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Tendência do aleitamento materno em município da região centro-sul do estado de São Paulo: 1995-1999-2004

Breastfeeding trends in a municipality in central-southern São Paulo state: 1995-1999-2004

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a situação do aleitamento materno em 2004 no município de Botucatu, SP, e identificar sua tendência nos últimos 10 anos. MÉTODOS: Trata-se de um estudo epidemiológico, no qual foram comparados os resultados de 3 inquéritos populacionais transversais (1995-1999-2004), metodologicamente semelhantes, sobre a situação do aleitamento materno em crianças menores de 12 meses. Os dados foram obtidos em Campanhas de Multivacinação, a partir de questionário contendo um recordatório da alimentação das crianças no dia anterior à pesquisa. Para identificar a tendência dos diferentes tipos de aleitamento (aleitamento materno exclusivo, aleitamento materno predominante e aleitamento materno), foram comparadas as prevalências, segundo faixas etárias selecionadas (0-1 mês, 0-4 meses, 0-6 meses e 0-12 meses), nos 3 inquéritos. Os resultados foram submetidos a teste estatístico (teste z) para verificação das diferenças entre proporções. RESULTADOS: Para as crianças menores de 4 meses, houve aumento progressivo e de grande magnitude (19,1% em 1995 e 36,9% em 2004) do aleitamento materno exclusivo e diminuição do aleitamento materno predominante - diferenças estatisticamente significantes. O mesmo ocorreu para as crianças menores de 6 meses: 13,0% em aleitamento materno exclusivo em 1995, 29,6% em 2004, representando 128,0% de aumento. Com relação ao aleitamento materno, tanto para as crianças menores de 4 meses, quanto para as menores de 6 meses e de 1 ano, houve pequeno aumento de prevalência, mas as diferenças não foram estatisticamente significantes. A duração mediana do aleitamento materno exclusivo aumentou 14 dias (82,0%) e do aleitamento materno 85 dias (50,9%) no período de 10 anos. CONCLUSÃO: Com a elevação expressiva da prevalência de crianças menores de 6 meses em aleitamento materno exclusivo e o aumento da mediana da amamentação exclusiva e da amamentação, pode-se afirmar que a evolução do aleitamento no município foi favorável. Entretanto, a situação em 2004 ainda está distante das recomendações atuais sobre alimentação infantil.

aleitamento materno; lactante; prevalência


OBJECTIVE: To evaluate breastfeeding practices in 2004 in the municipality of Botucatu, São Paulo State and to identify trends in the past ten years. METHODS: This is an epidemiological study comparing the results of three population-based cross-sectional studies (1995-1999-2004), using similar methodologies, assessing the breastfeeding practices among children under age 12 months. Data were obtained during multiple vaccination campaigns using a recall questionnaire to investigate the child's feeding in the previous day. The differences in the proportion of children in each type of feeding (exclusive breastfeeding, predominant breastfeeding, and breastfeeding) in the three surveys, according to selected age groups (0-1 month, 0-4 months, 0-6 months and 0-12 months), were analyzed using a z-test. RESULTS: For children under age 4 months, there was a marked and progressive increase (19.1% in 1995 and 36.9% in 2004) in exclusive breastfeeding and a reduction in predominant breastfeeding, with statistically significant differences. The same was observed among children under age 6 months, with 15% increase in exclusive breastfeeding in 1995 and 29.6% in 2004, representing a total 128.0% increase. Regarding breastfeeding, there were slight increases in prevalence for children younger than 4 months, 6 months, and 1 year, but significant differences were not found. The median duration of exclusive breastfeeding increased by 14 days (82.0%) and that of breastfeeding, by 85 days (50.9%) in the ten-year period. CONCLUSION: With the expressive increase in the prevalence of exclusive breastfeeding among children under six months and the increase in median duration of exclusive breastfeeding and of breastfeeding, we may conclude that breastfeeding in the municipality evolved favorably. However, the situation in 2004 is still far from fulfilling current recommendations on infant feeding.

