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Influência da desnutrição promovida pela dieta básica regional sobre o perfil de ácidos graxos do leite materno, o crescimento e o desenvolvimento de ratos jovens

Malnutrition promoted by a basic regional diet alters the fatty acid profile of breast milk, and the growth and development of rat pups

Resumos

OBJETIVO: Avaliar os efeitos do consumo da Dieta Básica Regional e da reabilitação nutricional, durante os períodos críticos de crescimento e desenvolvimento de ratos, sobre a evolução da sua massa corporal e tecidual, bem como o consumo alimentar de mães durante a gestação e lactação e de seus filhotes, machos e fêmeas, até 70 dias de vida. Adicionalmente, verificou-se o percentual dos ácidos graxos nas dietas experimentais e no leite materno. MÉTODOS: Foram utilizados ratos Wistar, de ambos os sexos. Após a constatação da prenhez, as ratas foram divididas em três grupos. 1) Grupo controle, animais alimentados com ração comercial durante o período de gestação e lactação (mães e filhotes) e, após o desmame, os filhotes até 70 dias de vida; 2) Grupo desnutrido, animais alimentados com ração Dieta Básica Regional durante o mesmo período descrito para o grupo controle e 3) Grupo recuperado, animais alimentados com ração Dieta Básica Regional durante o período de gestação e lactação e os filhotes, após o desmame, alimentados com ração comercial até 70 dias de vida. Os animais foram monitorados diariamente, aferindo-se a massa corporal e o consumo alimentar. Os filhotes com 70 dias de vida foram sacrificados por decapitação e o cérebro, o coração, o fígado e os rins foram retirados e pesados. Os animais receberam água e ração ad libitum e foram mantidos em biotério com temperatura e luminosidade controladas. Os testes estatísticos utilizados foram o teste t de Student, a Análise de Variância e o pós-teste de Bonferroni. RESULTADOS: Foram encontradas alterações importantes no percentual de ácidos graxos essenciais na Dieta Básica Regional, assim como no leite materno das mães desnutridas. O ganho de peso das mães desnutridas e de seus respectivos filhotes, tanto machos quanto fêmeas, foi menor que o de animais controle desde a lactação até o final do experimento. As fêmeas recuperadas apresentaram valores de massa corporal estatisticamente semelhantes aos do grupo controle, o que não foi observado nos filhotes machos do grupo recuperado. CONCLUSÃO: O comprometimento da massa corporal materna durante a lactação e o déficit na taxa de crescimento dos filhotes, machos e fêmeas, se deveram à ingestão da Dieta Básica Regional multideficiente. A diminuição dos teores de ácidos graxos específicos do leite materno poderia, ainda que não completamente, justificar o déficit de crescimento observado.

Ácidos graxos; Alimentação básica; Crescimento; Desnutrição; Estudos experimentais; Leite materno


OBJECTIVE: The aim of this study was to assess the effects of a basic regional diet and nutritional rehabilitation during the critical growth and development periods of rat pups and their effects on body weight and tissue mass gain; to assess food intakes of dams during gestation and lactation and of male and female pups until they were 70 days old; and to assess the percentages of fatty acids in experimental diets and breast milk. METHODS: Male and female Wistar rats were used. After mating, pregnant rats were divided into three groups: 1) Control group, consisting of dams from the beginning of pregnancy (21 days) and pups from birth until they were 70 days old (totaling 91 days) fed commercial lab chow; 2) Malnourished group, consisting of dams and pups fed the regional basic diet chow for the same 91 days; and 3) rehabilitated group, consisting of dams fed the regional basic diet during pregnancy and lactation and pups fed commercial lab chow after weaning (at 21 days) until they were 70 days old. The animals received food and water ad libitum and were maintained in a room with controlled temperature and lighting conditions. The animals were monitored daily to record body weight and food intake. At 70 days, the offspring were killed by decapitation and the brain, heart, kidneys and liver were removed and weighed. The results were analyzed using the Student's t-test, analysis of variance and Bonferroni post hoc test. RESULTS: Important changes were observed in the percentages of essential fatty acids in the regional basic diet as well as in the milk of malnourished dams. Weight gains of malnourished dams and male and female offspring were lower than those of the controls´ from the lactation period until the end of experiment. No differences in body weight were found between the females of the rehabilitated and control groups, but the weight of the male offspring of both groups differed. CONCLUSION: The impaired body weight gain of the dams during lactation and the deficient growth rate of the male and female pups were due to the basic regional diet which lacked many nutrients. The decreased amounts of specific fatty acids in breast milk could partially justify the observed growth deficit.

Fatty acid; Staple food; Growth; Malnutrition; Experimental studies; Breast milk


ORIGINAL ORIGINAL

Influência da desnutrição promovida pela dieta básica regional sobre o perfil de ácidos graxos do leite materno, o crescimento e o desenvolvimento de ratos jovens1 1 Artigo elaborado a partir de dissertação de A.S. SOUZA, intitulada "Conseqüências da desnutrição na distribuição relativa de ácidos graxos de cadeia longa do sistema nervoso central e no comportamento cognitivo de ratos". Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2006.

