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Traffic light labelling: traduzindo a rotulagem de alimentos

Traffic light labeling: translating food labeling

Resumos

OBJETIVO: Apresentar uma adaptação do Traffic Light Labelling, ou "Semáforo Nutricional", adotado no Reino Unido e outros países da Europa, às normas vigentes no Brasil e classificar produtos industrializados comercializados no país. MÉTODOS: Esta ferramenta baseia-se na utilização das cores do semáforo para valorar concentrações de gorduras total, saturada e trans, açúcar, sódio e fibra correspondente a 100g ou 100mL do produto. O sinal vermelho indica que o nutriente está presente em quantidade excessiva; o amarelo, média e o verde, adequada. Para fibras as baixas concentrações têm cor vermelha e as recomendadas, verde. A adaptação e aplicação desses conceitos para consumidores brasileiros fundamentaram-se nas normas do Regulamento Técnico Referente à Informação Nutricional Complementar da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e da Food Standards Agency. RESULTADOS: Foram classificados cem produtos industrializados, os quais foram selecionados da página eletrônica de um hipermercado brasileiro, optando pelos primeiros cinco a oito produtos listados na página, para cada uma das 17 categorias. A análise mostra que são altas as quantidades de gordura total, saturada e sódio e baixas as quantidades de gordura trans e fibra. CONCLUSÃO: A adaptação dessa metodologia visa facilitar a escolha de alimentos saudáveis, sensibilizando os consumidores quanto às desvantagens no que se refere a qualidade nutricional dos alimentos industrializados, e estimular as indústrias a melhorar a composição nutricional de seus produtos, sob a perspectiva de receberem maior quantidade de sinais verdes e menor quantidade de sinais vermelhos; assim, contribuindo para a prevenção de erros alimentares, obesidade e doenças crônicas não-transmissíveis, principais causas de incapacidade e mortes precoces no Brasil.

Alimentos industrializados; Consumo de alimentos; Informação nutricional; Rotulagem de alimentos; Rotulagem nutricional


OBJECTIVE: This study presented an adaptation of the Traffic Light Labeling or Nutrition Traffic Light adopted in the United Kingdom and other countries in Europe to the regulations in force in Brazil and classified the processed food products sold in the country. METHODS: This tool uses traffic light colors to indicate the amount of total, saturated and trans fats, sugar, sodium and fiber present in 100g or 100mL of the product. The red light indicates that the nutrient is in excess; yellow means average and green means appropriate. For fibers, low content is indicated by the red light and proper content by green light. High prices are indicated by red light and low ones by green light. The adaptation and administration of these concepts for Brazilian consumers were based on norms established by the Brazilian National Sanitary Surveillance Agency Agência Nacional de Vigilância Sanitária and by the British Food Standards Agency. RESULTS: One hundred processed foods from a Brazilian supermarket website were classified. The selected foods were the first five to eight items shown on a page of each of the 17 food categories. The analysis showed that the amount of total and saturated fats and sodium are high and the amounts of trans fats and fibers are low. CONCLUSION: The use of this method allows consumers to easily pick healthier foods, alerting consumers about the disadvantages of processed foods with respect to their nutritional quality, and incentivizes companies to improve the nutritional composition of their foods in order to receive a higher number of green lights and smaller number of red lights. This helps to prevent poor food choices, obesity and non-communicable chronic diseases, which are the main causes of early disability and death in Brazil.

Industrialized foods; Food consumption; Nutritional facts; Food labeling; Nutritional labeling


ORIGINAL ORIGINAL

Traffic light labelling: traduzindo a rotulagem de alimentos

Traffic light labeling: translating food labeling

Giovana Longo-Silva; Maysa Helena de Aguiar Toloni; José Augusto de Aguiar Carrazedo Taddei

Universidade Federal de São Paulo, Escola Paulista de Medicina, Departamento de Pediatria, Disciplina de Nutrologia. R. Loefgreen 1647, Vl. Clementino, 04040-032, São Paulo, SP, Brasil. Correspondência para/Correspondence to: J.A.A.C. TADDEI. E-mails: <taddei.dped@epm.br>; <nutsec@yahoo.com.br>

RESUMO

OBJETIVO: Apresentar uma adaptação do Traffic Light Labelling, ou "Semáforo Nutricional", adotado no Reino Unido e outros países da Europa, às normas vigentes no Brasil e classificar produtos industrializados comercializados no país.

