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Genealogia da clínica*1 *1 Este texto foi escrito a partir das notas que me orientaram na conferência de abertura do I Congresso Nacional de Filosofia, de Psicanálise e de Psicologia, realizada na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC/RJ, em 3 de maio de 2018.

Genealogy of the clinic

Généalogie de la clinique

Genealogía de la clínica

Genealogie der Klinik

Resumos

A finalidade deste ensaio é a de realizar a genealogia da clínica, baseando-se para isso no discurso genealógico de Nietzsche e na leitura desse discurso realizada posteriormente por Foucault. Se o seu ponto de partida é a problematizaçao dos impasses contemporâneos da clínica, o seu desenvolvimento se centra na problematizaçao da emergência da clínica médica no final do século XVIII e a rearticulação do discurso da clínica empreendido pela psicanálise.

Saber; poder; finitude


The purpose of this essay is to elaborate the genealogy of the clinic, based on Nietzsche’s genealogical discourse and on a reading of this discourse later done by Foucault. If his starting point is the problematization of contemporary clinical dilemmas, his development focuses on the problematization of the emergence of the medical clinic at the end of the 18th century and the re-articulation of the clinic discourse undertaken by psychoanalysis.

Knowledge; power; finitude


Cet essai vise à réaliser la généalogie de la clinique, en se basant sur le discours généalogique de Nietzsche et sur la lecture de ce discours réalisée postérieurement par Foucault. Si votre point de départ est la problématisation des dilemmes cliniques contemporains, votre développement se concentre sur la problématisation de l’émergence de la clinique médicale à la fin du XVIIIe siècle et la réarticulation du discours de la clinique entrepris par la psychanalyse.

Savoir; pouvoir; finitude


El propósito de este ensayo es trazar la genealogía de la clínica, basándose, para ello, en el discurso genealógico de Nietzsche y en la lectura de dicho discurso llevada a cabo posteriormente por Foucault. Si su punto de partida es la problematización de los dilemas contemporáneos de la clínica, su desarrollo se centra en la problematización de la aparición de la clínica médica, a finales del siglo XVIII, y en la rearticulación del discurso de la clínica realizada por el psicoanálisis.

Saber; poder; finitud


Dieser Artikel beschreibt unseren Versuch, eine Genealogie der Klinik zu erstellen, welche auf Nietzsches genealogischem Diskurs basiert, sowie auf dessen nachfolgender Interpretation durch Foucault. Wir nahmen als Ausgangspunkt die Problematisierung der gegenwärtigen Pattsituation der Klinik und konzentrierten uns dann auf die Entstehung der medizinischen Klinik im späten achtzehnten Jahrhundert, sowie auf die Umstrukturierung des Diskurses der Klinik durch die Psychoanalyse.


Preâmbulo

A finalidade deste ensaio é circunscrever o campo da clínica na sua especificidade e diversidade, tal como esta foi efetivamente construída numa perspectiva histórica. Para isso, é necessário destacar inicialmente a emergência histórica da experiência clínica com a constituição da medicina científica na aurora da modernidade, assim como as transformações fundamentais que ocorreram no campo daquela experiência com a constituição da psicanálise, no final do século XIX. Além disso, é preciso colocar em destaque os impasses e os obstáculos presentes no campo da clínica psicanalítica na contemporaneidade, com a constituição de um novo paradigma naturalista no campo dos saberes sobre o psíquico, que se evidencia pelos discursos da psiquiatria biológica, do cognitivismo e das terapias comportamentais.

No entanto, para que se coloque em pauta o campo da clínica na sua multiplicidade e diferença, onde se torna patente a construção de diferentes objetos teóricos (Canguilhem, 1968Canguilhem, G. (1968). L’objet de l’histoire des sciences. In G. Canguilhem. Études d’Histoire et de Philosophie des sciences. Paris, França: Vrin.) numa perspectiva eminentemente epistemológica, o que se impõe fundamentalmente é colocar em destaque as diferentes operações teóricas constitutivas do campo da clínica na sua diversidade. Com efeito, do registro do sinal ao do sintoma, aquelas operações teóricas podem ser evidenciadas com pertinência, na sua conjunção e disjunção efetivas. Além disso, o que estará ainda em pauta neste ensaio é o destino de tais operações teóricas na contemporaneidade, com os obstáculos e os impasses que se delinearam para o campo da experiência clínica na contemporaneidade.

Portanto, o que se pretende com este ensaio é destacar os eixos fundamentais constitutivos da experiência clínica, na sua multiplicidade e diversidade, assim como as suas condições concretas de possibilidade, que devem ser necessariamente moduladas numa perspectiva histórica. Contudo, para que possa aquilatar a importância das problematizações (Foucault, 1994fFoucault, M. (1994f). Dits et écrits (Vol. IV). Paris, França: Gallimard.; Deleuze e Guattari, 1980Deleuze, G. & Guattari, F. (1980). Mille Plateaux, Capitalisme et schizophrenie 2. Paris, França: Minuit.) que serão realizadas ao longo deste ensaio não se pode perder de vista que são os impasses e obstáculos presentes na experiência clínica na atualidade que é o foco crucial deste ensaio, isto é, quais são os destinos da clínica na contemporaneidade.

Enfim, por todas as razões destacadas, o que pretendo efetivamente realizar é uma genealogia da clínica, como se evidencia pelo título escolhido, mas para isso é preciso que se explicite o conceito de genealogia, de forma preliminar.

Saber e poder: problema, problemáticas e problematizações

Assim, a genealogia foi constituída como discurso teórico por Nietzsche (1874Nietzsche, F. (1874). Seconds consideration intempestive. De l’utilité et de l’inconvénient des études historiques pour la vie. Paris, França: Flammarion,/1980) no campo da filosofia, num ensaio intitulado “Segunda consideração intempestiva”, no qual Nietzsche colocou decisivamente em questão a leitura positivista da história. Com efeito, nessa crítica Nietzsche enfatizava a prática da interpretação presente no discurso da história, de forma a evidenciar assim, de maneira sistemática, que seriam os valores que norteariam as narrativas da história e não os fatos na sua literalidade documental. Portanto, pela conjunção dos registros da interpretação e dos valores que norteariam a construção do discurso teórico da história, Nietzsche sublinhava assim a dimensão do poder que orientaria a leitura de supostos fatos históricos. Enfim, pela conjunção entre os registros da interpretação, do valor e do poder que modulariam as narrativas históricas, Nietzsche (1874Nietzsche, F. (1874). Seconds consideration intempestive. De l’utilité et de l’inconvénient des études historiques pour la vie. Paris, França: Flammarion,/1980) colocava também em questão as dimensões de origem e de continuidade que o discurso da história procurava imprimir nas suas narrativas.

