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Influência de intervenções educativas em perfis antropométricos, clínicos e bioquímicos e na percepção de saúde e doença de portadores de hipertensão arterial no contexto da Saúde da Família

Influence of educational interventions on the anthropometric, clinical, and biochemical profiles and perceived health and disease of patients with high blood pressure in the context of Family Health

RESUMO

Objetivo:

Analisar a influência de intervenções educativas nos perfis antropométricos, clínicos e bioquímicos, bem como na percepção de saúde e doença de portadores de hipertensão arterial sistêmica no contexto da Estratégia de Saúde da Família.

Métodos:

Estudo longitudinal, de intervenção e comparativo, realizado com portadores de hipertensão arterial sistêmica cadastrados e acompanhados pela Estratégia de Saúde da Família do município de Porto Firme, Minas Gerais, Brasil. Realizaram-se intervenções educativas, com duração de 12 meses, nas unidades de Estratégia de Saúde da Família e durante visitas domiciliárias. Analisaram-se dados socioeconômicos, hábitos de vida, cuidados de saúde, nível de apreensão e conhecimento sobre a hipertensão arterial sistêmica, percepção de saúde e doença, além das variáveis antropométricas, bioquímicas e clínicas, antes e após as intervenções.

Resultados:

Ainda que de forma discreta, foi possível perceber melhorias nas avaliações clínicas, bioquímicas e antropométricas. As variáveis índice de massa corporal (p=0,001), circunferência da cintura (p<0,001), glicose (p=0,011), colesterol total (p<0,001), lipoproteínas de alta densidade colesterol (p<0,001) e triglicerídeos (p=0,019) apresentaram diferenças estatisticamente significativas antes e após as intervenções. Os entrevistados mostraram incorporação de novos conhecimentos ao significado da hipertensão arterial sistêmica e a percepção de saúde e doença relacionou-se de forma mais importante com aspectos subjetivos da experiência vivencial e com a qualidade de vida em detrimento das questões biológicas e médicas.

Conclusão:

As intervenções educativas demonstraram importante potencial no enfrentamento da hipertensão arterial sistêmica ao promoverem alterações positivas nos perfis analisados; contudo, seu efeito tem forte relação com a continuidade das ações.

Palavras-chave:
Educação em saúde; Estratégia Saúde da Família; Hipertensão.

ABSTRACT

Objective:

To analyze the influence of educational interventions on the anthropometric, clinical, and biochemical profiles and perceived health and disease of individuals with high blood pressure in the context of the Family Health Strategy.

Methods:

This longitudinal, interventional, and comparative study included individuals with high blood pressure registered at and followed by the Family Health Strategy of the municipality of Porto Firme, Minas Gerais, Brazil. Twelve-month educational interventions were conducted in the Family Health Strategy facilities and during home visits. Socioeconomic characteristics, life habits, health care data, understanding and knowledge about high blood pressure, perceived health and disease, and anthropometric, biochemical, and clinical variables were analyzed before and after the interventions.

Results:

The clinical, biochemical, and anthropometric variables improved, albeit by not much. The interventions changed body mass index (0.001), waist circumference (p<0.001), blood glucose (p=0.011), total cholesterol (p<0.001), high-density lipoproteins cholesterol (p<0.001), and triglycerides (p=0.019) significantly. The interviewees demonstrated that they had incorporated new knowledge on the meaning of high blood pressure, and their perceived health and disease was more strongly related to subjective aspects of their life experience and quality of life than to biological and medical issues.

Conclusion:

The educational interventions proved to have a high potential to fight high blood pressure by promoting positive changes on the study profiles. However, their effect is strongly related to their continuous provision.

Keywords:
Health education; Family Health Strategy; Hypertension.

INTRODUÇÃO

A Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) é considerada um dos mais importantes problemas de saúde pública no mundo por sua alta prevalência, baixa taxa de controle e elevado custo econômico e social11. Sociedade Brasileira de Cardiologia, Sociedade Brasileira de Hipertensão, Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol. 2010; 95(1 Supl.1):1-51.. Embora seja considerada o principal fator de risco de morbimortalidade cardiovascular, cerebrovascular e renal, frequentemente é negligenciada pelo fato da maior parte do seu curso ser assintomática e sem consequências imediatas à suspensão do tratamento22. Miranda RD, Perrotti TC, Bellinazzi VR, Nóbrega TM, Cendoroglo MS, Toniolo Neto J. Hipertensão arterial no idoso: peculiaridades na fisiopatologia, no diagnóstico e no tratamento. Rev Bras Hipertens. 2002; 9(3):293-300..

Para o controle e prevenção das complicações da HAS, a proposição de uma terapêutica que consiga ser eficaz e viável em longo prazo tem se constituído um grande desafio para os profissionais que atuam na Atenção Primária à Saúde. A dificuldade de cooperação do portador de HAS torna a adesão ao tratamento ainda mais complexa, por envolver um amplo espectro de fatores individuais, familiares e institucionais33. Santos ZMSA, Frota MA, Cruz DM, Holanda SDO. Adesão do cliente hipertenso ao tratamento: análise com abordagem interdisciplinar. Texto Contexto Enferm. 2005; 14(3):332-40. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072005000300003
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,44. Gusmão JL, Mion JR. Adesão ao tratamento: conceitos. Rev Bras Hipertens. 2006; 13(1):23-5..

