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A associação nacional dos programas de pós-graduação em administração nas palavras de seus presidentes

DOCUMENTOS E DEBATES

A associação nacional dos programas de pós-graduação em administração nas palavras de seus presidentes

A idéia de solicitar aos Ex-Presidentes da ANPAD depoimento sobre o seu período de gestão não é original; surgiu da leitura do Boletim Informativo da CAPES de abril/junho de 1996. Acrescentou-se-lhe outra idéia, a de complementar os relatos sobre o passado com a visão do futuro imediato. Para tanto solicitou-se ao atual Presidente da Associação que discorresse sobre as perspectivas da sua gestão para o biênio 1997-98. O período de abrangência do passado é de vinte anos: de 1977 a 1996, que envolve todas as gestões findas. Julgou-se que seria matéria interessante para inaugurar a seção Documento da primeira edição da Revista de Administração Contemporânea. Depoimentos dessa natureza são importantes para resgatar a história da Associação em perspectiva privilegiada: a da interpretação particular de cada Ex-Presidente sobre fatos e experiências, sobre reflexões e convicções do seu tempo.

Sem dúvida a tarefa de puxar pela memória não é fácil, é de natureza seletiva e pode levar à adoção da perspectiva cronológica na tentativa de narrar acontecimentos. Torna-se difícil evitar que se misture hoje com ontem. O caráter subjetivo do envolvimento de cada um pode enviesar a interpretação, destacando o que foi realizado como sendo importante e minimizando ou ignorando o que não foi levado a cabo; depoimentos sobre experiências são carregados de emoções. Justamente essas características os tornam altamente relevantes. Revelam o que não pode ser extraído de fontes documentais. Apresentam a história viva da ANPAD.

O Editor

ARMANDO S. M. DA CUNHA (1977-1978)

São vinte anos completos de trajetória da ANPAD desde o seminário realizado na primeira semana de setembro de 1976, em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, com o propósito de avaliar o estágio da pós-graduação em Administração no país. O evento, organizado pela CAPES e pela Fundação Universidade-Empresa de Tecnologia e Ciência da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, contou com a presença dos coordenadores de pós-graduação em Administração das seguintes Universidades: Universidade de Brasília, Universidade Federal da Paraíba, Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPEAD), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas (EBAP e EAESP), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e Universidade de São Paulo, esta última incluindo o Programa de Mestrado em Ciências Contábeis. Participaram do encontro, também, representantes da FINEP, PNTE, CNPq, CFE, DAU/MEC, Fundação Ford, e Embaixada da França.

Cabe-me contribuir para este marco dos 20 anos contextualizando a ANPAD em sua fase inicial de atuação. A tarefa é de alto risco, quer pelo abuso inevitável da memória, quer pelas incertezas quanto à interpretação atual de uma situação pretérita. Por outro lado, confesso, sinto-me um tanto fascinado pela oportunidade de resgatar experiências vividas, com as quais sempre podemos aprender algo novo, num mundo tão cambiante, tão turbulento e veloz que, normalmente, não nos sobra tempo para tais reflexões.

O encontro de coordenadores de pós-graduação em administração em torno de uma mesa, em acolhedor e tranqüilo ambiente, na região serrana do Rio de Janeiro, foi uma provocação à análise do estágio em que se encontrava essa área acadêmica no Brasil. Dava-se início, de forma sustentada, ao esforço cooperativo e ao intercâmbio na área, em suas diferentes dimensões.

De qualquer forma, o início dessa busca de oportunidades para a ação coletiva, na pós-graduação em Administração, refletia os desafios singulares que os diferentes programas de Mestrado em Administração enfrentavam na época.

Para diminuir os riscos desse mergulho no tempo farei brevíssimas referências somente ao que se vivenciava no Curso de Mestrado em Administração Pública da Escola Brasileira de Administração Pública, da Fundação Getúlio Vargas (EBAP/FGV). O curso de Mestrado, que surgiu em sua versão inicial, em 1967, como o Programa Nacional de Aperfeiçoamento de Professores em Administração (PRONAPA), adotava, em 1974, novo conteúdo, considerado pela própria Escola como experiência nova e pioneira no Brasil, e talvez na América Latina. Tratava-se de enfatizar o estudo das Políticas Públicas (Public Policy), sem deixar de dar atenção ao estudo da Gestão (Management). Almejava-se uma formação que contemplasse capacidade de avaliação crítica e independente de opções, ao mesmo tempo que se proporcionava aos alunos um conjunto de instrumentos de análise e de intervenção. Nessa perspectiva, o Curso tornava-se mais acadêmico do que seria desejável para muitos. Tal opção, implicava reavaliar alguns elementos cruciais, como a definição do tipo de clientela a ser atendida pelo Curso, a quantidade e qualidade dos estudantes a serem recrutados, o financiamento do Curso, e a política de pesquisas a ser desenvolvida.

Sem dúvida, não eram triviais esses desafios que enfrentávamos na consolidação do Curso de Mestrado da EBAP/FGV. Certamente, todos os demais programas, considerando as vocações específicas, também lidavam com a necessidade de dar respostas adequadas e atempadas ao acelerado processo de mudança pelo qual passava a sociedade brasileira.

A interação mais constante entre os vários programas de pós-graduação em Administração, a partir da constituição da ANPAD, clarificava, já no biênio 1977-78, as grandes questões da área. A primeira que cumpre ressaltar tem que ver com a utilização mais racional dos escassos recursos disponíveis na época. Era preciso evitar a dispersão e buscar mais relevância dos programas de ensino e pesquisa em Administração, para que tivessem impacto no processo de mudanças em andamento no país. Como conquistar o reconhecimento e o apoio, por parte do governo e do empresariado, à função da pós-graduação em Administração como geradora de conhecimentos e de competências? Reconhecia-se que era imperativo concentrar para um melhor conhecimento sobre o Brasil, tanto sobre a atividade governamental, quanto sobre o contexto empresarial.

Na época da criação da Associação, era pouca a experiência acumulada com a educação em Administração em nível de pós-graduação, o que tornava pouco significativo qualquer esforço de avaliação das ações dos Programas de Pós-Graduação até então.

Uma das características marcantes da pós-gradução em Administração era o alto grau de diversidade e flexibilidade em relação aos formatos, conteúdos e produtos gerados pelos diferentes Programas. Era consenso que tal quadro deveria continuar a prevalecer nos anos seguintes.

Dentre outras, questões como a dicotomia ensino profissional vs ensino acadêmico nos Mestrados e a crescente importância da educação continuada na área, tinham destaque no entorno mais amplo da educação avançada em Administração no país.

Para finalizar essas notas faço a seguir referências ao esforço constitutivo da Associação, no que tange à forma e conteúdo.

Além da primeira reunião de Friburgo, mais duas foram necessárias para a formulação das decisões e dos atos finais de constituição da ANPAD. A segunda reunião, na FEA/USP, em 15-10-76, foi dedicada essencialmente à preparação do projeto de Estatutos. Na terceira, realizada na EBAP/FGV, no Rio de Janeiro, em 21-12-76, foram finalmente aprovados os Estatutos e escolhida essa Escola como Sede da primeira presidência da ANPAD.

Nas quatro Assembléias realizadas ao longo do biênio 77-78, foram contemplados assuntos que se percebiam como fortalecedores da construção da comunidade acadêmica da área: o folheto anual, com informações sobre os Cursos existentes; o teste básico de aptidão, a ser aplicado a todos os candidatos aos cursos de mestrado; a realização do Primeiro Encontro, em Porto Alegre, sobre o tema Conteúdo Curricular dos Programas de Pós-Graduação em Administração; a divulgação das pesquisas em andamento nos diferentes Programas; o aperfeiçoamento docente, através da cooperação ANPAD/CAPES; a realização do Segundo Encontro, em agosto de 1978, em João Pessoa, com o propósito de discutir as linhas de pesquisa desenvolvidas pelos Programas.

Sobre os elos institucionais buscados pela ANPAD em sua fase inicial cabe ressaltar o total apoio recebido da CAPES desde o início das articulações. Em 1978, de grande importância foi o acordo com a SEMOR/SEPLAN, viabilizando, inclusive, a realização do Segundo Encontro, em João Pessoa. A busca de suporte junto ao CNPq enfrentava dificuldades, uma vez que essa Instituição, com tradição de apoio a projetos na área tecnológica, estava ainda muito timidamente voltada para as Ciências Sociais, tendo publicado na época um documento da série Avaliação e Perspectivas, sobre a área da Administração.

Foram esses, em síntese, os passos iniciais na busca de ação mais coletiva na área da pós-graduação em Administração no Brasil.