Em 1971, no ensaio intitulado “Nietzsche, a genealogia, a história”, Foucault (1970/1994c)Foucault, M. (1994c). Nietzsche, la généalogie, l’histoire. In Dits et écrits. (Vol. I.). Paris, França: Gallimard. (Trabalho original publicado em 1970). retomou a leitura crítica da história realizada por Nietzsche, retomando assim de forma frontal o projeto teórico da genea- logia. Com efeito, pela crítica dos conceitos de origem e de continuidade, supostamente presentes nos discursos da história, Foucault evidenciava a existência da dispersão nas origens, por um lado, e da descontinuidade, por outro, como marcas eloquentes do discurso da história. Em 1969, na obra intitulada A arqueologia do saber, Foucault já aproximava o projeto teórico da arqueologia do saber do projeto teórico da genealogia, ao enunciar que “o documento não é monumento”, esvaziando e relativizando então o valor de literalidade atribuído ao documento nas narrativas históricas, assim como os seus correlatos, a saber, as dimensões de origem e de continuidade que orientariam as narrativas da história (Foucault, 1969Foucault, M. (1969). Archeologie du savoir. Paris, França: Gallimard.).

Em decorrência disso, em Vigiar e punir, obra publicada em 1974, Foucault empreendeu o projeto teórico da constituição de uma genealogia do poder, ao enunciar a oposição existente entre os tempos históricos da modernidade e da pré-modernidade no que tange o registro do poder, pelos enunciados do poder disciplinar e do poder soberano, respectivamente (Foucault, 1974Foucault, M. (1974). Surveiller et punir. Paris, França: Gallimard.). Em seguida, em 1976, no livro intitulado A vontade do saber, Foucault enunciou a existência do biopoder que, ao lado do poder disciplinar, delinea- ria o campo do poder na modernidade (Foucault, 1976Foucault, M. (1976). La volonté de savoir. Paris, França: Gallimard.).

Ao lado disso, Foucault procurou articular desde então a arqueologia do saber, que caracterizara o seu percurso teórico anterior (Foucault, 1960/1972Foucault, M. (1972). Histoire de la folie à l’âge classique. Paris, França: Gallimard. (Trabalho original publicado em 1960).; 2004; 1966Foucault, M. (1966). Les mots et les choses. Paris, França: Gallimard.) com a genealogia do poder. Em decorrência disso, seria necessário conjugar os registros do saber e do poder na leitura dos discursos, das práticas e dos dispositivos.

Portanto, na genealogia da clínica que pretendo realizar neste ensaio articularei devidamente os registros do saber e do poder, para destacar nas perspectivas arqueológica e genealógica a constituição, os desdobramentos e as derivações do campo da clínica na sua complexidade.

Entretanto, é preciso considerar ainda que tanto no tempo teórico da genealogia do poder quanto no da arqueologia do saber o que estava sempre presente nas pesquisas realizadas por Foucault era a construção de problemáticas, a partir do destaque conferido a certos problemas presentes na atualidade, pela mediação da operação de problematização. Com efeito, a articulação existente entre a existência de um problema na atualidade, sobre o qual se realizariam problematizações pertinentes com vistas a se construir problemáticas, delinearia assim, ao mesmo tempo, um estilo de pensamento e um modelo de pesquisa (Castel T., Castel R. & Lovell, 1979Castel, F., Castel, R., Lovell, A. (1979). La société psychiatrique avancée: le modele américain. Paris, França: Grasset.).

Enfim, a genealogia da clínica que desenvolverei neste artigo pretende destacar a existência de um problema eloquente na atualidade, no que concerne ao campo da clínica, para que se possa em seguida realizar problematizações sobre esse, com vistas a construir certas problemáticas de leitura.

A clínica na berlinda

Desta maneira a clínica na atualidade, com os impasses e impossibilidades que se delineiam em seu campo, se impôs como o problema em pauta, sobre o qual é necessário realizar certas problematizações com vistas a construir certas problemáticas.

No que tange a isso, é preciso considerar que tanto a psiquiatria biológica quanto o cognitivismo e a terapia comportamental procuram desarticular o dispositivo da clínica do psíquico, na medida em que os registros do sujeito e da singularidade foram colocados em questão no campo terapêutico oriundo de tais discursos. Além disso, é preciso destacar ainda que todos esses discursos se inscrevem num paradigma naturalista de cientificidade, que se funda nos discursos teóricos da biologia e das neurociências. Finalmente, esses diferentes discursos se articulam e se conjugam na série de reconfigurações produzidas do DSM, desde o início dos anos 1980, com o DSM III e os DSM subsequentes, quais sejam, o DSM IV e o DSM 5.

A leitura da reformatação nosográfica do DSM desde os anos 1980 é crucial, na medida em que evidencia a aliança teórica estabelecida entre os três discursos acima sublinhados, assim como o silêncio correlato das categorias de sujeito e de singularidade na experiência psíquica. A totalidade deste processo de reconfiguração diagnóstica se evidencia ainda pela exclusão significativa do discurso psicanalítico, que estava ainda presente nos DSM I e DSM II.

Assim, o que caracterizou a série de DSM após os anos 1980 foi a suspensão da leitura histórica da enfermidade, de forma que no seu lugar o que se enunciou foi a categoria de síndrome. A resultante teórica disso foi que se passou a descrever transtornos e não mais enfermidades. Com isso, diferentemente da leitura da enfermidade, na qual se articulavam intimamente as categorias de espaço e do tempo, com a regulação deste sobre aquele, na leitura da síndrome o que se impõe como contrapartida é a descrição dos transtornos e das disfunções centradas na categoria do espaço. Portanto, nas novas versões do DSM o que se descreve são transtornos, síndromes e disfunções, em que a dimensão histórica e temporal da enfermidade foi suspensa, silenciada e no limite eliminada.

Além disso, é preciso evocar ainda que no tratamento do transtorno/síndrome/disfunção o que se prescreve é sempre o medicamento, que se articula com as técnicas oriundas dos discursos teóricos do cognitivismo e do comportamentalismo. Contudo, a figura do medicamento é certamente um operador crucial, pois estaria implicando, ao mesmo tempo, tanto a proposição terapêutica quanto a composição dos critérios diagnósticos dos transtornos/síndromes/disfunções.

