoriam firmi, atque; et si quis est, qui haec putet arte accipi posse: quod falsum est. (Praeclare enim se res habeat, si haec accendi, aut commoveri arte possint: inseri quidem, et donari ab arte non possunt omnia: sunt enim illa dona naturae) quid de illis dicet, quae certe cum ipso homine nascuntur? lingua solutio vocis sonus, latera, vires, conformatio quaedam, et figura totius oris et corporis. Neque haec ita dico, ut ars aliquid limare non possit: neque enim ignoro, et quae bona sint, fieri meliora posse doctrina; et quae non optima, aliquo modo acui tamen, et corrigi posse: sed sunt quidam aut ita linguua haesitantes, aut ita voce absoni, aut ita vultu, motuque motuque corporis vasti, atque aegrestes; ut, etiam si ingeniis, atque arte valeant, tamen in oratore numero venire non possint. (....) Neque haec in eam sententiam disputo, ut homines adolescentes, si quid naturale forte non habeant ominio a dicendi studio deterream,multis enim honori fuit illa ipsa, quamcumque assequi potuerunt, in dicendo mediocritas. (Soares, 1663, cap. 8 lib.1: Quibus rebus eloquentia comparetur, ac primum de natura, p. 13/14).

Quais seriam as relações entre a função psíquica do engenho e a complexão do corpo, pensáveis segundo a perspectiva conceitual jesuítica?

O filósofo jesuíta de Coimbra, Manuel de Góis, no Comentário Conimbricense (1602) ao tratado De anima de Aristóteles, refere-se ao termo ingenium no Livro II (artículo III, p. 71 e 72), quando, ao abordar alguns aspectos inerentes à unidade psicossomática que constitui o ser humano, discute a questão se a maciez da carne do corpo pode ser considerada indício de bom engenho. Com efeito, no De Anima, Aristóteles, ao dissertar acerca do sentido do tato e de sua importância no processo de conhecimento, afirmara que a maciez da carne predispõe a uma maior sensibilidade tátil e por isto a ter um bom engenho, ao passo de que os sujeitos que têm carne dura são rudes também quanto à inteligência: "Quinanque sunt duri carne, sunt inepti mente, Qui vero sunt molles carne, ii sunt ingeniosi, menteque dextri". Góis, porém, rejeita a tese aristótelica, com argumentos que relacionam o engenho à teoria dos temperamentos, alguns deles inclusive retirados de outros textos do Estagirita: os Problemata. Ao contestar a posição do De Anima, Góis propõe algumas evidências contrárias como, por exemplo, o fato de que os temperamentos fleumáticos dotados de carnes moles são menos inteligentes do que os coléricos e os melancólicos cujas carnes são mais duras devido à composição somática.2 2 . Optima vero temperies, et phantasia organum aptius, et ipsam phantasiam expeditiorem reddit: Deinde a phantasia, mentis in intelligendo facilitas, et promptitudo, in qua vis ingenii consistit, ut alibi exponuimos, magnopere dependet. Quo sit ut temperamenti bonitas tanquam causa materialis, et dispositiva ad excellentiam ingenii concurrat. Hinc ea, quae ex optimo temperamento proveniunt subtilioris ingenii, sunt indicia, ut color viurdus, subtilitas pilorum, tenuitas ungurum, mollitudo carnis. Et haec quidem mollitudo, cuius hic Aristoteles privatim meminit, eo etiam ingenium iuvat, quia dispergit, soluitque inutilia rectementa, quibus pulsis, spiritus, quos sanguine incalescenti, cor exhalat, subtiliores manent, et tam maiori alacritate as potentiarum obsequium accurrunt: unde et phantasmata puriora, ac defecatiora contingunt. His non obstat quod foeminis molior caro, in est, quam vitis; et tamen hi ordinarie, ut iudicio, ita et ingenio illis praestant. Nec quod phlegmatici. Qui hebetiores sunt cholericis, teneriorem cutem habent. Non enim mollitudo ex aqueo et pituoso humore orta, qualis est in foeminis et phlegmaticis; sed aeria, comes est bono ingenii. Nec item officit Aristetels in problemata sect 30 quaest. 1, scripsit omnes ingeniosos fuisse melancholicos; cum tamen atrabilis , ut sicca frigidaque est; ita corpus non molle, sed durum, terreumque; efficere videatur: id enim Qua ratione accependum sit, ex professo ostendimus lib2 de ortu et interitu. (Góis, 1602, p. 216). Neste contexto, Góis fornece uma definição de engenho como a facilidade e a prontidão do entendimento: "a phantasia, mentis in intelligendo facilitas, et promptitudo, in qua vis ingenii consistit" (1602, p. 216). Na filosofia conimbricense, portanto, parece haver a possibilidade de delinear certa conexão entre o engenho e os temperamentos caracterizados pela prevalência do elemento ígneo.