Nos três encontros preliminares ocorridos a partir de setembro de 1976 e nas quatro Assembléias Gerais realizadas no biênio 77-78, lá estavam Eduardo Vasconcelos (FEA/USP), Adalberto Fischman (FEA/USP), Carlos Osmar Bertero (EAESP/FGV), Paulo Cesar Motta (PUC-RJ), Paulo Mattos de Lemos (COPPEAD/UFRJ), Volnei Alves Correa (UFRGS), Wilson Guedes Marinho (UFPB), Paulo Vieira da Silva (UnB), Eliseu Martins (Contabilidade/USP), João Batista Peret (UFMG), Darcy Closs (CAPES), Laura Dantas (IUPERJ), sempre correndo o risco de aqui estar omitindo outros nomes. Todos foram cúmplices desde os primeiros momentos, na formatação e na implementação de uma boa idéia, como o passar desses anos está demonstrando.

No final do primeiro biênio, marcado por extraordinário esforço cooperativo, essencial para suplantar as dificuldades iniciais de implantação da Associação, estávamos todos, creio, convictos de que era fundamental somar experiências, recursos, partilhar das incertezas, complexidades e perplexidades associadas com a evolução da educação avançada em Administração no país. Buscava-se, solidariamente, soluções próprias, no sentido de serem desenvolvidas pelos Programas, em processo de permanente discussão, a partir do conhecimento da realidade brasileira, dentro de ampla cooperação e processo de trocas com o exterior.

VOLNEI ALVES CORRÊA (1979-1980)

Quando assumimos a direção da ANPAD, em substituição ao professor Armando Cunha, seu primeiro Presidente, nosso único trabalho foi procurar transformar as idéias iniciais, verdadeiros sonhos de um grupo de idealistas, em realidade.

As idéias surgiram nas dependências da CAPES, quando na qualidade de consultores do MEC, um grupo de professores, em sua maioria Coordenadores de Cursos de Pós-Graduação em Administração, procuravam soluções para aprimorar o ensino e a pesquisa, nesta área que apenas engatinhava, tentando levantar-se para seus primeiros passos.

As idéias eram muitas, destacando-se entre elas a necessidade de encontros nacionais para discutir os grandes temas nas áreas de ensino e pesquisa. Nosso temor, naqueles dias, era de que a crescente demanda pelos cursos acabasse transformando-os em mera graduação melhorada, perdendo sua primordial função, a de preparar novos docentes e pesquisadores.

A realização dos encontros criou uma nova necessidade. Nos encontros seriam apresentados trabalhos; por que então não se criar uma Revista, na qual os professores da área tivessem espaço para a divulgação de suas idéias? Já existiam as Revistas da EBAP e da USP, mas queríamos algo mais específico, que funcionasse como instrumento de divulgação das pesquisas realizadas tanto pelos professores como pelos alunos dos diferentes cursos.

Outro sonho era a criação de um teste de seleção nacional, no qual os candidatos se inscreveriam na sua sede, mas teriam a opção de escolher, dentre todos os programas oferecidos, aquele que mais lhe agradasse.

Já naquela época nossa preocupação primordial era com a qualidade dos serviços a serem oferecidos a uma comunidade extremamente necessitada, mas também extremamente exigente.

Esta comunidade, formada por dois segmentos bem caracterizados, eram as próprias universidades e as organizações em geral. Assim os cursos deveriam dar prioridade à formação de docentes para atuar nos cursos de graduação, sem esquecer o desenvolvimento de pesquisas. Contudo, esses professores não poderiam ficar distantes da realidade; teriam de atuar, de forma objetiva, nas organizações, tanto públicas quanto privadas. Essa proximidade oferecia grande risco, pois os salários oferecidos pelas empresas eram mais atraentes do que os oferecidos pelas Instituições de Ensino Superior.

Nesse sentido pautamos nossa atuação à frente da ANPAD, procurando garantir recursos para os programas. Tivemos o importante apoio da CAPES que juntamente com a FINEP eram os grandes financiadores da pós-graduação. Pleiteávamos bolsas para todos os alunos de dedicação exclusiva, buscávamos fontes de financiamento para a pesquisa.

Outra ação efetiva foi a realização do primeiro Encontro Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração para discutirmos as políticas de ensino e pesquisa adotadas nos diferentes programas.

Foi realizada a primeira tentativa de unificar os testes de seleção entre a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGA) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPEAD).

Passados todos estes anos, vejo que a maioria das idéias, verdadeiros sonhos, são agora pura realidade. O que nos levou ao ponto em que estamos? Como conseguimos transformar idéias e sonhos em ações concretas e objetivas? Creio que foi a superação do medo de realizar, a busca do novo, a quebra de antigos paradigmas.

Nesse sentido, gostaríamos de terminar essa nossa apresentação com um ensinamento indígena. Para os índios existem duas regras básicas para se enfrentar os medos, que são:

1º - Não tenha medo das coisas pequenas.

2º - Todas as coisas são pequenas.

O que nos parecia grande demais, quase impossível de ser vencido, nada mais é hoje do que pequeno desafio, plenamente superado com a união de todos.

EDUARDO VASCONCELLOS (1981-1982)

A área de administração no país continuava seu processo de consolidação. Pouco a pouco as empresas aumentavam a procura por graduados em administração para cargos gerenciais, reduzindo gradualmente a procura por advogados, engenheiros e economistas para essas funções. O número de cursos de graduação em administração cresceu muito, aumentando a demanda por docentes e exigindo ampliação dos cursos de pós-graduação. Este aumento foi facilitado pelo custo relativamente baixo da implantação.

A ANPAD teve contribuição muito importante neste processo. A CAPES, o CNPq e outras agências passaram a envolver mais a ANPAD nos processos decisórios por reconhecerem sua representatividade perante a comunidade acadêmica. Além disso, a associação contribuiu de forma significativa na discussão de padrões de excelência, criando estímulos e metas tanto para os cursos mais consolidados como para aqueles em formação. Outro benefício proporcionado pela ANPAD foi o aumento da integração entre os vários cursos, pelo encontro periódico dos seus coordenadores. Isso facilitou o intercâmbio de alunos e, até certo grau, o de docentes.

Naquela época o clima reinante na ANPAD era altamente positivo. Muitos coordenadores de cursos de pós-graduação eram os mesmos que criaram a associação, o que contribuiu para atitudes de cooperação e camaradagem. A sucessão da Presidência era realizada de forma tranqüila, seguindo rodízio entre os vários programas e sem competições acirradas.

Os encontros anuais proporcionavam trocas de conhecimento, criavam integração entre pesquisadores das várias áreas e aumentava o volume de publicações e pesquisas em administração.

Muitos desafios não foram vencidos durante minha gestão como Presidente , ficando para os que me sucederam. O intercâmbio de docentes nunca foi realizado com a intensidade necessária, assim como pesquisas multi-regionais que integrassem pesquisadores de vários programas. Tais ações eram sempre discutidas com entusiasmo durante os encontros mas não foram viabilizadas naquela época.

Hoje, após esses anos de acompanhamento das atividades da ANPAD, estou certo de que ainda há muito que se realizar; entretanto, as contribuições da associação falam por si. A ANPAD constitui empreendimento de sucesso, com enorme potencial para fortalecer a área de administração no Brasil. Tenho orgulho e satisfação de ter participado da sua criação e de ter oferecido pequena parcela de contribuição para esse resultado. Tenho certeza de que as gerações atuais e as futuras levarão adiante esse esforço de forma ainda mais competente.

ROBERTO COSTA FACHIN (1983-1984)

Lembramos termos concorrido à presidência da ANPAD após a gestão do Eduardo Vasconcellos, da FEA/USP. A ANPAD ainda estava em seu início. Tínhamos nós participado de encontros anuais da ANPAD, além de encontros dos coordenadores dos programas associados (é importante mencionar que exercemos a coordenação do PPGA/UFRGS, durante dois mandatos: 79-80 e 81-82 e foi durante o segundo mandato que concorremos e assumimos a presidência da ANPAD. No processo de proposição de nossa candidatura conseguimos a contribuição da Profª. Drª. Eunice Lacava Kwasnicka, da FEA/USP, para a Secretaria Executiva da ANPAD, sustentáculo valioso durante toda a gestão.

Lembramo-nos de que entre nossas preocupações iniciais estavam as de envolver todos os coordenadores de cursos, que compareciam às assembléias gerais, no diagnóstico da situação da ANPAD e no plano de atividades a ser desenvolvido. As assembléias gerais a que nós comparecíamos, como coordenador de curso, eram demasiado curtas (um dia, no máximo) e não havia tempo hábil para um debate minimamente conseqüente, sequer para um plano de atividades. Na primeira assembléia de coordenadores, o que consideramos um sucesso, nos reunimos por dois dias, possibilitando tal discussão e o planejamento de atividades.

Dentro do planejamento de atividades, algumas experiências e percepções da conjuntura vivida pela ANPAD influenciaram o plano de atividades que acabamos por desenvolver. Vínhamos nós de visitas a muitos programas, no afã de preparar o documento da área de Administração para o Avaliação & Perspectivas - 1982 - Ciências Sociais Aplicadas, vol. 8 (Brasília, Seplan/ CNPq, 1983, p. 27-68). As perplexidades vividas pelos membros da comunidade de Administração estavam bem presentes. Por outro lado, termos estado presente num dos encontros anuais da ANPOCS levou-nos a refletir um pouco mais sobre a estrutura de nossos encontros anuais e a propor mudanças.

