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Réplica 2 - produção de conhecimento de aprendizagem e de tecnologia são papéis dos programas de Pós-Graduação na capacitação de cientistas para o país?

Is knowledge production in learning and technology the role of post-Graduate Programs when it comes to training scientists in the country?

DOCUMENTOS E DEBATES

Réplica 2 - produção de conhecimento de aprendizagem e de tecnologia são papéis dos programas de Pós-Graduação na capacitação de cientistas para o país?

Is knowledge production in learning and technology the role of Post-Graduate Programs when it comes to training scientists in the country?

Silvio Paulo BotoméI, * * Endereço: Silvio Paulo Botomé ; José Carlos ZanelliII

IUniversidade Federal de Santa Catarina - UFSC, Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: botome@cfh.ufsc.br

IIUniversidade Federal de Santa Catarina - UFSC, Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: jczanelli@terra.com.br

Os autores do documento 'Estágio docência: um estudo no programa de pós-graduação em administração da Universidade Federal de Lavras' discutem a relevância do estágio-docência como alternativa para a formação de professores do nível superior de ensino. Como base para as análises e interpretações, a partir de referências em torno das atividades que são desenvolvidas em programas de pós-graduação stricto sensu no Brasil e, como denominam, da "construção da identidade docente pelos pós-graduandos" (p. 1139), tomam procedimentos praticados no Programa de Pós-graduação em Administração da Universidade Federal de Lavras (PPGA/UFLA) e, especificamente, as opiniões que seus mestrandos e doutorandos registraram num período (2008-2009) em que foram estagiários docentes. Assim, concluem pela eficácia e efetividade da promoção da prática de estágio-docência. Contudo fazem isso com ressalvas à necessidade de integração de teoria e prática. Nosso objetivo neste debate é destacar aspectos percucientes do processo de educar na pós-graduação e analisar o estágio-docência no contexto do desenvolvimento da pós-graduação brasileira.

Qual é o papel, responsabilidade específica ou objetivos dos programas de pós-graduação nas universidades? Em geral, a resposta mais direta e imediata é voltada para um aspecto que pode ser resumido na expressão fazer pesquisa ou, em vários casos, capacitar novos pesquisadores. Há, nessas expressões, um equívoco parcial na primeira e apenas uma parte desse papel na segunda. Cabe muito mais como responsabilidade ou objetivo para essa parcela de composição da Universidade, denominada de Programas de Pós-graduação. Nas últimas décadas, em torno da passagem do século XX para o XXI, houve vários improvisos para tentar corrigir o que foi, por agências e agentes diversos, considerado como defeitos da pós-graduação, criando complementações ou fazendo inovações. Como se nunca tivessem sido papel, responsabilidade, função ou objetivos da criação dos programas de pós-graduação no País vários aspectos que aparecem hoje para muitos administradores de instituições universitárias. Mestrados profissionalizantes, seminários de pesquisa com os alunos, estágios-docência e várias regras burocráticas que até contrariam os objetivos dos Programas de Pós-graduação para o País surgiram. Já estão até naturalizadas pelo tempo de uso, ou pela ausência de algumas das características específicas que, desde a origem, há meio século, deveriam compor o entendimento do que devem realizar os Programas de Pós-graduação nas universidades do País.