Para legitimar teoricamente a colocação em questão do discurso psicanalítico, no novo campo diagnóstico/terapêutico das práticas clínicas do psíquico, os discursos da psiquiatria biológica, do cognitivismo e do comportamentalismo enunciaram não apenas que a psicanálise era um tratamento muito longo, mas também que era ainda muito caro e com resultados terapêuticos duvidosos. Procuraram conjugar assim três argumentos heterogêneos, inscritos nos diferentes registros do tempo, da economia e da eficácia clínica, respectivamente. Contudo, todos esses argumentos foram devidamente criticados por Castel e colaboradores na obra intitulada A psiquiatria na sociedade avançada, na medida em que evidenciaram que os novos procedimentos terapêuticos repetiam os mesmos pontos que criticavam na experiência psicanalítica.

Além disso, é preciso sublinhar ainda que, pela construção teórica, norteada pela conjunção entre a psiquiatria biológica, o cognitivismo e a terapêutica comportamental, o DSM reformulado, desde os anos 1980, não é uma descrição ateórica, como proclamaram os seus idealizadores de forma eloquente, na medida em que se funda em escolhas teóricas baseadas nos campos daqueles discursos acima citados, por um lado, mas também por configurações interpretativas e delineadas por aqueles discursos teóricos, por outro. Vale dizer, a descrição baseada em síndromes/transtornos/disfunções, no lugar da categoria de enfermidade, evidencia de forma eloquente as linhas de força e as coordenadas teóricas dos campos discursivos que foram enfatizados.

É preciso evocar ainda que esse modelo nosográfico foi construído pela psiquiatria biológica como derivação ao que já ocorria no campo da medicina somática, que anteriormente se reformulou colocando de lado o discurso teórico da enfermidade e substituindo-o pelo discurso da síndrome. O correlato disso foi a constituição do discurso da medicina baseada em evidências pelo qual os procedimentos terapêuticos seriam então acoplados.

Em decorrência da totalidade desse processo, a psiquiatria biológica não apenas se desvencilhou definitivamente da psicanálise, à qual estava subordinada desde o início do século XX pelos próprios impasses clínicos do discurso psiquiátrico de então, como também pôde se enunciar como fazendo parte finalmente do campo da medicina, de fato e de direito (Kant,1971Kant, E. (1971). Critique de la raison pure. Paris, França: PUF.), pela sua fundamentação neurobiológica, o que não era o caso desde o século XIX, pois o discurso psiquiátrico não conseguia legitimar epistemologicamente a sua pertinência ao campo da medicina (Birman, 1978Birman, J. (1978). Psiquiatria como discurso da moralidade. Rio de Janeiro, RJ: Graal.; Foucault, 2003Foucault, M. (2003). Le pouvoir psychiatrique. Paris, França: Gallimard/Seuil.).

Porém, é preciso dizer ainda, com toda eloquência possível, como a confecção das novas versões da DSM implicaram a colaboração íntima entre os centros da pesquisa avançada em psiquiatria, com os órgãos sanitários do governo norte-americano e os laboratórios farmacêuticos, de forma a conjugar os diferentes registros do saber, do poder e do mercado. Isso porque são os mesmos agentes psiquiátricos que se inscrevem nas diferentes instâncias que foram mencionadas.

Portanto, essa reconfiguração teórica nas práticas terapêuticas oriundas dos discursos da psiquiatria biológica, do cognitivismo e do comportamentalismo silenciou a dimensão do sujeito e da singularidade do discurso da clínica, que a marcou desde a sua emergência histórica no final do século XVIII (Foucault, 1963Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF.), pois a regulação das síndromes/transtornos/disfunções passou a se realizar para tornar homogêneos os indivíduos inscritos em tais dispositivos terapêuticos. Com efeito, seria a referência às categorias de sujeito e de singularidade que poderiam introduzir a heterogeneidade no campo da clínica propriamente dita, pois somente com tais mediações o critério da diferença seria assim introduzido. Pode-se dizer, então, que esse novo campo terapêutico promoveria a normalização das individualidades e dos laços sociais, pelo silêncio dos registros do sujeito e da singularidade. O que se pretende com isso, enfim, é a normalização do campo social, de maneira ampla, geral e irrestrita, o que coloca frontalmente em questão o dispositivo da clínica.

Para aquilatar essa diferença, ao mesmo tempo teórica, epistemológica, ética e política, é preciso delinear a constituição do dispositivo da clínica na sua especificidade.

Medicina moderna

Assim, a clínica não se constituiu historicamente como prática e dispositivo pelo gesto eloquente de Hipócrates de se inclinar sobre o leito do enfermo, como essa cena se forjou como mito originário na tradição da medicina, mas na aurora da modernidade, na passagem do século XVIII para o século XIX, como formulou Foucault (1963)Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF. em Nascimento da clínica. Desta maneira, o discurso da clínica foi tributário da constituição da medicina moderna, na medida em que essa se configurou numa dupla vertente, qual seja, a da medicina individual e a da medicina coletiva, sob as formas da clínica, por um lado, e da higiene social e da polícia médica, pelo outro (Ibid.). Evidentemente, essa dupla face da medicina, se articulou de modo coerente e complementar, pela referência a uma invariante de base que as conjugou.

Essa invariante foi a construção de um discurso teórico no qual se enunciou a articulação e a diferença entre os registros do normal, do anormal e do patológico, na versão teórica de Foucault (1963)Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF.. Para Canguilhem (1943/1975)Canguilhem, G. (1975). Le normal et le pathologique (3rd ed.). Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1943)., em contrapartida, este tríptico conceitual foi enunciado pelos discursos da medicina e da pedagogia, no mesmo contexto histórico.

Contudo, no que concerne à medicina, a leitura dos dois autores é divergente, pois se Canguilhem (1943/1975)Canguilhem, G. (1975). Le normal et le pathologique (3rd ed.). Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1943). enfatiza a normatização do organismo como operador da norma, Foucault (1963)Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF. enunciou em oposição a isso um amplo processo de normalização do social. Para Foucault (1963/1994a)Foucault, M. (1994a). “Preface à la transgression”. In Dits et écrits (Vol. I). Paris, França: Gallimard. (Trabalho original publicado em 1963). essa marca crucial da norma, inscrita no dispositivo da normalização, implicou a desconstrução do registro da Lei, na modernidade. Essa desconstrução implicou a morte de Deus, de acordo com a leitura filosófica de Nietzsche (Ibid.).

