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Avaliação in vivo da qualidade protéica do champignon do Brasil (Agaricusbrasiliensis Wasser et al.)

In vivo protein quality evaluation of champignon do Brasil (Agaricus brasiliensis Wasser et al.)

Resumos

OBJETIVO: O trabalho aqui descrito trata da avaliação de uma dieta experimental contendo Champingnon do Brasil (Agaricus brasiliensis) como fonte de proteína em um modelo experimental de ratos. MÉTODOS: Para este propósito, foram selecionados 24 ratos Wistar machos, recém desmamados (21 dias) divididos em 3 grupos de 8 animais cada, que foram alimentados com uma dieta padrão de caseína, ou com uma dieta experimental de proteína de Agaricus brasiliensis ambas contendo 10% de proteína e isoenergéticas ou ainda, com uma dieta com muito baixo teor de proteína. O ensaio biológico foi realizado em 28 dias, ao longo dos quais se determinou a concentração de nitrogênio na urina e nas fezes, além dos cálculos do Quociente de Eficiência Alimentar (ganho de peso dividido pelo consumo de dieta), do Quociente de Eficiência Protéica (ganho de peso dividido pelo consumo de proteína), da Razão Protéica Líquida (ganho de peso corrigido dividido pelo consumo de proteína) e da Digestibilidade Verdadeira. RESULTADOS: Os resultados demonstraram que quando o Champignon do Brasil foi utilizado como fonte exclusiva de proteína na dieta, os índices de qualidade protéica apresentaram-se baixos (Quociente de Eficiência Alimentar=0,08, Quociente de Eficiência Protéica=0,92 e Razão Protéica Líquida=3,00), quando comparados com a dieta padrão caseína (Quociente de Eficiência Alimentar=0,30, Quociente de Eficiência Protéica=3,05 e Razão Protéica Líquida=4,21). Os índices obtidos para o grupo Agaricus mostraram-se comparáveis àqueles apresentados por alguns tipos de proteína vegetal e podem ser explicados por sua limitação em aminoácidos essenciais, notadamente a lisina e a leucina, respectivamente primeiro e segundo aminoácido limitante. CONCLUSÃO: Os dados apontam para a utilização da proteína do Agaricus brasiliensis como uma boa fonte para complementação protéica, quando combinada com outras culturas vegetais comuns na dieta típica brasileira.

Agaricus brasiliensis; Dietas experimentais; Avaliação nutricional protéica


OBJECTIVE: The present work describes the biological evaluation of an experimental diet containing Champingnon do Brasil (Agaricus brasiliensis) as the main protein source for a rat experimental model. METHODS: For this purpose, 24 21-day-old male Wistar rats were divided into 3 groups of 8 animals each and were fed with a standard casein diet or an experimental Agaricus diet both with 10% protein and isoenergetic or a very low protein diet. A biological assay was done for 28 days by determining the concentration of nitrogen in the urine and stools and calculating the Food Efficiency Ratio (weight gain divided by food intake), Protein Efficiency Ratio (weight gain divided by protein intake), Net Protein Ratio (corrected weight gain divided by protein intake) and True Digestibility. RESULTS: The results showed that when Champignon do Brasil was used as the only source of protein in the diet, the Protein Quality indices were low (Food Efficiency Ratio=0.08, Protein Efficiency Ratio=0.92 and Net Protein Ratio=3.00) when compared with the standard casein diet (Food Efficiency Ratio=0.30, Protein Efficiency Ratio=3.05 and Net Protein Ratio=4.21). The indices obtained for Agaricus were comparable to some plant protein sources and can be explained by the first and second limiting amino acids, lysine and leucine, respectively. CONCLUSION: The data show that Agaricus brasiliensis is a good source of protein when combined with other vegetables that are common in the typical Brazilian diet.

Agaricus brasiliensis; Experimental Diets; Nutrition assessment


ORIGINAL ORIGINAL

Avaliação in vivo da qualidade protéica do champignon do Brasil (Agaricusbrasiliensis Wasser et al.)

In vivo protein quality evaluation of champignon do Brasil (Agaricus brasiliensis Wasser et al.)

