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A heterogeneidade do desempenho, suas causas e o conceito de vantagem competitiva: proposta de uma métrica

Heterogeneity of performance, its causes and the concept of competitive advantage: the proposal of a metric

Resumos

O desempenho das empresas, contrariamente ao que prevê o modelo econômico neoclássico, apresenta grande heterogeneidade. A estratégia em especial tem-se preocupado em entender esta heterogeneidade, explicá-la e prevê-la. As diversas correntes do pensamento estratégico apresentam diferentes abordagens para isto. Uma noção fundamental neste processo é o conceito de vantagem competitiva. Este trabalho inspira-se nas análises de componentes de variância de desempenho para sugerir uma definição mais precisa de vantagem competitiva e uma métrica para medi-la e compará-la. A proposta é ilustrada com um trabalho empírico que analisa resultados de 252 empresas brasileiras entre os anos 1998 a 2001.

desempenho; heterogeneidade; vantagem competitiva; componentes de variância; Brasil


Opposite to what could be expected from the neoclassical economic theory, firms' performances present a wide heterogeneity. The strategy research tradition has concerned itself with the understanding, explanation and prediction of this heterogeneity. Competitive advantage is a fundamental concept in this effort. This research draws from previous studies on performance variance components to suggest an operational definition of the competitive advantage concept and a metric to measure it. The proposal is illustrated by an empirical study on results of 252 Brazilian companies from 1998 to 2001.

performance; heterogeneity; competitive advantage; variance components; Brazil


ARTIGOS

A heterogeneidade do desempenho, suas causas e o conceito de vantagem competitiva: proposta de uma métrica

Heterogeneity of performance, its causes and the concept of competitive advantage: the proposal of a metric

Luiz Artur Ledur Brito; Flávio Carvalho de Vasconcelos

RESUMO

O desempenho das empresas, contrariamente ao que prevê o modelo econômico neoclássico, apresenta grande heterogeneidade. A estratégia em especial tem-se preocupado em entender esta heterogeneidade, explicá-la e prevê-la. As diversas correntes do pensamento estratégico apresentam diferentes abordagens para isto. Uma noção fundamental neste processo é o conceito de vantagem competitiva. Este trabalho inspira-se nas análises de componentes de variância de desempenho para sugerir uma definição mais precisa de vantagem competitiva e uma métrica para medi-la e compará-la. A proposta é ilustrada com um trabalho empírico que analisa resultados de 252 empresas brasileiras entre os anos 1998 a 2001.

Palavras-chaves: desempenho; heterogeneidade; vantagem competitiva; componentes de variância; Brasil.

ABSTRACT

Opposite to what could be expected from the neoclassical economic theory, firms' performances present a wide heterogeneity. The strategy research tradition has concerned itself with the understanding, explanation and prediction of this heterogeneity. Competitive advantage is a fundamental concept in this effort. This research draws from previous studies on performance variance components to suggest an operational definition of the competitive advantage concept and a metric to measure it. The proposal is illustrated by an empirical study on results of 252 Brazilian companies from 1998 to 2001.

Key words: performance; heterogeneity; competitive advantage; variance components; Brazil.

INTRODUÇÃO

Uma das primeiras constatações ao observar-se certo universo de empresas é que o desempenho não é homogêneo. O equilíbrio econômico, preconizado pelo modelo de competição perfeita, está longe de ser atingido. A ênfase no estudo do desempenho como variável dependente é mais explícita no campo da estratégia, mas a idéia de que o desempenho deve ser previsto, entendido e determinado está presente em todas as áreas de estudos organizacionais (March e Sutton, 1997).

As várias tradições teóricas em estratégia oferecem diferentes perspectivas no entendimento da diversidade observada no desempenho. O conceito de vantagem competitiva surge como construto dominante na explicação do porquê algumas empresas apresentam desempenho superior. Segundo Barney (2002), a evidência que uma empresa possui vantagem competitiva sustentável é a presença de desempenho consistentemente acima da norma. A vantagem competitiva pode derivar tanto de recursos e competências únicas da empresa específica, como da exploração de uma posição específica e protegida da estrutura do mercado (Cool, Costa e Dierickx, 2002). O desempenho de uma empresa específica pode, contudo, ser afetado por outros fatores além de sua vantagem competitiva. O fato de pertencer a uma indústria traz implicações que afetam todos os participantes desta indústria, de modo que a indústria pode ser um dos fatores influenciadores do desempenho. Choques macroeconômicos em determinados anos podem afetar todas as empresa ou empresas pertencentes a determinados setores industriais. Sorte pode ser um dos determinantes de desempenho (Barney, 1986).

Apesar de sua importância, o conceito de vantagem competitiva não tem definição operacional detalhada. A maior parte dos estudos procura relacionar o desempenho diretamente com fatores organizacionais em uma relação de causalidade. March e Sutton (1997) advertem para as dificuldades desta abordagem, dada a complexidade das relações e, principalmente, a impossibilidade de controle de todas as variáveis em face da natureza observacional dos dados. A ambigüidade causal que, por sua vez, é uma das fontes de vantagem competitiva, é outro fator que dificulta a análise. Resulta que a maioria dos estudos sobre desempenho organizacional não logra identificar relações causais verdadeiras entre variáveis de desempenho e outras variáveis correlacionadas a ele. Como colocam os autores "o rei dos estudos organizacionais sobre desempenho está, na maior parte das vezes, nu" (March e Sutton, 1997, p. 702).

