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Até que os custos os separem: por que clientes e fornecedores estabelecem práticas relacionais para o desenvolvimento conjunto de projetos de software?

Until costs tear them apart: why do customers and suppliers set relational practices for the joint development of software projects?

Resumos

Em que pese o fato de acadêmicos e praticantes darem significativa atenção ao desenvolvimento de vínculos de longo prazo entre empresas, pouca ênfase há sobre o conhecimento acerca dos seus benefícios, especialmente quanto ao valor criado. O objetivo do presente estudo foi analisar o valor percebido em relacionamentos segundo a perspectiva da díade cliente-fornecedor e sua natureza dinâmica em relacionamentos de negócio. A construção do esquema de análise dos relacionamentos e do valor criado nas díades partiu de teorias de marketing de relacionamento com raízes em economia, ciência política, ciências organizacionais, sociologia, psicologia social e direito. Realizou-se uma pesquisa empírica de natureza qualitativa, por meio de entrevistas em profundidade com 14 díades cliente-fornecedor do setor gaúcho de software. O setor de software foi escolhido por sua representatividade econômica, pela viabilidade de aplicação dos conceitos de marketing de relacionamento ao contexto e pela existência de outros estudos sobre o tema nesse setor. Os resultados sugerem que a aquisição de softwares empresariais reverte em benefícios quantitativos e qualitativos de naturezas diversas para clientes e fornecedores, e que, dependendo dos vínculos relacionais, tais benefícios podem ser incrementados.

projetos de software; díades cliente-fornecedor; relacionamentos de negócio


In spite of the fact that academics and practitioners pay significant attention to developing long-term ties in industry, there is little emphasis placed on the benefits stemming from such ties, particularly on value creation. Our study analyzes perceived relationship value from the perspective of dyads consisting of one customer and one supplier working together, as well as its dynamic nature in business relationships. The analytical framework was developed from relationship marketing theories with roots in economics, political science, organization sciences, sociology, social psychology and law. A qualitative study was conducted by way of in-depth interviews with representatives from 14 customer-supplier dyads in the prominent software sector established in Southern Brazil, The software sector was chosen because of its economic representativity, its viability for the application of relationship marketing phenomena to the context and because of other studies on the matter in this sector. The findings suggest that the acquisition of enterprise software brings benefits of many types to both customers and suppliers, and that, depending on the relational ties, such benefits can be further improved.

software projects; customer-supplier dyads; business relationships


ARTIGOS

Até que os custos os separem: por que clientes e fornecedores estabelecem práticas relacionais para o desenvolvimento conjunto de projetos de software?

Until costs tear them apart: why do customers and suppliers set relational practices for the joint development of software projects?

Rita de Cássia de Faria PereiraI, * * Endereço: Rita de Cássia de Faria Pereira Departamento de Administração - CCSA - UFPB, Cidade Universitária, João Pessoa/PB, 58051-900. E-mail: ritacfpereira@ccsa.ufpb.br ; Fernando Bins LuceII

IDoutora em Administração pelo PPGA/UFRGS. Professora da UFPB, João Pessoa/PB, Brasil

IIDoutor em Administração de Empresas pela Michigan State University, Estados Unidos. Professor da UFRGS, Porto Alegre/RS, Brasil

RESUMO

Em que pese o fato de acadêmicos e praticantes darem significativa atenção ao desenvolvimento de vínculos de longo prazo entre empresas, pouca ênfase há sobre o conhecimento acerca dos seus benefícios, especialmente quanto ao valor criado. O objetivo do presente estudo foi analisar o valor percebido em relacionamentos segundo a perspectiva da díade cliente-fornecedor e sua natureza dinâmica em relacionamentos de negócio. A construção do esquema de análise dos relacionamentos e do valor criado nas díades partiu de teorias de marketing de relacionamento com raízes em economia, ciência política, ciências organizacionais, sociologia, psicologia social e direito. Realizou-se uma pesquisa empírica de natureza qualitativa, por meio de entrevistas em profundidade com 14 díades cliente-fornecedor do setor gaúcho de software. O setor de software foi escolhido por sua representatividade econômica, pela viabilidade de aplicação dos conceitos de marketing de relacionamento ao contexto e pela existência de outros estudos sobre o tema nesse setor. Os resultados sugerem que a aquisição de softwares empresariais reverte em benefícios quantitativos e qualitativos de naturezas diversas para clientes e fornecedores, e que, dependendo dos vínculos relacionais, tais benefícios podem ser incrementados.

Palavras-chave: projetos de software; díades cliente-fornecedor; relacionamentos de negócio.

ABSTRACT

In spite of the fact that academics and practitioners pay significant attention to developing long-term ties in industry, there is little emphasis placed on the benefits stemming from such ties, particularly on value creation. Our study analyzes perceived relationship value from the perspective of dyads consisting of one customer and one supplier working together, as well as its dynamic nature in business relationships. The analytical framework was developed from relationship marketing theories with roots in economics, political science, organization sciences, sociology, social psychology and law. A qualitative study was conducted by way of in-depth interviews with representatives from 14 customer-supplier dyads in the prominent software sector established in Southern Brazil, The software sector was chosen because of its economic representativity, its viability for the application of relationship marketing phenomena to the context and because of other studies on the matter in this sector. The findings suggest that the acquisition of enterprise software brings benefits of many types to both customers and suppliers, and that, depending on the relational ties, such benefits can be further improved.