Malnutrition promoted by a basic regional diet alters the fatty acid profile of breast milk, and the growth and development of rat pups

Amanda Santos de SouzaI; Luciana da Camara PachecoII; Priscila da Silva CastroII; Maria das Graças Tavares Do CarmoI

IUniversidade Federal do Rio de Janeiro, Centro de Ciências da Saúde, Instituto de Nutrição Josué de Castro, Laboratório de Bioquímica Nutricional. Bloco J, Sala J2-021, Cidade Universitária, 21941-902, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Correspondência para/Correspondence to: M.G. TAVARES DO CARMO. E-mail: <tcarmo@editema.com.br>

IIUniversidade Federal do Rio de Janeiro, Centro de Ciências da Saúde, Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, Laboratório de Neurobiologia da Retina. Rio de Janeiro, RJ, Brasil

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar os efeitos do consumo da Dieta Básica Regional e da reabilitação nutricional, durante os períodos críticos de crescimento e desenvolvimento de ratos, sobre a evolução da sua massa corporal e tecidual, bem como o consumo alimentar de mães durante a gestação e lactação e de seus filhotes, machos e fêmeas, até 70 dias de vida. Adicionalmente, verificou-se o percentual dos ácidos graxos nas dietas experimentais e no leite materno.

MÉTODOS: Foram utilizados ratos Wistar, de ambos os sexos. Após a constatação da prenhez, as ratas foram divididas em três grupos. 1) Grupo controle, animais alimentados com ração comercial durante o período de gestação e lactação (mães e filhotes) e, após o desmame, os filhotes até 70 dias de vida; 2) Grupo desnutrido, animais alimentados com ração Dieta Básica Regional durante o mesmo período descrito para o grupo controle e 3) Grupo recuperado, animais alimentados com ração Dieta Básica Regional durante o período de gestação e lactação e os filhotes, após o desmame, alimentados com ração comercial até 70 dias de vida. Os animais foram monitorados diariamente, aferindo-se a massa corporal e o consumo alimentar. Os filhotes com 70 dias de vida foram sacrificados por decapitação e o cérebro, o coração, o fígado e os rins foram retirados e pesados. Os animais receberam água e ração ad libitum e foram mantidos em biotério com temperatura e luminosidade controladas. Os testes estatísticos utilizados foram o teste t de Student, a Análise de Variância e o pós-teste de Bonferroni.

RESULTADOS: Foram encontradas alterações importantes no percentual de ácidos graxos essenciais na Dieta Básica Regional, assim como no leite materno das mães desnutridas. O ganho de peso das mães desnutridas e de seus respectivos filhotes, tanto machos quanto fêmeas, foi menor que o de animais controle desde a lactação até o final do experimento. As fêmeas recuperadas apresentaram valores de massa corporal estatisticamente semelhantes aos do grupo controle, o que não foi observado nos filhotes machos do grupo recuperado.

CONCLUSÃO: O comprometimento da massa corporal materna durante a lactação e o déficit na taxa de crescimento dos filhotes, machos e fêmeas, se deveram à ingestão da Dieta Básica Regional multideficiente. A diminuição dos teores de ácidos graxos específicos do leite materno poderia, ainda que não completamente, justificar o déficit de crescimento observado.

Termos de indexação: Ácidos graxos. Alimentação básica. Crescimento. Desnutrição. Estudos experimentais. Leite materno.

ABSTRACT

OBJECTIVE: The aim of this study was to assess the effects of a basic regional diet and nutritional rehabilitation during the critical growth and development periods of rat pups and their effects on body weight and tissue mass gain; to assess food intakes of dams during gestation and lactation and of male and female pups until they were 70 days old; and to assess the percentages of fatty acids in experimental diets and breast milk.

METHODS: Male and female Wistar rats were used. After mating, pregnant rats were divided into three groups: 1) Control group, consisting of dams from the beginning of pregnancy (21 days) and pups from birth until they were 70 days old (totaling 91 days) fed commercial lab chow; 2) Malnourished group, consisting of dams and pups fed the regional basic diet chow for the same 91 days; and 3) rehabilitated group, consisting of dams fed the regional basic diet during pregnancy and lactation and pups fed commercial lab chow after weaning (at 21 days) until they were 70 days old. The animals received food and water ad libitum and were maintained in a room with controlled temperature and lighting conditions. The animals were monitored daily to record body weight and food intake. At 70 days, the offspring were killed by decapitation and the brain, heart, kidneys and liver were removed and weighed. The results were analyzed using the Student's t-test, analysis of variance and Bonferroni post hoc test.

RESULTS: Important changes were observed in the percentages of essential fatty acids in the regional basic diet as well as in the milk of malnourished dams. Weight gains of malnourished dams and male and female offspring were lower than those of the controls´ from the lactation period until the end of experiment. No differences in body weight were found between the females of the rehabilitated and control groups, but the weight of the male offspring of both groups differed.

CONCLUSION: The impaired body weight gain of the dams during lactation and the deficient growth rate of the male and female pups were due to the basic regional diet which lacked many nutrients. The decreased amounts of specific fatty acids in breast milk could partially justify the observed growth deficit.