Gilberto Simeone HenriquesI; Maria Lúcia Ferreira SimeoneII; Maria Angela Lopes de Almeida AmazonasIII

IUniversidade Federal de Minas Gerais, Escola de Enfermagem, Curso de Nutrição, Departamento de Enfermagem Aplicada. R. Alfredo Balena, 190, Santa Efigênia, 30130-100, Belo Horizonte, MG, Brasil

IIEmpresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Florestas, Coordenação de Gestão de Laboratórios. Colombo, PR, Brasil

IIIEmpresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Florestas, Laboratório de Microbiologia, Biologia Funcional e Molecular. Colombo, PR, Brasil

RESUMO

OBJETIVO: O trabalho aqui descrito trata da avaliação de uma dieta experimental contendo Champingnon do Brasil (Agaricus brasiliensis) como fonte de proteína em um modelo experimental de ratos.

MÉTODOS: Para este propósito, foram selecionados 24 ratos Wistar machos, recém desmamados (21 dias) divididos em 3 grupos de 8 animais cada, que foram alimentados com uma dieta padrão de caseína, ou com uma dieta experimental de proteína de Agaricus brasiliensis ambas contendo 10% de proteína e isoenergéticas ou ainda, com uma dieta com muito baixo teor de proteína. O ensaio biológico foi realizado em 28 dias, ao longo dos quais se determinou a concentração de nitrogênio na urina e nas fezes, além dos cálculos do Quociente de Eficiência Alimentar (ganho de peso dividido pelo consumo de dieta), do Quociente de Eficiência Protéica (ganho de peso dividido pelo consumo de proteína), da Razão Protéica Líquida (ganho de peso corrigido dividido pelo consumo de proteína) e da Digestibilidade Verdadeira.

RESULTADOS: Os resultados demonstraram que quando o Champignon do Brasil foi utilizado como fonte exclusiva de proteína na dieta, os índices de qualidade protéica apresentaram-se baixos (Quociente de Eficiência Alimentar=0,08, Quociente de Eficiência Protéica=0,92 e Razão Protéica Líquida=3,00), quando comparados com a dieta padrão caseína (Quociente de Eficiência Alimentar=0,30, Quociente de Eficiência Protéica=3,05 e Razão Protéica Líquida=4,21). Os índices obtidos para o grupo Agaricus mostraram-se comparáveis àqueles apresentados por alguns tipos de proteína vegetal e podem ser explicados por sua limitação em aminoácidos essenciais, notadamente a lisina e a leucina, respectivamente primeiro e segundo aminoácido limitante.

CONCLUSÃO: Os dados apontam para a utilização da proteína do Agaricus brasiliensis como uma boa fonte para complementação protéica, quando combinada com outras culturas vegetais comuns na dieta típica brasileira.

Termos de indexação:Agaricus brasiliensis. Dietas experimentais. Avaliação nutricional protéica.

ABSTRACT

OBJECTIVE: The present work describes the biological evaluation of an experimental diet containing Champingnon do Brasil (Agaricus brasiliensis) as the main protein source for a rat experimental model.

METHODS: For this purpose, 24 21-day-old male Wistar rats were divided into 3 groups of 8 animals each and were fed with a standard casein diet or an experimental Agaricus diet both with 10% protein and isoenergetic or a very low protein diet. A biological assay was done for 28 days by determining the concentration of nitrogen in the urine and stools and calculating the Food Efficiency Ratio (weight gain divided by food intake), Protein Efficiency Ratio (weight gain divided by protein intake), Net Protein Ratio (corrected weight gain divided by protein intake) and True Digestibility.

RESULTS: The results showed that when Champignon do Brasil was used as the only source of protein in the diet, the Protein Quality indices were low (Food Efficiency Ratio=0.08, Protein Efficiency Ratio=0.92 and Net Protein Ratio=3.00) when compared with the standard casein diet (Food Efficiency Ratio=0.30, Protein Efficiency Ratio=3.05 and Net Protein Ratio=4.21). The indices obtained for Agaricus were comparable to some plant protein sources and can be explained by the first and second limiting amino acids, lysine and leucine, respectively.

CONCLUSION: The data show that Agaricus brasiliensis is a good source of protein when combined with other vegetables that are common in the typical Brazilian diet.

Indexing terms:Agaricus brasiliensis. Experimental Diets. Nutrition assessment.

INTRODUÇÃO

O interesse humano pelo cultivo e exploração de cogumelos comestíveis é milenar, assim como a valorização de suas propriedades nutricionais e medicinais1,2.