Com efeito, pela morte de Deus não existiria mais nenhum imperativo absoluto que se impusesse ao sujeito para se nortear no mundo e delinear assim o que seria certo e errado na sua existência (Ibid.), de forma que no vazio da Lei o sujeito se inflou e foi conduzido à transgressão (Ibid.), como formulou Foucault em 1963Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF., no ensaio intitulado “Prefácio à transgressão” (Ibid.). Portanto, foi para regular as transgressões no espaço social, nos registros social e coletivo, que o discurso da normalização se constitui historicamente. Em decorrência disso, o discurso da medicina foi o paradigma antropológico para a constituição das diferentes ciências humanas no século XIX, na medida em que todas essas se norteavam pela conjunção e diferença existente entre os registros do normal, do anormal e do patológico, para empreenderem a normalização do social, do corpo e do indivíduo (Foucault, 1963Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF.).

Assim, em Nascimento da clínica, Foucault (Ibid.) enunciou que a emergência da medicina moderna implicou a desconstrução do ideário da salvação, fundado na Lei, e a constituição correlata do ideário da terapêutica, fundada na norma. Além disso, pela derivação das categorias médicas para o campo das ciências humanas na modernidade, não existiriam apenas os organismos normal, anormal e patológico, mas também os indivíduos e as sociedades modulados igualmente por tais registros (Ibid.).

Porém, é preciso enfatizar ainda que, com a morte de Deus e a secularização correlata da existência, foi formulada também outra relação entre a vida e a morte que era anteriormente inexistente, pelos discursos da biologia e da medicina moderna. Com efeito, com Bichat a vida passou a ser concebida como o conjunto de forças que lutam contra a morte (Ibid.), de forma que a morte não seria mais o Outro que transcenderia a vida como outrora, mas seria, ao contrário, imanente à ordem da vida. Portanto, a morte como potência do Mal estaria sempre inscrita nos interstícios da vida, podendo assim, a qualquer momento e de forma inesperada, subsumir e sobrepujar a ordem da vida, impondo então a sua soberania sobre essa de maneira inapelável.

Portanto, o que o discurso da medicina instituiu e construiu na modernidade foi a problemática da finitude no registro do organismo, de forma que este nasce, se desenvolve e morre de forma inapelável, tendo assim na finitude a marca eloquente de seu ser (Ibid.). Polarizado então o organismo entre os registros da vida e da morte, de maneira conflitiva, a morte seria o signo ostensivo da finitude na ordem da vida. Além disso, com a derivação do paradigma antropológico da medicina, modelada pela oposição entre os registros do normal, do anormal e do patológico, foi inscrito nos campos das diversas ciências humanas, de maneira que a finitude do organismo se inscreveu igualmente nos registros do indivíduo e da sociedade. Enfim, da mesma forma que os organismos, os indivíduos e as sociedades também nasceriam, se desenvolveriam e morreriam (Ibid.).

Contudo, essa nova relação entre a vida e a morte enunciada na aurora da modernidade, articulou-se também no plano político, pois o registro do poder igualmente estabeleceu outras relações com a vida e a morte, anteriormente inexistentes. Com efeito, se no tempo histórico do poder soberano a figura do Rei fazia morrer, mas deixava viver por condescendência, com o poder disciplinar e o biopoder, em contrapartida, o poder fazia viver, mas deixava morrer (Foucault, 1974Foucault, M. (1974). Surveiller et punir. Paris, França: Gallimard.).

Portanto, pela mediação das práticas de normalização realizadas pelas diferentes ciências humanas e a medicina, o poder na modernidade promoveu o polo da vida na sua luta permanente contra a morte. Nesse contexto, o discurso da modernidade poderia ser interpretado como vitalista como enunciou Canguilhem (1943/1975)Canguilhem, G. (1975). Le normal et le pathologique (3rd ed.). Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1943). em O normal e o patológico, ou como mortalista, como enunciou Foucault (1963)Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF. em Nascimento da clínica, cada um dos autores enfatizando a primazia de um dos polos conflitivos delineados entre os registros da vida e da morte.

Foi em consequência dessa leitura outra, sobre as relações entre a vida e a morte, que a medicina moderna constituiu o discurso sobre a clínica, pela formulação axial de que a enfermidade seria uma forma parcial de morte. Com efeito, com a constituição do discurso da anátomo-clínica, que procurou articular os registros dos sinais clínicos com o da lesão registrado pela anatomia patológica, a enfermidade seria inscrita no campo dos tecidos com a lesão, que seria a marca inconfundível da morte no tecido, que poderia ser verificada pelo exame pós-mortem do doente, com o exame anátomo-patológico do cadáver (Ibid.).

É preciso destacar, assim, que a constituição da medicina moderna implicou a construção de outro discurso da anatomia, centrado agora no registro íntimo dos tecidos e não mais dos órgãos, como tinha sido estabelecido anteriormente por Vessálio, no Renascimento, no nível morfológico. Na nova anatomia, os tecidos atravessam diferentes órgãos, não ficando assim restritos ao registro do órgão. Por isso mesmo, o discurso da anatomia patológica privilegiou o registro dos tecidos, sendo assim a contrapartida da constituição teórica do discurso da histologia, pois seria no tecido que se localizaria a lesão anatômica.

O olhar

Assim, o que caracterizou a constituição arqueológica do discurso da clínica foi a construção do discurso da semiologia médica, para delinear o Mal no campo da visibilidade e da superfície corporal, por um lado, para poder captar então o que ocorreria na invisibilidade dos tecidos e na profundidade do corpo. O discurso da anátomo-clínica se constituiu, assim, pela conjunção entre os registros da visibilidade dos sinais e da invisibilidade dos tecidos, numa operação teórica e prática que visaria costurar os planos da superfície e da profundidade corporais (Foucault, 1963Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF.).

Pela semiologia clínica o médico procurava evidenciar pelos sinais o ser da enfermidade, ao mesmo tempo de forma objetiva e objetivável. Porém, a figura do doente também falava sobre o seu Mal, evidenciando esse por sintomas, de forma subjetiva, o que entreabria para a figura do médico a possibilidade de investigar novos registros de sinais. Portanto, pelo discurso a figura do enfermo se manifestava pelo sintoma e pela narrativa de sua história clínica, o que delineava novos registros para o exame semiológico realizado pela figura do médico (Ibid.).