Indexing terms: Fatty acid. Staple food. Growth. Malnutrition. Experimental studies. Breast milk.

INTRODUÇÃO

A desnutrição materna é um fator que contribui significativamente para os elevados índices de mortalidade perinatal e infantil. De acordo com a Organização Mundial da Saúde e a Organização Pan-Americana de Saúde, aproximadamente 174 milhões de crianças abaixo de cinco anos são desnutridas e em muitos países, como na África e no Sul da Ásia, existe alta prevalência de desnutrição em mulheres em idade reprodutiva. No Brasil, estima-se que o número de desnutridos seja maior em áreas rurais, principalmente na Região Nordeste1. As conseqüências clínicas da desnutrição dependem de vários fatores, incluindo o grau de severidade e a duração das deficiências nutricionais2.

A ingestão materna de dietas nutricionalmente deficientes durante a gravidez e/ou lactação ocasiona efeitos deletérios na prole3, principalmente durante o desenvolvimento do Sistema Nervoso Central2. Estudos mostraram que alimentar ratas durante a gravidez e a lactação com dietas deficientes em proteína diminui o tamanho da ninhada e a massa corporal de filhotes4,5. Hipoplasia e atrofia de tecidos podem ocorrer na deficiência protéico-energética e, dessa forma há diminuição do tamanho corporal e de órgãos6,7. Muitos dos efeitos da má nutrição pré-natal e pós-natal são permanentes, ainda que algum grau de melhoramento possa ser produzido por exposição a diferentes estímulos, inclusive ambiental e nutricional2.

A Dieta Básica Regional (DBR) constitui a base da alimentação diária da população desfavorecida da Zona da Mata de Pernambuco. A DBR corresponde a uma dieta multideficiente, pois contém cerca de 8% de proteínas dos quais a maior proporção é de origem vegetal e 1% de lipídios. Os ingredientes da dieta (g/g%) são farinha de mandioca (64,81), feijão mulatinho (18,34), batata-doce (12,76) e carne seca (3,74) que foram cozidos, desidratados à 60ºC e moídos. A DBR tem sido considerada um modelo adequado para estudar os efeitos da desnutrição materna e na prole8.

O crescimento e o desenvolvimento dos neonatos estão diretamente relacionados à qualidade e à quantidade do leite materno por eles consumido9. Entre os macronutrientes presentes no leite materno de várias espécies, os lipídios exercem funções de grande relevância, fornecendo 50,0% a 60,0% do total de energia contida nesta fonte alimentar essencial para o neonato. Triglicerídeos constituem 98% dos lipídios presentes, enquanto fosfolipídios 1,0% e colesterol e seus ésteres 0,5%9,10.

Os Ácidos Graxos (AG) que compõem os triglicerídeos do leite materno podem ter distintas origens, tais como: dietética, síntese hepática, circulação (ácidos graxos livres liberados do tecido adiposo após lipólise) ou nova síntese pela glândula mamária. Aproximadamente 30% dos AG do leite derivam diretamente da ingestão dietética11,12. Os AG sintetizados na glândula mamária são principalmente de cadeia média (C10:0, C12:0 e C14:0)11 e compreendem cerca de 10,0% a 12,0% do conteúdo total de AG do leite11,12. Esse tipo de AG representa uma fonte energética de fácil absorção para o lactente13. Dietas hipolipídicas e ricas em carboidratos aumentam a síntese destes AG na glândula mamária11. Alguns dos ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa (AGPI-CL), tais como o araquidônico (AA, C20:4 n-6) e o derivado do ácido graxo essencial α-linolênico, o ácido graxo docosahexaenóico (DHA, C22:6 n-3), também são encontrados no leite, ainda que em menor porcentagem14. Na maioria da população Ocidental a concentração média de ácido graxo docosahexaenóico no leite humano está entre 0,2 e 0,4% e este conteúdo é influenciado pela dieta materna11. Esses ácidos graxos são necessários para o desenvolvimento cerebral do neonato, pois participam da mielinização, da proliferação celular e da função retiniana11,14.

Não foram encontrados na literatura estudos demonstrando o perfil dos ácidos graxos no leite de animais tratados com a Dieta Básica Regional durante a gestação e a lactação, assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar os efeitos da desnutrição promovida pelo consumo de Dieta Básica Regional e da reabilitação nutricional, durante a gestação, a lactação e até 70 dias de vida pós-natal sobre a evolução da massa corporal, da massa dos tecidos cerebrais, cardíacos, hepáticos e renais, bem como sobre o consumo alimentar, de ratas gestantes e lactantes e de seus filhotes até 70 dias de vida. Adicionalmente, verificou-se o percentual dos ácidos graxos nas dietas experimentais e no leite materno.

