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Restaurante Sabor de Casa

Sabor de Casa Restaurant

Resumos

As empresas familiares de pequeno porte apresentam uma série de peculiaridades e desafios, em especial na administração de recursos humanos. Este caso descreve uma situação real de uma empresa, Restaurante Sabor de Casa, que retrata as relações entre fundador e sucessor e suas conseqüências nas políticas e práticas de recursos humanos. O relato é narrado sob o ponto de vista do sucessor, que pensa sobre a situação da empresa e vivencia a dinâmica e complexa etapa de atuar com sua mãe, fundadora da empresa, cuja atuação tem caráter empreendedor, embora tradicional. Mostra as suas reflexões sobre os rumos da empresa, a opinião dos funcionários, com base numa pesquisa realizada em 2006 por estudantes universitários e seus questionamentos sobre a forma de gerenciar a contribuição de seus funcionários, principalmente por reconhecer sua importância para o presente e futuro da empresa. Este caso trata da complexidade da administração de recursos humanos em ambiente organizacional familiar.

empresa familiar; administração de recursos humanos; ambiente organizacional


Small family businesses present a series of peculiarities and challenges, especially when it comes to the management of human resources. This case describes the true situation of an enterprise, Restaurante Sabor de Casa, and portrays the relationship between the founder and successor and its consequences on the practice and policy of human resources. The story is told from the point of view of the successor, who thinks about the situation of the company and his deep involvement in the dynamic and complex stage of working with his mother, the founder of the company, whose performance is that of an entrepreneur, albeit a traditional one. It shows his reflections on the directions the company has taken, the opinions of employees, based on research conducted in 2006 by university students and their questions about the way the contributions of the employees are managed, mainly by recognizing their importance for both the present and the future of the company. This case deals with the complexity of the management of human resources in a family organizational environment.

family business; management of human resources; organizational environment


CASOS DE ENSINO EM ADMINISTRAÇÃO

Restaurante Sabor de Casa

Sabor de Casa Restaurant

Patrícia Whebber Souza de OliveiraI, * * Endereço: Av. Rodrigues Alves, 557, Petrópolis, Natal/RN, 59020-200. E-mail: patriciawh@unp.br; patriciawh@bol.com.br ; Nilda Maria de Clodoaldo Pinto Guerra LeoneII; Tereza de SouzaIII

IDoutora em Educação pela UFRGS. Professora do Mestrado Profissional em Administração da UnP, Natal/RN, Brasil

IIDoutora em Ciências da Administração pela Université de Grenoble II, França. Professora do Mestrado Profissional em Administração da UnP, Natal/RN, Brasil

IIIDoutora em Administração de Empresas pela FGV-SP. Coordenadora do Mestrado Profissional em Administração da UnP, Natal/RN, Brasil

RESUMO

As empresas familiares de pequeno porte apresentam uma série de peculiaridades e desafios, em especial na administração de recursos humanos. Este caso descreve uma situação real de uma empresa, Restaurante Sabor de Casa, que retrata as relações entre fundador e sucessor e suas conseqüências nas políticas e práticas de recursos humanos. O relato é narrado sob o ponto de vista do sucessor, que pensa sobre a situação da empresa e vivencia a dinâmica e complexa etapa de atuar com sua mãe, fundadora da empresa, cuja atuação tem caráter empreendedor, embora tradicional. Mostra as suas reflexões sobre os rumos da empresa, a opinião dos funcionários, com base numa pesquisa realizada em 2006 por estudantes universitários e seus questionamentos sobre a forma de gerenciar a contribuição de seus funcionários, principalmente por reconhecer sua importância para o presente e futuro da empresa. Este caso trata da complexidade da administração de recursos humanos em ambiente organizacional familiar.

Palavras-chave: empresa familiar; administração de recursos humanos; ambiente organizacional.