MÉTODOS: Esta ferramenta baseia-se na utilização das cores do semáforo para valorar concentrações de gorduras total, saturada e trans, açúcar, sódio e fibra correspondente a 100g ou 100mL do produto. O sinal vermelho indica que o nutriente está presente em quantidade excessiva; o amarelo, média e o verde, adequada. Para fibras as baixas concentrações têm cor vermelha e as recomendadas, verde. A adaptação e aplicação desses conceitos para consumidores brasileiros fundamentaram-se nas normas do Regulamento Técnico Referente à Informação Nutricional Complementar da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e da Food Standards Agency.

RESULTADOS: Foram classificados cem produtos industrializados, os quais foram selecionados da página eletrônica de um hipermercado brasileiro, optando pelos primeiros cinco a oito produtos listados na página, para cada uma das 17 categorias. A análise mostra que são altas as quantidades de gordura total, saturada e sódio e baixas as quantidades de gordura trans e fibra.

CONCLUSÃO: A adaptação dessa metodologia visa facilitar a escolha de alimentos saudáveis, sensibilizando os consumidores quanto às desvantagens no que se refere a qualidade nutricional dos alimentos industrializados, e estimular as indústrias a melhorar a composição nutricional de seus produtos, sob a perspectiva de receberem maior quantidade de sinais verdes e menor quantidade de sinais vermelhos; assim, contribuindo para a prevenção de erros alimentares, obesidade e doenças crônicas não-transmissíveis, principais causas de incapacidade e mortes precoces no Brasil.

Termos de indexação: Alimentos industrializados.Consumo de alimentos. Informação nutricional. Rotulagem de alimentos. Rotulagem nutricional.

ABSTRACT

OBJECTIVE: This study presented an adaptation of the Traffic Light Labeling or Nutrition Traffic Light adopted in the United Kingdom and other countries in Europe to the regulations in force in Brazil and classified the processed food products sold in the country.

METHODS: This tool uses traffic light colors to indicate the amount of total, saturated and trans fats, sugar, sodium and fiber present in 100g or 100mL of the product. The red light indicates that the nutrient is in excess; yellow means average and green means appropriate. For fibers, low content is indicated by the red light and proper content by green light. High prices are indicated by red light and low ones by green light. The adaptation and administration of these concepts for Brazilian consumers were based on norms established by the Brazilian National Sanitary Surveillance Agency Agência Nacional de Vigilância Sanitária and by the British Food Standards Agency.

RESULTS: One hundred processed foods from a Brazilian supermarket website were classified. The selected foods were the first five to eight items shown on a page of each of the 17 food categories. The analysis showed that the amount of total and saturated fats and sodium are high and the amounts of trans fats and fibers are low.

CONCLUSION: The use of this method allows consumers to easily pick healthier foods, alerting consumers about the disadvantages of processed foods with respect to their nutritional quality, and incentivizes companies to improve the nutritional composition of their foods in order to receive a higher number of green lights and smaller number of red lights. This helps to prevent poor food choices, obesity and non-communicable chronic diseases, which are the main causes of early disability and death in Brazil.

Indexing terms: Industrialized foods. Food consumption. Nutritional facts. Food labeling. Nutritional labeling.

INTRODUÇÃO

Com o advento da industrialização, mudanças significativas ocorreram nos mais diversos segmentos da economia mundial, no estilo de vida e nos hábitos alimentares da população1.

A sociedade contemporânea converge para um padrão dietético composto por altos teores de sal, gorduras totais, colesterol, carboidratos refinados e baixos teores de ácidos graxos insaturados e fibras. Tais mudanças alimentares, aliadas à rotina de trabalho sedentário, à falta de tempo para refeições levando ao aumento do consumo de produtos industrializados, resultam no crescimento da obesidade e no aparecimento cada vez mais precoce de Doenças Crônicas Não-Transmissíveis (DCNT)1,2, realidade que destaca o papel primordial da alimentação equilibrada na promoção de bons níveis de saúde e bem estar3.