O jesuíta italiano Daniello Bártoli discute amplamente o tema do engenho no tratado Dell'uomo di lettere difeso ed emendato, Parte prima (1645), especialmente no capítulo "Il gusto dell'intendere spiegato, per saggio dell'altre scienze, nella sola cognizione dei cieli" (Bártoli, apud Raimondi, 1965a, p. 323 e segs.). Nesse texto, Bártoli descreve o ato do engenho como a experiência por ele mesmo vivenciada da investigação astronômica. Cabe evidenciar o método utilizado por Bártoli: tendo o objetivo de descrever e explicar o engenho, relata a experiência que desta potência psíquica se faz na pesquisa científica:3 3 . Eccovi quello che interviene a chi stupisce come, in mirando quel bellissimo volto della natura, il cielo, in cui Iddio, quanto n'era capace materia sensibile, disegnó, copiandoli da sé, lineamenti di sí rare bellezze, possa trovarsi materia di godimento che ne resti assorto l'ingegno, estatici i pensieri e beata la mente. Tutti mirano il cielo, ma non tutti l'intendono; e v'é fra chi l'intende e chi no, que divario che corre fra due, dei quali l'uno d'una scrittura arabica tratteggiata d'oro e miniata d'azzurro altro non vede che il lavorio de' ben composti caratteri, l'altro di piú ne legge i periodi e ne intende i sensi, talché il minor de' piaceri che gode é quello degli occhi (Bártoli, 1965a, p. 323).

Eis aqui o que acontece a quem se maravilha admirando aquele rosto belíssimo da natureza, o céu, onde Deus desenhou conforme a capacidade da matéria sensível, copiando-os de Si mesmo, traços de tão rara beleza, de modo que o engenho mergulhado nesta contemplação, encontra nela objeto de gozo, o pensamento fica em êxtase e a mente fica feliz. Todos admiram o céu, mas nem todos o entendem: e entre quem entende e quem não entende, há tanta distância quanto existe entre o contemplar a escritura arábica redigida em ouro e com iluminuras azuis e o entender o sentido dela não limitando-se apenas ao prazer da vista. (Bártoli, apud Raimondi, 1965a, p. 323, tradução nossa)

Conforme assinala Battistini (2000), na cultura da Idade Moderna, o termo engenho denota uma nova modalidade de pensamento.

Numa realidade tão instável como a do século XVII, requerem-se ao homem já consciente de sua modernidade uma tarefa criativa que não se satisfaça apenas pelas variações de relações já consolidadas e evidentes, mas que também crie outras relações por nada óbvias, menos evidentes e até misteriosas, através de uma contínua solicitação do intelecto e da imaginação. Explica-se assim a centralidade barroca do tema do engenho, dote este que consiste em aproximar coisas entre elas distantes, com uma sorte de círculo que provoca um incremento do conhecimento e do deleite derivado pela surpresa. Na verdade, o engenho é uma categoria já utilizada por Aristóteles. Todavia, a maioria dos autores do século XVII que tratam desta categoria, deixam de lado todos os cuidados do filósofo grego em evitar aproximações de conceito demasiado distantes. Em outras palavras, a matriz das poéticas barrocas ainda é aristotélica, mas suas regras são modificadas, eliminando a componente da

mesótes,

ou seja, da medida e da temperança. No jogo da recepção, a audácia do engenho do poeta que, ao criar metáforas, identifica um conceito com outro que imediatamente parecia inconciliável, desencadeia um processo duplo de velar e de desvelar que obriga o destinatário a participar da mesma felicidade inventiva do emitente, experimentando o prazer de decifrar pelo próprio engenho o que fora criado pelo engenho de outro. (Battistini, 2000, p. 131-132; tradução nossa)

O autor frisa que num mundo fragmentado como o do Barroco, o engenho parece ser a capacidade mais apta para encontrar relações de sentido e combater a perda de unidade entre sentidos e razão que se introduzira nos inícios da filosofia moderna. Daqui deriva a busca constante de correspondências e de processos associativos, não havendo nesta concepção uma diferença substancial entre o uso do engenho feito pelo cientista ao unir os fenômenos mais diversos sob uma única lei, e pelo poeta que gera metáforas colocando numa única palavra múltiplos significados. Em ambos os casos, a intervenção do engenho permite uma idêntica operação.