Nesse contexto, a adoção da Estratégia Saúde da Família (ESF) como política prioritária da Atenção Primária à Saúde no Brasil, devido à sua conformação e processo de trabalho, compreende as condições mais favoráveis para o desenvolvimento de estratégias de educação em saúde como forma de estímulo à responsabilização e ao autocuidado. Esse tem sido apontado como um caminho para o enfrentamento da problemática da adesão ao tratamento da HAS33. Santos ZMSA, Frota MA, Cruz DM, Holanda SDO. Adesão do cliente hipertenso ao tratamento: análise com abordagem interdisciplinar. Texto Contexto Enferm. 2005; 14(3):332-40. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072005000300003
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, mediante a incorporação de tecnologias leves55. Mehry EE, Chakkour M, Stéfano E, Stéfano ME, Santos CM, Rodríguez RA. Em busca de ferramentais analisadoras das tecnologias em saúde: a informação e o dia a dia de um serviço, interrogando e gerindo trabalho em saúde. In: Merhy EE, Onocko R, organizadores. Agir em saúde: um desafio para o público. São Paulo: Hucitec; 1997. p.113-50., extrapolando a ótica da simples prevenção das doenças para um conceito ampliado e positivo de promoção da saúde66. Cotta RMM, Reis RS, Carvalho AL, Batista KCS, Castro FAF, Alfenas RCG. Reflexões sobre o conhecimento dos usuários no contexto do Programa de Saúde da Família: a lacuna entre o saber técnico e o popular. Physis. 2008; 18(4):745-66. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-73312008000400008
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,77. Uchôa AC. Experiencias innovadoras de cuidado en Programa de Salud de la Familia (PSF): potencialidades y límites. Interface. 2009; 13(29):299-11. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-3283200900 0200005
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, como entendido na "VIII Conferência Nacional de Saúde"88. Brasil. Conselho Nacional de Saúde. VIII Conferência Nacional de Saúde. Relatório final. Brasília: Conselho Nacional de Saúde; 1986 [acesso 2016 jan 18]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/biblioteca/relatorios/relatorio_8.pdf.

Resgatando a discussão sobre saúde nos trabalhos de Mendes99. Mendes EV. Um novo paradigma sanitário: a produção social da saúde. In: Mendes EV. Uma agenda para a saúde. 2ª ed. São Paulo: Hucitec; 1999. e Cotta et al.1010. Cotta RMM, Campos AAO, Mendonça ET, Costa GD, Machado JC, Silva LS, et al. Políticas de saúde: desenhos, modelos e paradigmas. Viçosa: UFV; 2013., quando esta deixa de ser considerada apenas "ausência de doença" e passa a ser vista como o resultado de um processo de produção social o qual expressa a qualidade de vida de uma população, as ações educativas em saúde devem considerar, além dos sinais e sintomas das doenças, o impacto destas na funcionalidade dos indivíduos. Para isso, o entendimento de fatores sociais, psicológicos e ambientais que influenciam a rotina diária das pessoas ou sua participação nas mais diferentes esferas da sociedade1111. Câmara AMCS, Melo VLC, Gomes MGP, Pena BC, Silva AP, Oliveira KM, et al. Percepção do Processo Saúde-doença: significados e valores da educação em saúde. Rev Bras Educ Méd. 2012; 36(1 Supl.1):40-50. não pode ser ignorado. Diante disso, o objetivo do estudo foi analisar a influência de intervenções educativas nos perfis antropométricos, clínicos e bioquímicos, bem como na percepção de saúde e doença de portadores de HAS no contexto da ESF.

MÉTODOS

Estudo longitudinal, de intervenção e comparativo, realizado durante os meses de julho de 2012 a setembro de 2013, com portadores de HAS cadastrados e acompanhados pela ESF do município de Porto Firme, Minas Gerais. Para seleção dos participantes, foram adotados como critérios de inclusão: idade igual ou superior a 18 anos, ser portador de HAS sem acompanhamento nutricional e disponibilidade para participar de atividades em grupo. Os critérios de exclusão foram: presença de condições clínicas graves, gestação e histórico de alcoolismo e/ou uso de drogas ilícitas. Todos os portadores de HAS acompanhados pelo Sistema de Cadastramento e Acompanhamento de Hipertensos e Diabéticos (Hiper-dia) que se enquadravam nos critérios de seleção foram convidados a participar do estudo de forma voluntária.

As intervenções, que ocorreram durante um ano, aconteceram por meio de atividades mensais em grupo nas unidades de ESF e de visitas domiciliárias, também mensais. Em ambas as intervenções, o foco principal foi a educação alimentar e nutricional trabalhadas em práticas dialógicas, sendo estas planejadas e conduzidas pelos pesquisadores com participação de profissionais das equipes. A opção por esses dois tipos de intervenções se deu por serem estes os mais utilizados na prática da ESF local. Não houve perda de participantes no período do estudo.