Neste contexto, grande parte dos estudos e pesquisas que envolvem a área de nutrição e suas relações com estratégias para redução dos riscos de doenças, destaca a importância do adequado conhecimento da rotulagem nutricional dos alimentos para a promoção da alimentação saudável. Considera-se que este pode funcionar como um instrumento na educação do consumidor a respeito das relações entre nutrição e saúde, visando capacitá-lo a fazer escolhas alimentares mais saudáveis4.

O uso da informação nutricional obrigatória nos rótulos de alimentos e bebidas produzidos, comercializados e embalados na ausência do cliente e prontos para serem oferecidos ao consumidor, está regulamentada no Brasil desde 20015,6.

Desta forma, os rótulos devem declarar o valor energético, carboidratos, proteínas, gorduras totais, gorduras saturadas, gorduras trans, fibra alimentar e sódio, e opcionalmente, podem conter teores de vitaminas e minerais quando estiverem presentes em quantidade igual ou maior a 5% da Ingestão Diária Recomendada (IDR) por porção indicada no rótulo5,7. Estas informações referem-se ao produto na forma como está exposto à venda e devem ser apresentados em porções (gramas ou mililitros), e medidas caseiras correspondentes, devendo ainda conter o percentual de valores diários para cada nutriente declarado, que expressa o quanto uma porção daquele alimento representa do total da IDR, com base em uma dieta de 2.000kcal/dia4,6.

Apesar do indiscutível benefício desta normatização, estudos com o objetivo de verificar o grau de conhecimento da população sobre nutrição e comportamento do consumidor frente à utilização de rótulos de alimentos, não são animadores.

De acordo com o Inquérito Domiciliar sobre Comportamentos de Risco e Morbidade Referida de Doenças e Agravos Não-Transmissíveis realizado em 14 capitais e Distrito Federal no Brasil, apenas 44% da população consulta o rótulo nutricional, sendo este grupo predominantemente constituído pelo sexo feminino, com idades entre 15 e 24 anos e ensino fundamental completo ou superior8.

A não-utilização da rotulagem nutricional e a interpretação incorreta da mesma estão associadas a diversos fatores, destacando-se a falta de tempo, insuficiência de conhecimentos sobre nutrição e habilidades matemáticas dos consumidores, que têm limitações para utilizar as informações expostas, constituindo-se assim em uma barreira para melhores escolhas alimentares9.

Tendo em vista que para muitos compradores, a informação contida nos rótulos é excessivamente técnica e pouco clara, foi criada no Reino Unido, pela Food Standards Agency (FSA), uma proposta simples e intuitiva para orientar o consumidor na escolha de produtos mais saudáveis10.

Esta ferramenta, que já se expandiu para outros países da Europa, é o Traffic Light Labelling, ou "Semáforo Nutricional", que fornece subsídios para que se acrescentem nos rótulos informações diretas e práticas sobre a composição nutricional do alimento, tornando a compreensão dos rótulos mais acessível a leigos e crianças, direcionando-os para dietas mais equilibradas.

O "Semáforo Nutricional", proposto pela FSA, baseia-se nas cores do semáforo, analisando separadamente a concentração de gorduras, gorduras saturadas, açúcares e sal correspondente a 100g ou 100mL de cada produto. Desta forma, o "sinal" vermelho indica que o nutriente está presente em quantidade excessiva, o "sinal" amarelo indica média quantidade e o verde pouca quantidade10. O consumidor é orientado, caso consuma um alimento com sinal vermelho para um nutriente específico, a consumir outro com sinal verde para o mesmo nutriente.

A FSA recomenda a utilização desta metodologia em produtos processados de conveniência, como refeições prontas, pizzas, hambúrgueres, sanduíches, salsichas e cereais matinais, uma vez que seus conteúdos nutricionais são de difícil compreensão pelos consumidores. O semáforo deve estar preferencialmente na parte frontal da embalagem do produto, de modo a facilitar a visualização pelo consumidor10.

Com o objetivo de identificar a compreensão da rotulagem nutricional, pelos consumidores, foi conduzida uma pesquisa no Reino Unido com 2 932 consumidores, onde se constatou que a interpretação da rotulagem nutricional foi favorecida pelo Traffic Light Labelling (71% de compreensão), quando comparada à rotulagem tradicional (58% de compreensão)11.