Ao abordar a questão do engenho numa perspectiva moderna por ser baseada na experiência, Bártoli apóia-se, porém, na autoridade dos antigos e refere-se ao filósofo Sêneca por este já ter descrito análoga experiência no De Natura (quaest. 1, praef. 5).4 4 . Ció che della veduta del cielo, oggetto d'una particella delle naturali scienze, ho io detto fino ad ora per provare che l'intendere é una certa beatitudine di sí esquisito gusto che incanta il senso e toglie i desideri di quant'altro é d'ordine inferiore alla mente, intender si vuole degli altri sí numerosi, sí nobili, e sí vasti suggetti di soavissime cognizioni di che si puó godere l'ingegno dei letterati, introdotto nel mondo (disse Pitagora riferito da Sinesio) come spettatore in un teatro di sempre nuove e tutte nobili maraviglie. (....) Che se dal gusto dello speculare alla pratica del vivere si richiami l'uso delle lettere, massimamente piú severe e gravi, e mi si conceda (..) di chiamare con nome di savio quell'uomo di lettere a cui il lungo e retto intendere abbia raffinata la mente e purgato il discorso dalla feccia di quei bassi sensi e dalla terra vile di quegli affetti che in noi sentono dal brutale, sí che, prosperevoli o avversi che sieno gli avvenimenti, li pesi con le bilance della ragione per quel che sono, a me non sará punto difficile, conducendovi per alcune delle piú temute miserie, farvi vedere un tal uomo sí superiore ad esse come le piú alte stelle sono tanto dagli exclissi quanto dall'ombra delle terre lontane (idem, p. 325-326).

Na Parte seconda do mesmo tratado, cujo título é Genio, ingegno e giudizio, Bártoli tece uma ampla discussão acerca do engenho e suas relações com os diversos temperamentos, com o juízo e com os "talentos". A análise desse texto nos ajudará a esclarecer o significado da associação entre as categorias encontradas nos Catálogos Segundos:5 5 . Questo universalmente par vero, che avendo l'opere dell'ingegno un non so che dell'igneo, sí come mostrano e il velocissimo moto de' pensieri e la natura degli spiriti ignei che lo servono, quegli umori che piú tengono del focoso piú sono abili a servirlo, sí come all'incontro la flemma lo rende stupido e quasi in un piccol letargo dormiglioso. Dunque la bile, ch'é in eccesso calda e dipoi secca, tutta é in acconcio dell'ingegno. Ma piú di lei, come che meno il paia, la malinconia: non quella grossa e d'umor feccioso, che piú simbolizza con la flemma nel freddo che con la bile nel secco, ma una certa quasi parte piú adusta della flava bile, fredda e (p. 327) secca per natura, come la terra; ma se abbia chi l'assottigli e chi l'accenda, sí abile a concepir fuoco (come l'esaltazioni solllevate dal sole, che pur sono terra fredda e secca) e fuoco sí vemente e sí gagliardo che tiene del fulmine nella forza, ma é piú durevole e piú costante. E di qui nasce il furore e quella saggia frenesia della mente, che tutta fuori di sé la rapisce e tutta in sé la concentra; che le dá velocissimi moti e la tiene stabilissima e fissa, tutti insieme spargendole e tutti raccogliendole i pensieri. Né dee mancare, l'uno per alimento agli spiriti, l'altra per tempera, il sangue e la flemma, acciocché o sterile il troppo secco non renda o il soverchio caldo non istemperi l'organo e porti piú caligine che splendore. Il predominio peró deve essere igneo, il restante del misto a proporzione dei gradi di questo. E questa é, s'io mal non indovino, quella tanto famosa luce secca d'Eraclito, quell' 'igneus vigor et coelestis origo', che dove piú limpida la fiamma e in piú purgati umori meno torbida e fosca, ivi é cosa piú di mente celeste che di terreno ingegno. Questo é quel tanto difficile elettro (ndr: liga natural ou artificila de oro e prata), ingegno insieme e giudicio. L'ingegno, il mercurio tutto istabilitá e movimento; il giudicio, la chimica, la medicina che lo fissa. L'ingegno, il lione e il delfino tutto furia, tutto corso; il giudicio, il freno e l'ancora che gli regola i furori, che gli rintuzza il moto. L'ingegno, la vela; il giudizio, la zavorra. Quello l'ala, l'altro il peso. Quello il volto giovane di Giano, e questo il vecchio e canuto. Ma perciocché la tempera degli umori per servigio della mente non é una indivisibile, dalla loro varietá hanno principio le abilitá, i geni, i talenti che a varie professioni di lettere inclinano. Imperciocché, richiedendosi in alcuni studi piú pazienza e, come suol dirsi, piú flemma, in altri maggior prestezza di mente, altrove imaginazione piú ferma, altrove discorso piú astratto; qui gran memoria, qui capacitá d'abbracciare quasi in un atto solo la cognizione di molti oggetti e vederne la dipendenza senza confondersi; sí come gli umori e le loro qualitá sono variamente insieme armonizzate, onde piú o meno vi puó il caldo, il freddo, l'umido, il secco, cosí piú abile si ha la potenza ad una che ad un'altra professione di lettere, secondo la tempera delle qualitá che ricercano gli strumenti per essere piú disposti ad operare. E questa abilitá della potenza ben disposta verso tal sorte d'oggetti é fondamento di quello che chiamano genio. Imperciocché, essendo in ognuno per naturale istinto innata volontá di sapere, e non errando la natura, consapevole di ció che ha, in applicarsi a voler come suo bene per cui ottenere ella non abbia forze bastevoli, quindi é che a quello ella ci porta col desiderio, per cui conseguire siamo abbastanza disposti. La proporzione dunque della potenza coll'oggetto e la voglia che si ha di sapere, delle quali l'una applica, l'altra determina, cagionano quella proporzione e quella simpatia che si puó dir forma del genio (Bártoli, apud Raimondi, 1965a, p. 326-8).