MÉTODOS

Foram utilizados 133 ratos albinos de linhagem Wistar de ambos os sexos, provenientes do biotério de roedores do Instituto de Nutrição da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A manipulação e o sacrifício dos animais seguiram as normas estabelecidas pela Sociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento (SBNeC) e foram aprovadas pela comissão de uso de animais experimentais do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho. Ratas jovens, nulíparas foram submetidas ao acasalamento com ratos de mesma linhagem e origem. A provável prenhez das ratas foi detectada a partir da visualização de espermatozóides na secreção vaginal e a partir deste momento as ratas receberam suas respectivas rações. Ao nascimento, a ninhada foi reduzida a oito filhotes. A mãe do grupo desnutrido que apresentasse comportamento de canibalismo, ou seja, ingerir os filhotes, era descartada e se iniciava um novo acasalamento. Os animais receberam água e ração ad libitum e foram mantidos em biotério com temperatura de 24ºC (com variação de 2ºC) e ciclo claro-escuro de 12 em 12 horas.

As ratas grávidas foram subdivididas em três grupos experimentais, a saber: 1) Grupo Controle (GC), animais alimentados com ração comercial (Tabela 1) durante o período de gestação e lactação (mães e filhotes) e, após o desmame, os filhotes até 70 dias de vida; 2) Grupo Desnutrido (GD), animais alimentados com ração Dieta Básica Regional durante o mesmo período descrito para o GC e 3) Grupo Recuperado (GR), animais alimentados com ração DBR durante o período de gestação e lactação, e os filhotes após o desmame, alimentados com ração comercial até 70 dias de vida. Durante o período de ensaio, os animais foram monitorados diariamente, aferindo-se a massa corporal e estimando-se o consumo alimentar pela pesagem da ração antes e após a oferta ao animal, calculando-se então a diferença entre esses valores. Os filhotes com 70 dias de vida foram sacrificados por decapitação e o cérebro, o coração, o fígado, o rim direito e o esquerdo foram retirados e pesados em balança digital Coleman modelo PW-1100.

A Dieta Básica Regional (DBR), identificada por inquérito de freqüência de consumo alimentar, realizado pelo Setor de Nutrição Humana da Universidade Federal de Pernambuco, foi confeccionada no laboratório do Instituto de Nutrição da UFRJ, utilizando-se como ingredientes batata-doce (Iponea batatas), feijão mulatinho (Phaseolus vulgaris), farinha de mandioca (Manihot esculenta), carne seca (carne bovina salgada e prensada) e gordura da própria carne8. Os ingredientes (exceto a farinha de mandioca) foram cozidos e em seguida secos (desidratados) em estufa com circulação de ar (50-60ºC), durante, aproximadamente, 24 horas. Em seguida, foram moídos e homogeneizados, acrescentando-se também a gordura do charque, que foi retirada antes do cozimento da carne. Desse modo, a carne foi cozida, seca e moída com o menor conteúdo possível de tecido adiposo. A gordura foi derretida e acrescentada na proporção preconizada pela fórmula. Após os componentes em pó serem homogeneizados fez-se uma pasta, acrescentando-se aos poucos, 845 Desvio-padrão - DP=50mL de água morna (de 40ºC a 50ºC) para o preparo de 1kg de ração. A massa foi então processada em uma masseira para obtenção de pequenos pedaços (pellets). Os pellets assim obtidos permaneceram em estufa com circulação de ar (50ºC-60ºC) durante, aproximadamente, 24 horas até a sua secagem e solidificação.

A DBR e a ração comercial apresentam em percentagem, respectivamente, os seguintes nutrientes: proteínas (7,87 e 23,0), carboidratos (69,67 e 50,44), lipídios (0,8 e 5,0), fibras (7,21 e 10,0) e minerais (1,26 e 10,0), para um total de 317,36 e 338,76kcal. Nenhum suplemento vitamínico foi adicionado à dieta8.

Aos 14 dias de lactação, ratas lactantes do grupo controle (n=3) e desnutrido (n=4) foram anestesiadas intraperitonealmente com pentobarbital sódico (30mg/kg), e receberam ocitocina através das narinas (1mL/kg). O leite foi extraído por compressão manual das tetas, acondicionado em tubos plásticos e estocado a -70ºC até a análise de seu conteúdo lipídico. Um total de 300 e 80µL de leite foi extraído de cada rata controle e desnutrida, respectivamente. Após a extração do leite materno as ratas foram sacrificadas por decapitação.

Os lipídios totais foram extraídos segundo Bligh & Dyer15. O leite (10µL para cada grupo experimental) e as dietas experimentais (200mg) foram pesados e homogeneizados com solução salina 0,9%. Ao homogenato foram adicionados 2 mL de metanol e 1mL de clorofórmio. Após agitação em intervalos de 5 em 5 minutos por um período de 2 horas, o homogenato foi centrifugado, durante 10 minutos, a 3000rpm e o sobrenadante armazenado em geladeira. Ao precipitado resultante no tubo foram adicionados novamente 2mL de metanol, 1mL de clorofórmio e 0,8mL de água, agitados de 5 em 5 minutos por 1 hora e centrifugados durante 10 minutos a 3000rpm. O sobrenadante foi extraído e misturado ao que permaneceu armazenado na geladeira, adicionado de 1mL de água e 1mL de clorofórmio. Após agitação por 30 segundos e centrifugação por 30 minutos a 3000rpm, a solução foi separada em duas fases: fase aquosa e fase orgânica que contém os lipídios totais. A fase orgânica foi extraída e seca sob corrente de nitrogênio. A amostra foi então pesada.