breast feeding; prevalence; infant


ORIGINAL ORIGINAL

Tendência do aleitamento materno em município da região centro-sul do estado de São Paulo: 1995-1999-2004

Breastfeeding trends in a municipality in central-southern São Paulo state: 1995-1999-2004

Luciana FerreiraI; Cristina Maria Garcia de Lima ParadaII, * * Correspondência para/ Correspondence to: C.M.G.L. PARADA. E-mail: < cparada@fmb.unesp.br> ; Maria Antonieta de Barros Leite CarvalhaesII

IUniversidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Medicina, Programa de Saúde da Família e Comunidade. Botucatu, SP, Brasil

IIUniversidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Medicina, Departamento de Enfermagem. Campus Universitário Rubião Júnior, s/n. 18618-970, Botucatu, SP, Brasil

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a situação do aleitamento materno em 2004 no município de Botucatu, SP, e identificar sua tendência nos últimos 10 anos.

MÉTODOS: Trata-se de um estudo epidemiológico, no qual foram comparados os resultados de 3 inquéritos populacionais transversais (1995-1999-2004), metodologicamente semelhantes, sobre a situação do aleitamento materno em crianças menores de 12 meses. Os dados foram obtidos em Campanhas de Multivacinação, a partir de questionário contendo um recordatório da alimentação das crianças no dia anterior à pesquisa. Para identificar a tendência dos diferentes tipos de aleitamento (aleitamento materno exclusivo, aleitamento materno predominante e aleitamento materno), foram comparadas as prevalências, segundo faixas etárias selecionadas (0-1 mês, 0-4 meses, 0-6 meses e 0-12 meses), nos 3 inquéritos. Os resultados foram submetidos a teste estatístico (teste z) para verificação das diferenças entre proporções.

RESULTADOS: Para as crianças menores de 4 meses, houve aumento progressivo e de grande magnitude (19,1% em 1995 e 36,9% em 2004) do aleitamento materno exclusivo e diminuição do aleitamento materno predominante - diferenças estatisticamente significantes. O mesmo ocorreu para as crianças menores de 6 meses: 13,0% em aleitamento materno exclusivo em 1995, 29,6% em 2004, representando 128,0% de aumento. Com relação ao aleitamento materno, tanto para as crianças menores de 4 meses, quanto para as menores de 6 meses e de 1 ano, houve pequeno aumento de prevalência, mas as diferenças não foram estatisticamente significantes. A duração mediana do aleitamento materno exclusivo aumentou 14 dias (82,0%) e do aleitamento materno 85 dias (50,9%) no período de 10 anos.

CONCLUSÃO: Com a elevação expressiva da prevalência de crianças menores de 6 meses em aleitamento materno exclusivo e o aumento da mediana da amamentação exclusiva e da amamentação, pode-se afirmar que a evolução do aleitamento no município foi favorável. Entretanto, a situação em 2004 ainda está distante das recomendações atuais sobre alimentação infantil.

Termos de indexação: aleitamento materno; lactante; prevalência.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To evaluate breastfeeding practices in 2004 in the municipality of Botucatu, São Paulo State and to identify trends in the past ten years.

METHODS: This is an epidemiological study comparing the results of three population-based cross-sectional studies (1995-1999-2004), using similar methodologies, assessing the breastfeeding practices among children under age 12 months. Data were obtained during multiple vaccination campaigns using a recall questionnaire to investigate the child's feeding in the previous day. The differences in the proportion of children in each type of feeding (exclusive breastfeeding, predominant breastfeeding, and breastfeeding) in the three surveys, according to selected age groups (0-1 month, 0-4 months, 0-6 months and 0-12 months), were analyzed using a z-test.

RESULTS: For children under age 4 months, there was a marked and progressive increase (19.1% in 1995 and 36.9% in 2004) in exclusive breastfeeding and a reduction in predominant breastfeeding, with statistically significant differences. The same was observed among children under age 6 months, with 15% increase in exclusive breastfeeding in 1995 and 29.6% in 2004, representing a total 128.0% increase. Regarding breastfeeding, there were slight increases in prevalence for children younger than 4 months, 6 months, and 1 year, but significant differences were not found. The median duration of exclusive breastfeeding increased by 14 days (82.0%) and that of breastfeeding, by 85 days (50.9%) in the ten-year period.