Entre os cogumelos nativos do Brasil comercialmente cultivados, o Agaricus brasiliensis, até recentemente tido como Agaricus blazei Murrill3, tem chamado a atenção do mundo, em especial pelas suas propriedades imunomoduladoras, antitumorais e metabólicas4-6. O cogumelo apresenta também um grande potencial na culinária como um alimento de excelente sabor e textura7-10. De uma maneira geral, porém, os estudos bromatológicos de espécies de cogumelos comestíveis realizados até o momento prestam grande ênfase à composição centesimal, sem, no entanto, aprofundar-se na análise da qualidade nutricional protéica, dos polissacarídeos não digeríveis que compõem a fração fibra, e da biodisponibilidade de micronutrientes11.

Atualmente, nos países em desenvolvimento, a atenção está voltada à possibilidade de utilizar cogumelos como uma opção de fonte protéica da dieta, baseando-se no fato de que algumas de suas variedades possuem uma concentração relativamente alta de proteína em sua composição. Além disso, acredita-se que a qualidade da proteína dos cogumelos é elevada e poderia ser similar à de fontes de alto valor nutritivo consagradas, como a carne3-14.

Em se tratando da qualidade nutricional, muitos estudos prestam ênfase à composição de aminoácidos do cogumelo, porém, é escasso o número de trabalhos que avaliam a qualidade dessa proteína, sua capacidade de gerar crescimento, de atuar como fator nutricional positivo e em que magnitude, quando comparado a proteínas padrão. Tais estudos estão no domínio da nutrição experimental, que se utiliza de modelos animais para mimetizar o comportamento dos nutrientes no trato gastrintestinal.

A avaliação da qualidade protéica permite classificar as proteínas de acordo com o seu potencial nutritivo, detectar mudanças no valor nutritivo devido ao processamento e/ou estocagem, contribuindo para avaliar as necessidades de nitrogênio e aminoácidos para o crescimento e a manutenção da vida. O método mais utilizado para avaliar a digestibilidade protéica é o escore de aminoácidos corrigidos (PDCAAS), que consiste no produto do escore químico do aminoácido limitante multiplicado pela digestibilidade verdadeira da proteína. Recentemente, tem-se considerado este método como sendo o mais usual para a avaliação da qualidade protéica, por ser um procedimento que combina métodos químicos e biológicos14.

Até o momento, nenhum estudo foi conduzido sobre o valor nutritivo, especialmente, sobre a qualidade da proteína do cogumelo Agaricus brasiliensis e, portanto, neste trabalho pretende-se avaliar a qualidade da proteína.

A ênfase em análise da qualidade nutricional protéica de fontes como os cogumelos nativos reveste-se de grande importância para que informações precisas a respeito de seu valor nutricional sejam conhecidas e possam servir de subsídio para a decisão sobre sua introdução no hábito alimentar brasileiro, no contexto do consumo de dietas mistas, possibilitando um melhor aproveitamento do que atualmente ainda pode ser considerado como alimento alternativo ou até mesmo exótico e atribuindo valor menos subjetivo e mais definitivo às propriedades que caracterizam macrofungos da variedade Agaricus brasiliensis como alimento.

MÉTODOS

Ensaio com ratos

Foram selecionados 24 ratos machos da linhagem Wistar, recém desmamados (21 dias), divididos em 3 grupos experimentais: 1) Grupo Dieta Caseína (CAS); 2) Grupo Dieta Cogumelo (COG) e 3) Grupo Dieta Aprotéica (APT), sendo acomodados em gaiolas metabólicas individuais, aos quais administraram-se dietas semi-purificadas semelhantes à AIN-93 e água ad libitum. A composição das dietas teve como referência a proposta por Reeves et al.15, modificada para atingir a concentração de 9% a 10% de proteínas. Os animais foram sacrificados sob anestesia (sódio-pentobarbital 50mg/kg de peso), após 28 dias de ensaio biológico.

Preparação das dietas experimentais

A composição centesimal das rações experimentais encontra-se descrita na Tabela 1. As dietas foram preparadas de forma que mantivessem características isoprotéicas e isoenergéticas. Adotou-se como padrão de qualidade da preparação das dietas, as recomendações da Association of Official Analitical Chemists (AOAC) para a avaliação da qualidade protéica. A dieta com padrão caseína (CAS) foi preparada conforme as quantidades recomendadas pelo AIN-9315, modificando-se o teor de proteínas para 9% a 10% (Tabela 1). A dieta à base de proteína de cogumelo (COG) foi preparada a partir da matriz desidratada do corpo de frutificação de Agaricus brasiliensis moído e incorporado à formulação base do AIN-93 para os demais nutrientes que não a fonte protéica. Preparou-se, ainda, uma dieta com muito baixo teor de proteína (considerada aprotéica - APT) com a finalidade de utilizá-la na determinação da razão protéica líquida (RPL).