Key words: software projects; customer-supplier dyads; business relationships.

INTRODUÇÃO

A principal motivação deste estudo é a fragilidade das medidas utilizadas para avaliação dos impactos dos relacionamentos entre fornecedores e clientes. Tal motivação deve-se, sobretudo, à relevância que o tema tem, tanto na academia quanto no ambiente empresarial, e à necessidade de se avaliarem os resultados dos investimentos realizados pela díade cliente-fornecedor nessas iniciativas.

Em favor destes argumentos, vale destacar que, no topo da lista de prioridades de pesquisa elaborada pelo Marketing Science Institute [MSI] para o triênio 2004-2006, enfatiza-se a avaliação da produtividade e métricas de marketing, denotando-se a relevância de se definirem indicadores para mensuração do retorno obtido com os investimentos na área. Entre as prioridades, enfatizam-se os efeitos de marketing de curto e longo prazo, expressando-se a necessidade de se avaliarem impactos de programas de marketing que possuem efeitos demorados. Evidencia-se, neste grupo de prioridades, a avaliação de ativos intangíveis como questão de pesquisa relevante. Métodos e ferramentas pouco tradicionais em marketing, bem como novas formas de coletar dados, são enfatizados no grupo de prioridades denominado 'Ferramentas de Pesquisa'. Por fim, e intrinsecamente relacionada ao objeto do presente estudo, o MSI destaca a relevância de serem gerenciadas as atividades de marketing como criadoras de valor, em vez de tratá-las como custos ou despesas.

Paralelamente à ênfase no desenvolvimento de relacionamentos com os clientes e outros parceiros, o conceito de valor assume grande relevância no campo de marketing. Prova disso são os diversos estudos que focalizam o que constitui valor e as formas e condicionantes da criação de valor (Eggert, Ulaga, & Schultz, 2006; Ulaga, 2003; Ulaga & Eggert, 2001; Walter, Müller, & Helfert, 2002; Walter, Müller, Helfert, & Ritter, 2003; Woodruff, 1997). Tal relevância é demonstrada pelo volume de artigos publicados na área sobre o tema, bem como pela publicação de edições especiais do Journal of the Academy of Marketing Science (v. 25, 1997) e, especificamente voltados para o mercado empresarial, do Industrial Marketing Management (v. 30, n. 4, 2001), Journal of Business & Industrial Marketing (v. 15, n. 2/3, 2000) e Journal of Business Research (v. 39, n. 1, 1997).

Os excertos a seguir dão conta da visível importância que o conceito de valor tem em marketing, sobretudo nos estudos sobre relacionamentos: (1) criar valor superior para o cliente é essencial para criação e manutenção de relacionamento cliente-fornecedor de longo prazo (Eggert et al., 2006); (2) a ausência de investigação científica torna difícil avaliar a criação de valor em relacionamentos de negócio; apesar da tendência crescente para se utilizar relacionamento como um meio para criação de valor, a teoria de marketing ainda é deficiente neste campo; existe alta concentração sobre o lucro como valor a expensas de outras possíveis contribuições que o relacionamento pode gerar; a criação de valor é objetivo essencial para as empresas envolvidas em um relacionamento (Walter, Ritter, & Gemünden, 2001); e (3) a mensuração da criação de valor em relacionamentos de negócio ainda está em sua infância, e um entendimento de como as empresas criam e entregam valor em relacionamentos de negócio é necessário (Ulaga, 2003).

Observa-se, portanto, que, ainda que seja relevante para o desenvolvimento acadêmico e gerencial do tema, o valor criado nos relacionamentos ainda é pouco pesquisado. Há que destacar que tal limitação não se limita às variáveis utilizadas, mas também ao método de estudo, visto que neste campo os estudos, tradicionalmente, têm enfatizado a perspectiva de um ator na díade em detrimento de uma avaliação mútua pelos parceiros (Smith, 1999). Assim, este artigo analisa o valor criado em relacionamentos de negócio no setor de software na perspectiva da díade cliente-fornecedor, considerando as seguintes questões:

. Quais benefícios e custos estão envolvidos em um relacionamento no setor de software?

. Em que medida as teorias utilizadas para explicar os relacionamentos de negócio apóiam a criação de valor neste setor?

TEORIAS E ABORDAGENS PARA ANÁLISE DE RELACIONEMENTOS DE NEGÓCIO

Marketing de relacionamento representa a confluência de várias tradições de pesquisa (Spekman & Carraway, 2006). Por isso as variáveis relacionais têm sido definidas a partir de ampla variedade de domínios teóricos, tais como: (1) Teoria dos Custos de Transação, (2) Teoria de Contrato Relacional, (3) Teoria da Dependência de Recursos, (4) Teoria de Redes, (5) Paradigma Político-Econômico, e (6) Administração Transcultural (no caso de relacionamentos internacionais). Cannon (1992) destaca que muitas teorias têm sido aplicadas ao estudo dos relacionamentos entre compradores e vendedores, enfatizando que tais teorias são, geralmente, advindas de outras disciplinas e adaptadas ao estudo das trocas de mercado. Assim, constatando-se a relevância destas teorias para a compreensão e análise de relacionamentos entre compradores e vendedores, bem como a sua ampla difusão no ambiente de negócios, os conceitos e características das principais teorias da área são resumidamente apresentados a seguir e sistematizados na Tabela 1.