CONCLUSION: With the expressive increase in the prevalence of exclusive breastfeeding among children under six months and the increase in median duration of exclusive breastfeeding and of breastfeeding, we may conclude that breastfeeding in the municipality evolved favorably. However, the situation in 2004 is still far from fulfilling current recommendations on infant feeding.

Indexing terms: breast feeding; prevalence; infant.

INTRODUÇÃO

É inquestionável o relevante papel que o aleitamento materno desempenha no crescimento e no desenvolvimento infantil, além de ser parte integrante do processo reprodutivo, com importantes implicações para a saúde materna1.

Devido às suas propriedades físico-químicas e especificidades em relação às necessidades nutricionais da criança, o leite materno é o único alimento que garante qualidade e quantidade ideal de nutrientes para o lactente2.

Vários estudos mostram que a amamentação exclusiva nos primeiros seis meses de vida reduz a mortalidade infantil por enfermidades comuns da infância, como diarréia e pneumonia3, e ajuda na recuperação de enfermidades4-7.

Estudo realizado em 1987 já evidenciava que crianças que não recebiam leite materno tinham risco 14 vezes maior de morrer por diarréia e 3,6 vezes maior de mortalidade por doenças respiratórias, quando comparadas às que recebiam apenas leite materno sem complementos6.

O aleitamento materno também contribui para a saúde da mulher, protegendo-a contra o câncer de mama8, câncer de ovário9, osteoporose10 e esclerose múltipla11. Outra vantagem para a saúde da mulher é a de ampliar o espaçamento entre as gestações e promover efeito contraceptivo, pela amenorréia induzida pela lactação (LAM), confiável nos primeiros seis meses após o parto, desde que a amamentação seja exclusiva e que a mãe se mantenha amenorréica12.

O aleitamento materno exclusivo oferece a vantagem adicional de diminuir os custos das famílias, dos estabelecimentos de saúde e da sociedade em geral, ao eliminar os gastos com leites artificiais, mamadeiras e ao reduzir os episódios de doenças nas crianças13.

Há evidências suficientes que embasam a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de amamentação exclusiva por 6 meses e manutenção do aleitamento materno complementado até os 2 anos ou mais. No entanto, ainda é baixo o número de mulheres que a seguem, estando a duração e a prevalência dessa prática muito aquém do recomendado14.

Em 1998, estudo envolvendo 84 municípios do estado de São Paulo evidenciou que o aleitamento materno exclusivo nos primeiros 4 meses, raramente, alcançou índices superiores a 30% e, entre os menores de 12 meses, a amamentação (aleitamento materno sem ou com outros alimentos) ficou em torno de 50%15.

No Brasil, dados do Ministério da Saúde apontam que a prevalência de aleitamento materno exclusivo, em menores de 1 mês, era de 53,1% e entre crianças de 3 a 4 meses, 21,6%, decrescendo para 9,7% entre crianças de 5 a 6 meses16.

Se, por um lado, a situação atual ainda não é ideal, por outro é inquestionável a melhora da situação brasileira: se, em 1975, uma em cada duas mulheres amamentava apenas até o segundo ou terceiro mês, em 1999, uma em cada duas mulheres amamentava até cerca de 10 meses17.

Conhecer como os índices do aleitamento materno vêm se comportando ao longo dos anos pode ser importante do ponto de vista gerencial, pois permite melhorar o direcionamento de programas de promoção, proteção e apoio. Assim, foi proposto este estudo, cujos objetivos foram avaliar a situação do aleitamento materno no município de Botucatu, SP, no ano de 2004, e identificar sua tendência nos últimos 10 anos.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo epidemiológico, no qual foram comparados os resultados de 3 inquéritos populacionais transversais metodologicamente semelhantes sobre a situação do aleitamento materno em crianças menores de 12 meses no município de Botucatu, SP. O primeiro estudo foi realizado em 199518, o segundo em 199919 e o terceiro em 2004, cujos dados são apresentados neste artigo.