Como se estruturavam, então, os encontros anuais? A comunidade de participantes era reduzida; compulsando os Anais da 4ª reunião anual da ANPAD (1980) verificase a apresentação de painéis e de 16 trabalhos . De ano a ano se experimentava um formato julgado mais adequado. Lembramo-nos de que em uma das reuniões anuais ouviram-se trabalhos num grande auditório, em períodos de cinco (sic!) minutos, reunindo contribuições de diferentes origens - marketing, organizações, formação e treinamento de administradores, e outras. Obviamente não havia condições de debate, não só pelo tempo alocado, como devido às diferenças nas preferências acadêmicas dos participantes.

Era nossa convicção que urgia criar condições para que pessoas de orientações profissionais semelhantes se reunissem para discutir trabalhos e tal reflexão nos levaria a estruturar grupos homogêneos, mais ou menos à semelhança, embora ainda distante, do que se fazia na ANPOCS: constituição de grupos de estudo que se comunicavam durante o ano e que apresentavam os resultados dos trabalhos de pesquisa no encontro anual. Surgiu daí a reorganização dos encontros anuais, a partir de linhas temáticas, que, felizmente, a partir de nossa gestão, foram mantidas pelos que nos sucederam, com ampliação do modelo. E, também criou-se a categoria de coordenadores de temas, que faziam a seleção dos trabalhos a serem apresentados e coordenavam, durante a reunião, o encontro dos interessados naquela área. Além da figura de coordenadores de temas, buscamos ampliar o espaço de apresentação - não mais apenas cinco minutos. Na VIII Reunião, realizada em setembro de 1983, em João Pessoa, o encontro foi estruturado em 6 linhas temáticas: Gestão e Participação, Gestão Tecnológica, Pequena e Média Empresa, Pesquisa em Administração, Responsabilidade Social da Empresa e Administração Pública, com 31 trabalhos apresentados.

A divulgação dos encontros anuais, em anais, nem sempre com o cuidado editorial devido, por falta de recursos e de infraestrutura, levou-nos a procurar a Revista de Administração de Empresas da EAESP/FGV, para publicar um número especial com os anais do encontro. Graças à compreensão do Diretor da Escola, Prof. Dr. Carlos Osmar Bertero, publicou-se um número especial da RAE (v.24, n.4, out./dez. 1984), que esperávamos constituísse o embrião de uma publicação sistemática, tipo Proceedings com o devido cuidado editorial. Note-se a dificuldade que se tinha para publicar anais no momento do encontro. No VIII Encontro (1984) realizado em São Paulo, como parte das comemorações do cinqüentenário da USP, não tivemos condições de realizar os anais com a mesma qualidade gráfica e editorial, mas alguns trabalhos também ganharam espaço em número especial da Revista de Administração da USP. Hoje, vemos com satisfação a publicação, pela ANPAD, da Revista de Administração Contemporânea.

Preocupava-nos, também, verificar que os encontros da ANPAD apresentavam a tendência de reunir pesquisadores mais jovens, enquanto os mais antigos e respeitados membros da comunidade não se faziam presentes. Era necessário criar condições para tal: surgiu-nos a idéia de termos papers convidados em que se buscasse a contribuição de senior professors. Algumas das áreas aceitaram tal proposição, mas nem todas. Continuamos achando que tal deva ser ainda uma postura que cumpre incentivar.

Na esteira de continuidade de algumas iniciativas anteriores, procuramos estimular a criação de encontros menores, concentrando pesquisadores de uma área em torno de alguma temática, para permitir discussão aprofundada. Foi assim que, contando com a colaboração da Fundação Fulbright e CNPq, realizamos, em Gramado (RS), em junho de 1984, encontro sobre Teoria Administrativa e Organização Universitária, com reduzido número de participantes, selecionados segundo a temática de suas pesquisas. Temos certeza de que aqueles que dele participaram recordam com especial satisfação o evento, não só pela qualidade da participação, como pelo ambiente íntimo que o encontro propiciou. O evento ficou registrado em número especial da Revista Brasileira de Administração da Educação (v.2, n.2, jul./dez. 1984), órgão da ANPAE.

Outras modificações ocorreram durante a gestão, entre elas a gestação do novo esquema directivo, no bojo do processo sucessório, com a criação das diretorias científica e administrativa e a eliminação da figura do Secretário Executivo.

Esperamos que as relembranças desse período, fundadas na memória que é naturalmente seletiva, ajudem os membros da comunidade anpadiana, hoje acostumados a participar dos mega-encontros, a perceber não só as dificuldades enfrentadas nos primórdios da nossa Associação como as evoluções ocorridas. É nossa convicção de que a melhor contribuição de nossa gestão foi ter modificado o formato da Reunião Anual, permitindo alcançar, o que foi consolidado nas gestões seguintes, "a concentração dos artigos e ensaios em temas ou linhas de pesquisa que extravasam o interesse de uma só instituição de pesquisa e que representam preocupações que perpassam mais de um programa de pós-graduação" com isso "favorecendo o intercâmbio de idéias entre pesquisadores com preocupações semelhantes, o que não era facilitado pela estrutura dada aos Encontros anteriores" (Apresentação. RAE 24 (4:5), out./dez. 1984).

ROBERTO VENOSA (1985-1986)

Durante muito tempo a ANPAD foi uma associação dependente dos programas de pós-graduação em administração que promovia encontros anuais. Até mesmo o teste de admissão para o Mestrado e para o Doutorado se realizava por iniciativa de alguns programas, sem controle da ANPAD. Certo ou errado, não é necessário entrar no mérito: Era assim. Em 1984 vários professores dos mais diversos programas de pós-graduação reuniram-se e delinearam um projeto de uma ANPAD supra partidária, que coordenasse as atividades da área de Administração. Procurava-se uma arquitetura que retirasse da ANPAD a aparência de um Elmo de Mambrino. Projeto difícil, porém não impossível. Certo não se poderia incluí-los em nenhuma lista de deserdados do espírito, mas, ainda lembrando o velho Machado, a estes idealistas/pragmatas poder-se-ia aplicar adequado labéu: Dragões do Nada. Nada havia, tudo estava por construir. Em primeiro lugar, deveria ser articulado um programa que ultrapassasse os dois anos de mandato. Em segundo lugar, a força política deveria reunir mais que alguns poucos e de preferência vários muitos. Era preciso determinação, legitimidade, capacidade de articulação, representatividade regional, peso específico nos respectivos programas e propensão para agir em grupo. Em princípio, era um projeto para no mínimo seis anos. Decorrido este prazo, far-se-ia uma avaliação. De substantivo buscava-se maior estabilidade com previsibilidade de recursos para os encontros anuais, uma carta de princípios ainda que não escrita, maior poder de barganha junto às demais áreas, maior capacidade de orquestração com os organismos oficiais tais como CAPES, CNPq, FINEP, FAPESP, e outros, redefinição de prioridades, posicionamento em relação ao Teste de Seleção. Os anos de 1985-86 foram difíceis porém gratificantes. Com toda certeza o trabalho dedicado e competente da Diretoria Científica e o profissionalismo da Diretoria Administrativa permitiram concluir o mandato com saldo positivo. Sempre é mais difícil começar. Contamos com a colaboração de praticamente todos os envolvidos. Promovemos dois Encontros muito bem sucedidos em Belo Horizonte e Florianópolis. Hoje podemos afirmar que possuímos uma ANPAD da qual nos sentimos honrados, qualquer que seja o critério usado para se aferir sucesso. As Diretorias que nos sucederam fizeram, com competência, muito mais e contribuíram decisivamente para a ANPAD atual. Só podemos nos orgulhar de um pouco: Começamos.

CLÓVIS L. MACHADO-DA-SILVA (1987-88)

A minha primeira eleição como Presidente da ANPAD deu-se no bojo de projeto mais amplo que visava a tornar a Associação mais visível e significativa no contexto científico e tecnológico brasileiro. Na época, diversas associações científicas estavam consolidadas e várias outras, criadas recentemente ou nem tanto, procuravam alargar o seu nível de aceitação institucional. A Administração, como área de conhecimento e ação, muitos diriam mais de ação que de conhecimento, encontrava dificuldades para lograr ampla legitimidade institucional em contexto no qual era visualizada como composta de profissionais aprisionados pelo mercado e, portanto, sem o necessário distanciamento, para não dizer capacidade analítica, para a produção substantiva de conhecimento científico. Quase sempre ignorada em função desse possível aprisionamento, à ANPAD e aos representantes da comunidade acadêmica de Administração nas agências de fomento, cabia espaço reduzido em foros como CNPq, CAPES, FINEP e SBPC.