(1) Teoria dos Custos de Transação [TCT] - combinação de economia institucional e análises legal e organizacional (Heide & John, 1992), a TCT explica os motivos para a existência de diferentes formas de organizar as transações no mercado, as quais levam a diferentes formas de governança pela empresa. Explora-se, assim, a troca econômica como um problema de estabelecerem-se relações de contrato eficientes (Heide & John, 1992).

(2) Teoria de Troca Relacional - caracteriza-se como descritiva, focando as características situacionais e de processo, as quais variam entre formas de troca relacionais e discretas (Cannon, 1992). A forma discreta aproxima-se do conceito de mercado da TCT, abordando os benefícios econômicos e o comportamento dos atores orientado para o curto prazo. A forma relacional, contrariamente, observa a troca como fenômeno orientado por fatores que extrapolam a visão estritamente econômica. Percebe-se, então, a existência de normas sociais como diretrizes de ação para os atores envolvidos.

(3) Teoria de Troca Social - considera-se que, além das condições econômicas estabelecidas, as normas sociais desenvolvidas pelas partes influenciam o relacionamento. Assim, constata-se que o ponto focal para facilitar e manter trocas relacionais são os fatores sociais e psicológicos dos atores individuais. Portanto tais fatores não devem ser negligenciados na análise do comportamento dos atores envolvidos em uma relação, bem como as expectativas dos indivíduos ou organizações, quanto aos resultados da outra parte em jogo.

(4) Teoria da Dependência de Recursos e Paradigma Político-Econômico - fundamenta o argumento de que as organizações têm graus variados de dependência em entidades externas, particularmente para os recursos que elas requerem para operarem.

(5) Abordagem de Redes - os relacionamentos são formados entre várias unidades corporativas, organizações independentes e empreendedores. Necessitam de vínculos de alto nível de qualidade com parceiros e clientes, caracterizados por confiança, comprometimento, interdependência e satisfação.

Observa-se que os relacionamentos entre clientes e fornecedores resguardam diversidade de temas e perspectivas que não devem ser alijadas de sua análise.

VALOR EM RELACIONAMENTOS DE NEGÓCIO

Como o conceito de valor - seja para fornecedor, seja para clientes - encerra a noção de benefícios e custos (Woodruff, 1997), tanto o comprador quanto o fornecedor freqüentemente fazem adaptações substanciais e comprometem recursos no desenvolvimento de parcerias, refletindo o caráter de parceria como investimento (Möller & Törrönen, 2003). Tal investimento, assim como aqueles de natureza operacional ou tecnológica, por exemplo, requer avaliações e controles objetivos e subjetivos que permitam supor de que forma o relacionamento com determinado parceiro contribui para o desempenho do fornecedor.

A criação de valor caracteriza-se como processo que requer tempo para o desenvolvimento de confiança e comunicação entre os parceiros, necessárias ao alcance de resultados benéficos para ambos.

Relativamente ao valor no contexto industrial, o estudo de Lapierre (2000) identificou 13 elementos do valor percebido pelo cliente, sendo 10 elementos de benefícios para os clientes (soluções alternativas, qualidade do produto, customização do produto, capacidade de resposta, flexibilidade, confiabilidade, competência técnica, imagem, confiança e solidariedade) e três de sacrifícios (preço, tempo/esforço/energia, conflitos). Além da identificação dos elementos, foram testadas e comprovadas duas estruturas conceituais com clientes de três setores de serviços industriais. A primeira estrutura foi associada ao domínio do constructo a partir de dois fatores beneficio e sacrifício; a segunda foi associada com o escopo do constructo, composta de três fatores: produto, serviço e relacionamento.

Mais recentemente, autores vinculados ao IMP Group desenvolveram, com base nas funções primárias e secundárias do relacionamento, o constructo 'criação de valor no relacionamento', considerando funções diretas e indiretas de relacionamentos de negócio. Os autores caracterizaram o processo de criação de valor e forneceram, além de métricas, diretrizes para a condução dos vínculos relacionais. O modelo originalmente criado e aplicado à perspectiva do cliente foi, posteriormente, aplicado à perspectiva do fornecedor por Walter et al. (2001), mostrando adequação e validade. O modelo validado na perspectiva do fornecedor inclui: (1) funções diretas - atividades e recursos de cliente e fornecedor que criam valor para o relacionamento, independentemente de outras relações (função de lucro, função de volume e função de salvaguarda ou proteção); e (2) funções indiretas - efeitos conectados no futuro e/ou em outros relacionamentos (função de desenvolvimento de inovação, função de mercado, função de 'explorador' e funções de acesso).

Ainda sobre os estudos relativos a valor, Ulaga (2003), vendo a pouca realização de estudos a partir da perspectiva do cliente e a ausência de perspectiva mais gerencial, analisou o valor no relacionamento sob a perspectiva da grounded theory. Com base em entrevistas em profundidade com gerentes de compra, o estudo revelou oito dimensões de relacionamento: custos diretos do produto, custos do processo, qualidade do produto, entrega, tempo para entrada no mercado, suporte de serviço, conhecimento do fornecedor e interação pessoal.