A seleção dos interessados em receber visitas domiciliárias ocorreu por meio de sorteio e o número de pessoas a serem visitadas foi definido de acordo com a possibilidade de realização de acompanhamento domiciliar pelos investigadores. A definição do número mínimo de frequência nas atividades em grupo (N=8) baseou-se nos estudos de Ribeiro et al.1212. Ribeiro AG, Ribeiro SMR, Dias CMGC, Ribeiro AQ, Castro FAF, Suárez-Varela MM, et al. Nonpharmacological treatment of hypertension in primary health care: A comparative clinical trial of two education strategies in health and nutrition. BMC Public Health. 2011; 11:637. http://dx.doi.org/10.1186/1471-2458-11-637
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e Silva1313. Silva LS. Educação em nutrição e saúde: (re)significando a lacuna da adesão ao tratamento da hipertensão arterial no contexto da estratégia de saúde da família [monografia]. Viçosa: Universidade Federal de Viçosa; 2011 [acesso 2014 abr 1]. Disponível em: http://www.dns.ufv.br/?area=32, os quais constataram a insuficiência de cinco meses de intervenção na mudança de comportamento alimentar e hábitos de saúde.

As atividades nas unidades duravam, em média, uma hora, tinham formato de palestras dialogadas ou dinâmicas interativas e contavam com a utilização de recursos audiovisuais, como cartazes e vídeos, bem como demonstrações práticas. A definição dos conteúdos baseou-se em referências do Ministério da Saúde1414. Brasil. Ministério da Saúde. Plano de reorganização da atenção à hipertensão arterial e ao diabetes Mellitus: hipertensão arterial e diabetes Mellitus. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.

15. Brasil. Ministério da Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.
-1616. Brasil. Ministério da Saúde. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: hipertensão arterial. Brasília: Ministério da Saúde; 2013.. As temáticas trabalhadas foram: os aspectos gerais da HAS e medidas dietéticas para seu tratamento; consumo de lipídeos, açúcar e sódio; comorbida-des e fatores de risco cardiovascular relacionados à HAS; importância das frutas, verduras e hortaliças na alimentação; importância da atividade física para a redução/manutenção do peso corporal; como montar um prato saudável; o que é saúde; tipos de gordura e consumo adequado; árvore das soluções e abordagem do Desvio Positivo. No desenvolvimento desta atividade foram utilizadas metodologias ativas de educação, visando o estabelecimento de espaços críticos, participativos e de corresponsabilização entre os usuários e a equipe de saúde. O estímulo à interatividade e ao diálogo buscou captar as experiências dos membros dos grupos para favorecer não apenas a adequação das abordagens, mas, sobretudo, sua utilização.

As visitas domiciliárias, cujo direcionamento era adequado às necessidades identificadas em cada situação específica, duravam em média 45 minutos. O produto final das oficinas e das visitas, que era avaliar sua influência nos perfis antropométricos, clínicos e bioquímicos, bem como na percepção de saúde e doença de portadores de HAS, foi avaliado por meio de entrevistas.

Os dados sobre o perfil socioeconômico, hábitos de vida e cuidados de saúde foram coletados antes das intervenções, durante a primeira entrevista. As percepções sobre o significado da HAS, saúde e doença foram levantadas antes do início e após a finalização das intervenções. Em ambos os momentos, foram realizadas entrevistas semiestruturadas individualizadas.

Os dados antropométricos, clínicos e bioquímicos foram coletados antes da realização da primeira oficina e após a última, nas unidades de saúde. As pressões arteriais sistólica e diastólica foram aferidas mensalmente, durante atividades educativas. O peso foi obtido por meio de balança eletrônica, com capacidade de 150 kg e divisão de 50 gramas. A estatura foi aferida utilizando--se antropômetro portátil, de acordo com as técnicas propostas por Jellife1717. Jelliffe DBI. Evaluación del estado de nutrición de la comunidad. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 1968.. O índice de massa corporal foi calculado e classificado de acordo com os critérios da Organização Mundial da Saúde1818. World Health Organization. Physical status: The use and interpretation of anthropometry. Technical Report Series, nº 854. Geneva: WHO; 1995., para adultos, e Lipschitz1919. Lipschitz DA. Screening for nutritional status in the elderly. Prim Care. 1994; 21(1):55-67., para idosos. A circunferência da cintura foi aferida no momento da expiração por meio de fita inextensível posicionada no ponto médio entre a crista ilíaca e a face externa da última costela e classificada de acordo os pontos de corte propostos pela World Health Organization2020. World Health Organization. Obesity: Preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO Consulation on Obesity. Geneva: WHO; 1998..

Para a avaliação clínico-laboratorial, foram utilizados os resultados de exames séricos de colesterol total e frações (lipoproteínas de baixa densidade, lipoproteínas de alta densidade e lipoproteínas de densidade muito baixa), triglicerídeos e glicemia de jejum. As variáveis bioquímicas foram analisadas por meio de técnicas de rotina clínica. Os participantes foram orientados sobre o jejum de 12 horas. As técnicas e os critérios de classificação dos valores encontrados foram os de referência do único laboratório credenciado pelo município do estudo, sendo este também o responsável pela coleta e análise do material biológico. Já a pressão arterial foi classificada de acordo com os procedimentos e parâmetros das "VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão"11. Sociedade Brasileira de Cardiologia, Sociedade Brasileira de Hipertensão, Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol. 2010; 95(1 Supl.1):1-51..