ABSTRACT

Small family businesses present a series of peculiarities and challenges, especially when it comes to the management of human resources. This case describes the true situation of an enterprise, Restaurante Sabor de Casa, and portrays the relationship between the founder and successor and its consequences on the practice and policy of human resources. The story is told from the point of view of the successor, who thinks about the situation of the company and his deep involvement in the dynamic and complex stage of working with his mother, the founder of the company, whose performance is that of an entrepreneur, albeit a traditional one. It shows his reflections on the directions the company has taken, the opinions of employees, based on research conducted in 2006 by university students and their questions about the way the contributions of the employees are managed, mainly by recognizing their importance for both the present and the future of the company. This case deals with the complexity of the management of human resources in a family organizational environment.

Key words: family business; management of human resources; organizational environment.

INTRODUÇÃO

No início de mais um dia de trabalho, aguardando o telefone tocar para mais uma série de pedidos diários, Ronnald, na solidão de seu posto de trabalho, perguntava-se: como será o dia de hoje? Será que tudo vai funcionar adequadamente? Sua maior preocupação, como nos demais dias, era não atrasar a entrega dos produtos ao cliente, fato que nem sempre ocorria. Afinal tornou-se proprietário de forma legítima, adquirindo parte da empresa, fundada por sua mãe e, conseqüentemente, destacando-se na condição de sucessor. Apesar de reconhecer o sucesso de Lourdes, sua mãe, como empreendedora, Ronnald sabe que o mercado está mais competitivo, os clientes mais exigentes e os recursos mais escassos, não podendo mais a empresa ser gerenciada de forma intuitiva e pelo bom senso, tal como na época de sua fundação.

Há alguns meses, Ronnald havia autorizado uma pesquisa que foi realizada tanto junto aos empregados quanto com entre os dirigentes (ele e sua mãe) sobre diversos aspectos relacionados com o funcionamento do Restaurante. Os resultados da pesquisa foram bastante reveladores da realidade do Sabor de Casa. Enquanto o telefone não começava a tocar, com os pedidos daquele novo dia de trabalho, Ronnald refletia sobre como conversar com sua mãe sobre as mudanças que precisaria colocar em prática como resposta aos resultados contidos no relatório que tinha em mãos.

A HISTÓRIA DA EMPRESA

O restaurante Sabor de Casa teve início na década de 80, através da iniciativa de Lourdes, dona de casa, que sempre teve o dom da culinária, mas que nunca havia trabalhado na área. Após o casamento, havia deixado de trabalhar por imposição do marido, já que, na época, tinha crianças pequenas. Diante das dificuldades financeiras, estimulada por uma amiga e médica da família, resolveu abrir o seu próprio negócio.

Após um ano, o negócio começou a crescer, passando a não ser mais conveniente permanecer no ponto-casa no qual estava instalado. Assim foi alugado um imóvel para ponto comercial, separando-se do ambiente familiar.

Após várias mudanças de imóvel, no mesmo bairro, apenas com produção e serviços de entrega de marmitas e quentinhas, Lourdes resolveu mudar a empresa para um imóvel próprio, em bairro distante. Esse foi o segundo desafio, após a abertura do negócio caracterizado como primeiro desafio. Toda a família era contra, considerando que basicamente 90% de seus clientes eram de outro bairro. Mas dona de um temperamento forte e com "a cara e a coragem", palavras da própria fundadora, não só fez a mudança do local como passou a fornecer, além do serviço de quentinhas e marmitas, refeições no próprio local, tornado-se um Restaurante.

Em meados dos anos 2000, Ronnald, já apresentando experiência e potencial na área comercial, adquiriu a posição de sócio-proprietário, quando injetou capital na empresa, passando, assim, a gerenciar a empresa na área comercial, administrativa e financeira, ficando sua mãe na área de produção.

Atuando há mais de 20 anos no mercado, Ronnald e Lourdes reconhecem que há predominância de oportunidades, caracterizada especialmente pelo aumento da demanda por service food.

O SABOR DE CASA EM 2006

Ronnald reconhece que atua numa área limítrofe de mercado, cuja principal característica, serviços personalizados de qualidade e baixo custo, por um lado, se torna um diferencial competitivo; entretanto, se não for bem gerenciada, pode rapidamente tornar-se um ponto fraco da empresa.