MÉTODO DA PESQUISA

O setor de empresas vinculadas ao desenvolvimento e implementação de software foi selecionado para a realização da pesquisa, em função do particular grau de proximidade entre cliente e fornecedor, assim evidenciando viabilidade e importância para a indústria. Mais ainda, o setor de software é foco de estudos em marketing (e.g., Stump, Athaide, & Joshi, 2002), e interações durante e após o desenvolvimento de software fazem deste um rico campo para a análise de relacionamentos de negócio (Pereira & Bellini, 2006).

Unidade de análise e amostragem

A pesquisa com a díade cliente-fornecedor objetivou evitar o problema particular de pesquisas baseadas sobre uma única visão (Smith, 1999), assim permitindo análise mais exata do fenômeno. Deste modo, as perspectivas e desempenhos individuais estão se tornando menos relevantes do que perspectivas e desempenhos conjuntos (Smith, 1999). Com base em consulta aos cadastros da Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação - Regional RS [ASSESPRO-RS] e do Sindicato das Empresas de Informática do Rio Grande do Sul [SEPRORGS], foram selecionados 30 fornecedores que atuam com desenvolvimento de software, implementando projetos de Tecnologia de Informação [TI] e que, portanto, desenvolviam relacionamentos com seus clientes. Foram feitos contatos pessoais e por telefone com as 30 empresas, das quais 14 aceitaram participar do estudo.

Procedimentos de Coleta e Análise de Dados

A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas em profundidade de janeiro a julho de 2006. O contato inicial ocorria com o fornecedor, em que se solicitava a indicação de um cliente com quem ele tivesse um relacionamento de longa data e que fosse caracterizado como parceria. Inicialmente, o fornecedor era convocado a selecionar um relacionamento com um cliente, considerando dois critérios: 'importância do cliente' (Cannon, 1992) e 'tempo de relacionamento'. O setor de TI do cliente era, então, contatado pela pesquisadora, e esta novamente esclarecia os objetivos e características do estudo. A entrevista era marcada com o gerente de projeto ou pessoa por ele indicada que tivesse participado do projeto e conhecesse profundamente suas características e as do fornecedor. As 28 entrevistas realizadas com as 14 díades duraram, em média, uma hora e quarenta e cinco minutos, foram registradas em gravador digital e posteriormente transcritas por profissional especializado.

O roteiro de entrevista abordou os benefícios e custos de um relacionamento no setor de software. Foram abordadas as categorias de custos (preço, processo, custos de adaptação e mudança) e benefícios (produto, lucro, volume, proteção, serviço, mercado, explorador, acesso, sociais, tecnológicos, tempo para entrada no mercado e efeitos de rede), exploradas nos estudos de Anderson, Håkansson e Johanson (1994), Ulaga e Eggert (2001, 2003) e Walter et al. (2001). Além disso, o roteiro explorou os atributos específicos do relacionamento e suas variáveis contextuais, visando a caracterizar os relacionamentos e analisar como tais atributos e suas teorias de base explicavam a criação de valor no setor de software.

As dimensões de benefícios e custos foram identificadas a partir da análise de conteúdo. A análise de conteúdo compreende técnica de investigação que, por meio de descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto das comunicações, tem por finalidade a interpretação destas mesmas comunicações (Bardin, 1977).

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

As díades cliente-fornecedor foram, inicialmente, caracterizadas com relação ao relacionamento existente e ao tipo de projeto desenvolvido, como demonstra a Tabela 2.

Benefícios e Custos Percebidos no Relacionamento na Perspectiva de Clientes

Aqui, descrevem-se as categorias atinentes à perspectiva dos clientes.

Benefícios Percebidos no Relacionamento na Perspectiva de Clientes

Quando questionados sobre os benefícios inerentes ao relacionamento com o fornecedor, os entrevistados fizeram 103 citações, agrupadas em quatro categorias (Tabela 3).

Custos Percebidos no Relacionamento na Perspectiva de Clientes

Quando questionados acerca dos custos envolvidos no relacionamento com um fornecedor de TI, os entrevistados fizeram 78 citações, agrupadas em três categorias (Tabela 4).

Benefícios e Custos Percebidos no Relacionamento na Perspectiva de Fornecedores

Aqui, discorre-se sobre as categorias de benefícios e custos identificados na análise de conteúdo atinentes à perspectiva do fornecedor.

Benefícios Percebidos no Relacionamento na Perspectiva de Fornecedores

Relativamente aos benefícios atinentes ao relacionamento com o cliente, foram identificadas 64 citações, agrupadas em cinco categorias (Tabela 5).

Custos Percebidos no Relacionamento na Perspectiva de Fornecedores

Com relação aos custos atinentes a um dado relacionamento com o cliente, foram mencionados no discurso dos fornecedores diversos tipos de custos em 35 citações, agrupados em três categorias (Tabela 6).

Validação das Categorias de Valor à Luz das Teorias de Análises dos Relacionamentos de Negócio

Esta seção objetiva relacionar as categorias de custos e benefícios identificadas na seção anterior às teorias de base do relacionamento apresentadas anteriormente neste artigo.