Assim, pela observação visual do doente, como pelo exame e a ausculta do coração e dos pulmões, acompanhadas regularmente pela palpação do abdômen, a figura do médico provocava circunscrever o campo do Mal em diferentes registros da visibilidade. Esses diversos exames eram complementados pelos exames da urina e de sangue que ofereciam outros sinais de visibilidade para a semiologia clínica. Vale dizer, no registro epistemológico a semiologia clínica, assim como o exame do cadáver realizado pelo discurso da anatomia patológica, a figura do médico se pautava estritamente pela operação do olhar (Ibid.). Por isso mesmo, Nascimento da clínica tem como subtítulo, eloquente e rigoroso ao mesmo tempo, Uma arqueologia do olhar médico, na medida em que Foucault enfatizava a operação do olhar como a marca epistemológica específica do discurso da clínica médica.

Contudo, a operação da escuta do médico também ocorria, como contrapartida do discurso do doente no ato médico que enunciava, de forma subjetiva, as suas queixas e os seus sintomas. Se a escuta do médico servia, por um lado, para entreabrir outros campos possíveis para o exame visível dos sinais, é preciso enfatizar também que a escuta e a fala do médico visavam regular igualmente a inquietude dos doentes face à doença, no campo da relação do médico com o paciente (Ibid.), por outro. Com efeito, a doença atualizava também a possibilidade de morte para o doente sob a forma da angústia, na medida em que a enfermidade passou a ser concebida pela medicina anátomo-clínica como uma forma parcial da morte.

De qualquer forma, a operação médica do olhar era efetivamente soberana em face da operação da escuta no ato clínico, de forma que aquela sobrepujava largamente essa e a subsumia. Com isso, o discurso do doente tinha menos importância no campo do discurso da clínica, se comparado ao discurso da protoclínica, no qual a escuta do médico e o discurso do enfermo tinham mais espaço e densidade na experiência da medicina (Ibid.).

Entretanto, mesmo estando a escuta/discurso subsumido ao registro do olhar no ato clínico, no campo da relação médico-paciente, não resta qualquer dúvida de que a figura do médico apaziguava as inquietudes da figura do enfermo, pela escuta e pelo discurso. Por isso mesmo Lacan, no ensaio de 1936, intitulado “Além do princípio da realidade”, formulou que a psicanálise apenas pôde ser inventada como discurso teórico a partir de Freud, que era médico, e pelo discurso da medicina em decorrência da importância assumida pelo dispositivo da relação médico-paciente no ato clínico (Lacan, 1936/1966). Da mesma forma, Foucault (1963)Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF. em Nascimento da clínica enunciou igualmente que a relação transferencial entre as figuras do analista e do analisante encontrou a sua matriz teórica e clínica no campo da relação singular estabelecida entre o médico e o doente no ato clínico.

Além disso, não se pode esquecer que o discurso da clínica assim configurado implicou a transformação do hospital numa instituição especificamente médica, o que não era anteriormente, sob a forma de se configurar efetivamente como máquina de curar, como nos disse Foucault (1963)Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF. num outro ensaio sobre a constituição da medicina moderna.

Em decorrência disso, a articulação entre os registros do indivíduo e do social na constituição da medicina moderna, se condensou na consideração de que a leitura de cada caso clínico na sua particularidade implicava ao mesmo tempo a construção do conjunto de casos possibilitados pela reunião desses pela ordem hospitalar. Portanto, a leitura de cada caso clínico na sua especificidade implicava sempre a leitura diferencial do conjunto de casos, em que as variações eram então destacadas (Foucault, 1963Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF.). Vale dizer, o discurso da clínica como leitura do particular implicava necessariamente uma leitura de ordem eminentemente probabilística (Ibid.).

Ao longo dos séculos XIX e XX o desequilíbrio entre os registros do sinal (olhar) e do sintoma (escuta), foi se acentuando de forma radical, no entanto, de forma que o registro do sinal se impôs de forma absolutamente soberana sobre o registro do sintoma, de maneira que este desapareceu inteiramente do campo do ato médico na contemporaneidade.

Escuta e interpretação

Em contrapartida, o discurso freudiano se constituiu pela posição estratégica conferida ao registro do sintoma e não do sinal, ao colocar o campo do discurso no centro do dispositivo psicanalítico. Consequentemente, a clínica psicanalítica se pautou pela operação da escuta e não pela do olhar.

Assim, no que concerne a isso o ano de 1891 foi certamente decisivo na construção do discurso psicanalítico, na medida em que Freud publicou o ensaio clínico sobre o “Tratamento psíquico” (1891/1984Freud, S. (1984). Traitement psychique. In Résultats, idées, problems (1890-1920). (Vol. I). Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1891).), por um lado, e o “Ensaio sobre a afasia” (1891/1989Freud, S. (1989). Contribution à la conception des aphasies Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1891).) de cunho teórico, por outro, de forma que o registro do discurso estaria no fundamento da clínica e na teorização da psicanálise em formação. Com efeito, se o tratamento psíquico estaria centrado no campo da linguagem e não no da consciência (Freud, 1891/1984Freud, S. (1984). Traitement psychique. In Résultats, idées, problems (1890-1920). (Vol. I). Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1891).), o aparelho da alma de Meynert foi transformado por Freud (1891/1989Freud, S. (1989). Contribution à la conception des aphasies Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1891).) no aparelho de linguagem. Vale dizer, se no registro eminentemente clínico o que era efetivo na experiência da cura era a prática centrada no discurso, no registro teórico, em contrapartida, seria preciso destacar que o aparelho de linguagem seria fundante dessa modalidade de tratamento, centrado na linguagem. Enfim, o que discurso freudiano empreendeu foi a retomada do discurso teórico da protoclínica (Foucault, 1963Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF.) e não o da clínica médica no sentido estrito.