Apesar de esse projeto de longo prazo ter sido a base em que se apoiou a gestão do Professor Roberto Venosa (1985-86), época em que eu ocupava a posição de Diretor Científico, o seu embrião encontra-se na origem da ANPAD e foi gradualmente tomando corpo nas gestões de Armando Cunha, de Volnei Alves Corrêa, de Eduardo Vasconcellos e de Roberto Costa Fachin. Cada um no seu tempo e no seu modo, todos contribuíram significativamente para o projeto que se delineou fortemente a partir de 1985. Mais do que a título de ilustração, chamo a atenção para a relevante modificação que teve início a partir de 1983: a organização dos encontros anuais da Associação em torno de áreas temáticas, com coordenadores encarregados de alavancar os temas escolhidos. Nessa época, ao coordenar o tema Pesquisa em Administração, passei a me envolver mais efetivamente com a ANPAD.

Os temas que deram início à nova forma de organização dos encontros anuais da ANPAD refletiam preocupações de professores individualmente ou de grupos de pesquisa, na sua maioria em estágio ainda incipiente, em virtude da baixa ordenação dos programas em torno de linhas de pesquisa e da pequena inserção do corpo docente na atividade sistemática de investigação científica. Diante de tais circunstâncias, não constitui surpresa a descontinuidade da maioria dos temas de 1983 e 1984; apenas dois sobreviveram: 1) Administração de Ciência e Tecnologia, que garantiu a sua permanência com base em trabalhos de grupos de pesquisa com produção científica sistemática e consistente; 2) Administração Pública, mais como área de aplicação em luta permanente pelo seu espaço, uma vez que, diferentemente da sua inserção em departamentos de ciência política, em países como os EUA, foi instituída no Brasil em escolas de administração, o que lhe confere certa crise de identidade com evidentes implicações - de um lado vem captando trabalhos, nos encontros anuais, que poderiam ser perfeitamente classificados nas áreas temáticas de Organizações ou de Recursos Humanos e, de outro, pode gerar perspectivas privilegiadas para o estudo de várias questões de seu campo, como, por exemplo, a referente às novas configurações da relação entre o público e o privado nestes tempos da globalização da economia e dos mercados.

No biênio 1987-88, além desses dois temas, sete outros integram a programação dos encontros anuais: a) aqueles ligados às areas funcionais da Administração (Recursos Humanos, Marketing, Finanças e Produção) que parecem atuar positivamente no sentido de orientar o processo de organização do conhecimento da forma como se segmentam nos programas de pós-graduação, mas, ao mesmo tempo, acabam tendo certas implicações negativas pela inevitável indução à delimitação desses conhecimentos; b) Administração da Informação que surgiu, no início timidamente, como resposta às novas necessidades decorrentes da evolução sem precedentes da tecnologia nesse campo, e que se vem firmando pela produção crescente de profissionais e grupos de pesquisa; c) Organizações, com aumento quantitativo e evolução qualitativa constante, a partir de trabalhos cada vez mais analíticos, na caminhada para se firmar como campo legítimo de conhecimento nos moldes dos estudos organizacionais no exterior, livrando-se, gradualmente, do estereótipo de que sob o seu manto tudo cabe, na tentativa de alguns de acharem uma sucessora para a administração geral, que tanto conforto propiciou (e até certo ponto ainda propicia em instituições na contramão do processo de conhecimento), quando havia dificuldades de classificação, ou interesse estratégico em não categorizar, e a facilidade de acesso ao porto seguro de uma vala comum; d) Formação e Treinamento de Administradores que se vem mantendo com trabalhos conjunturais, mais pela tradição do que mediante razões substantivas, não conseguindo se firmar como área que mereça atenção sistemática de grupos de pesquisa - como o futuro vai demonstrar, a tendência é trabalhar de forma pontual com esse tema, em mesas-redondas especialmente delineadas para atender a pressões contextuais aqui e acolá. Cabe também uma palavra sobre Administração Rural, tema que não foi considerado no encontro anual de 1988, mas que integrou a programação dos ENANPADs em anos anteriores e posteriores; com a nova denominação de Administração Rural e Agroindustrial retornou à lista de áreas temáticas em 1994 e vai-se sustentando com dificuldades: vale a pena insistir na sua manutenção em face da sua importância no contexto do desenvolvimento brasileiro; acredito que a ANPAD deveria ir ainda um pouco mais longe, atuando junto à CAPES e ao CNPq, no sentido de reforçar o apoio aos grupos de pesquisa existentes e obter recursos adicionais com o objetivo de induzir a formação de novos pesquisadores nessa linha temática.

Até aqui dei certa ênfase à questão das áreas temáticas nos encontros anuais; tal destaque decorre de duas constatações: 1) o encontro anual, principal evento acadêmico da ANPAD, é o locus em que os membros da comunidade acadêmica (alunos, professores e demais profissionais interessados) passam a se conhecer, interagem social e profissionalmente, trocam idéias, submetem-se à avaliação crítica dos seus pares, enfim assentam as bases do necessário intercâmbio científico e técnico que constitui o fundamento do desenvolvimento da Administração como campo de conhecimento e ação; 2) as áreas temáticas propiciam o necessário focus para organização do encontro anual, agregando trabalhos resultantes de pesquisas e de reflexões dos profissionais que atuam, em especial nos programas de pós-graduação em Administração; elas induzem a produção científica de pesquisadores e a instituição de linhas e grupos de pesquisa, ao mesmo tempo que representam o que se produz nesses programas em razão da sua segmentação em subáreas; em suma, elas estruturam a Administração enquanto campo de conhecimento e são estruturadas pela forma em que se divide esse campo de conhecimento em subáreas, em linhas e grupos de pesquisa nos programas de pós-graduação. Desta forma refletem as articulações, as contradições, as limitações e as possibilidades da Administração, como ciência e como técnica, no país.

A relevância de se falar sobre o encontro anual e sua forma de organização reside na evidência de que é a partir do crescimento e evolução acadêmica desse evento que a ANPAD consegue firmar-se como entidade representativa da área e ampliar a sua legitimidade institucional. Só para se ter breve idéia: com aproximadamente 20 trabalhos/comunicações em 1983, em cada ano cresceu o número de papers submetidos e selecionados; em 1988, quase cinco vezes mais: 93 trabalhos foram escolhidos. Tal aumento quantitativo, que se fez acompanhar de evolução qualitativa, decorreu do crescente amadurecimento do processo de expansão da pós-graduação stricto sensu em Administração no país que, poucos antes, se restringia basicamente ao eixo São Paulo-Rio de Janeiro. Um indicador: em 1987 três programas de mestrado, de fora desse eixo, alcançaram pela primeira vez o conceito A na avaliação da CAPES, sobretudo pela elevação do nível de qualificação docente e pelo aumento da produção científica.

Nesse contexto de uma comunidade mais ampla, mais madura e mais exigente é que, entre outros, se conseguiu: a) trazer o teste de seleção, iniciativa isolada de alguns programas, para o abrigo da ANPAD em 1987 - sob a égide da Associação criou-se o TSANPAD e ampliou-se o número de programas participantes; b) realizar dois encontros anuais significativos, um no Rio de Janeiro e outro em Natal, com níveis de freqüência e de qualidade acima de quaisquer expectativas para a época; c) organizar palestra com o Presidente do CNPq, durante o evento em 1987, sobre Políticas de Pesquisa na Pós-Graduação, e com o Presidente da CAPES, em 1988, sobre Pós-Graduação no Brasil; d) interagir de maneira mais intensa com a CAPES e o CNPq, principalmente por meio de reavaliação qualitativa da colaboração com os representantes da área de Administração nessas agências de fomento, reforçando a articulação e preservando a independência de atuação de cada um; e) entregar aos participantes, pela primeira vez no momento de inscrição ao próprio evento (ENANPAD de 1988, em Natal-RN), os Anais completos do congresso.

Outras ações do período 1987-88 poderiam ser enumeradas. É detalhe. O que importa é que se deu continuidade, com certo grau de sucesso, ao projeto de ampliar a legitimidade institucional da ANPAD no contexto científico e tecnológico brasileiro. Tal projeto continuou na gestão seguinte e nas outras que se seguiram. Com acertos e com erros, é verdade. Felizmente mais acertos do que erros e o esforço de pessoas construtivas, em especial a grande maioria dos Coordenadores de Programas, bem representadas na competência e na dedicação de meus colegas de diretoria: Professora Suzana Braga Rodrigues e Professor Paulo Fiúza Bocáter.

SUZANA BRAGA RODRIGUES (1989-1990)

A tarefa de falar sobre a ANPAD apenas nos dois anos em que fui Presidente (1989-90) me pareceu a princípio uma tarefa difícil, para não dizer impossível. Primeiro, porque não consigo apagar completamente os quatro anos anteriores em que pertenci à diretoria como Diretora Administrativa (1985-86) e depois como Diretora Científica (1987-88), nem é possível ignorar a minha experiência em outros papéis, como participante e apresentadora de trabalhos, pois é a partir dessas primeiras experiências que consigo clarificar como era a ANPAD durante meu período como Presidente. Além disso, muito do que se referia à associação no início da década também podia ser observado no final da década, pois as indagações que levaram à sua constituição ainda persistiam como inquietações subjacentes.

