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Relação entre sobrepeso, adiposidade e distribuição de gordura com a pressão arterial de adolescentes no município do Rio de Janeiro

Relationship between overweight, fat mass and fat distribution with blood pressure among adolescents of the city of Rio de Janeiro

Resumos

Estudo elaborado com o objetivo de avaliar se o sobrepeso, a adiposidade e a distribuição de gordura seriam fatores explicativos para a associação entre o crescimento e o aumento de pressão arterial. Uma amostra probabilística dos adolescentes do município do Rio de Janeiro foi obtida com base em 2040 domicílios. Foram estimados 857 adolescentes de 12 a 19 anos, 86% participaram da pesquisa (646 adolescentes), sendo avaliados 646 adolescentes, em relação às medidas de pressão arterial sistólica e diastólica, peso, altura, dobras cutâneas triciptal e subescapular, circunferências de braço, cintura e quadril. Os meninos apresentaram maior prevalência de sobrepeso (22,9 ± 2,3) quando comparados com as meninas (12,5 ± 1,9), considerando o percentil 90 do Índice de Massa Corporal (IMC-Kg/m²) da população brasileira, bem como maior prevalência de hipertensão arterial, considerando o percentil 95 da população americana. As variáveis antropométricas correlacionaram-se mais com a pressão arterial sistólica do que com a diastólica, em ambos os sexos. A área de gordura braquial permaneceu significativamente correlacionada com a pressão arterial, após o ajuste pela idade, pelo IMC e pela área muscular do braço (p<0,05). Os resultados encontrados sugerem que o controle de peso em idades precoces possa ter impacto sobre a prevalência de hipertensão arterial.

Inquéritos; Adolescência; Pressão arterial; Índice de massa corporal; Obesidade; Antropometria


This study investigated if overweight, obesity and fat distribution would explain the relationship between growth and blood pressure increase. A representative sample of 2040 households from the city of Rio de Janeiro was assessed. Of 857 adolescents, with ages between 12 and 19 years, 86% were included in this study. Of these, 646 adolescents were evaluated for measurements such as weight, height, triceps and subescapular skinfolds, arm circumference, waist and hip circumferences, and blood pressure. The hypertension prevalence was higher in males, than females, according to the 95th percentile of the Second Task Force. Overweight prevalence was higher among males (22,9 ± 2,3) than among females (12,5 ± 1,9), considering the 90th percentile of the Body Mass Index (BMI - Kg/m²), from the Brazilian population. Anthropometric measurements were more correlated with systolic blood pressure than diastolic blood pressure, in both genders. After adjusting by age, BMI, and arm muscular area, the arm fat area remained significantly correlated with blood pressure. The overweight indicator variables were associated with blood pressure, especially in females, suggesting that weight control in youths is an important predictor of hypertension prevalence in adult life.

Surveys; Adolescence; Blood pressure; Body Mass Index; Obesity; Anthropometry


ARTIGO ESPECIAL SPECIAL ARTICLE

Relação entre sobrepeso, adiposidade e distribuição de gordura com a pressão arterial de adolescentes no município do Rio de Janeiro

Relationship between overweight, fat mass and fat distribution with blood pressure among adolescents of the city of Rio de Janeiro

Rosana Salles da Costa1 1 Endereço para correspondência Instituto de Nutrição/UERJ CCS - Bloco J, 2º andar Ilha do Fundão 21949-900 Rio de Janeiro, RJ - Brasil e-mail: rosana.costa@cyberwal.com.br ; Rosely SichieriI

IInstituto de Medicina Social/ UERJ Rio de Janeiro, RJ

RESUMO

Estudo elaborado com o objetivo de avaliar se o sobrepeso, a adiposidade e a distribuição de gordura seriam fatores explicativos para a associação entre o crescimento e o aumento de pressão arterial. Uma amostra probabilística dos adolescentes do município do Rio de Janeiro foi obtida com base em 2040 domicílios. Foram estimados 857 adolescentes de 12 a 19 anos, 86% participaram da pesquisa (646 adolescentes), sendo avaliados 646 adolescentes, em relação às medidas de pressão arterial sistólica e diastólica, peso, altura, dobras cutâneas triciptal e subescapular, circunferências de braço, cintura e quadril. Os meninos apresentaram maior prevalência de sobrepeso (22,9 ± 2,3) quando comparados com as meninas (12,5 ± 1,9), considerando o percentil 90 do Índice de Massa Corporal (IMC-Kg/m2) da população brasileira, bem como maior prevalência de hipertensão arterial, considerando o percentil 95 da população americana. As variáveis antropométricas correlacionaram-se mais com a pressão arterial sistólica do que com a diastólica, em ambos os sexos. A área de gordura braquial permaneceu significativamente correlacionada com a pressão arterial, após o ajuste pela idade, pelo IMC e pela área muscular do braço (p<0,05). Os resultados encontrados sugerem que o controle de peso em idades precoces possa ter impacto sobre a prevalência de hipertensão arterial.