Isto parece universalmente verdadeiro que os atos do engenho tendo qualidade semelhante ao fogo, como se evidencia pelo movimento velocíssimo dos pensamentos e pela natureza dos espíritos ígneos que o acompanham, os humores que mais possuem as qualidades do fogo são os mais aptos a servi-lo. Pelo contrário, a prevalência da fleuma torna-o estúpido e adormecido quase que num letargo. Portanto, a biles que é excessivamente quente e depois seca, é sobremaneira apta para o engenho. Mas ainda mais do que a biles, é apta a melancolia, mesmo que não pareça: não a melancolia de qualidade grossa e espessa (...), mas a parte mais densa da biles, fria e seca por natureza como a terra: esta quando acesa e tornada sutil, produz fogo e fogo tão veemente e forte que é semelhante ao relâmpago quanto à força, mas é mais durável e constante deste. E daqui nasce o furor e aqueles sábios frenesis da mente, que a leva para fora de si mesma e ao mesmo tempo a concentra, que imprime nela movimentos velocíssimos e ao mesmo tempo a mantém bem estável e fixa, ao mesmo tempo dispersando e recolhendo o conjunto dos pensamentos. Não deve faltar (na complexão do engenhoso) para alimentar os espíritos e temperá-los, o sangue e a fleuma; de modo que a demasiada secura não produza esterilidade e o excesso de calor não derreta os órgãos e cause mais neblina do que esplendor. Deve, porém, prevalecer o elemento ígneo e o restante da mistura deve ser proporcional à quantidade deste. (...) Este é aquele eletro

** ** Liga natural ou artificial de ouro e prata. (N. da R.)

tão raro: o engenho associado ao juízo. O engenho corresponde ao mercúrio, caracterizado pela instabilidade e pelo movimento; o juízo é a química, a medicina que o fixa. O engenho é o leão e o golfinho em plena corsa; o juízo é o freio e a âncora que o regula em seu movimento. (...) Mas a têmpera dos humores para o serviço das atividades da mente não é unívoca: pelo contrário, de sua variedade é que derivam as habilidades, os gênios, os talentos que inclinam os indivíduos nas diversas profissões e estudos. Pois alguns estudos exigem mais paciência e fleuma; outros, maior prontidão e rapidez da mente; outros, imaginação mais firme; outros, capacidades de raciocínio mais abstrato; em alguns casos, é necessária grande memória; em outros, serve a capacidade de abraçar num único ato o conhecimento de muitos objetos e reconhecer a dependência entre eles sem confusão. Assim como os humores e suas qualidades são compostos de modo a haver harmonia e variedade entre calor, frio, úmido e seco, também um indivíduo possui aptidões para uma ou outra profissão, ou estudo, conforme a têmpera das qualidades necessárias para os atos e os instrumentos exigidos. Esta aptidão da potência bem disposta para estes objetos é fundamento do que se define como gênio. (Bártoli, apud Raimondi, 1965a, p. 326-8; tradução nossa)