O município de Botucatu localiza-se na Região Centro-Sul do Estado de São Paulo e contava com uma população de 108.306 habitantes no ano de 2000, com distribuição predominantemente urbana20. Nos 3 estudos ora comparados, a população consistiu das crianças menores de 12 meses, que foram levadas a uma das etapas da Campanha de Multivacinação. Estimava-se que 1.782 crianças estivessem na faixa etária de 0 a 12 meses em 200421, 1.777 em 199919 e 1.736 em 199518. Foram obtidos dados válidos sobre a alimentação de 1.239 crianças em 2004, 1.273 crianças em 1999 e 1.509 crianças em 1995, representando, respectivamente, 90,6%, 79,9% e 91,8% do total de crianças menores de 12 meses vacinadas no dia de cada Campanha.

Para descrever a situação do aleitamento, foram obtidas informações referentes à data de nascimento da criança, situação do aleitamento materno (a criança mama no peito - sim ou não?) e, na vigência dessa prática, investigou-se o consumo de água, suco, chá, outros líquidos, outro leite ou papa salgada (sim ou não?).

As informações referiam-se aos dados atuais da alimentação da criança, os quais permitem uma simplificação do instrumento de coleta de dados, uma vez que não são incluídas questões retrospectivas sobre a alimentação infantil como, por exemplo, até quando mamou no peito e quando foram introduzidos outros alimentos. Trabalhando com dados atuais, evitam-se erros decorrentes da imprecisão da informação das mães (erros de memória).

Esse tipo de coleta de dados tem sido muito utilizado em pesquisas que envolvem crianças e mães, por garantir alta cobertura, rápida coleta de dados e baixo custo15,18.

De posse desses dados, estudou-se a duração mediana da amamentação e a prevalência de crianças nas seguintes categorias de aleitamento materno, conforme padronização da Organização Mundial da Saúde22:

- Aleitamento Materno Exclusivo (AME): crianças que receberam somente leite materno, sem outros líquidos ou outro leite, nas últimas 24 horas;

- Aleitamento Materno Predominante (AMP): crianças que receberam leite materno e água, chá ou suco, nas últimas 24 horas;

- Aleitamento Materno (AM): crianças que receberam leite materno, independentemente da oferta de qualquer complemento, lácteo ou não, nas últimas 24 horas.

Os dados foram coletados por entrevistadores treinados antes das campanhas, que trabalharam de tal forma a não comprometer o fluxo de crianças a serem vacinadas, evitando-se filas. As mães eram encaminhadas a uma sala previamente preparada para coleta de dados. A supervisão, no dia de cada uma das campanhas, foi realizada pelas autoras.

Nos três estudos, foram adotados os mesmos procedimentos. As entrevistas foram codificadas, sendo criados arquivos de dados utilizando recursos que permitiam apenas a entrada de dados previstos na codificação, para evitar erros de digitação. Os questionários com questões em branco foram revisados, parte dos dados digitados foi conferida e a consistência dos dados foi checada pela verificação da distribuição de freqüências de crianças em categorias de variáveis associadas. Eventuais erros foram corrigidos.

As prevalências e as medianas das várias modalidades de amamentação, com os respectivos intervalos de confiança, foram obtidas por meio da análise de probitos, realizada com os programas Statistical Package for Social Sciences (SPSS) 6.0 (1995 e 1999) e 12.0 (2004). Essa técnica de análise de regressão, adotada em ensaios biológicos do tipo dose-resposta de medicamentos, foi adaptada para estudo da situação do aleitamento materno em 199623, e vem sendo bastante utilizada desde então. Para estudo da amamentação, considera-se que o desmame é o evento terminal, sendo a idade da criança o fator de exposição.