Algo parecido - e complementar - aconteceu e acontece com os departamentos universitários. Quando foi extinta a cátedra, o sustentáculo de uma concepção de que as áreas de conhecimento eram propriedade do catedrático, que contratava seus adjuntos, auxiliares e assistentes para trabalhar na área de acordo com suas orientações e concepções, os docentes das universidades e os dirigentes que constituíam a cúpula do Ministério da Educação (na época era Ministério da Educação e Cultura, o que mantém o C da sigla MEC indefinidamente), entenderam que as áreas de conhecimento não se confundiam com os campos de atuação profissional (Chamliam, 1977; Paviani & Botomé, 1994). De um lado, os cientistas ou pesquisadores de uma área do conhecimento deveriam reunir-se em seus núcleos especializados com a infraestrutura apropriada e coletiva: laboratórios, equipamentos etc. e constituírem os departamentos seriam por área do conhecimento e não por campo de atuação profissional. De outro lado, cada departamento, considerado base de organização da Universidade, deveria oferecer ensino para todos os cursos de graduação da universidade, para garantir a multidisciplinaridade na capacitação dos profissionais dos campos de atuação profissional, que trabalhariam neles e para os quais os cursos de graduação os preparariam como agentes da atuação nesses campos. A burocracia estatal dos anos da década de 1960 e 1970 esvaziou essa definição e esse entendimento. E, além de igualar áreas de conhecimento e campos de atuação profissional como se fossem a mesma coisa, definiram o departamento na universidade pela expressão a menor unidade administrativa, anulando o papel de coordenador de curso de graduação como um articulador com os diferentes chefes de departamentos das variadas áreas do conhecimento nas instituições universitárias e esvaziando, com tal definição, o papel fundamental dos departamentos nas universidades.

Com isso, instalou-se uma parafernália de entendimentos, de que resultou extinguir e recriar departamentos em múltiplas universidades, ou a reduzi-los a meras agências de administração de cursos homônimos. O resultado foi, em geral, uma compartimentalização ainda maior, não pela existência de departamentos, mas pela concepção equivocada a respeito deles. A ausência de clareza a respeito do papel dos departamentos, isto é, produzir o conhecimento na área e disseminá-lo, particularmente, nos diferentes cursos da própria universidade; seus núcleos abrigariam os pesquisadores por afinidades de diferentes tipos, com que surgisse outro equívoco que atingiu os Programas de Pós-graduação. A crença de que, para fazer pesquisa, as universidades ou instituições de ensino superior precisam ter Programas de Pós-graduação. Isso fez com que os pesquisadores transformassem, com a colaboração, muitas vezes pressão direta da CAPES e do CNPq, os Programas de Pós-graduação em lugares de reunião dos pesquisadores, anulando ainda mais o papel dos núcleos de pesquisa nos departamentos, que ficaram cada vez mais burocráticos e destinados a servir para angariar fundos das agências de fomento, fomento que, cada vez mais, deu entrada nas universidades pelos Programas de Pós-graduação.

Os objetivos dos Programas de Pós-graduação, com isso, ainda sofreram mais uma distorção. Em lugar de ser a agência de capacitação de novos pesquisadores, para dominarem as etapas dos processos de produção de conhecimento, particularmente o científico e o filosófico, eles começaram a ser o lugar em que os alunos participam dos projetos de pesquisas dos professores, diminuindo o caráter de capacitação profissional de novos cientistas e filósofos e desempenhando um papel de iniciação científica e filosófica atrasada. O papel de capacitação científica e filosófica de profissionais é próprio dos cursos de graduação. Mas o de capacitação profissional de cientistas e filósofos é da pós-graduação. E essa distinção tem implicações ou decorrências importantes e muito sérias.

Uma dessas decorrências é a de que um Programa de Pós-graduação não é curso no sentido usual do termo, mas um programa de estudos. Nesse programa de estudos, cada aluno deve desenvolver seu projeto de vida profissional como cientista ou filósofo. Tal projeto de vida profissional, para os interesses do País, tem quatro subprogramas básicos: (a) um programa de estudos voltados para aprender e desenvolver processos de produção de conhecimento; (b) um programa de estudos voltados para aprender e desenvolver processos de ensinar em nível superior, não necessariamente em universidades; (c) um programa de estudos para aprender e realizar estudos de atualização constante, para acompanhar o desenvolvimento do conhecimento e da tecnologia na área que o interessado escolheu trabalhar como cientista e nos campos de atuação profissional, que utilizam tais tecnologias ou conhecimentos da área, para desenvolver tecnologias; (d) um programa de estudos para aprender e realizar gestão de Conhecimento, Tecnologia e Ensino Superior. Não se trata, portanto, de confundir um Programa de Pós-graduação com a estrutura de cursos de graduação ou com cursos de especialização, atualização ou aperfeiçoamento, nos quais há outros objetivos que exigem características diversas.