O presente trabalho sugere uma possível metodologia e métrica para a medição da vantagem competitiva, isolando-a de outros fatores que afetam o desempenho. O modelo inspira-se nos estudos de componentes de variância de desempenho iniciados por Schmalensee (1985) e Rumelt (1991). A abordagem é ilustrada com a medição da vantagem competitiva de um grupo de 252 empresas brasileiras, no período de 1998 a 2001. O trabalho situa-se dentro de um paradigma estritamente funcionalista, não cobrindo outras perspectivas de pesquisa. A heterogeneidade está, portanto, tomada como a dispersão dos resultados objetivos da empresa, no caso específico o lucro operacional sobre ativos totais e não como diferentes abordagens sobre o sucesso ou insucesso da organização.

A seção seguinte faz uma revisão de como as várias correntes teóricas em estratégia explicam a heterogeneidade do desempenho. Os estudos de componentes de variância e as abordagens mais descritivas da heterogeneidade do desempenho são revistos a seguir. A amostra analisada, critérios de medição e modelo utilizado são então apresentados. A discussão dos resultados, conclusões e sugestões encerram o trabalho.

AS EXPLICAÇÕES TEÓRICAS PARA A HETEROGENEIDADE DO DESEMPENHO

A Questão do Desempenho no Quadro da Organização Industrial

Em mercados competitivos perfeitos, a heterogeneidade do desempenho entre as empresas não existiria ou seria fenômeno transiente, resultado de imperfeição logo corrigida. As empresas não precisariam ter preocupações com estratégias, bastando focar-se na eficiência operacional (Williamson, 1991). A realidade, no entanto, é mais complexa do que suposto neste idealizado modelo neoclássico. A teoria de organização industrial ofereceu explicação parcial para a heterogeneidade. Empresas pertencentes a indústrias diferentes teriam desempenho diverso. O conceito de barreiras de entrada evitando a entrada de novos competidores, permitiria a manutenção de um nível de rentabilidade acima do equilíbrio. Isto seria a manifestação de um poder de mercado compartilhado, que levaria ao reconhecimento de dependência mútua, impedindo a competição de atingir o equilíbrio competitivo (Porter, 1979). A abordagem influenciou fortemente o campo da estratégia com o modelo ECP (estrutura-conduta-performance), sendo capaz de explicar diferenças entre médias de desempenho dos diferentes setores industriais. Uma parte da heterogeneidade foi explicada.

Caves e Porter (1977) abordaram também, em nível teórico, a questão da heterogeneidade intra-indústria. Reconhecendo que os participantes em uma indústria diferem em outras dimensões e não apenas em tamanho, identificaram a existência de grupos de indústrias dentro de um setor industrial. Estes grupos seriam separados por barreiras de mobilidade, uma generalização do conceito de barreiras de entrada. Enquanto as últimas se concentravam apenas no movimento de produção zero para algum valor positivo, as barreiras de mobilidade afetavam qualquer variação nos níveis de produção. O conceito poderia explicar por que a lucratividade variava entre os diferentes grupos, justificando a heterogeneidade e sua persistência dentro dos setores industriais. O conceito foi desenvolvido e apoiado por análise empírica no trabalho de Porter (1979), em que os grupos foram chamados grupos estratégicos, termo criado inicialmente por Hunt (1972). Porter (1979) apresentou uma teoria hierarquizada para a explicação da determinação da lucratividade de uma empresa. Fatores relacionados à estrutura da indústria como um todo influenciavam os lucros de todas as empresas participantes dessa indústria e, portanto, a lucratividade média da indústria. A intensidade das barreiras de mobilidade que protegem um grupo particular, dentro de uma indústria, afetava a lucratividade potencial das empresas desse grupo. Os lucros potenciais de um grupo também dependem de seu poder de barganha com as indústrias adjacentes e a sua exposição a produtos substitutos.

Porter (1979) reconheceu a existência de outros quatro elementos que complementam o modelo de determinação de lucratividade de uma empresa individual. Primeiro a lucratividade de um grupo particular é influenciada pelo grau de competição das empresas dentro do grupo. Esta competição pode ser aumentada pela existência de um grande número de empresas ou por diferentes perfis de risco das empresas. O segundo elemento é dado pelas diferenças de escala das empresas dentro do grupo estratégico: diferenças de tamanho tendem a se refletir em diferenças de desempenho. O terceiro elemento decorre das diferenças nos custos de mobilidade (custos específicos à empresa associados à sua entrada no grupo estratégico). O elemento final é a habilidade da empresa em executar a estratégia operacionalmente, em outras palavras, de transformar o posicionamento estratégico em realidade por meio da eficiência operacional, o que leva ao reconhecimento de um componente individual que pode tornar algumas empresas mais lucrativas do que outras. Como coloca Porter (1979, p. 219), "enquanto estas não são vantagens estruturais do tipo das barreiras de mobilidade e outros fatores discutidos acima, elas podem ser vantagens relativamente estáveis se o mercado para gerentes, cientistas e pessoas criativas for imperfeito".