Outra pesquisa, realizada na Austrália com 790 consumidores de todas as classes sócio-econômicas, apontou que 81% dos entrevistados foram capazes de escolher corretamente os alimentos mais saudáveis e comparar, de forma rápida, dois produtos, utilizando o Traffic Light Labelling. Houve diferença estatisticamente significante entre o desempenho observado no uso do Semáforo e da rotulagem nutricional tradicional12.

Diante do exposto, o objetivo do presente artigo é apresentar uma adaptação do Traffic Light Labelling às normas vigentes no Brasil e a classificação de produtos industrializados comercializados no País.

MÉTODOS

A adaptação do "Semáforo Nutricional", apresentada neste estudo, consistiu na adequação das cores às recomendações vigentes no Brasil e no acréscimo de sinais de tráfego para gordura trans e fibra além da conversão da classificação do sal para sódio (mg), por ser a unidade de medida adotada no país.

Os pontos de corte (Tabela 1) aqui sugeridos, para determinação da classificação dos nutrientes em verde, amarelo e vermelho, fundamentaram-se em normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)13, e para aqueles sem normatização, foram mantidas as classificações da FSA10. Deve-se ressaltar que todos os valores referem-se a 100g ou 100mL do alimento na forma como é exposto à venda.

Em relação à gordura total, gordura saturada e açúcar foram classificados com a cor verde alimentos com valores inferiores aos limites estabelecidos pela ANVISA para classificação como de "baixa quantidade" desses nutrientes. Estes pontos de corte constituem Regulamento Técnico Referente à Informação Nutricional Complementar13. Não havendo norma brasileira em relação às médias e excessivas quantidades destes nutrientes, os pontos de corte da FSA foram mantidos para os sinais amarelo e vermelho10.

O sódio recebeu a cor verde nos limites de "muito baixa quantidade", e a cor amarela para "baixa quantidade". Valores superiores a este limite receberam a cor vermelha13.

Quanto à gordura trans, não havendo recomendações dos níveis seguros de ingestão, considerou-se como verde a sua inexistência na porção do alimento considerado. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estabelece que sua ingestão diária máxima não exceda 1% do valor calórico da dieta, o que equivale a 2,2g em uma dieta de 2 000kcal/dia14. Desta forma, considerou-se, por medida de segurança, que o alimento contendo 50% do limite diário máximo permitido, receberia a cor amarela (< 1g) e aquele que exceder esta quantidade, receberia a vermelha (>1g).

A quantidade de fibras alimentares foi classificada segundo os limites estabelecidos pela ANVISA com "alto teor" recebendo a luz verde, alimento "fonte" recebendo amarela e abaixo desses limites a vermelha13.

Com base nos pontos de corte estabelecidos, foram classificados cem produtos industrializados, os quais foram selecionados da página eletrônica de um hipermercado brasileiro, optando, para cada categoria, pelos primeiros cinco a oito produtos listados (Anexo Anexo Anexo - Clique para ampliar ).

RESULTADOS

A Tabela 2 descreve os resultados da aplicação dos pontos de corte a uma das 17 categorias (salgadinhos de pacote), consideradas na metodologia. Observa-se que todas as marcas analisadas têm quantidades excessivas de gordura total, gordura saturada e sódio, com quantidades insuficientes de fibras, de forma que todos os alimentos, com exceção de um (Marca 5), receberam a cor vermelha na classificação do Semáforo Nutricional (fibra com sinal amarelo).

Por outro lado, a gordura trans não aparece em quantidades que, segundo as normas, devam aparecer no rótulo dos alimentos.

Na Figura 1 apresentam-se estes mesmos resultados para os cem produtos analisados, situação menor preocupante, já que para gordura total e gordura saturada, menos da metade dos produtos são classificados com o sinal vermelho, enquanto que para fibra alimentar e sódio mais de 2/3 dos cem produtos receberam o sinal vermelho.


DISCUSSÃO

Os resultados apresentados na Figura 1 refletem situação de inadequação nutricional dos alimentos industrializados, quadro preocupante, se considerado que os estudos têm demonstrado aumento contínuo no consumo desses alimentos no País1.