Há objeções e conflitos quanto ao entendimento desses quatro tipos de sub-programas (Botomé, 2002; Paviani & Botomé, 1993, 1994) e dificuldades para implementar um programa de estudos que seja orgânico e sistemático, mas não seja constituído por disciplinas dispostas em uma grade curricular, como geralmente acontece com os cursos de graduação nas universidades do País: programa de estudos individualizado de cada aluno, coordenado por um orientador, que estude e concretize, no projeto de cada orientando, as decisões de um trabalho de produção de conhecimento, outro de produção de aprendizagem, outro de atualização de conhecimentos e tecnologia e, outro de gestão de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Não é tarefa simples e exige estrutura diferenciada do que costumeiramente é encontrado, tanto nos Programas de Pós-graduação como nos cursos de graduação, de especialização, de atualização ou de aperfeiçoamento que, em geral, copiam a estrutura de disciplinas com professores diversos, sem haver, necessariamente, uma articulação bem estabelecida e multidisciplinar nesse tipo de estrutura. A própria multidisciplinaridade pode ser feita pela diversidade de projetos dos estudantes de cada grupo de pós-graduandos e pela oferta de estudos livres, como apoio ou ampliação para a capacitação de novos cientistas ou filósofos, para desenvolver o conhecimento, a tecnologia e o ensino superior. Por exemplo, pequenos cursos, dados por especialistas em diferentes áreas, para os alunos interessados, podem ser feitos ao longo do tempo com acesso não apenas aos alunos matriculados, mas também para egressos da área de cada programa ou de outros programas. A mobilidade disso e a complementaridade multidisciplinar podem ser muito mais do que ter disciplinas optativas no currículo.

Botomé (2002) examina um possível currículo básico de um Programa de Pós-graduação com uma orientação de ser desenvolvido por etapas de projetos dos alunos; os projetos têm origem nos problemas de pesquisa, formulados pelos alunos em função de seus projetos de trabalho como profissionais de Ciência ou Filosofia na área do Programa de Estudos em que estão inscritos. Isso pode ser feito, até mesmo com grupos de professores com afinidades de trabalho em áreas comuns, reunindo para seminários de discussão dos projetos dos estudantes, o que poderia ser uma simulação do que deveriam ser os congressos científicos, nos quais predominasse o debate dos trabalhos dos participantes com contribuições dos debatedores para o desenvolvimento dos trabalhos com múltiplos matizes, métodos, objetos de estudo etc.

Os seminários de pesquisa dos estudantes é uma forma de estagiar como futuros cientistas ou filósofos, assim como construir programas de ensino com supervisão de um orientador e testá-los em estágios de docência, para cursos de graduação ou outras modalidades de cursos. São um recurso importante como concretização dos estudos de um Programa de Pós-graduação. Da mesma forma, escrever um artigo de revisão do conhecimento e um artigo de atualização da tecnologia disponível na área de estudo dos projetos dos estudantes são formas de estágio no subprograma de atualização de conhecimento de um Programa de Estudos Pós-graduados. Há experiências, de os alunos próprios criarem projetos de empreendimento científico, de ensino ou tecnológico como estágio do sub-programa de gestão de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, empregando a tecnologia de programação de ensino, muito mais do que planejamento, disponível na área da Psicologia, por exemplo. Estudar as experiências de uso de tecnologia em uso como observador, onde elas estão sendo usadas, seria outro exemplo desse tipo de estágio. De certa forma, o que interessa é caracterizar e construir programas de pós-graduação que sejam efetiva iniciação de jovens no exercício profissional da Ciência e suas decorrências para a elaboração de tecnologia, para a divulgação e para a disseminação do conhecimento, particularmente por meio de ensino.