Em outra parte do mesmo tratado, Bártoli, ao dissertar acerca dos diferentes engenhos e de suas capacidades para a elaboração do discurso, apoiando-se no poeta latino Horácio, afirma que é necessário adequar o discurso e o ofício às capacidades diferenciadas do engenho de cada indivíduo:6 6 . Se avete un ingegno di punta debile e stemprata, non dovete prender a lavorare porfidi, serpentini, marmi molto piú duri del vostro scalpello. Misurate la vela col vento e il timone colle onde; e se voi siete un piccol burchiello (ndr: pequeno barco para uso em rios) non la vogliate far di grande nave. Il vostro mare oceano sará un lago, le vostre Indie un'isoletta lontana mezza giornata. (...) Chi non ha ingegno o sapere ubi consistat, non voglia, come avrebbe fatto Archimede, coelum terramque movere, addossandosi materie di gran peso e soggetti d'alta intelligenza, ai quali i voli dell'ingegno, non che della penna, non giunga. Anzi la piú bella parte d'un discorso é la bellezza dell'argomento: e chi lavora di cervello sa per pruova che il suggetto ingegnoso aguzza mirabilmente l'ingegno, e pare quasi che la materia nobile somministri da sé pensieri degni di sé, ambiziosa di essere nobilmente trattata" (Bartoli, 1965a, p. 336-7).

Se vocês têm um engenho com uma ponta débil e pouco aguçada, não podem trabalhar pedras e mármores muito mais duros do que o vosso escalpelo. Meçam a vela pelo vento e o timão pela ondas; e se vocês são um pequeno barco para navegação em rios, não queiram ser um grande navio. O vosso mar oceano será um lago, as vossas Índias uma ilha pequena e pouco distante. Quem não possui engenho (

sapere ubi consistat

), não queira fazer como teria feito Arquimedes (

coelum terramque movere

), assumindo objetivos tão difíceis a serem realizados que os vôos do vosso engenho não consigam alcançá-los. (Bártoli, apud Raimondi, 1965a, p. 336-7; tradução nossa)

No livro La ricreazione del savio, em Lib II, cap. II ("Il sapere di Dio male da noi circoscritto col piccolissimo circolo del nostro capo"), Bártoli (1965b) tempera o entusiasmo pelas capacidades do engenho e recorda sua fragilidade ligada à condição terrena:7 7 . I nostri ingegni, nel loro puro essere naturale, sono a guisa delle lucerne che dagli antichi a guardare i cadaveri si chiudevano nei sepolcri: fiammeggiante e vive sol fin che l'aria non le vede, matendole quell'umoroso aere e grasso che con una perpetua circolazione torna loro in alimento da sustenarsi quanto ardendo consumano. Ma in aprendosi il sepolcro elle sfiatano, spirano e son morte (idem, p. 567).

Nossos engenhos em seu ser natural, são como lucernas que os antigos colocavam nos sepulcros junto com os cadáveres: vivas e flamejantes quando não têm contato com o ar livre sendo alimentadas continuamente pelos vapores densos e internos aos sepulcros que as fazem arder; mas que apagam-se e esmorecem imediatamente na hora em que se abre o local. (p. 567)

Outros autores jesuítas discutem o tema do engenho: dentre eles, Antônio Possevini (1606), SI, no Livro Primeiro De cultura Ingeniorum do tratado Bibliotecha Selecta - trava um debate com a concepção do já citado médico espanhol Huarte de San Juan, e considera o engenho como sendo dom de Deus, comum a todos os homens, podendo porém ser danificado em seu uso por causas advindas do pecado. No capítulo décimo-primeiro ("Ingenia quot duplicia, ex Aristoteles") Possevini propõe uma classificação dos engenhos individuais, que podem ser distintos em "magna, item parva, mediocria, felicia, infelicia, apta, inepta, velocia, tarda, acuta, obtusa" (p. 8). Possevini dedica vários capítulos de sua obra para refutar a posição de Huarte segundo o qual a diversidade dos engenhos seria inata. O conhecimento dos engenhos aparece ao autor importante tendo em vista a orientação dos jovens para os estudos e recomenda que este conhecimento seja praticado nas instituições educacionais da Igreja.