As diferenças de proporções de crianças nos diferentes tipos de aleitamento, nos 3 inquéritos, segundo faixas etárias selecionadas (0-1mês, 0-4meses, 0-6 meses, 0-12 meses), foram submetidas a teste estatístico (teste z)24, teste bicaudal, adotando-se como estatisticamente significantes resultados com valor de p<0,05.

As faixas etárias adotadas correspondem às recomendadas pela OMS para estudo da situação populacional do aleitamento materno (0-6 e 0-12) e a faixas de interesse local de monitoramento, ressaltando-se que as categorias não são excludentes e, sim, cumulativas22.

As pesquisas foram realizadas mediante autorização da Secretaria Municipal de Saúde de Botucatu, e com a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu.

RESULTADOS

Merece ser destacado que a distribuição do conjunto das crianças menores de um ano estudadas em cada ano mostrou, de modo geral, um padrão uniforme nas diferentes faixas de idade.

A situação do aleitamento materno exclusivo, aleitamento materno predominante e aleitamento materno, segundo a faixa etária da criança, nos diferentes anos, bem como as diferenças percentuais de prevalências entre 1999 e 1995, 2004 e 1999 e entre 2004 e 1995, e os respectivos valores de p para avaliação da significância estatística dessas diferenças, são apresentados na Tabela 1.

A Tabela 1 mostra, para as crianças menores de 1 mês, pequenas diferenças nas prevalências do aleitamento materno nos três anos estudados. A comparação de 1995 e de 1999 com 2004 evidencia discreta melhora, embora tenha havido uma queda nos índices de 1999 em relação a 1995. O aumento percentual de prevalência na década foi de 13,0%, e entre 2004 - 1999 foi de 33,3%, mas essas diferenças não alcançaram significância estatística.

O aleitamento materno predominante diminuiu progressivamente na década entre as crianças menores de 1 mês, sendo a diferença percentual de prevalência entre 2004 e 1995 igual a - 37,5% e entre 2004 e 1999, - 23,9%. Porém, essas diferenças também não foram estatisticamente significantes.

Pode-se observar, para as crianças menores de 4 meses, aumento progressivo das prevalências do aleitamento materno exclusivo nos anos subseqüentes à primeira avaliação (1995), sendo esse aumento mais expressivo entre 1999 e 2004, e diminuição progressiva do aleitamento predominante. Todas as diferenças de prevalências relacionadas ao AME em menores de 4 meses foram estatisticamente significantes. Com relação ao aleitamento materno (AM) nessa faixa etária, comparando-se 1995 e 2004, houve pequena elevação da prevalência, sem alcançar significância estatística. Mas, entre 1999 e 2004, a elevação foi estatisticamente significante (p=0,0315).

Entre as crianças menores de 6 meses, as prevalências do aleitamento materno exclusivo foram sempre crescentes, enquanto que do aleitamento predominante foram decrescentes, sendo essas diferenças estatisticamente significantes. A proporção de crianças em AME nessa faixa etária mais do que dobrou na década. O aumento na prevalência do AME para esse grupo de crianças foi mais expressivo no período de 1999 a 2004, como pode ser melhor observado na Figura 1.


A evolução do AM em menores de 6 meses, na década estudada, foi positiva, com elevações estatisticamente significantes nas comparações 2004 com 1999 e 2004, com 1995. Em 2004, cerca de 80% das crianças menores de seis meses eram amamentadas, quase 30% de modo exclusivo.

A prevalência do aleitamento materno em menores de 1 ano manteve-se praticamente a mesma na primeira metade do período, quando comparados os anos de 1995 e 1999, e apresentou pequeno aumento de 1999 a 2004. Na década, a diferença percentual de prevalência foi de 15,3%, p<0,001. A Figura 1 destaca a tendência na década da prevalência de AM em menores de 12 meses.

A duração mediana, com os respectivos intervalos de confiança, do AME e do AM é mostrada na Figura 2. Como essas informações não estão disponíveis para o estudo realizado em 1999, são apresentados, na referida Figura, apenas os dados de 1995 e 2004.