A metilação foi feita partindo-se de uma alíquota das amostras de lipídios, do leite ou das dietas experimentais, de acordo com a técnica descrita por Lepage & Roy16, que preconiza o seu tratamento com uma solução de 2mL de metanolbenzeno (4:1v/v) e 200µL de cloreto de acetila, acrescentado sob leve agitação. A mistura final contendo os metil-ésteres de ácidos graxos foi estocada em freezer para análise posterior em cromatógrafo a gás.

Os ácidos graxos metilados foram quantificados por cromatografia gasosa em um cromatógrafo Perkin Elmer Autosystem XL, equipado com detector de chama ionizável, ligado a um software Perkin Elmer Nelson - EUA. Os ácidos graxos foram separados em coluna capilar SP-2330 (Supelco Inc., Bellefonte, PA) com 60mx0,32m de diâmetro interno. Os ésteres foram identificados por comparação com seu tempo de retenção com padrões conhecidos: E6013 cis 5,8,11-Eicosatrienoic acid methyl ester (MEAD), A9298 Arachidonic acid methyl ester 99%, L2626 Linolenic acid methyl ester, L1876 Linoleic acid methly ester, D2659 cis 4,7,10,13,16,19-Docosahexaenoic acid methyl ester, Supelco 37 Component FAME Mix (Sigma, Supelco e Nuchek).

Os resultados foram expressos como média e erro-padrão da média. A análise estatística utilizada foi o teste t de Student para comparar as variáveis entre o grupo controle e o desnutrido e a análise de variância ANOVA de uma via, para comparar os efeitos da recuperação nutricional entre os grupos. Para a comparação entre as médias dos resultados foi aplicado o pós-teste de Bonferroni, adotando-se como nível mínimo de significância o valor de p<0,05.

RESULTADOS

Os resultados apresentados na Tabela 1 correspondem ao percentual de ácidos graxos nas dietas consumidas pelos diferentes grupos experimentais durante o período de estudo. Na dieta Dieta Básica Regional observa-se que o somatório da concentração relativa de ácidos graxos saturados e monoinsaturados foi significantemente maior em relação à dieta controle. No entanto, em relação aos ácidos graxos poliinsaturados, a DBR apresentou valores percentuais significantemente menores. Observa-se também que o percentual do ácido graxo poliinsaturado essencial da família n-3, alfa-linolênico, foi significativamente maior na DBR, enquanto que os teores de ácido poliinsaturado essencial da família n-6, linoléico, foi significantemente menor na dieta DBR. Isto pode ser explicado pelo fato de que a Dieta Básica Regional contém 18,34g de pó de feijão mulatinho, que possui uma grande concentração do ácido graxo alfa-linolênico, já a dieta comercial é preparada com óleo de soja, que é rico em ácido linoléico. Os ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa, como o araquidônico e o ácido graxo docosahexaenóico, apresentaram valores percentuais abaixo de 0,50% e os valores encontrados não foram estatisticamente diferentes entre as dietas.

A Figura 1A apresenta os valores médios de consumo alimentar relativo (gramas de ração/100gramas de massa corporal). Observa-se que as mães desnutridas apresentaram consumo alimentar significantemente menor no primeiro e no último dia de gestação em relação ao grupo controle. Como conseqüência das poucas variações da ingestão alimentar materna entre os grupos, não houve diferença significante na massa corporal materna entre o grupo controle e desnutrido durante a gestação (Figura 1B).


 




Observa-se diminuição significante no consumo alimentar relativo nos dias 1, 14 e 21 de lactação nas mães do grupo desnutrido, em comparação às mães do grupo controle (p<0,001). Dessa forma, verifica-se que durante todo o período lactacional a massa corporal das mães do grupo desnutrido foi diminuindo gradativamente, apresentando, ao final da lactação, perda de 31,6% do peso em relação às mães do grupo controle (Figura 1AB).

Os valores apresentados na Tabela 1 mostram que o leite das ratas desnutridas apresentou maior percentual de ácidos graxos saturados de cadeia média (C10, 12 e 14) e no somatório de saturados em relação ao leite do grupo controle. Não foi observada, entre os grupos, diferença significante no total de ácido graxo monoinsaturado e no ácido graxo oléico. Com relação aos ácidos graxos poliinsaturados essenciais, observa-se diminuição significante, no leite das ratas desnutridas, dos ácidos graxos linoléico e α-linolênico em relação ao grupo controle. Quanto aos ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa, observa-se no leite do grupo desnutrido percentuais significantemente aumentados de ácido graxo docosahexaenóico (C22:6 n-3) e teores diminuídos de ácido graxo araquidônico (C20:4 n-6) em relação ao grupo controle. O valor percentual total de poliinsaturados foi menor no leite do grupo desnutrido em relação ao grupo controle.

A partir do nascimento já é possível observar diferença significante na massa corporal entre a prole do grupo desnutrido e a do controle, tanto nos machos, quanto nas fêmeas (Figura 2).