Teoria dos Custos de Transação [TCT]

Analisando-se os benefícios do relacionamento na perspectiva dos clientes, constata-se que alguns são de natureza transacional, vinculados às motivações iniciais da compra do serviço de implementação de software. Por isso os contratos desempenham papel fundamental nos relacionamentos, visto que minimizam a possibilidade de imprevistos e, conseqüentemente, a incerteza e o oportunismo do respectivo parceiro. Os contratos têm papel regulador no relacionamento e garantem que os benefícios advindos do software e do processo, aqui identificados como 'Benefícios de Gestão', 'Benefícios de Serviços' e 'Benefícios de Serviços Adicionais', sejam obtidos. Nesse sentido, a TCT traz algumas contribuições ao entendimento dos relacionamentos em questão, uma vez que explicita o papel do contrato na redução de incertezas e, primordialmente, no controle do oportunismo do parceiro. Como postula a Teoria, observou-se empiricamente que um dos focos para a avaliação do valor na perspectiva do cliente é a minimização dos custos de transação de mercado.

Sobre o controle da incerteza e definição de limites eficientes da firma, a decisão sobre 'comprar ou fazer' se expressa na visão dos clientes por meio da constante comparação entre os benefícios de contratar um fornecedor externo e aqueles inerentes ao desenvolvimento interno de soluções. Obviamente, a decisão de comprar é unânime e traz com ela todos os riscos associados às transações de mercado. O oportunismo, inerente à TCT, não foi ressaltado no discurso dos entrevistados, talvez, em certa medida, pela existência de fortes controles formais no relacionamento.

Para os fornecedores, os relacionamentos têm o papel de garantir o futuro e possibilitam perspectivas de sobrevivência do negócio e manutenção ou incremento dos níveis de desempenho. Entretanto pouca menção é feita aos contratos, denotando que este público acredita que tais resultados sejam produtos de características mais relacionais e menos contratuais. Consideram, assim, que os contratos minimizam, em menor intensidade, as incertezas inerentes às trocas.

Empiricamente, outros estudos identificaram benefícios de natureza transacional. O estudo de Kalwani e Narayandas (1995) enfatizou a melhoria dos níveis de lucratividade, a redução de estoque e controle e a oferta de preços mais baixos na visão do fornecedor. Também na visão do fornecedor, Walter et al. (2001) identificaram os benefícios de volume de vendas e garantia de níveis de negócios e retorno. Walter et al. (2003) e Walter et al. (2002) identificaram benefícios transacionais ligados ao valor do relacionamento na visão do cliente: redução de custos, volume de compras, qualidade dos produtos.

Notou-se, nas entrevistas realizadas, forte ênfase nos custos de adaptação inerentes aos relacionamentos. Para os clientes, os custos de adaptação não são percebidos como investimentos no relacionamento. Já os fornecedores encaram os custos de adaptação como investimentos no relacionamento e, portanto, perdas em caso de término da relação. Assim como no estudo de Doney e Cannon (1997), os investimentos idiossincráticos foram aqui percebidos como benefícios, tendo-se em vista a criação de custos de mudança para o cliente. Ainda que sejam vistos como investimentos, nem clientes nem fornecedores os percebem como específicos ao relacionamento analisado, podendo ser empregados em outros relacionamentos. Neste sentido consideram os entrevistados que não há especificidade de ativos nas díades em questão.

Apesar da natureza transacional de alguns benefícios e dos custos de adaptação existentes, a TCT contribui de forma limitada para a compreensão dos relacionamentos no contexto analisado. As formas contratuais de governança adotadas por fornecedores e clientes conseguem diminuir a atuação do oportunismo como fator de erosão do relacionamento e os ganhos de curto prazo, aumentando a possibilidade de ganhos de longo prazo. Os custos de adaptação, no entanto, não representam ativos específicos do relacionamento e, portanto, não explicam a manutenção do relacionamento e outros benefícios e custos nele envolvidos.

Teoria de Troca Relacional

Grover, Teng e Fiedler (2002) ressaltam que muitas empresas limitam a quantidade de fornecedores para coordenar cadeias de valor conjuntamente e criar relacionamentos que transcendem as trocas transacionais específicas, compreendendo um comportamento cooperativo com implicações de longo prazo. Os autores complementam que, enquanto a TCT foca em transações individuais, o relacionalismo representa o relacionamento como um mecanismo de governança, que reflete contratos relacionais implícitos para adaptar às contingências do ambiente e coordenar e garantir trocas.

Quando descreviam seus relacionamentos com o respectivo parceiro, os entrevistados destacaram que variáveis como comprometimento, confiança, adaptação, cooperação e comunicação agiam exclusiva ou paralelamente aos contratos, como salvaguardas para os atores envolvidos. E mais, no contexto analisado, os principais benefícios gerados nas díades são vinculados ao elevado grau de relacionamento entre clientes e fornecedor. O comprometimento, a confiança e a comunicação foram os atributos mais enfatizados pelos entrevistados como aqueles que fomentam benefícios e minimizam possibilidades de custos e conflitos no relacionamento.