Atualmente a empresa vem apresentando receitas satisfatórias; entretanto reconhece que não tem controle de estoque e custos operacionais. Conta com 10 colaboradores diretos, distribuídos nas áreas de produção e embalagem, de atendimento e administrativa.

Em termos de investimentos de capital, a empresa não investiu em inovações tecnológicas e organizacionais, exceto na ampliação de suas instalações físicas. Os clientes consideram boa a qualidade dos produtos ofertados pela empresa; entretanto reclamam da falta de padronização dos produtos: variação de quantidade e troca de itens solicitados.

Neste contexto, permanece a questão de como implementar melhorias na empresa. Como? Ronnald reconhece que deve ser através das pessoas. Assim, começou a pensar sobre a área.

A GESTÃO DE PESSOAS NA EMPRESA

Ronnald e Lourdes reconhecem a necessidade de maior investimento na área de recursos humanos, em especial na capacitação e valorização dos empregados, mas não tinham noção de como sistematizar as ações neste sentido.

Assim, Ronnald, quando procurado por uma equipe de universitários, solicitando autorização para uma pesquisa sobre gestão de pessoas na empresa familiar, não teve dúvidas de que esta poderia contribuir para melhor compreensão da empresa. A idéia da realização da pesquisa lhe pareceu oportuna, abriu as portas da empresa, permitindo prontamente todos os procedimentos teóricos e metodológicos sugeridos pelos universitários. De imediato, comunicou os objetivos da pesquisa e apresentou os universitários para sua mãe e seus funcionários, solicitando prontidão e disponibilidade para eles.

Como resultado, obteve informações importantes que o fizeram repensar a gestão de pessoas e os processos organizacionais.

A cultura organizacional da empresa identifica-se pela flexibilidade e caráter pessoal das relações interpessoais, não havendo separação das atividades funcionais da empresa. O caráter informal da empresa tem implicações no modo como são distribuídas as atribuições e responsabilidades de cada área.

A estrutura de cargos e salários atende relativamente às necessidades dos empregados, mesmo considerando-se baixos os salários da categoria, em relação a outras áreas. Os empregados dificilmente têm como ascender a funções mais complexas, pela própria estrutura da empresa, com poucos níveis hierárquicos.

O recrutamento e seleção são realizados por Ronnald ou por Lourdes. A principal fonte de recrutamento é a indicação de candidatos pelos próprios empregados e os critérios considerados têm como base a experiência profissional no cargo. A seleção é feita mediante uma rápida entrevista, além de testes práticos na área de atuação.

Os programas de treinamento e desenvolvimento têm ênfase no treinamento em serviço, cuja principal característica se encontra no fato de um empregado antigo transmitir conhecimentos para os novos funcionários.

A avaliação de desempenho tem caráter eminentemente informal. Os funcionários são avaliados pelo seu desempenho na função e os principais critérios têm base nos aspectos técnico-operacionais.

Processo Decisório e Estilo de Liderança

O poder de decisão encontra-se centralizado na área gerencial, limitando a participação dos empregados, principalmente no que diz respeito às definições de metas e mudanças nos processos de trabalho. Os gestores têm estilos de liderança democráticos, apesar de, em certas circunstâncias, tornálos eminentemente autocráticos, principalmente nas situações críticas emergenciais, gerando clima de insatisfação e instabilidade no ambiente.

Então começa a leitura do relatório da pesquisa dos universitários, pensativo, procura refletir o que melhorou até a situação presente.

Percepção da Empresa pelos Funcionários

Os funcionários, de modo geral, mencionaram estar satisfeito com o seu trabalho, considerando o relacionamento com as pessoas, bom ambiente de trabalho, a liberdade para trabalhar, existência de pessoal divertido e especialmente gostar do que faz.

Dentre as principais dificuldades para trabalhar na empresa, os funcionários destacaram: a falta de produtos e mercadorias, a falta de organização, o tratamento por parte de algumas pessoas e as condições precárias na rotina de trabalho.

A maioria dos funcionários considerou que o fato de trabalhar com pessoas da mesma família têm interferência no seu trabalho, principalmente pela diferença de opinião entre os gestores, destacando que existiam diferentes pessoas a darem ordem.