Uma contribuição interessante sobre o tema do engenho é proposta pelo jesuíta italiano E. Tesauro, na obra Cannocchiale aristotelico. Ao discutir a agudeza do engenho humano, Tesauro cita Aristóteles, que no terceiro livro da Retórica coloca que três coisas fecundam a mente humana e a tornam aguda: o engenho, o furor e o exercício. Para esse autor, uma das expressões mais criativas do engenho no discurso humano é a metáfora: estabelece assim uma importante ligação entre engenho, oratória e pregação.

Em conclusão, o tema do engenho é recorrente na literatura jesuítica da Idade Moderna, sendo um lugar-comum também a associação desta potência com algumas qualidades específicas do temperamento, de modo que não é de estranhar o uso destas categorias e da associação entre elas nos Catálogos Secundus da Companhia com o objetivo de orientar a organização dos indivíduos para as funções que lhes são mais convenientes, conforme suas aptidões. Quem possuir bom engenho associado com a prevalência dos humores colérico ou melancólico é predisposto para as funções mais próprias do carisma jesuítico, tais como a pregação, o governo, a docência. Este tipo de documentação evidencia, portanto, a construção de um conhecimento das características psicossomáticas dos indivíduos tendo em vista sua inserção no corpo político e social. Em suma: os Catálogos expressam uma tendência cultural difusa a partir do século XVI: antigos conhecimentos da psicologia filosófica e da medicina humoralista vêm a compor um saber orientado para a prática política, o corpo pessoal sendo concebido em função de sua pertença ao corpo social e político.

Versão inicial recebida em novembro de 2008

Versão aprovada para publicação em novembro de 2008

Marina Massimi

Professora Titular da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - FFCLRP-USP (Ribeirão Preto, SP, Brasil)