A Questão do Desempenho no Quadro da Visão Baseada em Recursos

Duas outras tradições teóricas de estratégia empresarial enfocam diferenças importantes em relação ao modelo dominante baseado na economia industrial. A primeira é a chamada escola austríaca, corrente de economistas que se concentra nas conseqüências econômicas da inovação e da mudança tecnológica; a segunda é aquela derivada das concepções econômicas de Chamberlin (1933), que focaliza os recursos diferentes usados pelas firmas na competição. Para os economistas da escola austríaca, o desequilíbrio é a situação normal, negando a tendência ao equilíbrio dos sistemas econômicos, advogada pela teoria microeconômica neoclássica (Conner, 1991; Kirzner, 1997).

A escola austríaca toma uma via diferente para criticar os pressupostos excessivamente simplificadores do modelo neoclássico. Em uma primeira perspectiva, a escola austríaca, com base na obra de economistas como Carl Menger, Joseph Schumpeter, Ludwig Von Mises e Friedrich Hayek, cria uma visão da economia baseada nos conceitos de inovação e em um estado de desequilíbrio contínuo (Jacobson,1992). O foco principal da escola austríaca está no estudo dos processos de mudança tecnológica e da estrutura social, nas dinâmicas de inovação, na entrada de novos concorrentes nos cenários competitivos, bem como na exploração dos motivos pelos quais as discrepâncias de lucratividade em relação à média são fenômenos tão corriqueiros, apesar de o mercado agir como mecanismo nivelador de lucros. Enquanto na economia neoclássica ortodoxa se desenvolve um conceito de equilíbrio estático e estável, na escola austríaca o equilíbrio é dinâmico e instável. O mercado, sem estar em equilíbrio em um ponto fixo qualquer, e sem nunca poder de fato atingi-lo, se caracteriza por um processo de descoberta interativa (por tentativa e erro) de novas oportunidades de negócios. Neste sentido, uma das mais importantes contribuições dos economistas austríacos é a idéia de que a economia é essencialmente um mecanismo heurístico interativo de descoberta de novas atividades e de procura de oportunidades de lucros excepcionais (Hayek, 1944).

A empresa obtém lucros extraordinários somente por meio deste processo de descoberta interativa, da inovação, da descoberta de oportunidades e da mobilização pioneira de recursos. A maior lucratividade do inovador (empreendedor) inevitavelmente atrai imitadores e, em pouco tempo, o diferencial de desempenho é corroído pela competição. Uma das principais funções do mercado é a criação e a transmissão de informação que se dão por meio da ação do empreendedor. A inovação constante e a ação empreendedora estão permanentemente criando fontes de heterogeneidade entre as firmas, apesar de os mecanismos de imitação atuarem no sentido inverso (Jacobson, 1992; Kirzner, 1997).

Outra explicação da dinâmica da estratégia empresarial e da heterogeneidade de desempenho das firmas pode ser encontrada nas concepções econômicas de Edward Chamberlin e de seus seguidores. Segundo Chamberlin (1933), a competição em uma indústria se dá entre firmas com recursos diferentes, ainda que ocasionalmente equivalentes. Alguns desses recursos específicos podem representar vantagens importantes para certas firmas em condições específicas de mercado. Dessa maneira, a especificidade das firmas, isto é, sua diferença intrínseca, pode ser fonte crítica para explicar a diferença de desempenho. Dado que os recursos das firmas são muitas vezes parcialmente equivalentes, a competição entre as firmas toma forma de competição monopolística, competição entre produtos específicos produzidos de forma monopolista que são parcialmente substituíveis um pelo outro, gerando uma forma de competição indireta por substituição.

As contribuições da economia austríaca, de Chamberlin e da economia de organização industrial podem ser vistas em comparação resumida no quadro abaixo.

A abordagem da estratégia empresarial conhecida como Visão Baseada em Recursos (Resource Based View - RBV), se fundamenta ao mesmo tempo na abordagem chamberliniana e na economia austríaca. A RBV oferece nova justificativa tanto para a geração como para a manutenção da heterogeneidade do desempenho das firmas (Wernerfelt, 1984, 1995; Barney, 1991, 2001; Conner, 1991; Peteraf, 1993). Segundo a teoria dos recursos, o desempenho superior é sustentável quando uma firma tem recursos capazes de lhe render resultados extraordinários, e estes recursos são raros (não disponíveis com facilidade para outras firmas), difíceis ou custosos de serem imitados, e a firma possui condições organizacionais para explorar as rendas geradas por tais recursos. Essas condições são conhecidas como o modelo VRIO, sigla para os testes de valor (value), raridade (rarity), imitabilidade (imitability) e organização (organization), testes sucessivos pelos quais um recurso deve passar para ser considerado fonte de vantagem competitiva (Barney, 2002).

A idéia central na RBV é que a fonte de diferenças de desempenho entre as firmas se encontra primariamente nos recursos das empresas. As firmas são vistas como conjuntos de recursos (Wernerfelt, 1984), ativos físicos ou intangíveis (Hall, 1982), cuja combinação específica resulta nas capacidades competitivas da empresa. A ruptura conceitual operada na construção da RBV, em relação à organização industrial, se dá na origem do desempenho. Na tradição da organização industrial, predominam as causas exógenas da determinação do desempenho. Na perspectiva da RBV, são os fatores internos à firma, retratados na sua configuração de ativos (seguindo a tradição de Chamberlin) ou suas capacidades de inovação e criação (seguindo a tradição austríaca), que determinam, em última instância, o desempenho.