Além disso, num ensaio crucial escrito entre 1893 e 1897 intitulado justamente “As diferenças entre as paralisias motoras e histéricas” (1893--1897/1978aFreud, S. (1978a). Some points for a comparative study of organic and hysterical motor paralyses. In The Standard Edition of complete psychological works of Sigmund Freud (Vol. II). Londres, UK: Hogarth Press. (Trabalho original publicado em 1893-97).), o discurso freudiano enunciou que nas perturbações corporais existentes na histeria o que estaria em pauta não era o registro do corpo figurado pelo discurso da anatomia, mas o registro do corpo representado existente no imaginário popular. Por isso mesmo, numa formulação irônica sobre a constituição genealógica da psicanálise, num ensaio de 1923, intitulado “Uma neurose demoníaca do século XVII”, Freud (1923/1981bFreud, S. (1981b). Une névrose démoniaque au XVIIe siècle. In Essais de psychanalyse. Paris, França: Payot. (Trabalho original publicado em 1923).) pôde articular a demonologia medieval com a psicanálise em oposição à medicina, ao enunciar que para ambos os discursos os espíritos poderiam efetivamente produzir perturbações corporais, que seria configurado na demonologia pela figura do diabo e, na psicanálise, pelos fantasmas.

Consequentemente, as narrativas clínicas oriundas da experiência psicanalítica foram consideradas estranhas e bizarras pela comunidade médica, no final do século XIX, pois não tinham a mesma construção teórica e retórica das narrativas clínicas provenientes da clínica médica. Com efeito, se nas narrativas da clínica médica o que estaria em cena era a reprodução retórica da lógica inerente ao discurso da anátomo-clínica, no qual se pretendia articular o registro dos sinais (visibilidade) ao registro da lesão anatômica (invisibilidade), em contrapartida nas narrativas clínicas da psicanálise o que estava sempre em pauta era a posição estratégica outorgada ao sintoma e ao sujeito que lhe seria inerente. Portanto, nas narrativas psicanalíticas a interpretação dos sintomas se conjugava de forma decisiva com a operação clínica da escuta.

Em decorrência dessa diferença significativa, na sua tessitura retórica, as narrativas psicanalíticas foram aproximadas das narrativas oriundas da literatura, principalmente do romance, pela comunidade médica na virada do século XIX para o século XX. Freud reagiu a isso de forma irritada e indignada, no ensaio teórico clínico de 1895 intitulado “Psicoterapia da histeria” (1895/1971bFreud, S. (1971b). Psychothérapie de l’hystérie. In S. Freud, J. Breuer. Études sur l’hystérie. Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1895).) e na narrativa clínica de Dora de 1905 (1905/1975cFreud, S. (1975c). Fragment d’une analyse d’hystérie (Dora). In Cinq psychanalyses. Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1905).), pois ansiava que o discurso psicanalítico fosse reconhecido como um discurso científico, de fato e de direito (Kant, 1971Kant, E. (1971). Critique de la raison pure. Paris, França: PUF.). Porém, a comunidade médica tinha certamente razão no que concerne a isso, pois do ponto de vista estritamente epistemológico a retórica freudiana não se inscrevia decididamente nos pressupostos teóricos da clínica médica, sem que isso implicasse, necessariamente bem entendido, na não cientificidade da psicanálise. Enfim, tudo isso indica a exigência teórica de outra problematização, mas que não vou realizar no campo deste ensaio.

Contudo, não resta qualquer dúvida que as narrativas clínicas oriundas da experiência psicanalítica são similares das que são provenientes do campo da literatura, pois nos seus títulos Freud (1905/1975c)Freud, S. (1975c). Fragment d’une analyse d’hystérie (Dora). In Cinq psychanalyses. Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1905). escolheu sempre o nome fictício do paciente em questão, como se fosse a personagem de uma história romanesca (Dora, Hans e Schreber), ou, então, a cena fantasmática que configura o sujeito no registro do inconsciente (Homem dos ratos e Homem dos lobos).

Porém, é preciso enfatizar ainda que dita similaridade existente entre a narrativa clínica psicanalítica e a narrativa literária é decorrente da articulação construída pelo discurso freudiano entre os diferentes registros do sintoma, do sujeito, da escuta, do discurso e da interpretação. Por isso mesmo, a psicanálise foi considerada posteriormente e caracterizada filosoficamente como um saber da interpretação por Ricoeur (1965)Ricoeur, P. De l’interpretation. Essais sur Freud. Paris, França: Seuil, 1965. e que Foucault (1967/1994bFoucault, M. (1994b). Nietzsche, Freud, Marx. In Dits et Écrits (Vol. I). Paris, França: Gallimard. (Trabalho original publicado em 1967).) inseriu Freud no campo dos inventores da hermenêutica, ao lado de Nietzsche e de Marx, que como prática de interpretação se opunha decisivamente à semiologia existente na Idade Clássica.

Para que aquela articulação acima enunciada se tornasse possível, necessário foi atribuir ao traço psíquico uma posição estratégica no aparelho psíquico. Assim, face à lesão anatômica, Freud privilegiou no psiquismo o traço psíquico para empreender a leitura sistemática das perturbações psíquicas. Foi pela rede de ligações tecidas entre os traços psíquicos que o registro psíquico do inconsciente foi concebido desde A interpretação dos sonhos (Freud, 1900/1973) assim como seria essa rede de traços psíquicos que constituiria a realidade psíquica em oposição à realidade material (Ibid.). Além disso, o registro do desejo foi introduzido no inconsciente entre 1895 e 1900, entre o “Projeto de sua psicologia científica” (1895/1973) e A interpretação dos sonhos (1900/1976Freud, S. (1976). L’interprétation des rêves (Capítulo VII). Paris, França: PUF.(Trabalho original publicado em 1900).) pela dinamização e a intensificação da rede dos traços psíquicos, na medida em que Freud (1895/1973Freud, S. (1973a). Esquisses d’une psychologie scientifique. In La naissance de la psychanalyse. Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1895).) introduziu nesses a dimensão da intensidade no psiquismo de forma a transformar o aparelho de linguagem em aparelho psíquico. Portanto, o que o discurso freudiano colocou em evidência no psiquismo foi a posição estratégica atribuída ao registro da memória e não mais a da consciência, pois, afinal das contas, “os histéricos sofrem de reminiscências”, como formularam de forma eloquente Freud e Breuer em 1893, no ensaio intitulado “Comunicação preliminar” (1893/1971aFreud, S. (1971a). Comunication preliminare. In S. Freud, J. Breuer. Études sur l’hystérie. Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1893).).