Av. Bandeirantes, 3900

14010-190 Ribeirão Preto, SP

mmassini3@yahoo.com

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    Pesquisa realizada com apoio da Fapesp.
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    Liga natural ou artificial de ouro e prata. (N. da R.)
  • 1
    . Natura igitur primum, atque ingenium, ad dicendo, vim affert maximam: neque vero scriptoribus artis ratio dicendi, et via, sed natura desuit, nam animi, atque ingenii celeres quidam motus esse debent, qui ad exocogitandum acuti, ad explicandum, ornandumque sint uberes et ad memoriam firmi, atque; et si quis est, qui haec putet arte accipi posse: quod falsum est. (Praeclare enim se res habeat, si haec accendi, aut commoveri arte possint: inseri quidem, et donari ab arte non possunt omnia: sunt enim illa dona naturae) quid de illis dicet, quae certe cum ipso homine nascuntur? lingua solutio vocis sonus, latera, vires, conformatio quaedam, et figura totius oris et corporis. Neque haec ita dico, ut ars aliquid limare non possit: neque enim ignoro, et quae bona sint, fieri meliora posse doctrina; et quae non optima, aliquo modo acui tamen, et corrigi posse: sed sunt quidam aut ita linguua haesitantes, aut ita voce absoni, aut ita vultu, motuque motuque corporis vasti, atque aegrestes; ut, etiam si ingeniis, atque arte valeant, tamen in oratore numero venire non possint. (....) Neque haec in eam sententiam disputo, ut homines adolescentes, si quid naturale forte non habeant ominio a dicendi studio deterream,multis enim honori fuit illa ipsa, quamcumque assequi potuerunt, in dicendo mediocritas. (Soares, 1663, cap. 8 lib.1: Quibus rebus eloquentia comparetur, ac primum de natura, p. 13/14).
  • 2
    . Optima vero temperies, et phantasia organum aptius, et ipsam phantasiam expeditiorem reddit: Deinde a phantasia, mentis in intelligendo facilitas, et promptitudo, in qua vis ingenii consistit, ut alibi exponuimos, magnopere dependet. Quo sit ut temperamenti bonitas tanquam causa materialis, et dispositiva ad excellentiam ingenii concurrat. Hinc ea, quae ex optimo temperamento proveniunt subtilioris ingenii, sunt indicia, ut color viurdus, subtilitas pilorum, tenuitas ungurum, mollitudo carnis. Et haec quidem mollitudo, cuius hic Aristoteles privatim meminit, eo etiam ingenium iuvat, quia dispergit, soluitque inutilia rectementa, quibus pulsis, spiritus, quos sanguine incalescenti, cor exhalat, subtiliores manent, et tam maiori alacritate as potentiarum obsequium accurrunt: unde et phantasmata puriora, ac defecatiora contingunt. His non obstat quod foeminis molior caro, in est, quam vitis; et tamen hi ordinarie, ut iudicio, ita et ingenio illis praestant. Nec quod phlegmatici. Qui hebetiores sunt cholericis, teneriorem cutem habent. Non enim mollitudo ex aqueo et pituoso humore orta, qualis est in foeminis et phlegmaticis; sed aeria, comes est bono ingenii. Nec item officit Aristetels in problemata sect 30 quaest. 1, scripsit omnes ingeniosos fuisse melancholicos; cum tamen atrabilis , ut sicca frigidaque est; ita corpus non molle, sed durum, terreumque; efficere videatur: id enim Qua ratione accependum sit, ex professo ostendimus lib2 de ortu et interitu. (Góis, 1602, p. 216).
  • 3
    . Eccovi quello che interviene a chi stupisce come, in mirando quel bellissimo volto della natura, il cielo, in cui Iddio, quanto n'era capace materia sensibile, disegnó, copiandoli da sé, lineamenti di sí rare bellezze, possa trovarsi materia di godimento che ne resti assorto l'ingegno, estatici i pensieri e beata la mente. Tutti mirano il cielo, ma non tutti l'intendono; e v'é fra chi l'intende e chi no, que divario che corre fra due, dei quali l'uno d'una scrittura arabica tratteggiata d'oro e miniata d'azzurro altro non vede che il lavorio de' ben composti caratteri, l'altro di piú ne legge i periodi e ne intende i sensi, talché il minor de' piaceri che gode é quello degli occhi (Bártoli, 1965a, p. 323).
  • 4
    . Ció che della veduta del cielo, oggetto d'una particella delle naturali scienze, ho io detto fino ad ora per provare che l'intendere é una certa beatitudine di sí esquisito gusto che incanta il senso e toglie i desideri di quant'altro é d'ordine inferiore alla mente, intender si vuole degli altri sí numerosi, sí nobili, e sí vasti suggetti di soavissime cognizioni di che si puó godere l'ingegno dei letterati, introdotto nel mondo (disse Pitagora riferito da Sinesio) come spettatore in un teatro di sempre nuove e tutte nobili maraviglie. (....) Che se dal gusto dello speculare alla pratica del vivere si richiami l'uso delle lettere, massimamente piú severe e gravi, e mi si conceda (..) di chiamare con nome di savio quell'uomo di lettere a cui il lungo e retto intendere abbia raffinata la mente e purgato il discorso dalla feccia di quei bassi sensi e dalla terra vile di quegli affetti che in noi sentono dal brutale, sí che, prosperevoli o avversi che sieno gli avvenimenti, li pesi con le bilance della ragione per quel che sono, a me non sará punto difficile, conducendovi per alcune delle piú temute miserie, farvi vedere un tal uomo sí superiore ad esse come le piú alte stelle sono tanto dagli exclissi quanto dall'ombra delle terre lontane (idem, p. 325-326).
  • 5