Fundamentalmente, penso que a reflexão sobre qualquer ramo do conhecimento deveria começar pela geração e pelo contexto que o produz. Logo, só consigo imaginar a ANPAD (como constituição institucional do campo científico Administração) pela identificação dos propósitos da geração que a criou e consolidou em determinado contexto. Isto posto, devo começar pela minha própria concepção do que seja a ANPAD, que identifico como a representação institucional do que se faz e se pensa sobre a Administração como área do conhecimento. A estrutura da ANPAD e de outras instituições do mesmo gênero que agregam programas de pós-graduação, como membros regulares, integrando diretamente os produtores do conhecimento apenas como eventuais participantes nas ocasiões da reunião anual, revela, de fato, a sua essência. Na prática, a ANPAD ainda privilegia a transferência do conhecimento por meio do ensino, acreditando que seja possível atingir as origens da sua produção pela mediação dos coordenadores de pós-graduação, seus membros regulares. Assim, quando a ANPAD procura falar com os pesquisadores, ela o faz através da estrutura, que é o sistema de pósgraduação. Conseqüentemente, ao discutirmos a ANPAD, torna-se inevitável confundir o produto (conhecimento sobre a administração) com a própria instituição política, ANPAD.

Em 1989 foram apresentados 171 trabalhos e comunicações na reunião anual, distribuídos entre as principais áreas funcionais, tais como Recursos Humanos, Organizações, Marketing, Finanças, Produção. Desde esse período, o encontro anual (era assim que chamavamos o ENANPAD) reproduzia o modelo americano de estrutura da pós-graduação, muito mais do que refletia os temas das pesquisas ou trabalhos científicos feitos pelos seus integrantes. Apesar disso, já nessa época, observava-se o surgimento de novos interesses e grupos de pesquisa genuinamente constituídos, como a Administração da Informação e a Administração de Ciência e Tecnologia. A Administração Pública lutava para se impor como área alternativa e autóctone; embora constasse do currículo dos programas em termos de uma ou duas matérias, pouco se integrava com outras disciplinas daqueles programas supostamente estruturados com base em Administração de Empresas.

Ainda é preciso lembrar o papel da chamada Administração Geral, presente em quase todos os programas de pós-graduação, e que incluía tudo, mas sem especificar quase nada. A lógica da Administração Geral, por outro lado, dava flexibilidade aos programas que não possuíam especialistas suficientes em cada subárea funcional, bem como permitia ajustamento político daqueles cursos que não tinham interesse em ligar a identidade do programa de pós-graduação ao setor público ou ao setor privado.

Essas reflexões me levam à percepção de que a ANPAD, enquanto instituição política, procurava fortalecer a legitimidade de sua face acadêmica, segmentando o conhecimento representado na reunião anual nas mesmas subáreas em que a pós-graduação se estruturava (exemplo: Marketing, Finanças, Produção). Enquanto essas subdivisões contribuíam para organizar o conhecimento e a própria reunião, elas levavam e ainda levam à demarcação excessiva de cada subterritório, dificultando as interfaces e o surgimento daquele conhecimento, que é, por sua natureza, interdisciplinar. A cópia do modelo americano, que se dava na estrutura de ensino e se reproduzia nas apresentações do conhecimento científico nas reuniões da ANPAD, representava não só a cópia do modelo americano, mas repetia o que constitui a sua principal falha - o conhecimento segmentado e desvinculado do contexto social e econômico em que ele se insere.

No início da década de 80, um outro ponto que se ressalta eram as lutas internas em que se procurava definir o que era a administração e do que deveria ocupar-se a ANPAD. Minhas lembranças sobre essa época são as de uma ANPAD atrelada às opiniões do Estado. Praticamente pensava-se e fazia-se em consonância com as opiniões da CAPES, que autoritariamente manifestava o seu pensamento sobre o que deveria ser o ocupar-se da associação. Embora considerássemos uma afronta ao que era percebido como interferência do ESTADO, pois achávamos que os órgãos de fomento se deveriam restringir apenas em apoiar as nossas iniciativas, sentíamo-nos como que reféns destes órgãos, pois o contexto político do país era favorável a um estilo de administração pública autoritário e tecnoburocrático. Contudo, não é justo afirmar que as relações entre as agências de fomento e a ANPAD tenham sido pautadas por relações autoritárias, pois a queda do regime militar, bem como a consolidação da própria pós-graduação no país contribuíram para mudar o caráter delas.

Ainda na década de 80, pouco se discutia sobre a validade do conteúdo do que constituía o conhecimento administrativo, nas reuniões da ANPAD, como começamos a fazer, aproximadamente a partir de 1985; discutia-se, em vez disso, a própria natureza desse conhecimento, se a Administração deveria ser uma arte, se era uma prática, ou se poderia ser uma ciência. Esperava-se que as estratégias de ensino fossem coerentes com as posições respectivas, mas havia ainda várias outras indagações: se os cursos de pós-graduação se deveriam concentrar na formação do profissional para o mercado de trabalho, se deveriam focalizar o tomador de decisões ou se deveriam, fundamentalmente, se voltar para a formação do pesquisador. Embora a ênfase quanto à influência dos egressos dos mestrados nas grandes decisões tenha sido trazida no bojo do crescimento dos MBAs americanos, cujos ex-alunos passaram a ocupar posições importantes nas grandes empresas, o que é mais relevante para nossa discussão aqui é outro ponto. Não se tratava apenas de afirmar que o conhecimento técnico em si era menos importante, mas de tornar evidente a importância do conhecimento tácito adquirido por meio da pós-graduação e, através disto, elevar-se o status da profissão, tanto no que se referia à sua dimensão política, quanto no que se referia às novas oportunidades de remuneração. No fundo, levantava-se a possibilidade de os egressos assumirem nas organizações posições mais vantajosas do ponto de vista da hierarquia financeira.

A outra alternativa, a formação do pesquisador, também recuperava a dignidade da profissão, mas de uma outra forma, atribuindo à Administração o status de ciência, aproximando-a das demais ciências sociais. Os cursos de administração deveriam contemplar a formação do pesquisador, pois tal alternativa teria por função atribuir legitimidade ao programa de pós-graduação diante do Estado. Essa estratégia era ainda assegurada e até mesmo requerida pela CAPES, que através da adoção de critérios uniformes para todas as áreas, das hard às soft sciences, contribuiu para transformar as questões epistemológicas que preocupavam a área no início da sua existência em questões irrelevantes, pois mesmo as ciências sociais aplicadas deveriam também se curvar aos critérios das hard sciences. Assim, era inútil persistir nas velhas questões que preocupavam a ANPAD no início da década. A discussão se a Administração era uma arte ou uma prática tornou-se politicamente irrelevante, pois persistir nela significava deslegitimar o conhecimento técnico e colocar em cheque a própria razão de ser dos cursos de pós-graduação, já em processo de consolidação a partir dos meados da década de 80.

Minha primeira experiência como consultora da CAPES, mediante convite do Professor Carlos Osmar Bertero, Presidente do comitê de área, permitiu-me testemunhar o surgimento de novos programas de pós-graduação, principalmente no Nordeste. Nessa época, 1984, era evidente a liderança da FGV, tida como modelo para estrutura curricular. Institucionalmente, observava-se certa aliança entre os programas do sudeste, e uma luta dos programas do centro e do nordeste para tornarem a sua existência e suas reinvidicações legítimas perante os programas já estabelecidos.

Portanto, na década de 80, quatro fatores me pareceram importantes na estruturação do campo e na definição da identidade da ANPAD: a influência americana na definição dos currículos e da estrutura dos cursos de pós-graduação, o papel do Estado na definição das políticas de ensino e pesquisa, o papel da FGV como programa padrão para os demais e, finalmente, a entrada dos novos doutores em programas já existentes que não haviam ainda tomado rumo próprio. Poderíamos afirmar que os três primeiros fatores se constituíam de forças impulsionadoras externas, enquanto que o último era reflexo da organização de forças e lideranças internas nos programas. Não se pode esquecer, nesta análise, a importância da própria ANPAD como instituição que estabelecia e, ao mesmo tempo, refletia os padrões e as distinções entre os diferentes programas, como um locus em que as lideranças primeiramente constituídas definiam o conteúdo do ensino e os padrões para comparação entre os programas.