Nas díades cliente-fornecedor analisadas, apesar da disponibilidade de fornecedores, os clientes não expressaram, como pressupõe a TCT, intenção de comportar-se de forma oportunista. Paralelamente, fornecedores conscientes sobre sua importância e dependência relativa do cliente para com seus produtos e serviços, não se preocupam em controlar informações - para manter assimetria de informações - ou adotar estratégias que dêem vantagem para ele em detrimento do cliente. Tais condutas são explicadas por vínculos relacionais e se expressam no desejo de continuidade do relacionamento, independentemente de benefícios econômicos diretos e de curto prazo. O contrato baseado na integridade do parceiro e em investimentos mútuos e troca de informação de forma simétrica garantem benefícios para os parceiros e previnem o foco em resultados individuais em detrimento dos resultados para a díade.

Teoria de Troca Social

É amplamente reconhecido que relações pessoais desempenham importante papel nos relacionamentos de negócio (Andersen & Kumar, 2006), porque estes são geralmente construídos sobre processos de troca social, nos quais os indivíduos se tornam comprometidos, além do conteúdo estrito da tarefa (Håkansson & Snehota, 1995), por meio de socialização e laços de amizade. Para Tikkanen, Alajoutsijärvi e Tähtinen (2000), é por meio da comunicação interpessoal que os indivíduos constroem processos característicos dos relacionamentos como adaptação, cooperação e, por isso, a interação social pode ser vista como a atividade central subjacente às outras facetas dos relacionamentos de negócio.

Na maior parte das díades cliente-fornecedor analisadas, observou-se, de forma intensa, o desenvolvimento de relações pessoais entre gerentes e consultores de ambos os lados. Na visão dos entrevistados, o sentimento de confiança é derivado desses vínculos e fomenta a continuidade, minimiza conflitos e propicia convergência de objetivos entre os parceiros. As relações extrapolam aquelas vivenciadas dentro do projeto, sendo comuns relatos de amizade, compreensão mútua e atividades de lazer fora do ambiente de trabalho. Neste sentido, sentimentos e emoções pessoais parecem, ao lado de outras variáveis relacionais, contribuir para sobrevivência e crescimento da relação em nível organizacional. A este respeito, Andersen e Kumar (2006) destacam que as emoções têm papel crucial na iniciação, desenvolvimento e manutenção de relacionamentos business-to-business, em nível individual ou grupal com implicações diretas na confiança estabelecida entre os parceiros.

Paralelamente, a análise revela que tais ligações pessoais também representam sanções a comportamentos indesejáveis em nível de grupo - em complemento às sanções contratuais - e influenciam positivamente a avaliação do cliente, sendo vistas, em alguns momentos, como benefícios pessoais na perspectiva do fornecedor.

Por fim, vale notar também a influência positiva dos vínculos pessoais na comunicação e, conseqüentemente, nos processos ligados à aprendizagem e inovação no relacionamento. Invariavelmente, os informes de relações pessoais intensas entre os parceiros eram ligados à troca intensa de informações operacionais e estratégicas e desenvolvimento de novas soluções, métodos de trabalho e inovações em nível de projeto e de organização.

A este respeito, Walter et al. (2003) e Walter et al. (2002) enfatizaram como funções indiretas dos relacionamentos com fornecedor, ligadas às relações interpessoais, os seguintes benefícios: estabelecimento de contatos com clientes potenciais, obtenção de informações técnicas ou relativas ao mercado e desenvolvimento de produtos e processos inovadores. O relacionamento com os clientes, por sua vez, cumpre as seguintes funções indiretas, fomentadas a partir de relações interpessoais: desenvolvimento e inovação de produtos e processos, recomendações e referências para a entrada da empresa em novos mercados, estabelecimento de relacionamentos com outros atores, obtenção de informações de mercado e redução de tempo e investimento em negociações com outros parceiros (Walter et al., 2001).

Teoria da Dependência de Recursos e Paradigma Político-econômico

A adaptação mútua reflete comprometimento, ao passo que limita e atribui poder às empresas. Ela pode fortalecer os vínculos entre cliente e fornecedor pela criação de ativos específicos ou pelo fomento a atributos relacionais, especialmente o comprometimento entre os parceiros. O foco desta teoria é o interesse da empresas em manterem a autonomia e poder sobre seus parceiros. Por se considerar que as adaptações nas díades investigadas não geraram ativos específicos nem representaram elementos para aumentar ou reduzir o poder, considera-se complexa a análise das díades com base nos pressupostos ligados ao exercício do poder.

Apesar de não declararem especificidade de ativos ou estratégias de utilização de poder, os entrevistados declaram temer o uso do poder por seus respectivos parceiros e se preocupam em não depender exclusivamente do parceiro. Tal preocupação revela-se nas afirmações sobre a seleção de outros fornecedores, visando à redução dos riscos de dependência técnica, do lado dos clientes, e o atendimento a grandes clientes, visando-se à não-dependência financeira dos atuais, do lado dos fornecedores.

Forsström (2005) identificou que a dependência age como motivação inicial para a manutenção do relacionamento e que o envolvimento entre os parceiros cria interdependência, vista, assim, como aspecto da co-criação de valor. Para a autora, a criação e exploração de interdependência é o meio para se realizar o potencial de criação de valor. No presente estudo, a interdependência não foi vista como motivação para o relacionamento nem como condição sine qua non para a criação de valor. Argumenta-se, com base em Anderson et al. (1994), que a interdependência favorece a manutenção do relacionamento e, apenas em conjunto com a conectividade de recursos, atividades e atores, possibilita a criação conjunta de valor.