A Figura 3A mostra que, ao longo do período estudado, o consumo alimentar relativo dos filhotes machos do grupo desnutrido foi significantemente maior em relação ao controle, exceto aos 35 dias de vida. O grupo recuperado aumentou significantemente o consumo alimentar em relação ao controle nos dias 35, 63 e 70º de vida pós-natal. Os filhotes machos do grupo desnutrido apresentaram déficit ponderal significativo, quando comparados aos grupos controle e recuperado. Os animais do grupo recuperado apresentaram maior ganho de massa corporal que os animais desnutridos, entretanto a massa corporal final desse grupo foi 28,9% menor que a do grupo controle (Figura 3B).


 




A Figura 3A mostra que os filhotes fêmeas do grupo desnutrido consumiram relativamente maior quantidade de ração nos 56, 63 e 70º dia de vida pós-natal em relação ao grupo controle. O grupo recuperado consome menos ração que o grupo controle nos 28, 42, 49 e 56º dia pós-natal. As fêmeas do grupo desnutrido apresentaram menor massa corporal comparadas ao controle e recuperado ao longo do período estudado. A partir dos 42 dias de vida o incremento na massa corporal do grupo recuperado foi semelhante ao do grupo controle, exceto aos 56 dias de vida e esta situação foi mantida até o final do experimento (Figura 3B).

Os resultados apresentados na Tabela 2 demonstram que a massa dos diferentes tecidos nos filhotes machos do grupo desnutrido apresentou-se diminuída em comparação aos grupos controle e recuperado. A massa correspondente ao cérebro, ao coração, ao fígado e aos rins direito e esquerdo dos machos do grupo recuperado foi significantemente maior que a do grupo desnutrido, mas significantemente menor que a do grupo controle, mostrando que a introdução da dieta controle permite o aumento da massa, mas não o suficiente para se igualar ao grupo controle. Quando se avalia a massa relativa dos tecidos, observa-se que somente o cérebro e o coração dos machos do grupo desnutrido apresentam massa significantemente maior que os grupos controle e recuperado. Nos demais órgãos não ocorreram diferenças significantes entre os grupos controle e recuperado.

Com relação às fêmeas, similarmente aos machos, os resultados apresentados na Tabela 2 mostram que a massa dos diferentes tecidos do grupo desnutrido apresentou-se inferior, em comparação aos valores respectivos dos grupos controle e recuperado. A massa dos tecidos das fêmeas recuperadas foi significantemente maior que a do grupo desnutrido, porém menor que a do grupo controle. Entretanto, a massa cerebral das fêmeas recuperadas foi igual, estatisticamente, a do grupo controle. A massa dos órgãos das fêmeas do grupo recuperado, quando corrigida pela massa corporal, não diferiu significantemente dos valores do grupo controle.

DISCUSSÃO

Com a finalidade de avaliar experimentalmente os efeitos da desnutrição nas mães e em suas respectivas proles sobre aspectos ponderais (corporal e tecidual), bem como sobre o conteúdo de ácidos graxos do leite produzido, administrou-se, durante a gestação, a lactação e após o desmame até 70 dias de vida, a Dieta Básica Regional, uma dieta multideficiente não somente em proteína, como também em lipídios, vitaminas e minerais. A DBR é considerada uma dieta isoenergética, devido ao seu elevado conteúdo de carboidratos, que compensa a redução energética devido a menores teores de lipídios e proteínas, sugerindo assim um modelo de restrição nutricional qualitativo e não energético, similar ao que ocorre na Zona da Mata do Nordeste brasileiro8. Além disso, quando foi avaliada a composição dos ácidos graxos da Dieta Básica Regional, constatou-se que além do reduzido conteúdo lipídico, esta dieta apresenta uma composição de ácidos graxos que não satisfaz as necessidades do feto e/ou neonato em desenvolvimento, apresentando menores percentuais de ácidos graxos poliinsaturados e elevadas proporções de ácidos graxos saturados (Tabela 1). Os ácidos graxos poliinsaturados são necessários para a adequada função tecidual e o ótimo crescimento e desenvolvimento do neonato17.

Em concordância com os resultados de Teodósio et al.8, as ratas desnutridas deste estudo apresentaram, ao longo do período gestacional, pouca variação na ingestão alimentar e, portanto, o incremento no ganho de massa corporal (Figura 1) foi semelhante ao do grupo controle. É provável que isto se deva também ao fato de a Dieta Básica Regional ter sido introduzida no 1º dia de prenhez, ou seja, quando as reservas maternas de gordura armazenadas no tecido adiposo ainda estavam preservadas, o que difere do estudo de Langley et al.18, que introduziram a dieta hipoprotéica antes mesmo do acasalamento e durante a prenhez das ratas. Entretanto, durante o período lactacional detectou-se redução significante na ingestão alimentar e na massa corporal das ratas lactantes tratadas com DBR, em relação ao grupo controle (Figura 1). Como conseqüência, os filhotes das mães alimentadas com a Dieta Básica Regional durante a gestação e a lactação apresentaram taxa de crescimento significantemente menor durante todo o período da lactação em relação aos filhotes de mães controles (Figura 2), sugerindo que a depleção nutricional durante a lactação foi mais prejudicial do que na gestação e interferiu de forma significativa no crescimento da prole.