Apesar da maioria dos programas de pós-graduação terem optado por um currículo inspirado no modelo americano, a ANPAD começou a se reafirmar no final da década de 80 como instituição autóctone, capaz de definir seu próprio destino e critérios. Politicamente a instituição ganhava, também, cada vez mais independência do Estado, sendo capaz de atuar na defesa dos interesses da pós-graduação stricto sensu que, gradativamente, passou a ganhar espaço em relação à pós-graduação lato sensu. Para isso contava, nessa época, com um contexto favorável. Tanto os órgãos de financiamento, quanto as universidades federais, encorajavam uma política que atribuísse legitimidade à pesquisa. Neste ponto, a influência das agências de fomento foi fundamental. Mesmo se tratando a Administração de área que, tradicionalmente, se definia como pertencendo ao domínio da prática e da consultoria, ela, aos poucos, vem conseguindo demonstrar a sua força no que se refere à geração de conhecimento genuíno. Fatores como os mencionados acima contribuíram fundamentalmente para transformação da própria ANPAD de instituição política, que privilegiava o conhecimento face a face, para uma estrutura capaz de encorajar o desenvolvimento de conhecimento autóctone e de relevância própria para o país.

TÂNIA FISCHER (1991-1992)

Os anos 90 reforçaram extraordinariamente a retórica da mutação.

A ANPAD agregou novas preocupações estratégicas, como porta-voz e fórum principal do conjunto de programas de pós-graduação em administração, que estão no olho do furacão da mudança signo que nos acompanha desde a origem.

Voltar ao início dos anos 90 foi exercício interessante.

O Boletim ANPAD número 3, de setembro de 1992, arrolava ações da gestão 1991-92. A elaboração de um Plano Diretor envolveu representantes do CNPq e CAPES e foi objeto de várias reuniões da comunidade. Houve integração da ANPAD ao conselho de sociedades científicas da SBPC; a ANPAD esteve presente em comissões que reivindicaram recursos de fomento dos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia. A ANPAD propôs um programa de apoio a teses e dissertações em Administração Pública à ENAP, hoje concretizado no Programa de Apoio à Pesquisa (PAP).

Os encontros nacionais realizados em Belo Horizonte e Canela foram acompanhados por diversos encontros regionais e temáticos: foram oportunidades de se perceber que a área crescia com segurança e, principalmente, que as diferenças se acentuavam e os programas buscavam novas identidades.

Na gestão 1991-92 compartilhamos a diretoria com a professora Maria Tereza Fleury e com o professor Roberto Moreno Moreira. Solidários e bem humorados, meus companheiros facilitaram, enormemente, o enfrentamento de dificuldades normais e as nem tanto, daqueles tempos de cólera. Além de nos comprometermos com problemas de alta relevância para o ensino e a pesquisa, vivemos situações entre o hilário e o dramático, como arrancar um talão de cheques de uma agência em Botafogo-Rio de Janeiro, com o Banco do Brasil em greve total, para pagar as passagens do ENANPAD 91, entre outros...

No final dos anos 90, a atual gestão não enfrenta exatamente problemas de todo novos. Sem dúvida, eles ganharam densidade e expansão: melhores padrões de qualidade acadêmica, abertura de novas frentes no ensino e na pesquisa, busca de recursos tradicionais e alternativos, são linhas de ação constantes, afetadas por conjunturas mais ou menos favoráveis.

No entanto, as novas diretrizes de política de pós-graduação e pesquisa trazem desafios maiores à competência estratégica dos programas.

O Plano Nacional de Pós-Graduação está em elaboração, o CNPq reorienta radicalmente suas políticas. O apoio ao ensino e à pesquisa está cada vez mais direcionado, exigindo que a área defina prioridades.

Cobra-se mais qualidade, ao passo que os recursos vão sendo reduzidos e a área deve abrir novas fronteiras.

Formatos alternativos para os cursos de mestrado, com a institucionalização dos mestrados profissionalizantes e interinstitucionais, vão requerer critérios adequados de avaliação.

Cumpre sublinhar a busca de fontes alternativas de recursos; maior flexibilidade; internacionalização crescente e abertura a padrões culturais diferenciados.

A diversidade dos programas e sua inserção em realidades regionais tão diferenciadas, a natureza multidisciplinar da Administração e o seu compromisso direto com a sociedade, as relações nacionais e internacionais que configuram a rede de relações acadêmicas, integrada pela área, tornam a tarefa de encontrar alternativas e modelos de ensino mais flexíveis e produtivos tão rica quanto complexa.

No final da década, a ANPAD encontra a maioridade e, com ela, a nossa área.

CLÓVIS L. MACHADO-DA-SILVA (1993-1994)

A minha segunda eleição como Presidente da ANPAD, em companhia dos competentes e dedicados companheiros da Diretoria Científica e da Diretoria Administrativa, Professor Jaime Evaldo Fensterseifer e Professor Cesar Gonçalves Neto, deu-se em circunstâncias diferentes: a Associação tinha ampliado, de forma significativa, a sua legitimidade institucional, seguindo a lógica de mudança incremental que a acompanha desde os seus primórdios. Apesar do olhar ainda desconfiado de várias outras áreas de conhecimento, em especial as consideradas mais nobres, não havia como negar que a ANPAD já possuía certa presença no contexto científico e tecnológico brasileiro. Não a que pode e precisa ter, mas a que tinha sido possível construir até aquele momento. Pude testemunhar a expansão da sua interação com as agências de fomento, e pude colaborar no processo de articulação com a CAPES, uma vez que, durante dois mandatos (1989-90 e 1991-92), ocupei a presidência da área no seu Conselho Técnico e Científico. A continuidade do projeto de 1985 havia sido garantida nas gestões das Professoras Suzana Braga Rodrigues e Tânia Fischer. Da mesma forma que na primeira gestão, o companheirismo e a cooperação mútua dominaram o ambiente da Associação; divergências de opinião eram tratadas mediante debates de qualidade, com resultados sempre positivos.

As novas circunstâncias ambientais, em especial as limitações crescentes das fontes tradicionais de fomento, exigiam da ANPAD não só reordenação mas clareza maior das suas diretrizes estratégicas de atuação. Para tanto elaborou-se o Plano Estratégico de Gestão, aprovado pela Assembléia Geral em 1993, o qual continha diagnóstico-síntese da área, certo reposicionamento quanto à concepção da Administração como pós-graduação e um conjunto de diretrizes para a orientação dos programas e para o direcionamento da atuação articuladora da ANPAD.

A análise de situação demonstrou a expansão quantitativa e a evolução qualitativa da pós-graduação stricto sensu, com o surgimento de novos programas de mestrado, com a criação de novas áreas de concentração nos cursos existentes, com o aumento geral no número de vagas ofertadas, com o ingresso de novos professores/pesquisadores nos programas, com o incremento e a diversificação da produção científica e técnica docente e discente, com a elevação dos conceitos (na avaliação da CAPES) de cursos de mestrado, com a melhor identificação e adequação das linhas de pesquisa em diversos programas, com o andamento das propostas de criação de três novos cursos de doutorado (todos fora do eixo São Paulo-Rio de Janeiro), com o aumento da consciência quanto a aspectos em comum e à diversidade de orientações na área. Em contrapartida, a mesma análise também revelou: a necessidade de incrementar a produção científica docente e discente, apesar do seu crescimento constante, uma vez que ainda se encontrava abaixo das possibilidades da área, notadamente o percentual de dissertações e de teses em relação ao número de ingressantes; o alto tempo médio de titulação tanto para o mestrado quanto para o doutorado; a necessidade de continuar aumentando o número de alunos admitidos nos programas; o número excessivo de créditos exigidos em alguns cursos de mestrado; a necessidade de adequar/aperfeiçoar as linhas de pesquisa em alguns programas; a carência de recursos em vários programas; a inevitável necessidade de procurar fontes alternativas de recursos.

Depois de longos debates sobre a situação da área, os membros da Assembléia Geral chegaram à conclusão de que os programas não mais poderiam restringir-se ao mestrado e ao doutorado; havia-se tornado imperativa a concepção de que a pósgraduação deve ser tratada como sistema, no âmbito de cada entidade, que deve envolver tanto a dimensão stricto sensu quanto a lato sensu. Tendo em vista as dificuldades crescentes de se obter apoio financeiro das agências tradicionais de fomento e considerando o nível salarial do corpo docente na maioria das instituições, cursos de especialização e aperfeiçoamento poderiam funcionar como fonte alternativa de recursos, assim como serviços de consultoria-pesquisa. No que se refere à pósgraduação stricto sensu, o doutorado, como não pode deixar de ser, deve ser visto como reserva de excelência com considerável massa crítica para a formação do docente e do pesquisador; por sua vez, o mestrado pode admitir diferentes formatos, além do tradicional, desde que mantenha o mesmo padrão de qualidade do acadêmico.