Os funcionários relataram ter dificuldades ao lidar com as diferenças de opinião entre os membros da família, em especial da fundadora e do sucessor, conforme relatos a seguir: "[...] ao fazer a comida uma pessoa dar opinião e a outra dar outra opinião" (F1)(1 1 (F1), (F2) ... refere-se às falas dos diferentes funcionários da empresa. ); "um dar uma ordem e o outro dar outra, deixando o funcionário confuso" (F2); "[...] um manda fazer pouca comida e acaba ocasionando problemas" (F4).

Quanto aos benefícios para os funcionários e para a família empresária, os mesmos alegaram não existir diferenças, sendo todos tratados de acordo com sua função.

Os funcionários, de modo geral, mencionaram não ter medo de dar opinião a qualquer pessoa da família, considerando que é melhor emitir sua opinião e dizer o que está ocorrendo de errado, desejando desta forma, o melhor para a empresa. Outros, apesar de não ter medo, destacam que sua opinião não é levada a efeito.

Dentre os pontos positivos da empresa, destacaram-se prioritariamente: o bom relacionamento com o proprietário e com os colegas, a sinceridade e disponibilidade do patrão, administração do proprietário, amizade e união com as colegas de trabalho e o crescimento e desenvolvimento da empresa em curto prazo. Além de férias e salário em dia, pagamento correto e adiantamento dos salários, quando necessário.

Como pontos negativos, consideraram: forma de tratamento com os empregados, falta de colaboração dos colegas, falta de organização, falta de comunicação, condições precárias na rotina de trabalho, pouco salário, e em alguns setores, que precisaria ter profissionais treinados, o treinamento da equipe é pouco realizado.

Quanto às medidas que tomariam para melhorar o ambiente de trabalho, os empregados investiriam na redefinição de funções, na sua capacitação, na melhoria nos relacionamentos entre os colegas e na aquisição adequada de produtos.

Os funcionários alegam sua permanência na empresa pelos seguintes motivos: necessidade de trabalhar; bom relacionamento e sinceridade do patrão; amizade e relacionamento com colegas; gostar do que faz; pontualidade no pagamento, ambiente de trabalho e uma maneira de participar da família. Para os funcionários, a empresa poderia melhorar o tratamento entre o patrão e empregado, principalmente em situações de estresse; a organização, comunicação e ambiente organizacional.

Quanto aos erros atuais da empresa, os funcionários não deixariam acontecer na sua própria empresa que alguns trabalhassem com falta de atenção, não atendendo às solicitações do patrão, fizessem coisas erradas e não assumissem, trabalhassem sem compromisso e conversassem na hora do trabalho; trabalhariam melhor o estoque e controle das carnes, até mesmo chegando um dia antes; não teriam tratamento inadequado com os funcionários e não deixariam ter falta de organização e de higiene.

Ronnald pensa no que afinal permanece ocorrendo hoje na empresa, fazendo um resumo mental, reconhecendo quanto os funcionários têm contribuição a dar para melhoria dos processos; mas as atividades do dia-a-dia não permitem que essas melhorias sejam efetivadas.

Reflexões de Ronnald

Ronnald não mais tem tempo de continuar a ler o relatório; afinal já eram 11h, e começavam a chegar os clientes de balcão e os telefones a tocar insistentemente. O movimento é enorme, não há tempo nem para olhar em volta, é como se estivessem entrando num palco, o planejado foi além e o que ocorre se torna improviso.

Após o movimento do dia, por volta das 15 horas, Ronnald volta ao relatório de pesquisa, agora na parte da percepção dos gestores.

Parecia que naquele dia ele estava inspirado. Assim, procurou analisar as principais divergências entre suas opiniões e as de sua mãe, fazendo uma espécie de lista mental, refletiu. Apesar das divergências, Ronnald considera que ambos estão satisfeitos com o trabalho e desempenho satisfatório dos familiares; concordam em que os pontos positivos da empresa estão relacionados à qualidade do produto, atendimento ao cliente, preço baixo, ótima localização e pagamento dos funcionários em dia.