No quadro da RBV, diversos fatores podem estar ligados à raridade e à dificuldade de imitação dos recursos, o que explica o seu potencial como geradores de diferenças sustentáveis de desempenho. Entre eles encontram-se os fatores naturais não reprodutíveis (relevo, raridade de recursos minerais, localização privilegiada), fatores legais e políticos (marcas, patentes, reservas de mercado, direitos de propriedade, influência política), além de elementos organizacionais (capacidades de inovação, capacidades gerenciais distintivas) e fatores econômicos ligados às imperfeições do mercado. A natureza tácita das competências e capacidades organizacionais (Reed e DeFillippi, 1990), as condições históricas únicas que levam a fenômenos de lock-in e path-dependency (Arthur, 1989), a ambigüidade causal e a complexidade cognitiva dos recursos organizacionais (Lippman e Rumelt, 1982; Reed e DeFillippi, 1990; King e Zeithaml, 2001; Barney, 2002), as deseconomias de tempo e as sinergias de ativos (Dierickx e Cool, 1989) estão entre os casos mais importantes de fontes das diferenças de desempenho.

Abordagens Diretas e Descritivas da Heterogeneidade do Desempenho

Schmalensee (1985) iniciou uma linha de análise de componentes de variância de desempenho que permitiu uma visão quantitativa da sua heterogeneidade. Com uso limitado em estratégia, a técnica de componentes de variância tem aplicação intensa em outras áreas como genética, sendo ferramenta para entender a estrutura de heterogeneidade dos fenômenos. Rumelt (1991) ampliou o trabalho de Schmalensee (1985), conseguindo isolar um percentual da variância total atribuível à empresa ou unidade de negócios individuais. Roquebert, Phillips e Westfall (1996) e McGahan e Porter (1997, 2002) realizaram estudos similares, usando uma base de dados muito mais ampla, a COMPUSTAT. Embora os resultados tivessem sido usados para justificar correntes de pensamento diferentes em estratégia e fossem vistos até como contraditórios (Mauri e Michaels, 1998), quando tomados apenas os dados referentes aos setores de manufatura, os resultados apresentam similaridade e consistência (vide Tabela 1).

Todos os estudos que exploraram o percentual da variância associado à empresa ou unidade de negócios individual o identificaram como o maior componente da variância total, com valores entre 33,79% e 46,37%. Este componente representa os fatores idiossincráticos associados à empresa individual, que se manifestam de forma constante durante todo o período analisado. A influência do setor industrial, ao qual pertence a unidade de negócios, respondeu pela segunda maior parcela da variância, com valores entre 10,81% e 19,59%. Hawawini, Subramanian e Verdin (2003) julgam que o efeito da indústria é maior, se considerarmos um grupo mais restrito de empresas, excluindo aquelas de desempenho muito diferente da média. O efeito puro do ano na variância total foi surpreendentemente pequeno. O efeito ano representa fatores que afetam todas as empresas de maneira uniforme em anos específicos. Finalmente, os estudos diferem quanto à influência da corporação a que pertence a empresa ou a unidade de negócios. Apenas Roquebert, Phillips e Westfall (1996) encontraram um efeito significativo da corporação na variância. A questão parece ser sensível à composição da amostra, tendo sido explorada por outros pesquisadores (Brush e Bromiley, 1997; Brush, Bromiley e Hendrickx, 1999; Chang e Singh, 2000; Bowman e Helfat, 2001).

Os estudos acima citados de componentes de variância permitem também uma avaliação quantitativa dessa variância. A Tabela 2 mostra as médias e desvios-padrões encontrados. As estimativas de desvio-padrão variam entre 15,7 e 21,2 pontos percentuais. A relevância da dispersão é o ponto a ser notado aqui. Uma empresa com desempenho de apenas um desvio-padrão acima da média pode ser encarada como altamente bem-sucedida, enquanto a posição de um desvio-padrão abaixo da média pode ser julgada como desastrosa.

Outra linha de pesquisa que esclarece algumas características da distribuição de desempenho, deriva da tradição econométrica. A persistência dos lucros, que contradiz o princípio de movimento rápido em direção ao equilíbrio previsto pelo modelo neoclássico, foi objeto de análise e investigação dos economistas. Mueller (1977) analisou resultados de 472 empresas norte-americanas, cobrindo um período de 24 anos, constatando que um desempenho superior tende a continuar superior e um desempenho inferior tem dificuldades em melhorar de forma significativa. Cubbin e Geroski (1987) concluíram que as diferenças sistemáticas em lucratividade surgem primariamente de componentes específicos da empresa em vez de componentes específicos da indústria. Geroski e Jacquemin (1988) analisaram a persistência de lucros em três países europeus, constatando diferentes graus de persistência entre países. Jacobsen (1988) analisou a persistência de retornos anormais, usando os bancos de dados PIMS e COMPUSTAT. Ele concluiu que o retorno sobre investimento (ROI) podia ser caracterizado por um processo auto-regressivo de primeira ordem, indicando que os lucros convergem. Algumas empresas, contudo, apresentaram persistência de lucros maior do que outras. Integração vertical, participação de mercado e investimentos em marketing provocaram redução na velocidade de convergência dos lucros. Concentração do mercado teve pequena e insignificante influência na persistência. Waring (1996) analisou a distribuição de desempenho dentro de setores industriais específicos, constatando que há setores onde os lucros convergem rapidamente para um valor comum e outros setores onde a diversidade permanece com a persistência dos resultados dos seus participantes. Goddard e Wilson (1996) analisaram a persistência dos lucros em indústrias de manufatura e de serviço no Reino Unido, comprovando a existência do fenômeno da persistência e verificando que ela parece ser marginalmente maior em serviços e apresenta grandes variações por empresas. Este conjunto de análises descritivas da heterogeneidade no desempenho das empresas permite sintetizar seguintes pontos.