Existem evidências científicas de que o consumo continuado de excessos de gordura total, gordura saturada, gordura trans, açúcar e sódio estão fortemente associados a sobrepeso, obesidade e DCNT15.

As quantidades de gordura trans receberam sinal verde em 86% dos alimentos analisados, indicando baixa quantidade. A decisão de incluir este sinal à metodologia partiu do seu consumo estar relacionado à ocorrência de DCNT, consequência de sua ação hipercolesterolêmica, elevando o colesterol total e sua fração de baixa densidade (LDL-c)16. Importante salientar que, de acordo com o Regulamento Técnico sobre Rotulagem Nutricional de Alimentos Embalados6, a informação de um nutriente pode ser expressa em "zero" ou "0" ou "não contém" quando o alimento contiver quantidades menores ou iguais às estabelecidas como "não significativas". Assim, se em uma porção do alimento, houver quantidades menores ou iguais a 0,2g de gordura trans, o fabricante pode omiti-la. Conclui-se, portanto que os resultados, aqui apresentados, da análise deste nutriente podem não retratar a realidade, podendo haver, em 100g do alimento, quantidade superior à reconhecida pela rotulagem nutricional, que muitas vezes se refere a quantidades bastante inferiores à 100g6.

O açúcar, definido como todos os monossacarídeos e dissacarídeos, digeríveis, absorvidos e metabolizados pelo seres humanos e presentes nos alimentos13, não foi classificado em nenhum alimento, em decorrência de sua omissão nos rótulos nutricionais. Constata-se que estudos alertam para o excesso de açúcar presente em alimentos industrializados, como biscoitos doces, bebidas e sobremesas lácteas, bebidas artificiais e cereais matinais17-19.

Em relação às fibras, apenas 11% receberam o sinal verde, indicando que os alimentos industrializados não contribuem, com percentual significativo, para as necessidades nutricionais, realidade preocupante quando constatada também, a baixa ingestão de frutas, hortaliças, leguminosas e cereais integrais, fontes deste nutriente, observada em estudos populacionais brasileiros1. A ingestão adequada de fibras desperta preocupação dos profissionais de saúde, em decorrência de suas propriedades protetoras, como redução da absorção do colesterol, da glicemia, regulação do funcionamento intestinal, prevenindo constipação e câncer de cólon20,21.

A classificação da quantidade de sódio mostrou que 77% dos alimentos continham excesso deste mineral, sabidamente associado ao aumento das prevalências de hipertensão arterial, infarto agudo do miocárdio, insuficiência renal e acidente vascular cerebral22.

Esses dados são mais uma evidência de que a sociedade contemporânea, em decorrência da falta de tempo para o preparo de suas refeições, é tentada para a aquisição de alimentos prontos para o consumo disponibilizados pelas indústrias1,23. O principal problema é que a população os adquire sob influência da propaganda e desconhecendo os riscos para a saúde e nutrição associados ao consumo continuado desses alimentos4.

Assim, a alimentação inadequada constitui-se em fator de risco modificável para o incremento do excesso de peso e DCNT14. As consequências dos excessos alimentares são facilmente identificadas ao se observar a prevalência de sobrepeso na população, que atinge 34,2% das mulheres em idade fértil no Brasil24. A cada ano, no mundo, pelo menos 2,6 milhões de pessoas morrem como consequência de estarem acima do peso ou serem obesas; 4,4 milhões morrem em decorrência de níveis totais de colesterol elevados e 7,1 milhões por causa de pressão sanguínea elevada14, sendo que somente no Brasil as DCNT são causas de 32,2% das mortes25.

Além de ser causa de morte, o fardo dessas doenças tem efeitos adversos na qualidade de vida dos indivíduos, gera grandes e subestimados efeitos econômicos para as famílias, comunidades e sociedades em geral, ao se associarem à incapacitação e mortes precoces de cidadãos em fase produtiva da vida14.