A duração mediana do AME em 1995 foi 17 dias, aumentando para 31 dias em 2004. Assim, a diferença de mediana na década para essa categoria de aleitamento foi 14 dias (aumento percentual de 82,0%). Para o aleitamento materno, a mediana aumentou de 167 dias em 1995 para 252 dias em 2004, com diferença de 85 dias (aumento percentual de 50,9%).

DISCUSSÃO

Analisando a tendência das diferentes categorias do aleitamento materno no município de Botucatu, SP, nos últimos 10 anos, pode-se observar que, de uma maneira geral, houve melhora nos indicadores, principalmente para o AME (mais significante), mas também para o AM. A revisão de publicações brasileiras revela que essa mesma tendência foi observada para o País inteiro e em vários municípios nas décadas de 80 e 9025.

A comparação dos três inquéritos mostrou diferenças pequenas, que não alcançaram significância estatística, nas prevalências de crianças menores de 1 mês em aleitamento materno, seja de modo exclusivo, predominante ou apenas crianças amamentadas (AM). As altas prevalências de AM nesse grupo etário, nos 3 estudos, indicam que praticamente todas as crianças do município iniciam a amamentação após o nascimento. As prevalências de AM nessa faixa etária em Botucatu, SP, nos 3 anos estudados, são um pouco maiores que a encontrada em 2000 (90,3%) por Montrone & Arantes26, mediante estudo realizado com a mesma metodologia, no município de São Carlos, SP, cidade com porte semelhante ao de Botucatu, SP.

Com relação ao AME em menores de um mês, a situação atual em Botucatu, SP, ainda é inferior à de alguns municípios do mesmo estado, como São Carlos, SP26 (52,4%) e Itapira, SP27 (64,8%). Em 2004, em Botucatu, SP, mais da metade das crianças nessa idade já recebia água, chás ou outros leites.

Para as crianças com idade até 4 meses, merece destaque o grande aumento na prevalência do AME, já que, em 2004, 36,9% dessas crianças recebiam exclusivamente leite materno, enquanto que em 1995 a prevalência era de apenas 19,1%. Na verdade, o aumento foi mais expressivo de 1999 para 2004. Estudo realizado em 84 municípios paulistas em 1998, já citado, mostrou que apenas 32,0% deles apresentavam prevalência de AME, em menores de 4 meses, superior a 20,0%15. Também foi importante a queda na prevalência do AMP, evidenciando uma melhora no nocivo padrão de introdução precoce de outros líquidos à alimentação infantil. A magnitude dessa mudança pode ser percebida quando se avalia a diferença percentual de prevalência do AME nessa faixa etária na década: 93,2%.

Uma possível explicação para a tendência positiva do AME seria a melhoria das práticas de cuidado de mães e recém-nascidos nas maternidades. Esta hipótese se apóia em evidências do estudo sobre situação do aleitamento em municípios paulistas: crianças cujas mães residiam em locais onde inexistia Hospital Amigo da Criança (HAC) tinham 2,2 vezes mais chances de receber precocemente outros líquidos e alimentos nos primeiros quatro meses de vida15. Em Botucatu, SP, até o momento, não existe HAC, mas há um movimento nesse sentido, iniciado no final da década de 90 no Hospital das Clínicas, hospital de referência para o parto de médio e alto risco na região e que, pela presença de seus docentes e alunos, também exerce considerável influência em outra maternidade desse município. É possível que esse seja um fator a explicar a evolução positiva do AME em menores de 4 e também em menores de 6 meses, ocorrida principalmente, entre 1999 e 2004. Em relação às crianças menores de 6 meses, merece destaque o aumento expressivo do AME: mais de 127,0%.

Diante dos dados da literatura6,28, pode-se supor que a tendência positiva do AME detectada possa exercer um efeito positivo sobre os coeficientes de morbimortalidade infantil no município.