. Relevância da heterogeneidade: a dispersão dos resultados de desempenho é muito ampla, quando comparada com a avaliação de sucesso ou insucesso empresarial. Os valores observados mostram que o sucesso e insucesso não distam mais do que um desvio-padrão da média.

. Convergência do desempenho: o modelo econômico de equilíbrio prevê a convergência do desempenho para um valor de equilíbrio ao longo do tempo. Alguns estudos (Mueller, 1977; Jacobsen, 1988) confirmaram essa tendência em determinados períodos e indústrias. A tendência à convergência está, porém, acompanhada de uma força oposta que a retarda ou até a elimina: a persistência do desempenho.

. Persistência do desempenho: empresas com resultados acima ou abaixo da média apresentam tendência de manter esse resultado distanciado da média. Esta persistência varia por empresa e alguns dos fatores que podem influenciá-la foram identificados. A persistência, contudo, parece mais associada à empresa do que ao setor.

. A estrutura da heterogeneidade: a dispersão do desempenho não é distribuição aleatória, existe uma estrutura dela. A maior parte da variância observada está associada a fatores específicos da empresa individual. Ela responde por 30 a 50%, em valores aproximados, da variância total. O setor industrial no qual se insere a empresa é a segunda maior fonte de variação, respondendo por 10 a 20% da variância total.

QUESTÃO DE PESQUISA, DADOS E MÉTODOS

A presente pesquisa tem por objetivo sugerir caminho metodológico e métrica para a vantagem competitiva. A questão que antecede a esta, contudo, é como medir o desempenho. O desempenho das empresas tem natureza multidimensional e não pode ser representado por apenas um índice (Chakravarthy, 1986; Kaplan e Norton, 1996). Além disso, uma verdadeira medida estratégica de desempenho necessita de componente futurístico, que meça a habilidade de a empresa transformar-se para enfrentar os desafios futuros (Chakravarthy, 1986). Os indicadores financeiros acabam sendo usados por sua disponibilidade e comparabilidade; mas é necessário ter em mente que apenas uma dimensão do desempenho está sendo medida. Os estudos de composição de variância acima citados usaram a razão entre o lucro contábil, antes de impostos e custos financeiros, e os ativos totais da empresa. Outros autores, porém, exploraram diferentes formas financeiras de medição de desempenho, como q de Tobin, medidas híbridas, lucro econômico, valor de mercado e até enquetes com gerentes, chegando a conclusões razoavelmente coincidentes (Wernerfelt e Montgomery, 1988; Powell, 1996; McGahan, 1999; Hawawini, Subramanian e Verdin, 2003). Reconhecendo todas essas limitações, a presente pesquisa também estimou o desempenho como a razão entre lucro operacional contábil sobre ativos totais. A sua proposta é de natureza metodológica; assim, a ilustração do método é possível.

A Gazeta Mercantil publica, desde 1977, um relatório anual, consolidando informações disponíveis em balanços publicados e informações submetidas voluntariamente após análise de sua equipe. A edição de 2002 incluiu mais de 10.000 empresas agrupadas em 55 setores industriais, por sua vez divididos em subsetores, chegando a uma classificação final bastante detalhada. Foram selecionados 15 subsetores, em que as empresas apresentavam negócios bastante focados e poderiam ser tratadas como unidades de negócio. Somente empresas com vendas líquidas totais acima de R$10 milhões em 2001 e que tivessem dados para pelo menos três dos quatro anos analisados (1998 a 2001) foram consideradas. No conjunto, foram coletados resultados de 252 empresas com um total de 938 observações.

Foi criado um modelo para representar o resultado de desempenho da empresa, levando em conta grupos de fatores que nela podem influir. O modelo foi inspirado nos trabalhos de análise de componentes de variância, em especial no trabalho de Rumelt (1991). De maneira mais formal, este modelo é representado pela equação (1).

Nesta equação ri,k,t é a razão entre o lucro operacional e os ativos totais. O índice i representa os subsetores ou indústrias. No caso da presente pesquisa i=1,2,...,15. O índice t representa os vários anos considerados na análise, t=1998, 1999, 2000, 2001. O índice k representa as várias empresas consideradas. Como neste estudo foram consideradas 252 empresas, k=1,2,...,252.