Abordagem de Redes

Paralelamente à visão exclusivamente econômica, os entrevistados apontaram os resultados intangíveis do relacionamento incorporados a produtos e atividades do cliente. Neste sentido, busca-se, na abordagem de redes, respaldo para compreender estes benefícios, bem como descrever as características dos relacionamentos, vistas na seção anterior.

Tal abordagem e seus vínculos permitem a investigação do relacionamento das díades, tanto do ponto de vista do processo quanto de seus resultados. Do ponto de vista processual, viu-se que projetos de implementação de software envolvem a atuação conjunta de equipes de cliente e fornecedor, pelo que pressupõem a interligação de métodos de trabalho e atividades de forma a gerarem-se novos recursos. Conforme discurso dos entrevistados, a adaptação de atividades e processos era corrente na visão dos entrevistados. Como exemplo disto, cita-se a redefinição da forma de gestão das equipes, conforme método do fornecedor ou do cliente, as mudanças nas formas de pagamento e a adoção de novos padrões de comunicação e conduta. Neste processo, a separação entre recursos tangíveis e intangíveis, empregados no desenvolvimento do software, era tênue durante e após a implementação, o que contribuiu para o grau de aprendizagem destacado nos benefícios, bem como para a percepção de custos de adaptação. Assim, se, por um lado, os relacionamentos agregaram valor do ponto de vista dos benefícios gerados por essa combinação de recursos, essa combinação e adaptação de métodos incrementam a noção de custo do relacionamento. Teoricamente, sabe-se que tais vínculos de atividades e recursos e as conseqüentes interdependências por eles criadas alteram a forma como os atores se percebem e, por conseguinte, suas estratégias relacionais. A percepção de valor é, desta forma, analisada a partir de seus benefícios e custos, é influenciada pela percepção de interdependência e investimentos no relacionamento. Do ponto de vista de resultados, neste contexto de interligação de recursos, atividades e atores, um relacionamento que envolve colaboração próxima entre os parceiros ajuda as empresas a aprenderem, absorverem e internalizarem o conhecimento tácito dos parceiros. Para Bångens e Araújo (2002), o benefício central deste tipo de vínculo é o acesso dos parceiros a capacidades complementares. Como afirmam Håkansson e Snehota (1995), aprendizagem pode ser alcançada por meio da interação de provedores e usuários de recursos. Quanto mais se sabe sobre as diferentes dimensões de recursos que podem ser usados em conjunto, mais efetivamente elas poderão ser combinadas. Tikkanen et al. (2000, p. 377) complementam que relacionamentos tendem a se tornar 'rotinizados' ao longo do tempo: " rotinas e rituais relacionados a processos de adaptação e coordenação são estabelecidos na interação social, quando um relacionamento interorganizacional se desenvolve" .

Ademais, observa-se respaldo teórico para os benefícios e custos identificados na análise das díades, a partir da abordagem de redes. Na visão do cliente, a aquisição de conhecimentos inerentes a produtos, processos e mercado junto ao fornecedor, bem como o desenvolvimento de competências organizacionais e individuais durante o relacionamento inserem-se nas funções secundárias de Anderson et al. (1994) e relacionam-se aos objetivos dos intercâmbios conforme esta abordagem.

Para o cliente, as funções secundárias do relacionamento propiciam benefícios institucionais, de aprendizagem e de mercado, ao fomentarem novos relacionamentos, imagem e a agregação de conhecimentos a produtos, processos e metodologias do fornecedor, por meio do relacionamento com o cliente. Vêem-se, deste modo, reflexos dos relacionamentos analisados em outros relacionamentos e atores. Assim, mudanças feitas como conseqüências de aprendizagem em um único relacionamento se propagarão pela rede, fazendo com que o relacionamento focal tenha efeitos de rede sobre os seus demais relacionamentos. Cita-se o exemplo dos fornecedores que, ao agregarem conhecimento ao seu produto, a partir da atuação em um segmento específico ou do atendimento a um cliente com características distintas e reconhecidas no mercado (processos diferenciados, excelência em qualidade etc.), melhoraram seus relacionamentos com outros clientes e até mesmo com seus fornecedores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por se tratar de tema relativamente novo, torna-se difícil a comparação dos resultados aqui obtidos com estudos da área. Ademais, a maior parte dos estudos são cross-industry ou focam em uma indústria diferente da indústria de software, o que compromete qualquer comparação entre os resultados.

Desconsiderando-se a indústria, o estudo exploratório elaborado por Ulaga (2003) é o mais próximo do presente. Com base em entrevistas com clientes de várias indústrias, foram identificados oito vetores de valor: custos diretos do produto, custos do processo, qualidade do produto, entrega, tempo para entrada no mercado, suporte de serviço, conhecimento do fornecedor e interação pessoal. No presente estudo, foram revelados, na perspectiva do cliente, quatro vetores de benefícios (gestão, serviços, serviços adicionais e aprendizagem) e três de custos (pessoais, adaptação e de projeto) e na perspectiva do fornecedor, cinco vetores de benefícios (institucionais, aprendizagem, volume de negócios e garantia, mercado e pessoais) e três de custos (investimentos e adaptação, operação e pessoais). Entretanto, ainda que tenha a prerrogativa de aplicação a várias indústrias, o modelo de Ulaga (2003) contemplou apenas a visão dos clientes. Diferentes dos resultados aqui obtidos, as categorias foram identificadas de forma empírica, não havendo suporte teórico anterior à sua definição.