Palavras-chave: Inquéritos. Adolescência. Pressão arterial. Índice de massa corporal. Obesidade. Antropometria.

ABSTRACT

This study investigated if overweight, obesity and fat distribution would explain the relationship between growth and blood pressure increase. A representative sample of 2040 households from the city of Rio de Janeiro was assessed. Of 857 adolescents, with ages between 12 and 19 years, 86% were included in this study. Of these, 646 adolescents were evaluated for measurements such as weight, height, triceps and subescapular skinfolds, arm circumference, waist and hip circumferences, and blood pressure. The hypertension prevalence was higher in males, than females, according to the 95th percentile of the Second Task Force. Overweight prevalence was higher among males (22,9 ± 2,3) than among females (12,5 ± 1,9), considering the 90th percentile of the Body Mass Index (BMI - Kg/m2), from the Brazilian population. Anthropometric measurements were more correlated with systolic blood pressure than diastolic blood pressure, in both genders. After adjusting by age, BMI, and arm muscular area, the arm fat area remained significantly correlated with blood pressure. The overweight indicator variables were associated with blood pressure, especially in females, suggesting that weight control in youths is an important predictor of hypertension prevalence in adult life.

Keywords: Surveys. Adolescence. Blood pressure. Body Mass Index. Obesity. Anthropometry

Introdução

Estudos epidemiológicos têm demonstrado que a prevalência de hipertensão tem aumentado em muitos países. A Organização Mundial de Saúde1 estima que a prevalência de hipertensão atinge cerca de 10 a 20% em populações adultas. No Brasil, o Ministério da Saúde2 estima que são hipertensos 15% dos brasileiros acima de 20 anos.

Diversos fatores conhecidamente associados à hipertensão nos adultos têm sido também associados com o aumento nos níveis da pressão arterial na infância e adolescência3. Dentre os fatores ambientais associados à fisiopatologia da hipertensão arterial, o sobrepeso é reconhecido como o mais importante determinante da elevação de pressão arterial, tanto em adultos quanto em crianças e adolescentes4.

Aumento da prevalência de sobrepeso entre adultos e adolescentes tem sido uma constante tanto em países desenvolvidos como em países em desenvolvimento 5,6. Na população brasileira, o sobrepeso aumentou em 56,3% entre homens, e 39,7% em mulheres, no período de 1975 a 19897 e, entre adolescentes, o sobrepeso em 1989 já aparecia de forma destacada8.

Estudos avaliando a composição corporal através de medidas antropométricas como peso, altura, dobras cutâneas e medidas de circunferências têm sido realizados com o objetivo de identificar as medidas que apresentam melhor correlação com os aumentos pressóricos9. Em adultos, o peso é a variável que apresenta a maior correlação com a pressão arterial10, juntamente com o índice de massa corporal (IMC) e a dobra cutânea triciptal11. A distribuição regional de gordura, com concentração na área abdominal também tem sido, associada com o aumento da pressão arterial12.

O ideal para se estabelecer quais os fatores presentes na adolescência que serão fatores de risco para hipertensão do adulto são os estudos longitudinais, ainda escassos e com custo elevado. Contudo, como os adolescentes hipertensos tendem a se manter hipertensos na idade adulta, estudos transversais realizados na adolescência podem ter valor preditivo dos níveis pressóricos dos adultos.

O estudo atual foi elaborado com o objetivo de avaliar as prevalências de hipertensão arterial e sobrepeso em adolescentes do município do Rio de Janeiro, assim como as associações entre medidas antropométricas e níveis de pressão arterial em uma amostra representativa destes adolescentes.

Material e Métodos

População de Estudo

Este estudo transversal foi desenvolvido no município do Rio de Janeiro, no período de novembro de 1995 a agosto de 1996, em uma amostra probabilística de 2040 domicílios, desenhada com base nos dados do censo de 1991 e da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios13. Destes domicílios elegíveis, 1668 participaram da pesquisa. A taxa de não resposta foi de 18,2%, sendo que 49 domicílios encontravam-se fechados e 323 se recusaram a participar. A descrição do processo de amostragem e uma análise das perdas podem ser encontradas na referência de Sichieri, em 199814.

Para a faixa etária de adolescentes, de 12 a 19 anos, a amostra foi estimada em 857 adolescentes, sendo obtido um total de 736 adolescentes. Destes, foram excluídos os portadores de hipertensão arterial secundária a doenças renais e metabólicas (4), portadores de Síndrome de Down (2) e deficiências mentais (4), com doenças cardíacas (2), com insuficiência renal (2), doenças imunológicas (5), doenças metabólicas (4) e adolescentes grávidas (9). Adicionalmente, 58 adolescentes foram excluídos por apresentarem uma ou mais medidas antropométricas ou de pressão arterial não avaliadas. A amostra final de 646 adolescentes era composta por 330 meninos (51,4%) e de 316 meninas (48,6%).