O termo µ é a média do desempenho de todas as observações, de todas as empresas em todos os setores e todos os anos. No caso deste estudo, ela foi de 3,8%. O termo γt representa a influência do ano. Os efeitos de ano refletem variações macroeconômicas que influenciam de forma comum todas as empresas em um ano particular. Ciclos de negócios e mercados financeiros são os maiores causadores de efeitos de ano (McGahan, 1999). O termo αi representa a influência da indústria i, sendo equivalente aos industry effects nas análises de componentes de variância. Os efeitos da indústria são fatores que afetam os participantes de uma indústria de forma comum, durante todo o período analisado. Barreiras de entrada, revoluções tecnológicas, amplas oportunidades de crescimento e diversificação são exemplos desse tipo de fatores. O termo δit representa a interação de ano e indústria. Ele captura fatores que afetam, de forma comum, os participantes de uma indústria em um ano particular. Uma safra agrícola excepcional em determinado ano, por exemplo, pode afetar apenas alguns setores industriais e sua influência seria capturada nesse termo.

O termo φk é a contribuição individual da empresa. Ele inclui tudo o que não é explicado pelo ano ou indústria e é específico da empresa k. Este efeito empresa reflete as características únicas da empresa individual que afetam seu desempenho de maneira constante, durante o período analisado. Ele é a medida de quanto a empresa individual difere das demais, de forma sustentada, durante o período em estudo, devido às suas características únicas. Pode ser encarado como medida da vantagem competitiva da empresa durante este período, como sugerido por McGahan (1999). Finalmente, o termo εi,k,t é o resíduo não explicado pelo restante do modelo. Esse termo captura fatores como sorte, interações de indústria e empresa e de ano e empresa e mesmo outros.

O período de tempo analisado tem influência na interpretação dos fatores, já que os efeitos devem estar presentes durante todo o período para serem associados a uma classe de fatores. Especialmente, no caso do termo da empresa, essa observação reflete o caráter temporal da vantagem competitiva. O conceito talvez pode ser mais bem entendido como vantagem competitiva média, durante o período considerado. Longos períodos de análise tendem a reduzir os efeitos da empresa individual, já que diferenças que afetam o desempenho teriam de estar presentes durante todo o período analisado.

A análise de componentes de variância foca-se na determinação da composição da variância, estimando o percentual da variância total que está associado a cada efeito, mas não se preocupa em determinar os valores específicos dos diferentes níveis de cada efeito. Para isto, foi usado um modelo de regressão linear múltipla, com variáveis dummy para os diferentes níveis de cada efeito. Nesta pesquisa foi adotada uma codificação para efeitos conforme descrito por Cohen e Cohen (1983), que faz com que o valor dos coeficientes das variáveis dummy na regressão possam ser interpretados como o efeito em relação à média geral. Os coeficientes das variáveis dummy empresa representam uma medida direta da influência dos fatores individuais e idiossincráticos, presentes durante todo o período analisado no desempenho. Indicam quanto o desempenho é afetado positiva ou negativamente em relação à média. São uma medida da vantagem competitiva resultante, ou da desvantagem dessa empresa, se negativos.

A variável dependente da regressão é a razão entre o lucro operacional e os ativos totais. A regressão, feita desta forma, é equivalente à análise de variância (Netter et al., 1996). Para cada efeito com n níveis são necessárias n-1 variáveis dummy. O modelo teve, então, 268 variáveis dummy: 3 para representar os 4 níveis do efeito ano, 14 para representar os setores industriais e 251 para representar as empresas. A interação entre indústria e ano foi excluída do modelo de regressão, já que uma análise preliminar de componentes de variância mostrou que a variância explicada pela interação era menos que 3% da variância total e a sua inclusão representaria a necessidade de mais 59 variáveis dummy (4 x 15 = 60 níveis). A equação (1) fica então transformada em:

O modelo de regressão tem, portanto, a forma geral dada pela equação abaixo.

onde,

é o valor do lucro operacional sobre ativos, previsto pela regressão. é a média geral dos valores de lucro operacional sobre ativos. At: são as variáveis dummy referentes ao ano. γt: são os coeficientes obtidos na regressão para as variáveis dummy ano. Ii: são as variáveis dummy referentes ao setor industrial. αi: são os coeficientes para as variáveis dummy setor industrial. Ek: são as variáveis dummy referentes a cada uma das empresas consideradas. são os coeficientes para as variáveis dummy de cada empresa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A apresentação e discussão dos resultados está dividida em duas partes. Inicialmente, faz-se análise descritiva da amostra, avaliando-se a distribuição obtida comparando os seus parâmetros com os encontrados em outros estudos. Na segunda parte, a regressão descrita na metodologia é estimada e os coeficientes são interpretados como medida da vantagem competitiva.

A amostra de indústrias brasileiras está detalhada em termos descritivos na Tabela 1. Confirma-se a relevância da dispersão dos valores de desempenho. No setor de produtos petroquímicos, onde foram feitas 200 observações, a média do setor foi de 3,8%, igual à média geral, e o desvio-padrão foi de 12,8 pontos percentuais, próximo também do valor encontrado para a amostra total. Desempenho com desvio-padrão acima da média (3,8 + 12,8 = 16,6%) representaria resultado excelente; desempenho com desvio-padrão abaixo da média (3,8 - 12,8 = -9,0%) seria péssimo resultado.