Para a análise dos dados quantitativos, foi utilizado o software Sciences Statistical Package for the Social Sciences (SPSS Inc., Chicago, Illinois, Estados Unidos) for Windows (version 20.0). A normalidade e homogeneidade das variáveis foram avaliadas pelos testes de Kolmogorov-Smirnov e Levene. Para comparar as variáveis antes e após a intervenção, utilizou-se o Teste t pareado ou Teste de Wilcoxon, dependendo da normalidade da amostra. Para análise das variáveis nominais antes e após a intervenção, utilizou-se o Teste de McNemar. Considerou-se o nível de significância estatística de p<0,05.

Em relação aos dados qualitativos, as categorias de significados atribuídos à HAS e percepções de saúde e doença foram definidas de acordo com os núcleos de sentido emergentes das próprias falas dos sujeitos de pesquisa. Os diferentes aspectos da experiência de convivência com a HAS foram analisados segundo os paradigmas Flexneriano e da Produção Social da Saúde e discutidos de forma esquemática e gráfica, a exemplo dos trabalhos desenvolvidos por Ribeiro et al.2121. Ribeiro AG, Cotta RMM, Silva LS, Ribeiro SMR, Dias CMGC, Mitre SM, et al. Hipertensão arterial e orientação domiciliar: o papel estratégico da saúde da família. Rev Nutr. 2012; 25(2):271-82. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-52732012000200009
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, Dias et al.2222. Dias G, Franceschini SCC, Reis JR, Reis RS, Siqueira-Batista R, Cotta RMM. A vida nos olhos, o coração nas mãos: concepções e representações femininas do processo saúde-doença. Hist Ciênc Saúde Manguinhos. 2007; 14(3):779-800. http://dx.doi. org/10.1590/S0104-59702007000300006
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e Conde & Concha2323. Conde F, Concha G. La evolución de las representaciones sociales sobre la salud de las mujeres madrilenas-1993-2000. Rev Esp Salud Pública. 2002; (76):493-507.. A seleção dos diferentes significados e associações atribuídas à HAS em subespaços se deu, para delimitação dos dois paradigmas no eixo x e, no eixo y, para diferenciação das percepções dos entrevistados, de acordo com as características de cada paradigma, segundo Cotta et al.1010. Cotta RMM, Campos AAO, Mendonça ET, Costa GD, Machado JC, Silva LS, et al. Políticas de saúde: desenhos, modelos e paradigmas. Viçosa: UFV; 2013..

O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Viçosa, Protocolo nº 044/2012, em consonância com a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. Todos os participantes receberam informações sobre a pesquisa e, após anuência, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Segundo o Sistema de Informações da Atenção Básica (SIAB), no período analisado, o município registrava 697 portadores de HAS cadastrados2424. Brasil. Ministério da Saúde. Número de diabéticos, hipertensos e diabéticos com hipertensão por sexo, tipo e risco. Brasília: Ministério da Saúde; 2012 [acesso 2012 abr 1]. Disponível em: http://hiperdia. datasus.gov.br/, dentre os quais 292 eram acompanhados pelo Hiperdia. Divididos em grupos de 30 a 40 indivíduos, conforme microáreas de atuação de agentes comunitários de saúde, os pacientes eram atendidos em unidades de ESF por meio de consultas mensais. Os participantes deste estudo, que após a seleção somavam 212 portadores de HAS, correspondiam a 30,4% dos cadastrados no SIAB.

Entre os sujeitos analisados, 191 participaram das atividades educativas nas unidades e 21 receberam visita domiciliária mensal, além de participar dos grupos nas unidades. A maioria era do sexo feminino, com idade superior a 60 anos, casada, de baixa escolaridade e baixa renda. A maioria também não era tabagista ou fazia uso de bebidas alcoólicas (Tabela 1). 52,58% descobriram ser portadores de HAS há mais de 10 anos, após sentir algum mal-estar físico (53,58%) ou durante consulta de rotina (33,80%).

Tabela 1
Características socioeconômicas e de saúde dos portadores de hipertensão arterial sistêmica. Porto Firme (MG), 2012-2013.

Em relação às características antropométricas, clínicas e bioquímicas antes e após as intervenções educativas (Tabela 2), ainda que de forma discreta, foi possível perceber melhorias nos parâmetros avaliados. As variáveis índice de massa corporal (p=0,001), circunferência da cintura (p<0,001), glicose (p=0,011), colesterol total (p<0,001), lipoproteínas de alta densidade-colesterol (p<0,001) e triglicerídeos (p=0,019) apresentaram diferenças estatisticamente significativas antes e após as intervenções. Todavia, níveis inadequados de High Density Lipoprotein (HDL, Lipoproteína de Alta Densidade) e triglicerídeos também aumentaram após intervenções.

Tabela 2
Variáveis antropométricas, clínicas e bioquímicas dos portadores de hipertensão arterial sistêmica antes e após intervenções educativas. Porto Firme (MG), 2012-2013.

Em relação ao significado atribuído à HAS tanto antes (33,91%) quanto após o término das intervenções educativas (27,95%), os entrevistados não conseguiram construir em palavras um conceito de sua doença. Contudo, se antes das intervenções relacionavam a HAS a sinais e sintomas de alterações físicas e psicológicas inespecíficas, como "agitação", por exemplo, após as atividades educativas já conseguiam ampliar essa relação a aspectos cardiovasculares e alimentares, demonstrando incorporação de novos conhecimentos, conforme evidenciado na Tabela 3.