Ao terminar sua lista mental, Ronnald continua pensativo, procurando lembrar-se das observações dos universitários, no feedback, no término da pesquisa: 1) Ainda há na empresa uma característica cultural predominante da informalidade e familiaridade nas relações de trabalho. 2) Os empregados são valorizados e reconhecidos; mas isto não se reflete exatamente nas práticas diárias. 3) Há necessidade de profissionalizar a empresa; esta já apresenta amplo potencial para desenvolvimento; entretanto há um uso inadequado das ferramentas de gestão. 4) As decisões e relações profissionais relativas às pessoas ainda estão permeadas pelo caráter paternalista e subjetivo. 5) O impasse entre fundador e sucessor reflete-se na ambivalência dos sentimentos e percepções dos empregados, que tentam agradar a ambos e ao mesmo tempo realizar o trabalho da forma que consideram corretas. 6) De modo geral, os empregados consideram a empresa um excelente local para trabalhar; entretanto acham que a empresa pode melhorar em termos de qualidade dos serviços prestados.

O Problema

Ronnald pensa, agora, o que fazer para compartilhar sua percepção com a mãe, sem ofendê-la, e pensa: "como posso começar o processo de mudança na empresa, sem afetar minhas relações familiares. Gostaria de começar pelos funcionários, mas como? Já perdi muito tempo." Eis que começa um turbilhão de idéias, conflitos e sentimentos deste jovem sucessor, que permanece com os seus pensamentos solitários e difusos. Resolve, então, ir surfar para que as idéias possam fluir suavemente, desejando que a sensação do deslizar sobre as ondas consiga inspirá-lo a encontrar alternativas viáveis para a situação em que sua empresa se encontra.

NOTAS DE ENSINO

Objetivos de Aprendizagem

O caso enfatiza as principais dificuldades do gerenciamento de uma empresa familiar, justamente pela justaposição dos papéis: empresa, família e gestão. Estas dificuldades refletem-se nas políticas e procedimentos de administração de recursos humanos.

Seus objetivos são desenvolver nos participantes: 1) conhecimentos sobre as peculiaridades da empresa familiar; 2) reconhecimento da possibilidade de aplicação dos conceitos de administração de recursos humanos nas PMEs; 3) capacidade diagnóstica na área numa concepção estratégica e sistêmica; 4) análise crítica da literatura; 5) busca de alternativas de ação para equilibrar os fatores impulsores e restritivos; 6) capacidade de estabelecer claramente o link entre teoria e prática.

Fontes dos Dados

Este caso relata uma situação real, iniciada em meados de 2006, numa empresa da área de alimentação. As situações apresentadas são fieis à realidade pesquisada. As informações coletadas são de caráter primário, sendo utilizadas técnicas de observação, questionários e entrevistas com os funcionários e gestores. Para garantir a fidelidade das informações, os proprietários da empresa foram consultados, autorizando a sua publicação.

Sugestões para Discussão do Caso

Este caso pode ser lido em 30 minutos em sala de aula. Sugere-se sua aplicação em cursos de graduação e/ou especialização em administração de recursos humanos e gestão de empresas familiares. Nota-se a importância da seqüência dos passos: 1) Explicação sobre a empresa familiar e uso dos conceitos da área; 2) leitura individual; 3) discussão em pequenos grupos; 4) discussão em plenária; 5) apresentação pelo professor da temática e da situação.

Questões para Discussão

1) Com base no ambiente onde a empresa está inserta, identifique os pontos impulsores e restritivos da organização no seu atual estágio, em especial da gestão de pessoas.

2) Que estratégias de gestão de pessoas devem ser adotadas pela empresa?

3) Relacione as alternativas de ação na gestão de pessoas, podendo associá-las às ações de outras áreas organizacionais, necessárias em curto, médio e longo prazo.

4) Como a literatura de gestão de pessoas e comportamento organizacional contempla os problemas apresentados no caso?