Em estudo abordando os efeitos de diferentes concentrações de proteína dietética na alimentação de ratas foi observado que, após o parto, as ratas do grupo controle apresentavam 30g a mais de peso corporal que na época da concepção, enquanto as mal nutridas apresentaram perda de peso19. De fato, prévios estudos sugerem que a ingestão dietética materna é de grande importância no período lactacional, tanto para a saúde da mãe quanto para a performance lactacional e o crescimento das crias. Ratas no pico da lactação (12-14 dias da lactação) mobilizam gordura corporal e proteínas teciduais, acumuladas durante a gestação, para ajudar a manter as necessidades energéticas desse período. A mobilização materna de proteínas teciduais, durante a lactação, é uma alternativa para melhorar o desempenho lactacional principalmente sob condições de inadequada ingestão de nutrientes pela dieta20. Neste período, grande parte da energia e dos nutrientes de reserva materna está disponível para manter a produção de leite21,22. A restrição alimentar diminui a quantidade de leite produzido e a taxa de crescimento de suas crias23.

As dietas nutricionalmente deficientes durante a lactação também podem alterar a composição do leite e repercutir no desenvolvimento do lactente. Reconhecendo a importância dos lipídios no período perinatal, dada a sua essencialidade para funções estruturais e regulatórias24, foi analisada a composição dos ácidos graxos do leite de ratas lactantes alimentadas com a Dieta Básica Regional. Em geral, as concentrações dos ácidos graxos no leite refletem a composição desses ácidos graxos na dieta materna13. Vários trabalhos apontam que dietas ricas em carboidratos favorecem a síntese de ácidos graxos de cadeia média na glândula mamária11. De maneira similar, no presente estudo o leite secretado pelas ratas desnutridas, que consumiram uma dieta rica em carboidratos e hipolipídica, apresentou composição em ácidos graxos diferente daquela de mães-controles, por conter teor mais elevado de ácidos graxos de cadeia média (C10:0, C12:0 e C14:0) e menores proporções de ácidos graxos poliinsaturados da família n-6 essenciais e de cadeia longa, como o ácido araquidônico (Tabela 1).

Estas diferenças na composição dos ácidos graxos saturados de cadeia média são favoráveis ao neonato, por fornecerem maiores teores de ácidos graxos rapidamente absorvíveis e combustíveis facilmente oxidados13 o que, de certa forma, entre outros fatores, poderia garantir a sobrevivência da prole frente a essa situação de grave depleção nutricional. No entanto, os ácidos graxos polienóicos de cadeia longa, principalmente o araquidônico, necessário para o crescimento11,14 apresentaram-se severamente depletados no leite do grupo desnutrido. Estes dados permitem sugerir, portanto, que o déficit de crescimento observado nos filhotes do grupo desnutrido ocorreu, pelo menos em parte, por alteração na proporção de araquidônico no leite dessas mães, ocasionando menor disponibilidade desse ácido graxo para o neonato.

Por outro lado, os ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa (AGPI-CL n-3), como o ácido docosahexaenóico (C22:6 n-3 DHA), apresentaram-se em maior porcentagem no leite da rata desnutrida em relação ao da rata controle. O ácido docosahexaenóico (C22:6 n-3 DHA) é essencial para o crescimento e o desenvolvimento funcional do cérebro dos neonatos11,14,25. No presente estudo, as ratas desnutridas consumiram 20,89g (DP=0,88) de Dieta Básica Regional na última semana de amamentação (Figura 1), isto significa dizer que a ingestão diária de DHA foi de 0,042%. Já o grupo controle consumiu 0,240% de DHA em 77,22g (DP=1,69) de ração comercial, entretanto a porcentagem de DHA no leite da rata desnutrida foi maior que a do leite da rata controle. É provável que os triglicerídeos armazenados no tecido adiposo materno durante a gestação, contendo DHA, tenham sido mobilizados devido à intensa lipólise, sendo então liberados para a glândula mamária e disponibilizados ao neonato através do leite. Considerando que o ácido docosahexaenóico pode ser formado a partir do ácido graxo essencial α-linolênico, pelas vias enzimáticas de dessaturação e alongamento, principalmente hepática, é possível que a maior proporção do ácido graxo α-linolênico (C18:3 n-3) verificada na Dieta Básica Regional em relação à ração comercial, 11,44% e 2,87%, respectivamente (Tabela 1), ao ser dessaturado e alongado no tecido hepático, também poderia contribuir para o suprimento de ácido docosahexaenóico para o leite das ratas desnutridas. Análises complementares como, por exemplo, da atividade das enzimas dessaturases no fígado, são necessárias para melhor elucidar estes achados.