O Semáforo Nutricional, embora não solucione o problema de nutrição e obesidade da população, promove escolhas alimentares mais saudáveis, justamente nesta perspectiva, em que a extensão desta metodologia para países em desenvolvimento, com níveis socioeconômicos e de escolaridades menores, torna-se de grande relevância. Afinal, a síntese de indicadores sociais brasileiros reflete uma realidade lamentável, onde 65,5% dos adolescentes com idades entre 15 e 17 não frequentam o ensino médio, 10,0% da população com 15 anos de idade ou mais é analfabeta, correspondendo a 14,1 milhões de indivíduos26. Esta situação resulta em consumidores de capacidade de entendimento e conhecimento limitados, tornando-se ilusório considerar que a rotulagem nutricional atual passa a ser interpretada de forma adequada.

Ainda nesta visão, considerando dados recentes que demonstram que 70% das pessoas consultam rótulos dos alimentos no momento da compra e, no entanto, mais da metade não compreende adequadamente o significado das informações27, a proposta de haver uma representação gráfica, por meio de cores, torna-se de grande valia no que se refere à maior facilidade de compreensão. Já que é difícil desacelerar o aumento progressivo da produção e o consumo de alimentos industrializados, deve-se disponibilizar aos consumidores ferramentas de fácil entendimento que lhes permitam, sem embasamento teórico, científico ou matemático, interpretar a composição nutricional dos alimentos, otimizando a qualidade da sua alimentação.

Apesar dos benefícios de se traduzir a rotulagem nutricional, tornando-a de simples e fácil entendimento ao consumidor, assume-se que, como proposta voluntária, o interesse e adesão, por parte das indústrias, seriam baixos, pelo excesso de luzes vermelhas que receberiam o que poderia comprometer a venda e interferir inclusive no lucro das empresas, sendo desinteressante ao núcleo empresarial, por outro lado, como já ocorre nos países escandinavos como processo de conscientização dos consumidores, devem ocorrer modificações no desenvolvimento dos produtos oferecidos à população, de forma a atender as exigências de grupos populacionais melhor informados. Neste contexto o advento desses temas, de facilitação do entendimento da adequação nutricional dos produtos industrializados, pode vir a ser potente instrumento para aceitação desses alimentos, que além de atraentes e práticos, sejam ainda adequados para o consumo humano e compatíveis com um estilo de vida saudável.

CONCLUSÃO

A adaptação dessa metodologia visa facilitar a escolha de alimentos saudáveis, visando sensibilizar os atores sociais envolvidos no processo de produção e consumo de alimentos, indústria e consumidor, quanto às vantagens e desvantagens no que se refere ao custo e qualidade nutricional dos alimentos industrializados.

A adoção do "Semáforo Nutricional" constitui-se, portanto, em estratégia indireta de estímulo às indústrias para que produzam alimentos com menor quantidade de açúcar, gordura total, gordura saturada, gordura trans, sódio e maior quantidade de fibras, sob a perspectiva de receber melhor aceitação junto aos consumidores, quando seus produtos receberem maiores quantidades de sinais verdes e menor quantidade de sinal vermelho.

Desta forma, procura-se contribuir para o consumo continuado de dietas quantitativa e qualitativamente adequadas, efetivo para prevenção da obesidade e DCNT associadas.

Por fim, sugere-se que sejam realizados estudos, que objetivem avaliar o grau de compreensão e utilidade desta metodologia pelos consumidores brasileiros, bem como a adesão e utilização desta inovação.

COLABORADORES

G.L. SILVA colaborou na execução, análise de dados e na redação. M.H.A. TOLONI colaborou na idealização do projeto e na redação. J.A.A.C. TADDEI colaborou na idealização do projeto e revisão da redação.