Tabela 3
Conhecimento de portadores de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) sobre o significado da enfermidade antes e após intervenções educativas. Porto Firme (MG), 2012-2013.

Quando questionados em relação à possibilidade de prevenção da HAS, 78,97% dos indivíduos concordaram com essa afirmação antes das intervenções e 83,49%, depois. Em relação às complicações ou intercorrências associadas ao descontrole da pressão arterial, os participantes do estudo citaram, antes e depois das intervenções educativas, derrame e infarto do miocárdio como principais eventos decorrentes da HAS.

A importância dos hábitos de vida para o controle da HAS foi reconhecida entre os entre-vistados, que associaram a elevação da pressão arterial ao consumo exagerado de sal, à alimentação inadequada e ao estresse (descrito como "nervosismo"), tanto antes quanto após as atividades educativas. Os participantes também citaram a alimentação adequada (49,3% antes das intervenções e 44,8%, após), o seguimento das orientações médicas (7,1% antes das intervenções e 5,9%, após) e a manutenção do equilíbrio emocional (8,9% antes das intervenções e 18,7%, após) como fatores principais para prevenção e controle da HAS.

No tocante à percepção de saúde e doença, esta relacionou-se de forma mais importante com os aspectos subjetivos da experiência vivencial e com a qualidade de vida, em detrimento das questões biológicas e médicas, conforme apresentado na Tabela 4. Para a percepção de saúde, as variáveis relacionadas aos sentimentos positivos e boas sensações, alimentação adequada e ausência de sinais e sintomas de mal-estar físico apresentaram diferenças estatisticamente significativas antes e após as intervenções. No que concerne à percepção de doença, as variáveis estatisticamente significativas foram necessidade de consulta médica e falta de perspectiva de vida.

Tabela 4
Percepções de saúde e doença entre portadores de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS). Porto Firme (MG), 2012-2013.

Em relação ao modo de convivência adotado para o enfrentamento da HAS, destaca-se que 23,4% dos entrevistados, antes das atividades educativas, e 27,5%, após as atividades, não efetuaram nenhum tipo de modificação em seus hábitos de vida depois de se descobrirem portadores da doença. Analisando as principais características discursivas dos participantes do estudo (Figura 1), percebe-se que tanto o significado atribuído à HAS quanto sua relação com a doença encontram-se em um processo de transição entre os dois paradigmas sanitários norteadores destacados.

Figura 1
Subespaços construídos a partir das percepções e experiências de portadores de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) frente à doença. Porto Firme (MG), 2012-2013.

O eixo x apresenta os significados positivos atribuídos à experiência de convivência com HAS, separados de acordo com as aproximações características de cada paradigma. No quadrante superior direito, as percepções são centradas em aspectos subjetivos, estilo de vida e autonomia, demonstrando a associação dessa experiência a uma perspectiva positiva da saúde. No quadrante superior esquerdo, as experiências, ainda que positivas, são orientadas a partir da doença e seu controle e focalizadas em aspectos biológicos e médico/medicamentosos.

Os quadrantes inferiores apresentam as percepções negativas da experiência de convivência com a doença. No lado esquerdo, a ênfase está nos aspectos incapacitantes da doença e na atuação médica curativa. No quadrante inferior direito, as experiências negativas relacionam-se com aspectos individuais e subjetivos. Dessa forma, embora a experiência de convivência com a HAS esteja associada de modo importante aos seus aspectos negativos (doença, morte, dor) e práticas médicas tradicionais, a preocupação com o estilo de vida e com o bem-estar aponta para essa transição.

DISCUSSÃO

Os achados deste estudo, no qual o perfil geral dos portadores de HAS (mulheres idosas, casadas, de baixa escolaridade e renda, não tabagista e não etilista) foi semelhante ao encontrado em outros trabalhos2121. Ribeiro AG, Cotta RMM, Silva LS, Ribeiro SMR, Dias CMGC, Mitre SM, et al. Hipertensão arterial e orientação domiciliar: o papel estratégico da saúde da família. Rev Nutr. 2012; 25(2):271-82. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-52732012000200009
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,2525. Manfroi A, Oliveira FA. Dificuldades de adesão ao tratamento na hipertensão arterial sistêmica: considerações a partir de um estudo qualitativo em uma unidade de Atenção Primária à Saúde. Rev Bras Med Fam Com. 2006; 2(7):167-76. http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc2(7)52
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,2626. Brito DMS, Araújo TL, Galvão MTG, Moreira TMM, Lopes MVO. Qualidade de vida e percepção da doença entre portadores de hipertensão arterial. Cad Saúde Pública. 2008; 24(4):933-40., mostraram indícios importantes a respeito dos efeitos de intervenções educativas na saúde de portadores de HAS. Ainda que discreta, a melhora nos perfis antropométricos, clínicos e bioquímicos após as intervenções demonstra o seu efeito positivo, bem como o potencial desse tipo de ação. Apesar disso, um longo caminho necessita ser trilhado na construção da consciência, autocuidado e adoção de práticas saudáveis.