Apesar dessa conclusão da Assembléia Geral, era possível observar restrições de vários coordenadores de programas quanto à flexibilização do mestrado, em especial quanto à criação do mestrado profissional, alternativa largamente debatida na época, diante da insistente indução da CAPES nessa direção. Tais restrições atuaram tão fortemente que só a partir de 1997 o mestrado profissional passa, efetivamente, a ser considerado como alternativa exeqüível. É minha opinião que há espaço para o mestrado profissional, desde que se firme em alto padrão de qualidade e que seja avaliado com base em indicadores e critérios no mesmo nível de rigor dos aplicados para avaliar o mestrado acadêmico. Acredito que possa ser oferecido juntamente com o acadêmico (para preservar a atividade de pesquisa) nas instituições que atuam apenas com mestrado, apesar de julgar que está aberto ao debate, e, portanto, a definições e sugestões, em que aspectos um se diferencia do outro no presente cenário de globalização, em que pensar é tão crucial quanto fazer Administração. Chego a entender que possa substituir o acadêmico naquelas instituições que oferecem doutorado de excelência, uma vez que devem possuir linhas e grupos de pesquisa consolidados e atividade contínua de investigação com produção científica consistente.

Hoje, na análise das formas de flexibilização do mestrado, o que me preocupa é o mestrado fora da sede que a CAPES batizou com o eufemismo de mestrado interinstitucional, e que vem incentivando, mediante solicitação de propostas de instituições de ensino superior, localizadas fora dos centros avançados de ensino e pesquisa do país, com o objetivo de formar o quadro de pessoal dessas organizações. Apesar do aparente cuidado da CAPES na elaboração das normas e orientações para a apresentação de propostas, torna-se difícil evitar o risco de vulgarização do mestrado. Parte importante do processo de ensino-aprendizagem não acontece por meio dos professores ou na sala de aula, mas pela convivência continuada no ambiente acadêmico de socialização que caracteriza e envolve um curso de mestrado de qualidade. Não por acaso programas que só admitem alunos em tempo integral obtêm melhores resultados do que similares com alunos em tempo parcial. A própria CAPES reconhece a importância desse ambiente acadêmico ao estabelecer, no edital de chamada de propostas para o mestrado interinstitucional, o estágio obrigatório de no mínimo quatro meses na sede do programa promotor. É tapar o sol com peneira. Com o ensino de graduação que se tem no país, a vivência durante todo o processo no ambiente acadêmico do mestrado regular torna-se ainda mais relevante. Há vários outros pontos que se poderiam levantar sobre o assunto, mas não há espaço disponível, aqui, para tanto. Fica uma observação: se formatos diferentes de mestrado podem ser saudáveis, a sua minimização não o é. É o incentivo à criação de doutorados que propiciará, gradualmente, o conveniente reposicionamento do mestrado. No atual estágio de desenvolvimento da pós-graduação stricto sensu em Administração no Brasil, há várias designações possíveis para o mestrado interinstitucional incentivado pela CAPES; a menos indicada parece ser a de mestrado, qualquer que seja o adjetivo que se lhe adicione. Para formar o pessoal docente dessas instituições, a CAPES deveria incentivar a expansão da oferta nos programas existentes, com aumento conveniente do fluxo de recursos, e possibilitar a criação de novos mestrados com formato acadêmico, uma vez que há demanda para tal; o número atual de mestrados em Administração é insuficiente em face da população e da dimensão territorial do país.

A atuação da ANPAD, no período, pautou-se pelo conjunto de diretrizes estabelecidas no Plano Estratégico de Gestão. Dentre as realizações podem-se destacar: a organização dos encontros de Salvador, em 1993, com 37 comunicações e 190 trabalhos selecionados, e de Curitiba, em 1994, com apresentação de 53 comunicações e 215 trabalhos, ambos atestando a continuidade da dinâmica de expansão incremental da produção acadêmica em Administração; o lançamento, no ENANPAD de Curitiba, do Prêmio Bamerindus para a melhor dissertação de mestrado na área bancária; a organização e coordenação de mesas-redondas nos eventos principais da SBPC em Recife, 1993, e em Vitória, 1994; o incremento da interação com organizações internacionais como CLADEA e BALAS e com as agências de fomento CAPES e CNPq, de forma articulada com os representantes de área; a preparação de toda a documentação necessária para registro da Associação que se inicia nesta gestão e se consuma na de Peter Spink; o aperfeiçoamento do TSANPAD, dentro dos limites da concepção e estrutura atuais, tornando-o auto-suficiente em termos financeiros e saldando os empréstimos que acumulava de vários programas.

No final da gestão, procurou-se passar para a diretoria eleita para o biênio seguinte, algumas constatações: a) o ENANPAD havia alcançado o status de mega-encontro, com aproximadamente 600 participantes: era hora de passar a organização da sua parte não-acadêmica para uma agência especializada em eventos; b) o TSANPAD havia praticamente esgotado as suas possibilidades de aperfeiçoamento na atual concepção, precisando evoluir para se transformar no equivalente do GMAT; c) a produção científica em Administração, conforme a representada nos encontros anuais, justifica o atendimento de expectativa antiga da comunidade: o lançamento de revista acadêmica, vinculada à ANPAD, com perfil diferenciado das existentes; e d) a consolidação da Associação no território nacional, respaldada por produção científica consistente e pós-graduação de qualidade, revela que o sistema já alcançou nível de maturidade suficiente para alçar maiores vôos rumo à sua inserção internacional, em especial nos países latinos.

A ANPAD é realidade construída por muitos. De forma gradual e consistente, veio crescendo e ocupando espaço no contexto científico e tecnológico brasileiro. Hoje, consolidada, não pode parar de evoluir. Para tanto precisa da competência e da seriedade de pessoas-chaves da comunidade acadêmica. Além disso, precisa incentivar sempre a nova geração de pesquisadores, envolvendo mais intensamente aqueles com potencial para liderança. A solidez de uma Associação vem do passado, mas precisa do presente e tem de contar com o futuro.

PETER SPINK (1995-1996)

Os professores José Antonio Gomes de Pinho, José Carlos Sardinha e eu assumimos a ANPAD com mandato claro e de consenso entre os membros da assembléia. A associação tinha crescido ao longo dos anos; estava no momento de se consolidar como entidade representativa que se podia fazer presente na discussão cada vez mais internacionalizada sobre o ensino e a pesquisa em administração. Em termos práticos, isso se traduzia na necessidade de dar forma legal completa para ANPAD, de buscar uma solução estável e permanente para o ENANPAD, de criar uma revista e assumir o Teste de Seleção enquanto atividade regular e constante.

A diretoria anterior já tinha iniciado o processo de registro da associação, mas mesmo assim iria levar mais um ano antes que tivéssemos todos os documentos em dia, todas as certidões negativas em mão para que pudéssemos entrar com um pedido de apoio ao ENANPAD na FINEP. Os colegas da PUC-RJ aceitaram sediar a associação, e iniciamos a nova fase com um escritório permanente, com arquivos e com uma secretária. Aproveitamos a oportunidade para revisar, junto com a assembléia, os estatutos atuais. Boa parte das alterações se referiam a práticas já estabelecidas, entretanto não registradas; também foi proposta e aceita a criação de um comitê executivo, eleito pelos membros da assembléia, para ajudar a diretoria nos períodos entre as reuniões principais. Com mais de vinte membros, reunir a assembléia com a periodicidade necessária para acompanhar e discutir os múltiplos acontecimentos na área de administração já se mostrava difícil.

O ENANPAD tinha crescido de uma reunião de poucos pesquisadores, boa parte amigos, para um encontro com a apresentação de grande número de trabalhos e rigorosa exigência de avaliação. No lado científico, já havia sido discutida a necessidade de optar pelo processo de blind review dos trabalhos submetidos, como também de avançar em direção da publicação de resumos em vez de anais. Com mais de 200 trabalhos sendo aceitos (às vezes, dependendo da área, depois de uma seleção de 3 trabalhos por vaga), a publicação completa dos anais para todos os congressistas comprometia parcela substancial do orçamento.

No lado institucional, também era claro que poucos programas estavam dispostos a assumir a organização de um encontro de tal envergadura. Felizmente a equipe do professor Humberto Marques Filho concordou em organizar o evento em João Pessoa (um grande sucesso), quando uma solução mais permanente foi aceita pela assembléia. Aprendemos em João Pessoa-Paraíba e pudemos aplicar as conclusões no ano seguinte. O blind review foi introduzido, o número de espaços para os trabalhos foram ampliados nas áreas temáticas mais solicitadas, contratamos uma empresa organizadora de eventos e levamos o ENANPAD para as instalações do Clube Med em Angra dos Reis. A gerência do Clube Med aceitou fechar o lugar durante os três dias do evento que, com quinhentos participantes, permitiu nível de convívio, debate e conversa sem igual nos últimos anos. Conseguimos criar um meio termo em relação aos resumos e anais, o que evitou o translado de toneladas de papel de uma parte do país para a outra.