Métodos para composição das dietas

As análises químicas de teor de umidade, proteína bruta, extrato etéreo e de cinza foram realizadas de acordo com a metodologia indicada pela AOAC16. Para a determinação do teor da matéria seca foi utilizado o método gravimétrico, no qual as amostras foram secas em estufa a 105ºC até a obtenção de peso constante. O teor de nitrogênio total foi determinado pelo método microkjeldahl, sendo o teor protéico determinado multiplicando-se o conteúdo de nitrogênio total pelo fator 3,99. Os lipídeos foram determinados por extração contínua com éter etílico em aparelho de Sohxlet, à temperatura de 45-50ºC por aproximadamente 8 horas, após as quais o solvente foi recuperado e os recipientes contendo o extrato etéreo foram resfriados em dessecador e pesados, obtendo-se o valor de lipídeos por diferença gravimétrica. O percentual de cinzas foi determinado por carbonização e incineração das amostras em mufla à temperatura de 550ºC por aproximadamente 4 horas. A concentração de fibra alimentar foi determinada por meio do método enzimático-gravimétrico17, que consiste na digestão enzimática da amostra desengordurada, com α-amilase termoestável, amiglicosidase e protease para a remoção de contaminantes do amido e de proteína. A precipitação da fração solúvel foi realizada com etanol a 98% (v/v), seguida de filtração. Precipitado e resíduo foram então lavados com concentrações crescentes de etanol (78% e 98%) e acetona após os quais foram secos e pesados. Os carboidratos foram obtidos por diferença entre a fração total e os percentuais de proteína, umidade, cinzas e fibra.

Métodos de avaliação da qualidade protéica

Utilizou-se como parâmetro de avaliação da qualidade protéica do cogumelo Agaricus brasiliensis o Quociente de Eficiência Protéica (QEP), que se constitui do quociente entre o ganho de peso dos animais e a quantidade de proteína ingerida calculado em 28 dias a partir da fórmula: [ganho de peso do grupo teste (g)/proteína consumida pelo grupo teste (g)], segundo o método de Osborne, Mendel e Ferry (AOAC)16. A Razão Protéica Líquida (RPL), uma modificação do QEP, foi calculada segundo o método proposto por Bender & Doell18, somando ao cálculo do ganho de peso do grupo teste a perda de peso do grupo aprotéico segundo a fórmula: [ganho de peso do grupo teste (g) + perda de peso do grupo aprotéico (g)/proteína consumida pelo grupo teste]. Determinou-se a razão entre o ganho de peso dos animais (g) e o consumo total das dietas (g) ao final do experimento, avaliando-se a eficiência alimentar. A digestibilidade verdadeira foi observada a partir de um ensaio no qual as dietas foram marcadas com indigocarmin na concentração de 200mg/100g e oferecidas aos animais no 3º e no 9º dia de experimentação. Coletaram-se então as fezes do 4º ao 10º dias em recipientes individuais, em seguida secando-as em estufa ventilada a 105ºC por 24 horas, sendo então pesadas e trituradas para a determinação da concentração de nitrogênio. A partir desse resultado, calculou-se a digestibilidade verdadeira (DV), determinando as quantidades de nitrogênio ingeridas por meio da dieta, excretada nas fezes e a perda metabólica fecal, estimada pela quantidade de nitrogênio excretado pelos animais do grupo alimentado com a dieta com muito baixo teor de proteína (APT). Utilizou-se a seguinte equação para o cálculo da DV:

% de Digestibilidade= I - (F - FO) / I x 100

Em que: I= Nitrogênio ingerido pelo grupo teste (COG); F= Nitrogênio fecal do grupo teste (COG); FO= Nitrogênio fecal do grupo com dieta com muito baixo teor de proteína (APT).