A Figura 1 mostra o histograma da amostra de empresas brasileiras analisada, comparado com a curva normal. A análise demonstra que a distribuição é quase simétrica e, claramente, uma distribuição leptocúrtica, ou seja, apresenta pico central maior do que a distribuição normal e caudas mais espessas. Isto é evidenciado pelo coeficiente de curtose de 5,03, superior a 3, correspondente à curva normal. Intuitivamente, uma distribuição leptocúrtica representa uma situação, cujas laterais da curva foram desbastadas e o material removido adicionado ao pico e às caudas (Spanos, 1999). Isto indica que o desempenho tende a agrupar-se mais em torno da média, mas que, ao mesmo tempo, existem mais observações com valores muito distantes da média do que ocorreria em distribuição normal.


A distribuição de desempenho claramente difere de uma distribuição normal. O teste de Kolmogorov-Smirnov rejeita a hipótese de normalidade com p-value de 0,000.

A segunda parte da análise deste trabalho procura determinar os parâmetros da regressão linear que modela o desempenho em função dos fatores setor industrial, ano e empresa individual, conforme descrito anteriormente. A Tabela 1 mostra a significância da regressão que obteve um R2 de 0,686, explicando, portanto, 68,6% da variância observada nos dados. A regressão foi estatisticamente significativa com um p-value de 0,000.

A regressão apresentou multicolinearidade apenas entre as variáveis Ii que representavam os vários setores industriais. As demais variáveis apresentaram VIFs (variance inflation factors) abaixo de 5. A multicolinearidade não afeta o poder prognóstico da regressão, afetando apenas a precisão na determinação dos coeficientes das variáveis envolvidas (Netter et al., 1996). Como os coeficientes de interesse da presente pesquisa são os Φk, referentes às variáveis dummy das empresas individuais, o problema de multicolinearidade não tem implicação prática para esta pesquisa. A análise dos resíduos também não apresentou problemas graves.

Os coeficientes Φk representam a influência específica da empresa k na estimativa do desempenho. Por exemplo, a empresa 8 do estudo, da área petroquímica, teve coeficiente de Φ8 = 12,545. A interpretação é que fatores intrínsecos, associados apenas à empresa 8, influenciam o resultado dela em 12,545 pontos percentuais em relação à média. Se a média for 3,8%, o efeito empresa 8 levaria este resultado para (3,8 + 12,5 = 16,3%). O resultado real da empresa sofre a influência paralela de outros fatores como o ano e setor industrial, como mostra a equação (2), mas a influência pura dos fatores individuais e idiossincráticos foi estimada pela regressão como 12,545. O fato de que o valor é positivo indica que a empresa teve vantagem em relação à média. Se o valor fosse negativo, como ocorreu, por exemplo, com a empresa 22, do setor de aço, que teve coeficiente de Φ22 = -14,230, a empresa teria desvantagem competitiva resultante em relação à média, neste valor.

É interessante avaliar a distribuição desses coeficientes. Um histograma desta distribuição está apresentado na Figura 2. Temos distribuição aproximadamente simétrica, um pouco deslocada para a direita. As empresas que têm os seus coeficientes do lado extremo direito apresentam vantagem competitiva e as empresas que se posicionam à esquerda uma desvantagem competitiva. Em ambos os casos, as vantagens e desvantagens são relacionadas apenas a fatores intrínsecos e específicos das empresas, já que os demais fatores, incluindo o componente aleatório, não estão contidos aí.


A regressão permite também testar se os coeficientes são significativamente diferentes de zero. Para cada coeficiente, determina-se uma estimativa de desviopadrão; um teste t pode ser usado para verificar se ele é diferente de zero. Em outras palavras, é possível usar um teste estatístico para validar a existência ou não da vantagem competitiva. Na amostra analisada de 252 empresas, apenas 89 apresentaram coeficiente significativamente diferente de zero no nível de significância de 0,05. Dessas 89 empresas, 44 (17,5% do total de 252) apresentaram coeficiente negativo, indicando desvantagem competitiva; 45 (17,9%) apresentaram coeficiente positivo ou vantagem competitiva significativa em relação à média. Se um nível de significância de 0,10 fosse assumido, mais 19 empresas seriam classificadas como tendo vantagem ou desvantagem competitiva significativa. Neste caso, 47 (18,7%) empresas teriam desvantagem competitiva e 61 (24,2%), vantagem competitiva.

CONCLUSÕES

O presente trabalho traz três contribuições para a pesquisa em estratégia. A análise descritiva das distribuições de desempenho de empresas brasileiras confirma, em primeiro lugar, a relevância do estudo da heterogeneidade do desempenho. A dispersão de valores encontrada é elevada, quando comparada à avaliação geral que se pode fazer do desempenho de uma empresa. Estar um desvio-padrão acima ou abaixo da média pode significar a diferença entre grande sucesso ou grande fracasso. Esta constatação contradiz as conclusões de Powell (2003, p. 83), que vê o desempenho excepcional como raro, quase um outlier, questionando o valor das teorias de vantagem competitiva: "nada de excepcional está acontecendo no desempenho da maioria das indústrias. A ação ocorre nos casos extremos, e é lá onde as teorias de estratégica adicionam valor". Esta pesquisa mostra que desempenho superior, ou inferior, não é fato raro.