À semelhança de outros trabalhos66. Cotta RMM, Reis RS, Carvalho AL, Batista KCS, Castro FAF, Alfenas RCG. Reflexões sobre o conhecimento dos usuários no contexto do Programa de Saúde da Família: a lacuna entre o saber técnico e o popular. Physis. 2008; 18(4):745-66. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-73312008000400008
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,2727. Dell'Acqua MCQ, Pessuto J, Bocchi SCM, Anjos RCPM. Comunicação da equipe multiprofissional e indivíduos portadores de hipertensão arterial. Rev Latino Am Enfermagem. 1997; 5(3):43-8. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11691997000300007
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28. Péres DS, Magna JM, Viana LA. Portador de hipertensão arterial: atitudes, crenças, percepções, pensamentos e práticas. Rev Saúde Pública. 2003; (37):635-42. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102003000500014
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200300...
-2929. Toledo MM, Rodrigues SC, Chiesa AM. Educação em saúde no enfrentamento da hipertensão arte-rial: uma nova ótica para um velho problema. Texto Contexto Enferm. 2007; 16(2):233-8. http://dx.doi. org/10.1590/S0104-07072007000200004
https://doi.org/10.1590/S0104-0707200700...
, observou-se dificuldade de conceituação da HAS por parte dos portadores da doença, bem como do significado individual de saúde e doença e da associação do conceito de doença à falta de perspectiva de vida. Embora os entrevistados não tenham conseguido formular um conceito concreto de HAS, na maioria das vezes associando a doença a sinais e sintomas de alterações físicas e psicológicas, após as intervenções foi possível perceber uma evolução na percepção para aspectos mais concretos e possíveis de atuação, como a sua relação com a alimentação.

Neste estudo, a maioria dos entrevistados demonstrou reconhecer a relação do estilo de vida com a prevenção e o controle da doença, relacionando não apenas fatores mais discutidos e reconhecidos, como alimentação inadequada, mas também fatores socioambientais, como o estresse, dado curioso quando se trata de uma realidade de cidade interiorana de pequeno porte. Ao contrário do achado de estudos como o de Câmara et al.11 e Siqueira et al.3030. Siqueira FV, Nahas MV, Faccchini LA, Silveira DS, Piccini RX, Tomasi E, et al. Fatores considerados pela população como mais importantes para manutenção da saúde. Rev Saúde Pública. 2009; 43(6):961-71. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-891020090050 00066
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, os entrevistados demonstraram compreensão pouco mais ampliada dos aspectos ligados a sua doença ao relacionar a importância do equilíbrio emocional, além da alimentação saudável, consultas médicas e abstenção de álcool e tabaco para a manutenção da sua saúde. Esse fato reforça o momento de transição da percepção das experiências entre os paradigmas sanitários Flexneriano e de Produção Social da Saúde.

Como citado anteriormente, a influência do Paradigma Flexneriano1010. Cotta RMM, Campos AAO, Mendonça ET, Costa GD, Machado JC, Silva LS, et al. Políticas de saúde: desenhos, modelos e paradigmas. Viçosa: UFV; 2013. ainda é muito forte na realidade dos participantes, o que é perceptível pela associação feita entre a doença e seus aspectos negativos, biológicos, curativos e medicamentosos. Não obstante, especialmente após as intervenções educativas, a saúde passa a relacionar-se de forma mais importante com seus determinantes sociais, estilo de vida e bem-estar. Neste estudo, a conjugação de cuidados médicos tradicionais a ações educativas permitiu aos portadores de HAS o reconhecimento do seu papel no controle da sua condição de saúde, o que é fundamentado no Paradigma da Produção Social, onde a saúde é tida como um produto social resultante de fatores econômicos, políticos, ideológicos e cognitivos.

A importância da superação do modelo biomédico por parte dos portadores de HAS reside na possibilidade do seu autoconhecimento como agentes promotores de saúde. Conquanto esteja em interação com outros agentes os quais influenciam e são influenciados pela realidade onde estão inseridos, esse reconhecimento pode estimular a superação da passividade e da resistência à adesão ao tratamento da HAS. Ademais, considerar os portadores de HAS em uma dupla dimensão, de agentes e coprodutores do processo de sua própria educação, pode levar a um cuidado ade-rente2929. Toledo MM, Rodrigues SC, Chiesa AM. Educação em saúde no enfrentamento da hipertensão arte-rial: uma nova ótica para um velho problema. Texto Contexto Enferm. 2007; 16(2):233-8. http://dx.doi. org/10.1590/S0104-07072007000200004
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e a práticas efetivamente emancipatórias e modificadoras da realidade.