Um aspecto importante é tornar desnecessária a existência de mestrados profissionalizantes, até porque profissionalizam para outras coisas e não para haver mestres. Qualquer programa de pós-graduação pode ter estudantes desenvolvendo projetos de pesquisa aplicada, tecnológica ou outras modalidades, além da pesquisa básica ou dos modelos restritos a laboratórios acadêmicos. Nunca foi proibido que a Pós-graduação fizesse isso. Para haver maior probabilidade de programas de estudos aplicados e de pesquisa tecnológica bastaria que os Programas fossem orientados para isso; enquanto os órgãos do governo, particularmente SESu, CAPES e CNPq, auxiliassem com seus respectivos papéis ou responsabilidades nessa orientação. Criar outro tipo de mestrado para fazer pesquisa profissionalizante, principalmente com a alegação de que os programas de pós-graduação estão muito voltados para pesquisas acadêmicas não é corrigir um possível erro, mas mantê-lo e criar outra agência para fazer o que já devia ser feito pelos programas existentes. É desnecessário e muito alto o custo disso para a contrapartida de que o País necessita.

A articulação entre empresas, cursos de graduação, núcleos de pesquisa dos departamentos e projetos dos estudantes de pós-graduação pode ser feito por meio do trabalho de professores e estudantes articulados, de maneira séria e bem administrada, com as empresas que precisam de estudos para desenvolver seus sistemas de trabalho ou de gestão. As camisas de força impostas aos professores pelos critérios produtivistas de publicação de pesquisas como critério predominante podem, nesse sentido, não auxiliar a diversidade de trabalhos, cujo custo em trabalho e tempo é maior, embora nem sempre o seja no âmbito financeiro. Paula e Rodrigues (2006) salientaram que a tecnologia do fast food é largamente utilizada no ensino: padronizando a informação e maximizando a quantidade de alunos e, acrescente-se, diminuindo os prazos para encerrar os programas ou cursos.

De forma semelhante podem ser examinadas as formas de concretização do ensino. Adestramento de alunos em técnicas (ou truques), ou enrijecimento e fixação do discurso das novas gerações, de acordo com o discurso que lhes é apresentado, não é ensinar, menos ainda em nível superior. Se isso predominar em um sistema de apresentação de informações e técnicas e de adesão a elas, teremos apenas novas gerações de despachantes, a manter rotinas sem preocupar-se, ou sequer ver os resultados sociais de suas atividades. Nas palavras de Paula e Rodrigues (2006), não interessa que professores se dediquem a oferecer receitas de trabalho pedagógico, científico, tecnológico, ou a disseminar doutrinas de diferentes escolas ou teorias de suas preferências ou que são seus objetos de interesse ou dedicação pessoal. Professores não são entertainers, entretenedores para divertir estudantes, nem empreendedores particulares para maximizar ganhos pessoais (Paula & Rodrigues, 2006).

E os diferentes tipos de estágio, possíveis nos quatro tipos de subprogramas, que podem constituir um Programa de Estudos de Pós-graduação, não devem reduzir-se a uma instrumentalização da racionalidade encontrada nos livros, nos compêndios ou nos discursos dos professores. Transformar o conhecimento de melhor qualidade em comportamentos humanos significativos para a sociedade implica a envolve também transformar o conhecimento a respeito de ética, solidariedade, empreendedorismo social e relações sociais, como parte importante da capacitação profissional, tanto de profissionais em geral como os profissionais da Ciência e da Filosofia egressos dos programas de estudos pós-graduados, como profissionais de nível superior, seja lá o que essa expressão signifique. Informações, tecnologias e instrumentos são meios e não objetivos do ensino, em qualquer grau em que ele seja. E isso é uma distinção não comum no ambiente educacional, embora esteja ficando cada vez mais urgente separar ativismo dos estudantes com aprendizagem ativa em que, efetivamente, o estudante seja capaz de transformar informação de qualidade em comportamentos humanos íntegros e socialmente de valor, constituindo-se em sujeito e protagonista de seus processos de capacitação para lidar com as exigências que as novas gerações encontrarão como ambiente.