Para o conjunto de crianças com até 1 ano, a prevalência da amamentação cresceu na segunda metade da década estudada, alcançando, em 2004, 61,7%. Esse índice é, até certo ponto, surpreendentemente melhor do que o encontrado em Pelotas, RS29 no ano de 1993, e em comunidades do Nordeste da Bahia30, no período de 1988 a 1989, onde apenas 23,1% e 12,5% das crianças nessa faixa etária recebiam leite materno, respectivamente. Entretanto, diferenças na época de realização desses estudos limitam tais comparações.

Uma maneira mais sintética de avaliar a tendência do aleitamento materno é comparar as medianas obtidas na década: houve aumento, passando de 167 dias (5,5 meses) em 1995 para 252 dias (8,4 meses) em 2004, este último valor semelhante ao encontrado em estudos realizados entre 1996 e 1997 em Florianópolis, SC31 (238 dias) e Montes Claros, MG32 (261 dias) e superior ao encontrado em Ouro Preto, MG no mesmo período (198 dias)33.

O último dado brasileiro sobre duração mediana do AM disponível é da Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde, desenvolvida em São Paulo, Rio de Janeiro e várias regiões do País e que apontou duração mediana do AM de 210 dias25. Entretanto, deve-se ponderar que aquela pesquisa foi realizada em 1996 e já apontava tendência de aumento na duração mediana do AM.

Para o aleitamento materno exclusivo, a duração mediana obtida em 2004 foi de 31 dias, 14 dias a mais que a verificada em 1995. Comparando com dados de 1996 e 1997, o valor obtido em 2004, neste estudo, foi superior aos encontrados nas cidades de Montes Claros, MG32 (27 dias) e Ouro Preto, MG33 (17 dias), mas inferior à mediana de Florianópolis, SC (53 dias)31. Porém, deve ser considerado que, entre 1996 e 2004, a situação nos municípios citados pode ter melhorado, já que essa é a tendência nacional.

Em síntese, detectou-se expressiva elevação do AME em menores de quatro e de seis meses no período de 1995 a 2004, particularmente entre 1999 e 2004, e elevação mais discreta do AM.

Embora não tenha sido objetivo deste estudo identificar as causas das mudanças ocorridas, podem ter contribuído com a melhoria observada: a criação do Banco de Leite Humano na maternidade terciária do município, em 1999, bem como a intenção desta em se qualificar, com vistas a receber o título de Hospital Amigo da Criança; a mudança na atenção básica do município, com a criação de unidades de Saúde da Família e o aumento no número dos profissionais de saúde envolvidos com a amamentação no município. Tais fatos apóiam evidências da literatura de que, no que diz respeito ao aleitamento materno, o potencial de influência dos serviços e dos profissionais de saúde é grande.

A situação da amamentação encontrada em Botucatu, SP, em 2004, indica padrões melhores do que aqueles verificados para esse município em meados da década de 90, bem como para outros municípios brasileiros nos anos de 1996 e 1997, embora aquém do preconizado pela OMS14: leite materno exclusivo até o sexto mês de vida e com alimentos complementares até dois ou mais anos. Assim, apesar da tendência favorável do aleitamento materno em Botucatu, SP, há ainda muito a melhorar, sendo necessário manter as ações de promoção, proteção e incentivo ao aleitamento materno no município.

Estudos de monitoramento das práticas de alimentação infantil devem continuar sendo realizados, pois constituem importante fonte de informação para o planejamento e a avaliação de políticas e programas dirigidos a apoiar e promover o aleitamento materno. Ações específicas para evitar tanto a precoce introdução de líquidos e outros leites nos primeiros meses de vida, quanto para aumentar a duração do aleitamento materno, além do primeiro ano, devem ser implementadas no município.

Recebido em: 31/3/2005

Versão final reapresentada em: 21/8/2006

Aprovado em: 21/12/2006

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    Correspondência para/
    Correspondence to: C.M.G.L. PARADA.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Jul 2007
    • Data do Fascículo
      Jun 2007

    Histórico

    • Recebido
      31 Mar 2005
    • Aceito
      21 Dez 2006
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