Recebido em: 22/1/2009

Versão final reapresentada em: 4/5/2010

Aprovado em: 5/7/2010

ANEXO

  • 1
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [banco de dados na internet]. Pesquisa de Orçamentos Familiares no Brasil (POF) 2002-2003. Rio de Janeiro: IBGE; 2004 [acesso 2008 nov 17]. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_impressao.php?id_ noticia=278>
  • 2. Lands WE. Dietary fat and health: the evidence and the politics of prevention: careful use of dietary fats can improve life and prevent disease. Ann N Y Acad Sci. 2005; 10(55):179-92.
  • 3. Abrams SE, Wells MR. Feeding better food habits in mid-20th-century America. Public Health Nurs. 2005; 22(6):529-34.
  • 4. Feitosa TC, Pontes TE, Brasil AL, Marum ABRF, Taddei JAAC. Transição nutricional e desenvolvimento de hábito de consumo alimentar na infância. In: JE Dutra-de-Oliveira, J Sérgio Marchini, organizadores. Ciências nutricionais: aprendendo a aprender. 2Ş ed. São Paulo: Sarvier; 2008.
  • 5
    Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n. 40, de 21 de março de 2001. Regulamento técnico para rotulagem nutricional obrigatória de alimentos e bebidas embalados. Diário Oficial da União. Brasília, março 2001; (22-E):1; Seção 1.
  • 6
    Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n. 359, de 23 de dezembro de 2003. Regulamento Técnico de Porções de Alimentos Embalados Para Fins de Rotulagem Nutricional. Brasília: Ministério da Saúde, 2003 [acesso 2008 nov 20]. Disponível em: <http://e-legis.bvs.br/leisref/public/showAct.php?id=9058>.
  • 7
    Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Gerência Geral de Alimentos. Rotulagem nutricional obrigatória: manual de orientação às indústrias de alimentos. Brasília: Ministério da Saúde; 2005.
  • 8
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Inquérito domiciliar sobre comportamentos de risco e morbidade referida de doenças e agravos não transmissíveis. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde; 2003.
  • 9. Cassemiro JA, Colauto NB, Linde GA. Rotulagem nutricional: quem lê e por quê? Arq Ciências Saúde Unipar. 2006; 10(1):9-16.
  • 10. Food Standards Agency. Food labels: traffic light labelling. London: FSA; 2007 [cited 2008 Jul 20]. Available from: <http://www.eatwell.gov.uk/>.
  • 11. Food Standards Agency. Compreension and use of UK nutrition signpost labeling shemes. London: FSA; 2009.
  • 12. Kelly B, Hughes C, Chapman K, Louie J, Dixon H, King L. On behalf of a collaboration of Public Health and Consumer Research Groups. Front-of-pack food labelling: Traffic light labelling gets the green light. Sydney: Cancer Council; 2008.
  • 13
    Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Portaria n. 27, de 13 de janeiro de 1998. Regulamento técnico referente à informação nutricional complementar. Brasília: Ministério da Saúde: 1998 [acesso 2008 nov 20]. Disponível em: <http://e-legis. anvisa.gov.br/leisref/public/showAct.php?id=97& word>
  • 14. World Health Organization. Preventing chronic diseases: a vital instrument. Geneva: WHO; 2005. WHO Global Report.
  • 15. Denker MA. Effects of cocoa butter on serum lipids in humans historial highlits. Am J Clin Nutr. 1994; 60:1014S-20S.
  • 16. Chiara VL, Silva R, Jorge R, Brasil AP. Ácidos graxos trans: doenças cardiovasculares e saúde materno-infantil. Rev Nutr. 2002; 15(3):341-9. doi: 10.15 90/S1415-52732002000300010.
  • 17. Jahns L, Siega-Riz AM, Popkin BM. The increasing prevalence of snacking among US children from 1977 to 1996. J Pediatr. 2001; 138(4):493-8.
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  • 19. Simon VGN, Souza JMP, Souza SB. Aleitamento materno, alimentação complementar, sobrepeso e obesidade em pré-escolares. Rev Saúde Pública. 2009; 43(1):60-9.
  • 20. Spinelli MGN, Goulart RMM, Santos ALP, Gumiero LDC, Farhud CC, Freitas EB, et al Consumo alimentar de crianças de 6 a 18 meses em creches. Rev Nutr. 2003; 16(4):409-14. doi: 10.1590/S1415-52 732003000400004.
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  • 24
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS), 2006. Brasília: Ministério da Saúde; 2008.
  • 25
    Brasil. Ministério da Saúde. Saúde Brasil 2007: uma análise da situação de saúde: perfil de mortalidade do brasileiro. Brasília: Ministério da Saúde; 2008.
  • 26. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de indicadores sociais - 2008. Rio de Janeiro: IBGE; 2008 [acesso 2008 dez 1]. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=1233&id_pagina=1>
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Anexo

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Abr 2011
  • Data do Fascículo
    Dez 2010

Histórico

  • Revisado
    04 Maio 2010
  • Recebido
    22 Jan 2009
  • Aceito
    05 Jul 2010
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