Quando foi avaliada a prole de machos e fêmeas após o desmame até a idade jovem (70 dias), observou-se que os filhotes, machos e fêmeas, de mães desnutridas que receberam a Dieta Básica Regional, apesar de consumirem quantitativamente mais ração que o grupo controle, não recuperaram a massa corporal ao longo do período do estudo (Figura 3), apresentando um déficit na massa corporal significante na idade jovem em relação aos grupos controle e recuperado. De maneira similar, a massa tecidual também foi significantemente afetada, de modo que os machos desnutridos deste estudo apresentaram perda de 86,8% na massa do fígado (Tabela 2) com redução de 86,9% na massa corporal (Figura 3). Estes achados diferem dos de Boza et al.26, que observaram valores 30,0% menores no peso do fígado e 14,5% na massa corporal na desnutrição causada pela restrição dietética. Observa-se que na análise da massa de tecidos por 100 gramas de massa corporal, o cérebro e o coração dos machos do grupo desnutrido apresentaram maior peso comparativamente aos grupos controle e recuperado, mostrando que a desnutrição preserva a massa de órgãos com função primordial, como já havia sido descrito por Parra et al.27, de modo que na desnutrição há, prioritariamente, perda de massa hepática para garantir a disponibilidade de energia aos órgãos mais vitais, como o cérebro e o coração.

No grupo recuperado, os machos apresentaram incremento gradativo na massa corporal durante a recuperação nutricional, sem que houvesse grandes variações no consumo alimentar em relação ao grupo controle (Figura 3). Comportamento semelhante foi observado no estudo de Nunes et al.7 os quais acompanharam os animais até 30 dias de idade. A persistência de diferenças na massa corporal em relação ao grupo controle, mesmo após reabilitação nutricional, por tempo mais prolongado, também foi observada por outros pesquisadores, em ratos machos na idade de 90 dias28 e 120 dias29. Estes resultados não surpreenderam, visto que o déficit de massa corporal induzido pela restrição protéica em fase de crescimento rápido não consegue ser completamente restabelecido por uma dieta normal30. Além disso, observaram-se alterações na massa absoluta dos órgãos, no entanto, em termos proporcionais a massa do cérebro (g/100g massa corporal) foi preservada nas fêmeas do grupo recuperado (Tabela 2), confirmando estudos anteriores que sugerem a existência de mecanismos capazes de proteger tecidos essenciais como o cérebro27.

No trabalho de Nunes et al.7 não foi verificada diferença significante entre machos e fêmeas em relação à massa corporal, após a reabilitação nutricional, de modo que para ambos os sexos essa variável foi significantemente menor em relação ao grupo controle. No entanto, os resultados do presente estudo com a Dieta Básica Regional mostram que, diferentemente do que ocorre com os machos, as fêmeas recuperadas apresentaram menor consumo alimentar e incremento na massa corporal que estatisticamente se assemelham ao do grupo controle a partir do 42º dia de vida, exceto aos 56 dias (Figura 3). Já com relação à massa dos órgãos aos 70 dias, nota-se que em termos proporcionais as massas de todos os órgãos não diferiram das respectivas do grupo controle (Tabela 2), incluindo o cérebro. Seria interessante realizar estudo posterior com este modelo experimental para avaliar a composição corporal. Com a determinação do conteúdo de gordura e proteína da carcaça seria possível obter uma melhor compreensão acerca da compartimentalização da massa corporal das fêmeas do presente estudo, em termos de percentuais de massa gorda e magra.

Em conclusão, os resultados deste estudo sugerem que a desnutrição durante o período pré e pós-natal, promovida pela Dieta Básica Regional, compromete a massa corporal materna durante a lactação e repercute em notório déficit na taxa de crescimento dos filhotes lactentes, o que, entre outros fatores, poderia ser devido a uma redução no conteúdo ou alteração da proporção entre os diferentes tipos de ácidos graxos do leite materno, principalmente araquidônico, reconhecidos essenciais para o crescimento do neonato. Além disso, a reabilitação nutricional iniciada após o desmame produz efeitos diferentes na massa corporal e de órgãos dos filhotes, machos e fêmeas na idade jovem, sendo estes parâmetros mais comprometidos nos filhotes machos do que nas fêmeas. Estes resultados reforçam o conceito segundo o qual a restrição nutricional qualitativa durante o período perinatal altera, em idades mais tardias, o desenvolvimento da prole, e de maneira diferenciada entre os sexos.

AGRADECIMENTOS

Ao Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, à Universidade Federal do Rio de Janeiro e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pelas bolsas concedidas às alunas de Iniciação Científica e Mestrado, respectivamente.

COLABORADORES

A.S. Souza contribuiu com o acompanhamento dos animais, a elaboração da Dieta Básica Regional, a análise estatística, a interpretação dos dados e a redação do manuscrito. L.C. Pacheco e P.S. Castro contribuíram com o acompanhamento dos animais. M.G. Tavares do Carmo contribuiu com a orientação da Dissertação de Mestrado, a redação e a revisão do manuscrito.

Recebido em: 3/9/2007

Versão final reapresentada em: 12/8/2008

Aprovado em: 9/2/2009

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    Artigo elaborado a partir de dissertação de A.S. SOUZA, intitulada "Conseqüências da desnutrição na distribuição relativa de ácidos graxos de cadeia longa do sistema nervoso central e no comportamento cognitivo de ratos". Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2006.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      Ago 2009

    Histórico

    • Aceito
      09 Fev 2009
    • Revisado
      12 Ago 2008
    • Recebido
      03 Set 2007
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