Os modismos que, cada vez mais, se difundem com o esgotamento de informações, terminologia, procedimentos ou equipamentos atingem também os conceitos. Um deles é o de confundir ação ou atividade com comportamento, responsabilizando o behaviorismo, como se fosse algo geral e homogêneo, por fragmentação e ensino de competências nos cursos superiores, incluindo a pós-graduação. As contribuições do behaviorismo radical, porém, são muito diferentes do chamado behaviorismo metodológico; elas superam em muito o que é conhecido, particularmente nos países em desenvolvimento, como recursos para superar os atuais problemas de fragmentação e ensino de técnicas e truques. Aliás o próprio conceito de competência precisa ser mais bem examinado (Botomé, 2002) em relação a ser um grau de exigência de qualidade de qualquer comportamento humano e não uma categoria de comportamentos redutíveis a técnicas e truques imediatistas, para envolver, agradar ou manter os estudantes nos cursos. A capacidade de detectar lixo (Postman & Weingartner, 1971) já é um alerta, há mais de cinco décadas, na literatura como um dos objetivos do ensino superior. Isso é tanto mais importante quanto mais proliferam informações de qualidade variada com um acréscimo naquelas de qualidade duvidosa na literatura em geral e, em particular, até mesmo na chamada científica. Maurício Tragtenberg, desde a década de 1974, já insistia em que um possível foco excessivo na pesquisa não necessariamente mostra preocupação com os objetivos sociais do conhecimento, correndo o risco de voltar-se a atividade das universidades para um produtivismo no qual os artigos são úteis para medir o sucesso universitário, os congressos científicos são mercados com finalidades financeiras, comerciais ou para status e os periódicos são depósitos de textos que não são acessados ou lidos por grande parte dos que constituem as universidades. A mesma perspectiva de exame é retomada por Oliveira e Sauerbronn (2007).

O estágio docente, como obrigação dos pós-graduandos, é pouco para completar ou dar sentido ao trabalho da pós-graduação. Menos ainda é suficiente para constituir uma iniciação no trabalho dos pós-graduandos. Essa iniciação e esse sentido só se completam com várias mudanças no sistema que conhecemos como programas de pós-graduação. Como a Universidade e a Educação no País têm necessidade muito menos de remendos, improvisos ou truques isolados, para sanar um ou outro defeito e muito mais de um balanço conceitual, por meio de uma avaliação dos principais conceitos definidores desses tipos de instituições. Para isso não é suficiente reunir pessoas com experiências pontuais de gestão, trabalho, ou estudo de um aspecto ou momento da vida acadêmica. Há um montante de contribuições históricas (Darci Ribeiro 1969; Rogério Cerqueira Leite, 1980, e tantos outros), que precisam ser revistas e estudadas para orientar uma linha de desenvolvimento da Universidade no País, tanto em seus aspectos funcionais como nos estruturais. A Conferência Mundial sobre Educação Superior (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization [UNESCO], 1998), em Paris final do século XX, já indicou vários aspectos como tendências para a Educação Superior no século XXI; o próprio Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras elaborou uma proposta de redefinição de finalidades e de reestruturação organizacional, como base para a planificação do trabalho das universidades, que o Conselho representaria em um papel diferenciado no sistema de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para o País (Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras [CRUB], 2000).

Um projeto de mestrado ou doutorado é um empreendimento de vida, no plano pessoal. Prepara ou deveria preparar o indivíduo para a continuidade da carreira e de suas atividades de trabalho. No âmbito do Programa, onde irá desenrolar-se, é necessário articular atividades e profissionais em uma área de conhecimento, com a finalidade de preparar professores de nível superior e cientistas, na produção e difusão de conhecimento e de tecnologia. No âmbito social, a atenção às necessidades locais e regionais precisa ser priorizada, como norteadora das políticas e práticas que são estabelecidas. Enfim, o que se espera é o desenvolvimento de competências, tanto de ensino-aprendizagem como de qualificação científica para resolver parte de tantas carências que o País apresenta.

Em síntese, o papel dos coordenadores foi analisado como o de um articulador necessário no interior do Programa e na interação do sistema com os demais Programas da própria universidade e em âmbito nacional e internacional. Fazer pesquisa é uma das atividades inerentes ao sistema, mas pesquisas não deveriam ser realizadas apenas no âmbito da pós-graduação. Pelo contrário, idealmente, mestrandos deveriam chegar aos programas com suficiente capacitação científica e filosófica. A partir desse repertório, caberia desenvolver processos de produção de conhecimento, aprender e desenvolver processos de ensinar em nível superior, aprender e realizar estudos de atualização constante, aprender e realizar gestão de Conhecimento, Tecnologia e Ensino Superior. Contudo ainda é corrente a compreensão de programas de pós-graduação como cursos, no sentido que se atribui à graduação: uma sequência de disciplinas em uma grade curricular. Tal lógica repete, no nível pós-graduado as lacunas, insuficiências e superposições do que é denominado grade de conteúdos curriculares, apesar de todas as críticas que tal concepção tem recebido ao longo de muitos anos.