Crise, repetição e finitude

Além disso, a construção do dispositivo psicanalítico incorporou o discurso da crise da medicina pós-moderna, que foi descartado decididamente posteriormente pelo discurso da clínica (Freud, 1896/1973bFreud, S. (1973b). La naissance de la psychanalyse. Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1896).), pelo qual a crise seria o momento crucial em que a enfermidade revelaria plenamente a sua verdade e poderia assim ser devidamente diagnosticada. Como foi então que o discurso freudiano incorporou o conceito de crise da medicina pré-moderna no dispositivo psicanalítico? De diferentes maneiras, como destacarei a seguir de forma esquemática.

Inicialmente, pela formulação do conceito de transferência, pelo qual a figura do analisante estabeleceria um laço afetivo com a do analista (Freud, 1895/1971bFreud, S. (1971b). Psychothérapie de l’hystérie. In S. Freud, J. Breuer. Études sur l’hystérie. Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1895).), por um lado, mas também porque esse laço afetivo seria a rememoração em ato de um laço afetivo com figuras importantes da história do analisante, por outro (Freud, 1905/1975cFreud, S. (1975c). Fragment d’une analyse d’hystérie (Dora). In Cinq psychanalyses. Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1905).). Consequentemente, o que não poderia ser enunciado pela figura do analisante na experiência analítica, se formularia como enunciação e ato na experiência da transferência.

Em seguida, costurando de forma ainda mais consistente as relações existentes entre as categorias de crise, de transferência e de rememoração na experiência psicanalítica, o discurso freudiano formulou no ensaio de 1912, intitulado “A dinâmica da transferência” que não se poderia “combater o inimigo em ausência ou effigie” (Freud, 1912/1972Freud, S. (1972). La dynamic du transfert. In La technique psychanalytique. Paris, França: PUF. (Trabalho original publicado em 1912).). Logo em seguida um novo passo teórico foi realizado, em 1914, no ensaio intitulado “Rememoração, repetição e elaboração” (Freud, 1914/1972) pelo qual o discurso freudiano enunciou o conceito de neurose de transferência para formular que no fundamental a cura psicanalítica se condensaria na desarticulação em ato das linhas de força constituintes da neurose da transferência (crise), construída pelas coordenadas estabelecidas entre as figuras do analisante e do analista.

Finalmente, em 1920, com a publicação do ensaio intitulado “Além do princípio do prazer”, o discurso freudiano colocou a problemática da repetição no centro da experiência psicanalítica (Freud, 1920/1981aFreud, S. (1981a). Au-delà du principe du plaisir. In: Essais de psychanalyse. Paris, França: Payot. (Trabalho original publicado em 1920).), de forma que essa não se restringiria mais à interpretação dos sintomas e à superação das resistências, pois a experiência insistente da repetição estaria no centro da experiência psicanalítica (Ibid.).

Porém, dita repetição aludia à incidência de uma experiência traumática que teria marcado o sujeito, de forma que o trauma foi assim inscrito no coração da experiência psicanalítica. Evidentemente, o conceito de trauma remete respectivamente ao conceito de crise, essa então assumindo outra figuração no discurso freudiano.

Contudo, o enunciado teórico sobre a centralidade da repetição no aparelho psíquico remete ao enunciado conceitual que lhe é fundante, a saber, o novo dualismo pulsional estabelecido entre a pulsão de vida e a pulsão de morte (Ibid.). Com efeito, nesse contexto teórico o dualismo pulsional no discurso freudiano não se restringiria mais à oposição entre a pulsão sexual e a pulsão da autoconservação, tampouco à oposição existente entre a pulsão sexual e a pulsão do eu, mas todas essas oposições anteriores passaram a estar subsumidas à oposição axial estabelecida entre a pulsão de vida e a pulsão de morte (Ibid.).

O que implica dizer que se no psiquismo a pulsão de vida seria uma potência de conjunção e de intrincação (Ibid.) entre a força da pulsão e o objeto com vistas à experiência da satisfação (Ibid.), em contrapartida a pulsão de morte seria uma potência de disjunção e de desintrincação (Ibid.) da força da pulsão e do objeto, impossibilitando a dita experiência de satisfação. Em consequência, a pulsão de morte em estado livre teria uma incidência traumática, de forma que o trauma não se produziria apenas por incidência externa, mas também por incidência interna, promovido pelo impacto da disjunção da pulsão de morte com a pulsão de vida (Ibid.). Enfim, os destinos da crise e do trauma se evidenciam desde então no campo da economia psíquica da pulsão de morte, na medida em que a experiência da repetição seria uma operação psíquica que visaria tornar possível a produção de um traço psíquico, isto é, a inscrição da força da pulsão.

Foi em decorrência disso que Foucault enunciou, em Nascimento da clínica, que o discurso freudiano retomou o discurso de anátomo-clínica — que enunciara desde Bichat que a vida seria o conjunto de forças que lutam contra a morte e que inscreveria assim o organismo no registro da finitude que vimos acima —, no campo do sujeito. Com efeito, o sujeito no discurso freudiano tardio foi então concebido pela oposição infinita estabelecida entre as pulsões de vida e as pulsões de morte (Foucault, 1963Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF.). Não obstante a diversidade dos registros em pauta — organismo e sujeito —, o que estaria sempre em pauta seria a problemática da finitude, inaugurada com a emergência histórica da medicina moderna, de forma que no campo da arqueologia do saber a psicanálise seria herdeira do discurso da anátomo-clínica.

Em 1936, Lacan (1936/1966)Lacan, J. (1966). Au-delà du principe de realité. In Écrits. Paris, França: Seuil.(Trabalho original publicado em 1936). já enunciava em “Além do princípio da realidade”, que o conceito metapsicológico de pulsão de morte seria oriundo do discurso teórico de Bichat, sobre as novas relações estabelecidas entre a vida e a morte na aurora da modernidade, indicando assim as relações de fundação estabelecidas entre a emergência histórica da clínica no final do século XVIII e a da psicanálise no final do século XIX.

Da mesma forma, a ontologia existencial de Heidegger, sistematizada inicialmente em Ser e tempo, obra publicada em 1927, estaria igualmente escrita, do ponto de vista da arqueologia do saber, na tradição anátomo--clínica, na medida em que o Dasein foi enunciado decididamente como ser para a morte, marcado que seria assim pela finitude radical (Foucault, 1963Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF.),

Portanto, se os diferentes registros do organismo, do sujeito e do Dasein seriam marcados pelo signo da finitude, foi o discurso na anátomo-clínica que antecedeu decididamente o discurso da psicanálise e da ontologia existencial, na leitura norteada pela arqueologia do saber.