Assumir um evento nessa forma exigiu muito dos poucos recursos financeiros da Associação porque, mesmo que o balanço final seja positivo, há muita variação de fluxo de caixa no caminho. Se a criação de um encontro científico com perfil internacional foi obra do nosso Diretor Científico, professor Pinho, tivemos no professor Sardinha um especialista em finanças, disposto a utilizar seu conhecimento para o desenvolvimento da ANPAD. Junto com o professor André Martinewski do Teste de Seleção e com a associação legalmente constituída, as contas bancárias das diferentes atividades foram interligadas de forma que permitiram gerenciamento mais estratégico das necessidades de caixa.

A discussão sobre os caminhos do Teste de Seleção ainda não terminou, mas parece que estamos indo em direção a algo mais parecido com o GMAT. Um teste que acontece duas ou três vezes por ano e cujo resultado é parte integrante de processos de seleção que podem ocorrer de forma diferente e em épocas diferentes, dependendo do programa. A revista, entretanto, com o nome de Revista de Administração Contemporânea, já existe. Para convencer os pesquisadores da ANPAD que era possível, decidimos, em assembléia, transformar os anais do encontro de João Pessoa em edição-teste da revista, para depois consolidá-la na sua própria base. A revista sempre foi uma aspiração para a geração que criou a ANPAD; foi com muita satisfação que todos receberam a notícia de que o professor Clóvis L. Machado-da-Silva estava inclinado a assumir o posto de editor. Como bem lembraram os membros da assembléia, após discutir a criação da revista: estava na hora!

Mais de 700 pessoas submeteram trabalhos para o encontro em Angra dos Reis, aceitando a avaliação cega de seus trabalhos. A qualidade das pesquisas apresentadas tem melhorado sensivelmente; é reflexo claro das 1.500 e mais teses e dissertações produzidas nos programas membros da ANPAD, nos últimos cinco anos. Não há um outro país na América Latina com o número que temos de programas de pós-graduação na área e com o nível de titulação de nossos docentes. Somos o único país com programas de doutorado em número suficiente para poder suprir a demanda para qualificação docente, possibilitando, assim, que os recursos CAPES/CNPq sejam utilizados para bolsas de curta duração e de doutorado sanduíche.

A ANPAD, nestes dois anos, discutiu bastante e acompanhou o debate em torno dos mestrados profissionais, as possíveis reestruturações da pós-graduação no país, a introdução do exame geral para os cursos de graduação e as diversas modificações introduzidas no processo de avaliação. Ficou também claro o quanto a dimensão internacional está se fazendo presente entre nós e o quanto a ANPAD está potencialmente bem posicionada para exercer alguma liderança neste campo em relação aos nossos colegas nos outros países da América Latina. A impressão que tenho é que, pouco a pouco, a ANPAD consolidou uma competência madura de analisar e reconhecer as melhorias necessárias, tanto no conjunto da administração como em programas específicos e com relativa habilidade de criticar, quando necessário; de forma incremental, assim se constrói uma comunidade.

ROBERTO MORENO (1997-1998)

Após longos anos de luta, diversas contribuições desinteressadas e sacrifícios pessoais, a Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração (ANPAD) se consolida como representante efetiva da área de Administração junto aos diferentes foros acadêmicos e institucionais que, em alguma medida, têm participado de discussões em torno do tema.

Os depoimentos apresentados pelos ex-presidentes da ANPAD neste número inaugural da Revista de Administração Contemporânea (RAC) revelam muito desta trajetória e acreditamos que uma incursão sobre perspectivas estabeleça um bom arremate para todos os que desejem conhecer mais e participar dos esforços da Associação.

Consistente com essa vocação da ANPAD, iniciamos a apresentação para a Assembléia da ANPAD de nosso Plano de Trabalho para o biênio 1997-98 pelo que denominamos Fórum Estratégico ANPAD: trata-se de consolidar a Associação como referência natural de todos quantos se envolvam com a pós-graduação em Administração, estimulando a realização de encontros periódicos em torno de um plano estratégico para área, comprometendo, ao mesmo tempo, nossos representantes na CAPES e no CNPq na defesa desses esforços.

De outro lado, a visão estratégica passa pelo fortalecimento dos Programas de Mestrado e Doutorado associados, propiciando condições para que eles se mantenham em permanente processo de desenvolvimento. Este processo tem de ser compatível com a manutenção da qualidade e a contemporaneidade da discussão acadêmica em um país em profunda transformação, com as conseqüentes repercussões na administração das empresas e do setor público.

O Teste de Seleção da ANPAD (TSANPAD) é outra de nossas preocupações no curto prazo. Iniciado há longo tempo como resposta à necessidade de termos homogeneidade no processo de seleção para os nossos Programas, o TSANPAD tem evoluído, mas ainda se encontra distante de sua verdadeira potencialidade. Não obstante, acreditamos que o teste tenha condições de se transformar no equivalente brasileiro do GMAT e, mais ainda, que possa ser de grande utilidade inclusive para empresas, transformando seu uso em instrumento importante a participar do processo de contratação/seleção de profissionais para posições gerenciais. Para que isso ocorra, é preciso que aumentemos os cuidados com a avaliação e aperfeiçoamento do Teste, de modo a elevar adicionalmente sua confiabilidade e, então, expandir os horizontes de seu emprego.

O Encontro Nacional da ANPAD, mercê da importância de que já se reveste, tem sido freqüentemente confundido com a própria Associação, como se fosse a razão de ser da ANPAD. E esta confusão tem até certa razão de ser, em vista do crescimento do Encontro, não apenas em termos do número de trabalhos apresentados, mas, ainda de maior importância, pela extraordinária evolução da qualidade desses trabalhos. De tal forma se transformou o ENANPAD, que os atores envolvidos em sua organização tiveram de mudar: antes de responsabilidade de um Programa, apoiado pela Diretoria (especialmente, o Diretor Científico) da ANPAD, agora de responsabilidade da Diretoria da ANPAD (em que pontifica o Diretor Científico) com o suporte de uma empresa especializada. De qualquer forma, e tendo em vista a importância deste fórum, em que se busca a união enriquecedora entre a discussão acadêmica - transformadora - e a convivência social dos participantes - que integra acadêmicos e expande horizontes de pesquisa - o Encontro deve merecer a atenção necessária para que não perca suas características e ganhe, pelo contrário, novas dimensões. Insere-se neste último caso o esforço de se atrair a maior participação de executivos, bem como a de professores de renomados centros internacionais, ampliando a troca acadêmica de qualidade.

O crescimento e a consolidação da ANPAD, além da posição estratégica que ela vem assumindo como interlocutora privilegiada, em diferentes níveis de decisão, acabou por converter a comunicação entre os alunos e professores, e a Associação, em uma das chaves para o permanente progresso da ANPAD como referência para a área de Administração. Nesse sentido, é fundamental que contemos com um instrumento universal de comunicação, como é o caso da home page da ANPAD. Prevista para estar disponível já no segundo semestre deste ano, a home page constituirá mais um elemento integrador da área, permitindo o acesso facilitado aos dados dos membros associados, com destaque para a produção científica e técnica, e substituindo com vantagem a produção de um catálogo dos programas, especialmente por facilitar a atualização e a disponibilidade da informação.

Por se apresentar como um endereço eletrônico da ANPAD, a home page cumprirá, ainda, o papel de facultar o acesso democrático daqueles que têm interesse pela área, disponibilizando com facilidade as informações e a troca de idéias.

Vale assinalar que o lançamento da RAC é um passo importante na estratégia de prover maior comunicação entre os profissionais, acadêmicos ou não, de Administração e vem culminar uma antiga reivindicação de todos: a de ter alternativas para publicação. O lançamento desta Revista deve estimular, adicionalmente, o aumento da produção acadêmica e representa um belo exemplo de maturidade de todos nós. Entretanto, a manutenção de uma revista de qualidade não é empreitada simples, como atestam os inúmeros exemplos de insucesso de que temos notícia. Assim, caberá à ANPAD, em particular, e à comunidade acadêmica, em geral, realizar todos os esforços para que essa iniciativa logre êxito e a RAC acabe por se firmar como periódico acadêmico.

Finalmente, os papéis a serem desempenhados pela ANPAD exigem sua maior inserção no cenário nacional e internacional e, em conseqüência, um aumento do intercâmbio, ainda incipiente, que ela mantém com outras associações. Nesse sentido, estabelecer relações mais estreitas e permanentes com a ANGRAD permitirá ampliar a integração entre a Pós-Graduação e a Graduação, condição necessária para o fortalecimento da qualidade no ensino e na produção acadêmica. Ainda nesse contexto, impõe-se maior intercãmbio com associações assemelhadas nacionais (como ANPOCS e SBPC) e internacionais (como no caso do BALAS e do CLADEA).

Concluindo, a trajetória da ANPAD deve ser motivo de grande orgulho e satisfação para quantos dela têm participado. No entanto, o sucesso dessa trajetória acaba por estabelecer novos desafios a serem vencidos, ainda mais extraordinários que aqueles do passado. Certamente a maturidade e a união da área assegurarão que nosso destino se cumpra.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Abr 2009
  • Data do Fascículo
    Abr 1997
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