Análise do Caso

Pode-se começar a discussão do caso, abordando a gestão de pessoas no contexto organizacional, considerando o ambiente em que a empresa se insere, o porte e tipo de empresa, em especial o fato de ser empresa familiar.

Deve-se destacar que o sistema da empresa familiar é composto por três subsistemas: interdependentes, mas superpostos: gestão/empresa, propriedade e família (Gersick, Davis, Hampton, & Lansberg, 1997).

Neste contexto, as políticas e gestão de pessoas devem ser definidas de acordo com as demandas organizacionais, considerando que a empresa é de pequeno porte, devendo-se evitar a sofisticação e burocratização da área. Assim, não se devem neutralizar os pontos fortes da Empresa.

Deve-se reconhecer os paradoxos e contradições organizacionais, entendendo que a empresa não funciona como máquina, de forma linear e previsível, mas com elementos que se influenciam mutuamente (Morgan, 1996).

Como premissa básica, deve-se considerar o equilíbrio entre os objetivos organizacionais e os objetivos individuais, incluindo a existência de um acordo implícito que permeia as relações entre empresa e funcionários (Milkovich & Boudreau, 2000)

A partir daí, ganha força a necessidade de discutir a elaboração das políticas e práticas da gestão de pessoas, sempre na justa medida das demandas e recursos organizacionais. De nada adianta estabelecêlas sem que a empresa possa implementá-las e mantê-las.

Práticas de Gestão de Pessoas

Quanto às práticas de gestão de pessoas, deve-se considerar a concepção estratégica e sistêmica (Jamrong & Overholt, 2004). O Recrutamento por indicação de funcionários deve ser visto como positivo, visto que há pessoas potencialmente bem avaliadas e aceitas pelos funcionários; entretanto o processo de seleção deve ser profissionalizado. Realizando-o sem critérios, a empresa corre o risco de contratar profissionais com perfil inadequado para o cargo.

Em face disso, sugere-se que seja discutido com o grupo a importância de ações de treinamento e desenvolvimento, considerando a necessidade da empresa de ter seus processos padronizados e voltados para o cliente.

Nesta etapa, chega-se a uma das questões fundamentais da gestão de pessoas, o sistema de salários, benefícios e incentivos. Pode-se, assim, ressaltar que as políticas salariais de uma empresa devem levar em conta as características do ambiente externo, as condições organizacionais e características individuais (Milkovich & Boudreau, 2000).

Neste sentido, deve-se, ainda, considerar a importância da análise e descrição dos cargos (Milkovich & Boudreau, 2000), gestão de desempenho (Lucena, 1995) e reconhecimento dos funcionários (Robbins, 2002).

O que se deve mostrar é que as políticas e práticas de gestão de pessoas devem estar interligadas, desencadeadas a partir das necessidades organizacionais, que não são pontuais nem factuais.

Liderança e Participação dos Funcionários

Uma questão importante a ser abordada é a importância da liderança e seus impactos no comportamento dos liderados. A liderança tem papel crucial no comportamento do grupo, visto que o líder oferece a direção para o alcance dos objetivos (Robbins, 2002).

Quando se discute a questão da liderança, é importante destacar as variáveis situacionais, tais como se defendem nas teorias contigenciais. Pode-se subsidiar a discussão, abordando a teoria da liderança situacional de Hersey e Blanchard (1986), destacando que não existe um único modo de influenciar pessoas e que o estilo do líder depende da maturidade dos liderados (Hersey & Blanchard, 1986).

Deve-se concluir a discussão do caso, tratando a temática de participação e reconhecimento dos funcionários (Robbins, 2002).

Estratégias de Gestão de Pessoas

Ronnald, neste sentido, deve priorizar a definição de estratégias de gestão de pessoas, antes de mobilizar os recursos organizacionais para outras áreas, sem perder o foco na visão sistêmica da organização.

A empresa tem pontos impulsores que devem ser reconhecidos e que contribuem para seu desenvolvimento; entretanto apresenta alguns problemas que precisam ser resolvidos.