Ainda que em outros trabalhos66. Cotta RMM, Reis RS, Carvalho AL, Batista KCS, Castro FAF, Alfenas RCG. Reflexões sobre o conhecimento dos usuários no contexto do Programa de Saúde da Família: a lacuna entre o saber técnico e o popular. Physis. 2008; 18(4):745-66. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-73312008000400008
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,2828. Péres DS, Magna JM, Viana LA. Portador de hipertensão arterial: atitudes, crenças, percepções, pensamentos e práticas. Rev Saúde Pública. 2003; (37):635-42. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102003000500014
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,3131. Carvalho F, Telarolli Junior R, Machado JCS. Uma investigação antropológica na terceira idade: concepções sobre a hipertensão arterial. Cad Saúde Pública. 1998; 14(3):617-21. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X1998000300019
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a consulta médica e o uso de medicamentos tenham sido mais comumente descritos como a principal forma de tratamento, neste estudo as respostas dos entrevistados indicaram a alimentação como o fator mais relevante tanto para a prevenção quanto para o controle da HAS, em especial após a intervenção. Conforme preconizado pelas "VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão"11. Sociedade Brasileira de Cardiologia, Sociedade Brasileira de Hipertensão, Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol. 2010; 95(1 Supl.1):1-51., concomitantemente à terapêutica medicamentosa, os indivíduos devem adotar um estilo de vida saudável, eliminando hábitos que constituam fatores de risco para a HAS. Contudo, é amplamente reconhecida na literatura11. Sociedade Brasileira de Cardiologia, Sociedade Brasileira de Hipertensão, Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol. 2010; 95(1 Supl.1):1-51.,33. Santos ZMSA, Frota MA, Cruz DM, Holanda SDO. Adesão do cliente hipertenso ao tratamento: análise com abordagem interdisciplinar. Texto Contexto Enferm. 2005; 14(3):332-40. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072005000300003
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,44. Gusmão JL, Mion JR. Adesão ao tratamento: conceitos. Rev Bras Hipertens. 2006; 13(1):23-5. a resistência dos portadores dessa doença à mudança de hábitos e estilos de vida, haja vista seu forte componente pessoal.

Reconhecidas como um importante instrumento de acesso ao conhecimento sobre o processo saúde-doença-adoecimento, as estratégias educativas visam aumentar a capacidade de controle sobre seus determinantes2121. Ribeiro AG, Cotta RMM, Silva LS, Ribeiro SMR, Dias CMGC, Mitre SM, et al. Hipertensão arterial e orientação domiciliar: o papel estratégico da saúde da família. Rev Nutr. 2012; 25(2):271-82. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-52732012000200009
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. As transformações dos conceitos de saúde/doença ao longo do tempo, especialmente após o advento da Reforma Sanitária e da "VIII Conferência Nacional de Saúde", possibilitaram que a educação em saúde passasse a ser vista como uma importante estratégia de transformação social, por sua capacidade de reorientar práticas e relações estabelecidas, quando assumida pelas equipes de saúde3232. Alves GG, Aerts D. As práticas educativas em saúde e a Estratégia Saúde da Família. Ciênc Saúde Colet. 2011; 16(1):319-25. http://dx.doi.org/10.1590/S14 13-81232011000100034
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.

Cunhada por Martins et al.3333. Martins PC, Cotta RMM, Siqueira-Batista R, Mendes FF, Franceschinni SCC, Priore SE, et al. Democracia e empoderamento no contexto da promoção da saúde: possibilidades e desafios apresentados ao Programa de Saúde da Família. Physis. 2009; 19(3):679-94. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-7 3312009000300007
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e inspirada nos trabalhos de Freire3434. Freire P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2007. e Sen3535. Sen AK. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000., a expressão empoderamento/libertação refere-se ao processo através do qual as pessoas ou comunidades adquirem maior controle sobre decisões e ações que afetem sua saúde, ampliando as possibilidades de controle dos aspectos significativos relacionados à sua própria existência. Dentro dessa concepção, considerar todas as dimensões de saúde relevantes para o indivíduo, sejam elas subjetivas ou objetivas, pode resultar em processos ativos de interpretação, auxiliando na superação da dificuldade de adesão vivenciada pelos portadores de HAS.

A complexidade dos sujeitos os quais utilizam os serviços de saúde, o que implica que os indivíduos não sejam limitados às expressões das doenças as quais possuem, relaciona-se diretamente com sua participação e conscientização do processo terapêutico, especialmente em contextos de tratamentos de longo seguimento3636. Brasil. Ministério da Saúde. Clínica ampliada e compartilhada. Textos Básicos de Saúde. Série B. Brasília: Ministério da Saúde; 2009.. Nesse cenário, associar ao tratamento convencional da HAS abordagens as quais possibilitem a incorporação e o reconhecimento de outros fatores além daqueles relacionados à doença em si, parece favorecer canais eficientes de comunicação, ponto central para a adesão dos portadores de doenças crônicas3737. Dias AM, Cunha M, Santos A, Neves A, Pinto A, Silva A, et al. Adesão ao regime terapêutico na doença crónica: revisão da literatura. Millenium. 2011; 40:20119., bem como para seu empoderamento/libertação.

Em resposta a essa demanda e buscando entender os indivíduos em seus diversos aspectos, considerando que o processo de "medicalização da vida" reduz a autonomia e aumenta a dependência ou a resistência ao tratamento, a Clínica Ampliada foi proposta como uma das diretrizes da Política Nacional de Humanização para qualificar o modo de se fazer saúde3636. Brasil. Ministério da Saúde. Clínica ampliada e compartilhada. Textos Básicos de Saúde. Série B. Brasília: Ministério da Saúde; 2009.. Entendida como a "transformação da atenção individual e coletiva, de forma que outros aspectos do sujeito, que não apenas o biológico, possam ser compreendidos e trabalhados pelos profissionais"3838. Cunha GT. A construção da clínica ampliada na atenção básica. São Paulo: Hucitec; 2005., esta consiste na articulação e diálogo de diferentes saberes para compreensão dos processos de saúde e adoecimento e na necessidade de inclusão dos usuários como cidadãos participantes das condutas em saúde, inclusive da elaboração de seu projeto terapêutico3636. Brasil. Ministério da Saúde. Clínica ampliada e compartilhada. Textos Básicos de Saúde. Série B. Brasília: Ministério da Saúde; 2009..