Análise dos aminoácidos no hidrolisado ácido

Após a extração do corpo de frutificação por refluxo contínuo utilizando etanol a 80%, seguida de evaporação do solvente a 40ºC, as amostras foram hidrolisadas com ácido clorídrico (HCl) bidestilado 6N, procedendo-se à derivação pré-coluna dos aminoácidos livres com fenilisotiocianato (PITC), após a qual realizou-se a separação dos derivados feniltiocarbamil-aminoácidos (PTC-aa) em coluna de fase reversa C18 (Pico-Tag 3,9 x 150mm) com monitoramento em comprimento de onda de 254nm. A quantificação das amostras foi feita pela medida da área dos picos conforme o aparecimento de cada aminoácido, comparando-os à área obtida para o pico de um padrão de aminoácidos de concentração conhecida (controle) derivado nas mesmas condições experimentais e no mesmo tempo em que as amostras teste. Calculou-se então o escore químico corrigido pela digestibilidade, por meio da equação: PDCAAS = escore mais baixo do aminoácido essencial x digestibilidade verdadeira da proteína. Escores de PDCAAS maiores que a unidade permitem considerar a proteína como de boa qualidade19.

Análise estatística

A análise estatística dos dados foi realizada com o auxílio do software Statistica 5.0®. A variância total dos dados de cada tratamento foi decomposta a partir de uma Análise de Variância de uma via (ANOVA one-way). A discriminação das médias foi efetivada pelo teste t não pareado com nível de significância de 95% (p<0,05).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados analíticos (g/100g) das dietas utilizadas nos ensaios com ratos são mostrados na Tabela 2.

Neste trabalho, acompanhou-se a evolução ponderal (g) dos grupos avaliados, calculando-se o ganho de peso (g), aferindo-se o consumo alimentar (g) dos animais (Tabela 3), a eficiência alimentar, os índices de qualidade protéica, Quociente de Eficiência Protéica (QEP) e Razão Protéica Líquida (RPL) e os valores da Digestibilidade Verdadeira (DV) (Tabela 4), obtidos a partir da administração das dietas experimentais cuja composição centesimal encontra-se descrita na Tabela 1.

Em se tratando do peso inicial, os grupos não apresentaram diferença significante (p>0,05), guardando uma diferença não superior a 5 gramas entre si. Aos 14 dias de experimentação os grupos Caseína e Dieta Cogumelo já apresentavam diferença significante entre si (p<0,05), mantendo-se até o final do experimento (28 dias), o que se refletiu sobre o resultado calculado para o QEP. Este apresentou-se baixo, em uma escala de avaliação de 0 a 4 atingiu 0,92, ou seja, apenas 23% do desenvolvimento esperado, comparando-se ao desempenho de proteínas de origem vegetal quando utilizadas como fonte única de proteína na composição de rações experimentais. Segundo a interpretação deste índice, para cada 1 grama de proteína do cogumelo Agaricus brasiliensis ingerida, é possível obter um crescimento ponderal de 0,92 g. Este valor é significantemente inferior ao obtido para a dieta padrão (CAS), cuja ingestão de 1 grama de proteína significou um incremento ponderal de 3,05 gramas (p<0,05). Quando avaliada a RPL, esta diferença entre os tratamentos aplicados diminui, podendo-se considerar a proteína do Agaricus brasiliensis como mais eficiente para a manutenção do turnover protéico do que para promover crescimento, pois o grupo COG atingiu 71% daquele obtido para o grupo CAS.

Estes resultados, à primeira vista discordantes, devem ser tomados com cautela em sua interpretação. O QEP (Quociente de Eficiência Protéica) não faz referência à manutenção e assume que toda proteína é utilizada para crescimento. Ele, portanto, tomado isoladamente, induz à interpretação do fato de avaliar se a proteína teste (COG) é ou não satisfatória para promover crescimento. Já a RPL (Razão Protéica Líquida), leva em consideração a proteína necessária à manutenção metabólica dos animais, acrescentando ao experimento um grupo com dieta com muito baixo teor de proteína (APT), pressupondo que a quantidade de proteína necessária para prevenir a perda de peso desse grupo seja equivalente à proteína necessária à manutenção metabólica21.

A digestibilidade, um fator determinante da qualidade protéica, é significantemente menor no grupo COG, quando comparado aos animais controle (CAS) (p<0,05). O valor encontrado para a variedade Agaricus brasiliensis pode ser considerado baixo, até mesmo quando comparado a outras proteínas de origem vegetal, porém é um preditivo das interferências que podem ocorrer durante o processo de digestão e absorção de alimentos com teores significativos de fibra alimentar e de matriz constituída de arranjos complexos, nos quais há a probabilidade de interações de nutrientes entre si e com fatores antinutricionais.

Há que considerar que o consumo total de ração foi significantemente menor no grupo COG quando comparado ao grupo CAS, provavelmente em razão de diferenças na composição das dietas experimentais, sobremaneira na fração fibra alimentar. Porém a relação proteínas/calorias ingeridas foi mantida constante, não comprometendo as análises efetuadas.