Como estratégias de gestão de pessoas, Ronnald deve priorizar: 1) Definição de atribuições, objetivos e metas dos funcionários. 2) Investimento em treinamento e desenvolvimento, até mesmo para os gestores. 3) Participação e envolvimento dos funcionários. 4) Valorização e reconhecimento dos funcionários.

Alternativas de Ação

Divergência de Opinião entre os Gestores

De acordo com os funcionários, as dificuldades de trabalhar na empresa decorrem, em grande parte, das divergências de opinião entre os gestores. Ambos, Ronnald e Lourdes, tiveram sucesso no negócio baseado nas suas características empreendedoras; entretanto, no atual estágio da empresa, há necessidade de conhecimentos técnicos que podem ser adquiridos com a participação em cursos, tais como: Liderança; Gerência e Gestão de negócios.

Assim, poderão definir adequadamente suas responsabilidades, além da visão e estratégias do negócio, priorizando a empresa em detrimento das divergências familiares.

Cultura Organizacional Baseada na Informalidade

A informalidade e pessoalidade nas relações interpessoais contribuem para um bom ambiente de trabalho, percebido pelos próprios funcionários; entretanto em excesso podem levar à falta de clareza na definição de objetivos, metas e processos organizacionais.

Desse modo, há necessidade de a empresa começar a padronização dos processos organizacionais, incluindo a produção, e definir políticas e práticas de gestão de pessoas.

Processo Decisório Centralizado

Os gestores demonstram ter atuação empreendedora. Com isso, há uma tendência à centralização das decisões. Tal fato limita a autonomia e responsabilidade dos funcionários.

Desta forma, Ronnald e Lourdes vão ter uma atuação política que estimula a participação dos funcionários, com reuniões informais, café da manha (gestores) e visitas aos setores.

Deficiência no Processo de Comunicação

Como o processo de comunicação na empresa se encontra deficitário, entre os próprios gestores, Ronnald deveria realizar reuniões mensais de planejamento, acompanhamento e avaliação do trabalho.

Falta de Definição das Atribuições e Responsabilidades

Não há definição de responsabilidades das áreas/funcionários; estes não conhecem claramente as expectativas dos gestores. As atribuições não estão bem definidas. Nota-se que há necessidade da descrição e análise dos cargos para o conhecimento das competências: conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias ao ocupante dos cargos.

Seleção de Pessoal Deficitária

O recrutamento e seleção podem ser aperfeiçoados, em termos dos critérios e técnicas utilizadas. Por exemplo, uso de testes de simulação, baseados na análise e descrição de cargos.

Falta de Capacitação dos Funcionários e Reconhecimento dos Funcionários

As ações na área de treinamento e desenvolvimento da empresa estão calcadas no treinamento em serviço. Nota-se que há necessidade de investimento em treinamentos na área comportamental, em especial: Qualidade no atendimento ao cliente; Relacionamento interpessoal e Trabalho em equipe.

Quanto ao reconhecimento dos funcionários, Ronnald deveria implantar um plano de benefícios e incentivos: plano de saúde, cesta básica, premiação e incentivos. Estes devem levar em conta os recursos financeiros da Empresa.

Além disso, como os funcionários demonstraram valorizar o ambiente de trabalho e os relacionamentos interpessoais, Ronnald e Lourdes poderiam promover maior integração social na empresa, com participação da família: comemoração de datas especiais. Estas atividades, em geral, apresentam baixo custo e permitem maior envolvimento do funcionário e da família com a Empresa.

Avaliação de Desempenho Informal e Calcada em Critérios Técnicos

Não foram identificadas ações sistemáticas de avaliação de desempenho na Empresa. Na justa medida, sem burocratizar os processos organizacionais, poder-se-ia investir no sistema de negociação e avaliação do desempenho, incluindo critérios técnicos e comportamentais e definição de objetivos e metas funcionais.

Como todas as ações não podem ser desenvolvidas simultaneamente, as mudanças devem ser incrementais. Considerando os recursos organizacionais, sugere-se que estas sejam delimitadas em curto, médio e longo prazo, conforme tabela a seguir.