Em consonância com as diretrizes da Clínica Ampliada e resgatando Almeida et al.3939. Almeida ER, Moutinho CB, Leite MTS. A prática da educação em saúde na percepção dos usuários hi-pertensos e diabéticos. Saúde Debate. 2014; 38(101):328-37. http://dx.doi.org/10.5935/0103-1 104.20140030
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, para quem a educação em saúde promove mudanças perceptíveis no estilo de vida pela possibilidade de reflexão conjunta e pela busca por um caminho terapêutico adequado ao cotidiano do usuário, os grupos educativos podem ser ferramentas valiosas. Nestes, a valorização da escuta qualificada pode estimular a compreensão dos diversos saberes e competências que o usuário desenvolve acerca de sua doença, o que lhes traz autonomia e protagonismo3636. Brasil. Ministério da Saúde. Clínica ampliada e compartilhada. Textos Básicos de Saúde. Série B. Brasília: Ministério da Saúde; 2009.. Ademais, a valorização do trabalho em equipe na complementariedade do tratamento, que também pode ser efetivada nessas atividades, permite a ampliação do atendimento de diversas necessidades de saúde do usuário, para além do motivo da sua busca pelo serviço3636. Brasil. Ministério da Saúde. Clínica ampliada e compartilhada. Textos Básicos de Saúde. Série B. Brasília: Ministério da Saúde; 2009..

Embora o envolvimento ativo das pessoas, situação potencialmente vivenciada durante intervenções educativas, possa favorecer mudanças reais e a corresponsabilização, evitando o que Santos40 definiu como "desperdício da experiência", a simples realização destas não será determinante de mudanças de comportamento. É preciso que haja, também, um enfoque ideológico comprometido com a construção da autonomia e do autocuidado. Almeida et al.3939. Almeida ER, Moutinho CB, Leite MTS. A prática da educação em saúde na percepção dos usuários hi-pertensos e diabéticos. Saúde Debate. 2014; 38(101):328-37. http://dx.doi.org/10.5935/0103-1 104.20140030
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ressaltam que abordagens estruturadas na transmissão de informações inspiradas no higienismo e no condicionamento dos indivíduos apenas prescrevem normas de conduta, o que traz como consequência uma participação descaracterizada de seu objetivo principal, que é aprender.

Tendo em vista o perfil dos entrevistados (idade, escolaridade e nível socioeconômico), é possível afirmar que mais do que a realização, a continuidade das intervenções educativas é preponderante para a apropriação crítica e não apenas a memorização de conceitos e orientações. Embora em 12 meses tenha sido possível perceber melhoras na saúde geral e no controle da HAS, a descontinuidade pode se constituir forte limitador ao autorreconhecimento do portador de HAS como um agente promotor de sua própria saúde. Dessa forma, os resultados do presente estudo apontam para a necessidade de realização de investigações futuras, as quais busquem analisar os efeitos de intervenções educativas de longo prazo na construção e evolução da autonomia e responsabilização dos portadores de HAS frente ao tratamento da sua doença, auxiliando no enfrentamento da problemática da adesão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao promoverem alterações positivas nos perfis antropométricos, clínicos e bioquímicos dos participantes do estudo, as intervenções educativas demonstraram seu potencial no enfrentamento da HAS. A utilização de práticas empoderadoras também demonstrou seu efeito benéfico na superação da ideia de saúde como mera ausência de doença, ampliando os conhecimentos dos mesmos em relação à sua doença e ao autocuidado. Entretanto, a responsabilização e auto gerência do tratamento, caminhos imprescindíveis para a qualidade de vida e convivência harmoniosa dos portadores de HAS com sua condição de saúde, ainda se mostravam pouco desenvolvidos mesmo após as intervenções.

Por se tratar de um processo comportamental influenciado por diversos fatores, a adoção de hábitos de vida saudáveis em longo prazo representa um grande desafio, especialmente no controle da HAS. Ao mesmo tempo, a adoção de estratégias terapêuticas que envolvam fatores considerados não-clínicos, embora possa direcionar intervenções mais eficazes de controle da HAS, ainda é limitada pelas atuais relações vivenciadas rotineiramente nas unidades de ESF.

As intervenções educativas, se bem direcionadas, por funcionarem como catalisadores do processo de empoderamento/libertação podem criar ambientes favoráveis ao desenvolvimento do senso crítico e da conscientização sanitária. Entender o cuidado em saúde também em sua dimensão educativa pode constituir uma importante via de transformação e emancipação, auxiliando os indivíduos a fazerem escolhas conscientes e condizentes com o tipo de vida que escolheram valorizar.

Contudo, a construção de uma verdadeira relação terapêutica só se concretizará quando houver uma relação de corresponsabilização, construída através da valorização dos indivíduos como agentes conscientes do seu quadro de saúde e compromissados com sua qualidade de vida. Ademais, abrir espaços de produção de diálogo pode favorecer formas mais humanas e efetivas de interação, promovendo, assim, a construção de um fazer em saúde, não meramente técnico, mas comprometido com o projeto democrático do Sistema Único de Saúde.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    01 Jun 2015
  • Revisado
    25 Jan 2016
  • Aceito
    13 Abr 2016
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