A segunda, e mais específica, contribuição deste trabalho é a proposta de uma definição operacional mais precisa e de uma métrica para medir a vantagem competitiva. Embora o conceito de vantagem competitiva se tenha tornado central na pesquisa em estratégia, ele tem sido usado como variável intermediária entre o desempenho superior consistente e os fatores que podem causá-la (Wiggins e Ruefli, 2002). Com a definição operacional proposta, a vantagem competitiva pode ser isolada de outros fatores que afetam o desempenho de maneira externa à empresa e medida. A abordagem apresenta vantagens em relação à simples comparação direta de resultados. Primeiro, ela mede apenas os fatores intrínsecos à empresa que afetaram o desempenho de forma consistente, eliminando as influências do ano específico, da indústria e até da sorte. Segundo, ela tem comparabilidade. Ela transforma todos os efeitos no desempenho em valorresultante: o efeito no desempenho nas unidades de medida utilizadas. É possível comparar empresas em diferentes setores e países, e avaliar quantitativamente em quanto uma vantagem competitiva é maior ou menor do que outra. Terceiro, ela pode ser testada estatisticamente.

A vantagem competitiva de um grupo de empresas brasileiras no período de 1998 a 2001 foi medida com esta abordagem, e analisada a distribuição dos valores encontrados. Mais de 35% das empresas analisadas apresentavam vantagem ou desvantagem competitiva com nível de significância de 0,05. Esses dados confirmam que a presença de desempenho superior não é fato raro.

Interessantes também são as noções de vantagem competitiva resultante e vantagem competitiva média. A medição proposta está avaliando o resultado combinado de todas as influências associadas à empresa individual no desempenho. Está, portanto, medindo uma vantagem competitiva resultante. Essa noção esclarece muitas das colocações propostas por Powell (2001) na sua exploração dos fundamentos lógicos e filosóficos da vantagem competitiva. O período selecionado também tem influência importante, já que a medição considera apenas os fatores que estiveram presentes durante todo o período considerado. Se períodos mais longos forem considerados, a possibilidade de os fatores que determinam a vantagem competitiva terem sofrido variação é maior. Provavelmente, a parcela da variação dos resultados que pode ser associada de forma permanente à empresa individual será menor e a determinação da vantagem competitiva menos definida, porquanto o que está sendo avaliado é a vantagem competitiva média, durante o período considerado.

A terceira contribuição do presente estudo é de cunho metodológico. March e Sutton (1997) criticaram muitos estudos que selecionaram um tipo de fatores potencialmente determinantes do desempenho para serem analisados e procuraram correlacionar estes fatores com o desempenho. A falta de controle experimental na análise baseada em observação e a natureza multidimensional, repleta de ambigüidade causal, do desempenho e seus determinantes frustram os objetivos iniciais. O presente trabalho sugere caminho inverso. A possibilidade de medir a vantagem competitiva, com definição operacional mais precisa, permite partir dos dados observacionais completos, com os efeitos resultantes de todos os construtos possíveis, analisar sua distribuição, agrupar empresas com resultantes semelhantes e, a partir daí, encontrar características comuns, fatores subjacentes.

Wiggins e Ruefli (2002) colocam que a maioria das pesquisas sobre vantagem competitiva focaliza o desempenho como variável dependente e procura estudar a natureza do amplo leque de variáveis independentes que afetam o desempenho, mas pouca atenção tem sido dada a topografia do desempenho propriamente dito. "Isto é similar à situação de um epidemiologista que estuda os vários fatores que poderiam afetar determinada condição clínica - sem se preocupar em determinar a incidência e relevância desta condição na população" (Wiggins e Ruefli, 2002, p. 83).

A abordagem de medição da vantagem competitiva tem na sua novidade uma fraqueza. Ela necessita de mais ampla investigação e de aplicações práticas para ter sua utilidade comprovada. A amostra restrita de empresas brasileiras é outra limitação. Diferentes extensões de tempo deverão ser exploradas. O modelo de regressão poderia ser melhorado com a inclusão de termos de interação, termos auto-regressivos e outras abordagens. Diferentes critérios ou combinação de critérios de medição de desempenho devem ser explorados. Estudos futuros, partindo desta constatação comprovada de vantagem/desvantagem competitiva, podem investigar os grupos de empresas com e sem vantagem similares, identificando padrões, práticas e situações, em vez de seguir o caminho oposto.

Artigo recebido em 27.08.2003.

Aprovado em 03.12.2003.

Luiz Artur Ledur Brito, é Doutorando em Administração de Empresas na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas. Professor do Departamento de Operações da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas. Suas áreas de interesse em pesquisa são operações, estratégia.

Endereço: Fundação Getulio Vargas - FGV, Escola de Administração de Empresas de São Paulo - EAESP, Av. 9 de Julho, 2029, 10º andar, 01313-902, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: lbrito@fgvsp.br

Flávio Carvalho de Vasconcelos, é Doutor em Administração de Empresas pela École des Hautes Études Commerciales, França. Professor do Departamento de Administração Geral e de Recursos Humanos da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas. Sua área de interesse em pesquisa é estratégia e teoria organizacional.

Endereço: Fundação Getulio Vargas - FGV, Escola de Administração de Empresas de São Paulo - EAESP, Av. 9 de Julho, 2029, 9º andar, 01313-902, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: fvasconcelos@fgvsp.br

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Mar 2009
  • Data do Fascículo
    2004

Histórico

  • Aceito
    03 Dez 2003
  • Recebido
    27 Ago 2003
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