Especificamente sobre a indústria de software, Verville e Halingten (2003) notam que pouca pesquisa na área de comportamento de compra organizacional tem focado a aquisição de softwares de TI, ignorando os elevados investimentos neste tipo de compra. Relativamente à compra de sistemas integrados de gestão, os autores destacam que ela compreende uma atividade de elevado custo para as organizações. Neste estudo, nove das catorze díades cliente-fornecedor analisadas estavam envolvidas na implementação de ERP. Por isso os resultados do estudo dos autores contribuem para a presente análise, por provarem que, ao contrário da crença de que aquisições de TI são feitas de forma simples e rotineira, as aquisições desta natureza são complexas e intensivas em esforços e investimentos por parte do comprador. Dado que a área de aquisição de ERP é relativamente nova em pesquisa e que esse tipo de compra organizacional inclui um processo de planejamento longo e que envolve inúmeras variáveis (Verville & Halingten, 2003), investigar fatores inerentes à aquisição e avaliação do serviço, por clientes e fornecedores, incrementa os processos de compra e implementação, bem como maximizam-se os aspectos que aumentam o valor percebido pela díade, como confiança e comunicação. Ademais, a compra de projetos de softwares envolve complexidades dos clientes, porque afetam e são afetadas por várias áreas organizacionais. Por isso a gama de problemas inerentes à implementação de ERP varia de questões específicas da instalação do software até mudanças processuais, comportamentais, políticas e organizacionais manifestas durante a instalação (Verville & Halingten, 2003).

Nota-se que a apreciação do valor difere, obviamente, dos conjuntos de critérios de avaliação de vendedores definido por Verville e Halingten (2003), porque antecede a compra e inclui, por exemplo, ambiente tecnológico da organização, requisitos funcionais, requisitos funcionais e técnicos, processos existentes nas áreas afetadas pelos softwares e diferenças de usuários. Apesar disso, este estudo contribui em aprofundar métricas de avaliação de fornecedores utilizadas pelos clientes. Sobre isso, sublinhe-se que a definição de categorias de benefícios e custos pode apoiar também o fornecedor a avaliar mais efetivamente os seus clientes quanto ao potencial de criação de valor em relacionamentos. A definição de métricas para avaliação de clientes é tema recente na área de desenvolvimento de software e representa uma das prioridades de pesquisa, considerando-se os riscos e elevados investimentos incorridos por clientes e fornecedores no processo e a quase exclusiva atenção ao cliente e sua avaliação do desempenho do fornecedor e, portanto, o desequilíbrio da avaliação do valor no relacionamento (e.g., Bellini, 2006). As práticas do setor de software analisado apontam, assim, a necessidade de definir modelos para avaliação do valor.

A pesquisa, ao priorizar a perspectiva de cliente e fornecedor, constatou contradições no discurso dos parceiros, o que aponta a importância de serem consideradas as duas perspectivas na análise. Isso ocorre porque o compartilhamento de informação é feito de forma diádica, e a mensuração de ambos os lados da transação pode expressar equilíbrio ou simetria entre parceiros e mensuração independente, livre de percepções individuais e vieses (Straub, Hoffman, Weber, & Steinfield, 2002). Assim, diferenças nas percepções de benefícios e fatores de interdependência reforçam a importância da análise conjunta aqui realizada.

Entretanto, ainda que a perspectiva da díade cliente-fornecedor represente uma contribuição relevante do estudo, ela representa apenas um ponto de partida para as pesquisas na área. Como notaram Tikkanen et al. (2000), ao analisarem a satisfação na indústria de software, a gestão é mais complexa do ponto de vista de rede conectada do que de relacionamentos diádicos. Um fornecedor pode influenciar sua própria rede de negócios, por exemplo, aumentando a qualidade técnica de seus subcontratados por meio de planejamento e desenvolvimento de produto conjuntos. No presente estudo, viu-se a participação decisiva do fornecedor de TI no relacionamento do fornecedor com os clientes. Notou-se, ainda, a influência que os relacionamentos analisados tinham no contexto e nos demais relacionamentos dos clientes no mercado. Sugere-se, assim, a adoção de perspectivas que ampliem a visão da díade e considerem os efeitos de rede dos relacionamentos de negócio e destes na rede como um todo. Mais ainda, incitam-se pesquisas sobre valor com os vários públicos envolvidos no processo de implementação, como gerentes, analistas, consultores e programadores das equipes de clientes e fornecedores. Alguns relatos sugeriram que estes públicos muito têm a dizer sobre o valor criado em um relacionamento empresarial no setor pesquisado.

Artigo recebido em 31.12.2007.

Aprovado em 19.09.2008.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Aceito
      19 Set 2008
    • Recebido
      31 Dez 2007
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