A realização de um projeto de escolha do pós-graduando, com a orientação articulada em torno dos processos mencionados no parágrafo anterior, em condições de multidisciplinaridade decorrente da variedade de interesses de pesquisa, facilitaria o desenvolvimento para o exercício profissional do trabalho com Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Facilitaria também o aprendizado para trabalhar mais próximo à tecnologia de que as organizações precisam na sociedade: divulgar e disseminar conhecimento, entre outras maneiras, por meio do ensino. Assim, o desenvolvimento de projetos de pesquisa aplicada, tecnológica ou em outras modalidades, além da pesquisa básica ou dos modelos restritos a laboratórios acadêmicos seria viável. No entanto o modelo vigente está mais próximo da mera reprodução de receituários e apegos ou defesas de doutrinas vinculadas a interesses pessoais e distantes dos objetivos sociais da produção de conhecimento.

O que foi examinado refere-se a um reflexo e fortalecimento do produtivismo que emergiu nos anos recentes, em proposta de mensuração aparente das finalidades do sistema da pós-graduação e universitário, a multiplicação dos congressos e periódicos, que se somam sem atender ao propósito de leitura e construção cumulativa do conhecimento. É nesse contexto que a obrigação do estágio-docente desponta como insuficiente para completar o trabalho da pós-graduação ou dar-lhe o condizente sentido.

UFSC, Campus Universitário Trindade, Depto. Psicologia, Florianópolis/SC, 88040-970.

  • Botomé, S. P. (2002). Responsabilidade social dos programas de pós-graduação e formação de novos cientistas e professores de nível superior: problemas e perspectivas. In C. M. Castro & Colaboradores, Desafios e perspectivas do ensino de pós-graduação no setor particular. Brasília: FUNADESP.
  • Cerqueira Leite, R. C. (1980). As sete pragas da universidade brasileira. São Paulo: Duas Cidades.
  • Chamliam, H. C. (1977). O departamento na estrutura universitária (Dissertação de mestrado). Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
  • Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras. (2000). Plano institucional do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras - uma proposta de redefinição de finalidades e de reestruturação organizacional como base para a planificação do trabalho do CRUB no ano 2000. Brasília: Autor.
  • Oliveira, F. B., & Saurbronn, F. F. (2007). Trajetória, desafios e tendências no ensino superior de administração e administração pública no Brasil: uma breve contribuição [Edição Especial]. Revista de Administração Pública, 41, 149-170. doi: 10.1590/S0034-76122007000700009
  • Paula, A. P. P., & Rodrigues, M. A. (2006). Pedagogia crítica no ensino da administração: desafios e possibilidades [Edição especial]. Revista de Administração de Empresas, 46, 10-22.
  • Paviani, J., & Botomé, S. P. (1993) Interdisciplinaridade: disfunções conceituais e enganos acadêmicos. Caxias do Sul, RS: Editora da Universidade de Caxias do Sul.
  • Paviani, J., & Botomé, S. P. (1994). Acesso à pós-graduação - uma estratégia para desenvolver qualificação institucional de universidades através de mestrados e doutorados descentralizados. Caxias do Sul, RS: Editora da Universidade de Caxias do Sul.
  • Postman, N., & Weingartner, C. (1971). Contestação - nova fórmula de ensino. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura.
  • Ribeiro, D. (1969). A universidade necessária. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
  • Tragtenberg M. (1974). Burocracia e ideologia São Paulo: Ática.
  • United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization. (1998). Tendências da educação superior para o século XXI. Paris: Autor, Brasília: CRUB.
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    Endereço: Silvio Paulo Botomé
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Nov 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2011
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