O aproveitamento biológico da proteína descrito neste trabalho é semelhante àqueles encontrados nas avaliações de proteínas de origem vegetal em fontes cujo perfil de aminoácidos foi melhorado. Braga et al.22, estudando variedades de milho em diferentes estágios de maturação encontraram RPL média de 2,8. Henriques & Costa (dados não publicados, 1995), trabalhando com a variedade de milho QPM BR-273 desenvolvida pela Embrapa, encontraram um QEP de 1,58 e uma RPL de 3,13 quando oferecido em uma dieta como única fonte protéica. Valores semelhantes foram relatados por Glória et al.23, quando esta variedade vegetal foi acrescida na formulação de uma multimistura. Os dados deste estudo são compatíveis com as baixas concentrações de aminoácidos essenciais apresentada por essa variedade de cogumelo9, que podem explicar o baixo desempenho da fonte protéica quando analisada exclusivamente sob o parâmetro de crescimento dos animais.

As baixas qualidade protéica e digestibilidade verdadeira relatadas são semelhantes àquelas encontradas por Dabbour et al.13 para outros quatro tipos de cogumelos nativos cultivados no oriente13,24.

Quando calculado o escore químico corrigido pela digestibilidade da proteína (PDCAAS - Tabela 5), encontrou-se, segundo o escore químico do primeiro aminoácido limitante, o valor de 36%. Notadamente a limitação da proteína do cogumelo é significativa em se tratando dos aminoácidos essenciais lisina (1º limitante) e leucina (2º limitante) atingindo escores pouco superiores a 50%, quando comparados ao padrão FAO/WHO. Pires et al.25 encontraram valores de escore químico de 0,45 para o aminoácido lisina, estudando cultivares de trigo e milho, sendo este também o primeiro limitante. A concentração média desse aminoácido nesses cultivares foi de 25,96mg/g de proteína, valor próximo àquele encontrado em A. brasiliensis. O perfil dos demais aminoácidos encontrados nesta variedade de cogumelo se aproxima daquele encontrado em outros tipos de proteínas vegetais tais como as leguminosas26. Tais limitações são compatíveis com o desempenho dos índices de qualidade protéica apresentados pela proteína do cogumelo Agaricus brasiliensis, quando ingerido por animais como única fonte protéica da dieta, como demonstrado neste estudo.

CONCLUSÃO

A partir dos dados obtidos pode-se concluir que a espécie de cogumelos Agaricus brasiliensis pode não ser, quando fornecida na dieta como única fonte protéica, adequada para garantir níveis de crescimento satisfatório, porém, não se pode subestimar sua adequação ao garantir a manutenção do metabolismo protéico no organismo dos animais indicado pelo valor de RPL. Por se tratar de um fungo comestível e apresentar propriedades intermediárias entre as espécies vegetais e animais em muitas de suas características, pressupunha-se que a sua qualidade protéica poderia apresentar um perfil semelhante. Porém, mediante os dados encontrados que apontam limitação em aminoácidos essenciais, sobretudo lisina e leucina, deve-se considerar sua adição em uma dieta mista, que contenha outras fontes protéicas passíveis de complementação, tornando o perfil protéico mais adequado à manutenção e ao crescimento dos animais, no entanto, não desconsiderando sua utilização como alimento.

AGRADECIMENTOS

À Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA Florestas), pelo suporte técnico-científico; Ao Grupo Agaricus Pilar (GAPI), pela cessão das amostras de Agaricus brasiliensis; À Fundação Araucária, pelo suporte financeiro a este trabalho.

COLABORADORES

G.S. HENRIQUES, Desenvolvimento de rações e realização dos ensaios biológicos para a determinação da qualidade protéica de A. brasiliensis. M.L.F. SIMEONE, Análises bromatológicas e da composição de aminoácidos de A. brasiliensis. M.A.L.A. AMAZONAS, Cultivo e seleção qualitativa de A. brasiliensis. Líder do Projeto Bioprospecção da Macromicota dos Biomas Floresta com Araucária e Mata Atlântica - Macroprograma 1 - Embrapa.

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Recebido em: 10/4/2006

Versão final reapresentada em: 24/3/2008

Aprovado em: 28/5/2008

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Jan 2009
  • Data do Fascículo
    Out 2008

Histórico

  • Aceito
    28 Maio 2008
  • Recebido
    10 Abr 2006
  • Revisado
    24 Mar 2008
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