Contudo, no campo do discurso freudiano a oposição entre a pulsão de vida e a pulsão de morte, fundante do sujeito do inconsciente, seria marcada e modulada pela experiência da castração, o que definiria o dito sujeito no registro incontornável da finitude, de forma que o limite seria fundamental para a construção do sujeito do inconsciente face ao imperativo da pulsão de morte.

Assim, existe certamente identidade e diferença entre o discurso da anátomo-clínica e os discursos da psicanálise e da ontologia existencial, pois se todos esses discursos problematizaram certamente a finitude, por um lado, a operação epistemológica do olhar norteia o discurso da clínica enquanto a escuta e a interpretação fundariam os discursos da psicanálise e da ontologia existencial, por outro.

Hermenêutica e semiologia

No que concerne especificamente à psicanálise é preciso destacar ainda que o discurso freudiano, ao lado do discurso filosófico de Nietzsche e do discurso da economia política de Marx, foram os constituintes da moderna hermenêutica que se opôs epistemologicamente ao discurso da semiologia (Foucault, 1967/1994cFoucault, M. (1994c). Nietzsche, la généalogie, l’histoire. In Dits et écrits. (Vol. I.). Paris, França: Gallimard. (Trabalho original publicado em 1970).). Com efeito, se tanto a hermenêutica quanto a semiologia seriam certamente técnicas de interpretação, a hermenêutica se constituiu na modernidade enquanto a semiologia se construiu efetivamente na Idade Clássica, enunciando, além disso, diferentes economias simbólicas do signo (Ibid.).

Assim, se na semiologia o signo representava a coisa, numa relação especular, de forma que a origem do signo era circunscrita pela referência, na hermenêutica, em contrapartida, o signo reenviava a outro signo num processo que seria infinito, de forma que a origem não apenas seria perdida para sempre, como também seria marcada pela dispersão (Ibid.). Portanto, no discurso da anátomo-clínica a interpretação semiológica norteia decididamente as operações da clínica médica, pois a construção epistemológica da anátomo-clínica procurava articular os registros da visibilidade e da invisibilidade como vimos, enquanto nas hermenêuticas filosófica (Nietzsche), psicanalítica (Freud) e na economia política (Marx) o que estaria sempre em pauta seria a dispersão da origem (poder, fantasma, relação entre forças produtivas e relações de produção) (Ibid.). Por isso mesmo, a hermenêutica moderna é uma interpretação ao infinito, pela qual a categoria de referência foi desativada.

Inquérito e exame

Contudo, é preciso evocar ainda que a construção da medicina moderna implicou na formulação de que seria possível existir saber no registro do particular e não apenas no do universal, tal como foi formulado na “Metafísica” de Aristóteles (1991)Aristote. Metaphysique. (Vols. I e II). Paris, França: Vrin, 1991., na qual apenas poderia existir o saber sobre o universal (Foucault, 1963Foucault, M. (1963). Naissance de la clinique. Paris, França: PUF.). No que tange a isso, ao lado da clínica médica que formulou o saber do particular e por isso se transformou, como vimos acima, em paradigma antropológico e epistemológico das ciências humanas (Ibid.), é preciso evocar ainda que os diferentes discursos constituintes do poder disciplinar e do biopoder são modulados também pela leitura do particular (Foucault, 1974Foucault, M. (1974). Surveiller et punir. Paris, França: Gallimard.).

Com efeito, o discurso da clínica e suas derivações, centrados todos na verdade do particular, pautaram-se no registro do exame, que se opôs radicalmente ao procedimento do inquérito constituído na Antiguidade (Ibid.). Se o procedimento do inquérito forjou o discurso jurídico desde a Grécia clássica e modulou posteriormente a emergência das ciências naturais desde o século XVII, centrados no universal, o procedimento do exame foi constitutivo da medicina moderna e das ciências humanas, norteados pelo saber e pela verdade do particular (Ibid.).

Em decorrência disso, Foucault (1976)Foucault, M. (1976). La volonté de savoir. Paris, França: Gallimard. criticou frontalmente a psicanálise nas versões de Freud e de Lacan em A vontade do saber, que conceberam o poder pelo registro do inquérito e não do exame, valendo-se assim da figura do Édipo seja como complexo (Freud), seja como estrutura (Lacan). Com efeito, a figura de Édipo seria paradigmática do dispositivo jurídico do inquérito e não do exame, remetendo assim a uma figura do poder de ordem pré-moderna (Ibid.). Portanto, centrando-se na ciência do sexual e não na arte erótica, a psicanálise concebeu a dita ciência do sexual, como os demais discursos da sexologia, centrada no paradigma do inquérito (Foucault, 1974Foucault, M. (1974). Surveiller et punir. Paris, França: Gallimard.).

Prática de si e coragem de verdade

Porém, nesta genealogia da clínica e da clínica psicanalítica, é possível afirmar ainda que a psicanálise como discurso remeteria para as práticas de si oriundas da Antiguidade grega, romana e helenística, como enunciou Foucault em 1981, no curso realizado no Collège de France intitulado “A hermenêutica do sujeito” (Foucault, 1981-82/2001Foucault, M. (2001). L’herméneutique du sujet. Paris, França: Gallimard/Seuil /EHESS. (Trabalho original publicado em 1981-82).). Assim, enquanto prática de produção de si, promovendo a produção do sujeito, a psicanálise remeteria ainda para as práticas antigas centradas na coragem de verdade (Foucault, 1982/1994eFoucault, M. (1994e). Les techniques de soi. In Dits et écrits (Vol. IV). Paris, França: Gallimard. (Trabalho original publicado em 1982).; 1982-83/2008Foucault, M. (2008). Le gouvernement de soi et des autres. Paris, França: Gallimard/Seuil. (Trabalho original publicado em 1982-83).; 1984/2009Foucault, M. (2009). Le courage de verité. Paris, França: Gallimard/Seuil. (Trabalho original publicado em 1984).) onde se destacaram a operação e a experiência da paresia, na qual dizer a verdade era um risco efetivo para o sujeito, a psicanálise inscrevendo-se então numa longa tradição ética e espiritual iniciada na Antiguidade.

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  • Financiamento/Funding: O autor declara não ter sido financiado ou apoiado / The author has no support or funding to report.

Editado por

Editora da entrevista/Editor: Profa. Dra. Ana Maria Rudge e Profa. Dra. Sonia Leite

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    24 Jun 2018
  • Aceito
    5 Ago 2018
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