    . Questo universalmente par vero, che avendo l'opere dell'ingegno un non so che dell'igneo, sí come mostrano e il velocissimo moto de' pensieri e la natura degli spiriti ignei che lo servono, quegli umori che piú tengono del focoso piú sono abili a servirlo, sí come all'incontro la flemma lo rende stupido e quasi in un piccol letargo dormiglioso. Dunque la bile, ch'é in eccesso calda e dipoi secca, tutta é in acconcio dell'ingegno. Ma piú di lei, come che meno il paia, la malinconia: non quella grossa e d'umor feccioso, che piú simbolizza con la flemma nel freddo che con la bile nel secco, ma una certa quasi parte piú adusta della flava bile, fredda e (p. 327) secca per natura, come la terra; ma se abbia chi l'assottigli e chi l'accenda, sí abile a concepir fuoco (come l'esaltazioni solllevate dal sole, che pur sono terra fredda e secca) e fuoco sí vemente e sí gagliardo che tiene del fulmine nella forza, ma é piú durevole e piú costante. E di qui nasce il furore e quella saggia frenesia della mente, che tutta fuori di sé la rapisce e tutta in sé la concentra; che le dá velocissimi moti e la tiene stabilissima e fissa, tutti insieme spargendole e tutti raccogliendole i pensieri. Né dee mancare, l'uno per alimento agli spiriti, l'altra per tempera, il sangue e la flemma, acciocché o sterile il troppo secco non renda o il soverchio caldo non istemperi l'organo e porti piú caligine che splendore. Il predominio peró deve essere igneo, il restante del misto a proporzione dei gradi di questo. E questa é, s'io mal non indovino, quella tanto famosa luce secca d'Eraclito, quell' 'igneus vigor et coelestis origo', che dove piú limpida la fiamma e in piú purgati umori meno torbida e fosca, ivi é cosa piú di mente celeste che di terreno ingegno. Questo é quel tanto difficile elettro (ndr: liga natural ou artificila de oro e prata), ingegno insieme e giudicio. L'ingegno, il mercurio tutto istabilitá e movimento; il giudicio, la chimica, la medicina che lo fissa. L'ingegno, il lione e il delfino tutto furia, tutto corso; il giudicio, il freno e l'ancora che gli regola i furori, che gli rintuzza il moto. L'ingegno, la vela; il giudizio, la zavorra. Quello l'ala, l'altro il peso. Quello il volto giovane di Giano, e questo il vecchio e canuto. Ma perciocché la tempera degli umori per servigio della mente non é una indivisibile, dalla loro varietá hanno principio le abilitá, i geni, i talenti che a varie professioni di lettere inclinano. Imperciocché, richiedendosi in alcuni studi piú pazienza e, come suol dirsi, piú flemma, in altri maggior prestezza di mente, altrove imaginazione piú ferma, altrove discorso piú astratto; qui gran memoria, qui capacitá d'abbracciare quasi in un atto solo la cognizione di molti oggetti e vederne la dipendenza senza confondersi; sí come gli umori e le loro qualitá sono variamente insieme armonizzate, onde piú o meno vi puó il caldo, il freddo, l'umido, il secco, cosí piú abile si ha la potenza ad una che ad un'altra professione di lettere, secondo la tempera delle qualitá che ricercano gli strumenti per essere piú disposti ad operare. E questa abilitá della potenza ben disposta verso tal sorte d'oggetti é fondamento di quello che chiamano genio. Imperciocché, essendo in ognuno per naturale istinto innata volontá di sapere, e non errando la natura, consapevole di ció che ha, in applicarsi a voler come suo bene per cui ottenere ella non abbia forze bastevoli, quindi é che a quello ella ci porta col desiderio, per cui conseguire siamo abbastanza disposti. La proporzione dunque della potenza coll'oggetto e la voglia che si ha di sapere, delle quali l'una applica, l'altra determina, cagionano quella proporzione e quella simpatia che si puó dir forma del genio (Bártoli, apud Raimondi, 1965a, p. 326-8).
  • 6
    . Se avete un ingegno di punta debile e stemprata, non dovete prender a lavorare porfidi, serpentini, marmi molto piú duri del vostro scalpello. Misurate la vela col vento e il timone colle onde; e se voi siete un piccol burchiello (ndr: pequeno barco para uso em rios) non la vogliate far di grande nave. Il vostro mare oceano sará un lago, le vostre Indie un'isoletta lontana mezza giornata. (...) Chi non ha ingegno o sapere ubi consistat, non voglia, come avrebbe fatto Archimede, coelum terramque movere, addossandosi materie di gran peso e soggetti d'alta intelligenza, ai quali i voli dell'ingegno, non che della penna, non giunga. Anzi la piú bella parte d'un discorso é la bellezza dell'argomento: e chi lavora di cervello sa per pruova che il suggetto ingegnoso aguzza mirabilmente l'ingegno, e pare quasi che la materia nobile somministri da sé pensieri degni di sé, ambiziosa di essere nobilmente trattata" (Bartoli, 1965a, p. 336-7).
  • 7
    . I nostri ingegni, nel loro puro essere naturale, sono a guisa delle lucerne che dagli antichi a guardare i cadaveri si chiudevano nei sepolcri: fiammeggiante e vive sol fin che l'aria non le vede, matendole quell'umoroso aere e grasso che con una perpetua circolazione torna loro in alimento da sustenarsi quanto ardendo consumano. Ma in aprendosi il sepolcro elle sfiatano, spirano e son morte (idem, p. 567).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Jan 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2008

    Histórico

    • Recebido
      Nov 2008
    • Aceito
      Nov 2008
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