Naturalmente não existe uma única maneira de tratar questões tão complexas como aquelas relacionadas à gestão de pessoas; entretanto deve-se ressaltar que não é necessária a burocratização, nem sistemas altamente sofisticados de gestão, se o porte da empresa não os justifica; mas é necessária a profissionalização da empresa, através de políticas consistentes e inovadoras de gestão de pessoas, com nova forma de organização do trabalho produtivo.

NOTAS

2 CP – Curto prazo; ML – Médio prazo; LP – Longo Prazo.

LEITURAS RECOMENDADAS

  • Gersick, K. E., Davis, J. A., Hampton, M. M., & Lansberg, J. (1997). De geração para geração: ciclos de vida das empresas familiares (N. Montingelli Jr., Trad.). São Paulo: Negócio, Editora. (Obra original publicada em 1997).
  • Hersey, P., & Blanchard, K. (1986). Psicologia para administradores: a teoria e as técnicas da liderança situacional (E. Royer, Trad.). São Paulo: EPU. (Obra original publicada em 1982).
  • Jamrong, J. J., & Overholt, M. H. (2004). Building a strategic HR function: continuing the evolution. HR Human Resource Planning, 27(1), 51-62.
  • Lucena, M. D. S. (1995). Planejamento de recursos humanos São Paulo: Atlas.
  • Milkovich, G. T., & Boudreau, J. W. (2000). Administração de recursos humanos (R. C. Marcondes, Trad.). São Paulo: Atlas. (Obra original publicada em 1997).
  • Morgan, G. (1996). Imagens da organização (C. W. Bergamini & R. Coda, Trad.). São Paulo: Atlas. (Obra original publicada em 1986).
  • Robbins, S. (2002). Comportamento organizacional (9a ed.). (R. C. Marcondes, Trad.) São Paulo: Atlas. (Obra original publicada em 2000).
  • Albuquerque, L. G. (2002). A gestão estratégica de pessoas. In M. T. L Fleury (Coord.). As pessoas nas organizações São Paulo: Editora Gente.
  • Coda, R., Cesar, A. M. R. V. C., & Garcia, M. N. (2005, setembro). Um novo RH: avaliando a atuação e o papel da área de RH em organizações brasileiras. Anais do Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração, Brasília, DF, Brasil, 29.
  • Gersick, K. E., Davis, J. A., Hampton, M. M., & Lansberg, J. (1997). De geração para geração: ciclos de vida das empresas familiares (N. Montingelli Jr., Trad.). São Paulo: Negócio, Editora. (Obra original publicada em 1997).
  • Hersey, P., & Blanchard, K. (1986) Psicologia para administradores: a teoria e as técnicas da liderança situacional (E. Royer, Trad.). São Paulo: EPU. (Obra original publicada em 1982).
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  • Leone, N. M. C. P. G. (2005). Sucessão na empresa familiar: reparando as mudanças para garantir sobrevivência no mercado globalizado São Paulo: Atlas.
  • Longenecker J. G., Moore, C. W., & Petty, J. W. (1997) Administração de pequenas empresas: ênfase na gerência empresarial. São Paulo: Makron Books.
  • Lucena, M. D. S. (1992) Avaliação de desempenho São Paulo: Atlas.
  • Lucena, M. D. S. (1995). Planejamento de recursos humanos São Paulo: Atlas.
  • Milkovich, G. T., & Boudreau, J. W. (2000). Administração de recursos humanos (R. C. Marcondes, Trad.). São Paulo: Atlas. (Obra original publicada em 1997).
  • Morgan, G. (1996). Imagens da organização (C. W. Bergamini & R. Coda, Trad.). São Paulo: Atlas. (Obra original publicada em 1986).
  • Robbins, S. (2002). Comportamento organizacional (9a ed.). (R. C. Marcondes, Trad.) São Paulo: Atlas. (Obra original publicada em 2000).
  • 1
    (F1), (F2) ... refere-se às falas dos diferentes funcionários da empresa.
  • *
    Endereço: Av. Rodrigues Alves, 557, Petrópolis, Natal/RN, 59020-200. E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Fev 2009
    • Data do Fascículo
      Mar 2009
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