As medidas antropométricas e a pressão arterial foram aferidas, nos domicílios, por antropometristas treinados e padronizadas, de acordo com as recomendações de Lohman15 e o método de padronização proposto por Habitch16, para as medidas da circunferência do braço, dobra cutânea triciptal e subescapular, estando os adolescentes utilizando roupas leves e sem sapatos. Foram aferidos o peso (Kg), altura (cm), dobras cutâneas triciptal e subescapular (mm), circunferências de braço (cm), cintura (cm) e quadril (cm), pressão arterial sistólica e diastólica (mmHg). Para a aferição do peso foram utilizadas balanças digitais da marca Filizola, com variação de 0,1 Kg e capacidade de 150 Kg. Para a aferição da altura e circunferências foram utilizadas fitas métricas de material não elástico, com variação de 1 mm e capacidade de 150 (cm). Para as dobras cutâneas foram utilizados adipômetros plásticos, marca Sustacal, com variação de 2 mm.

Para aferição da pressão arterial, foram utilizados aparelhos da marca SunMark Home Health Care, conforme a padronização proposta pelo Fifth Report of The Joint National Committee17, sendo este procedimento realizado duas vezes, com intervalos de pelo menos 10 minutos entre as aferições, e em caso de diferença maior do que 5 mmHg, tanto para a pressão arterial sistólica como para a diastólica, o procedimento era repetido uma terceira vez. Antes da primeira aferição, o adolescente era orientado a permanecer sentado, sem fumar, comer ou beber por pelo menos 15 minutos. Para a análise, foram utilizados os valores médios obtidos nas duas aferições da pressão arterial, sendo deprezada a primeira medida, no caso de 3 aferições.

A prevalência de sobrepeso na amostra foi calculada considerando o IMC como critério de avaliação de sobrepeso, utilizando-se os valores referentes ao percentil 90 da população brasileira8. A prevalência de hipertensão arterial foi estimada utilizando-se como critério de normalidade o percentil 95, proposto pela classificação do "Second Task Force"17.

Análise dos Dados

Os valores médios das variáveis, bem como as prevalências de sobrepeso e hipertensão arterial, foram calculados levando-se em conta a probabilidade de seleção corrigida para a não resposta, aqui chamadas de valores expandidos da amostra. O cálculo dos intervalos de confiança levou em conta o desenho da amostra, utilizando o software SUDAAN, versão 7.018.

As análises de regressão linear consideraram como variáveis dependentes a pressão arterial sistólica e diastólica separadamente, sendo os modelos ajustados por idade. Para a avaliação da associação da distribuição regional de gordura e de adiposidade com os níveis de pressão arterial, os modelos foram ajustados para idade e a área muscular do braço.

Para os procedimentos gráficos foi utilizado o software S-Plus versão 3.319,20.

Resultados

Os meninos apresentaram valores médios da pressão, das medidas de peso, altura, IMC e área muscular do braço, superiores aos das meninas. A área de gordura braquial, obtida com base nos valores de dobra cutânea triciptal e área muscular do braço, apresentou valor médio superior entre as meninas (Tabela 1).

Os meninos apresentaram maior prevalência de sobrepeso, considerando o percentil 90 da população brasileira8 do IMC, como também maior prevalência de hipertensão, tanto para a pressão arterial sistólica, como para a diastólica (Tabela 2).

Avaliando as correlações entre a pressão arterial sistólica e diastólica com as variáveis antropométricas, foi possível observar que a pressão arterial sistólica apresentou correlações maiores com estas variáveis quando comparada com a pressão diastólica. Entre os meninos, a altura, o peso e a área muscular do braço correlacionaram-se de forma importante aos níveis tensionais sistólico e diastólico. Entre as meninas, merece destaque a correlação da pressão arterial com a área de gordura braquial e com o IMC. Com relação às variáveis associadas à distribuição de gordura, a relação cintura/quadril apresentou baixa correlação com a pressão arterial, sendo mais correlacionada no sexo feminino com a pressão arterial diastólica (Tabela 3).

Analisando os modelos de regressão linear entre a pressão arterial e as medidas antropométricas, quando ajustados os modelos pela idade, a pressão arterial associou-se significativamente com as medidas antropométricas (p<0,05). Nestes modelos, as maiores inclinações da reta foram encontradas para o IMC (Figura 1) e a área de gordura braquial (Figura 2) em relação à pressão sistólica, principalmente entre as meninas.



Após o ajuste pelo IMC, a pressão arterial sistólica permaneceu significativamente associada com a área muscular do braço e com a área de gordura braquial, em ambos os sexos (p< 0,001), enquanto que a pressão arterial diastólica apresentou associação significante com as medidas antropométricas principalmente entre as meninas (p< 0,05) (Tabela 4). Com o ajuste pela área muscular do braço, todas as variáveis antropométricas, apresentaram associação significante (p<0,05), principalmente com a pressão arterial sistólica entre os meninos, sendo este o modelo com os maiores valores de R2 (Tabela 5).

Discussão

Não existe um critério universalmente aceito para definir normotensão e hipertensão arterial na adolescência21. As curvas propostas pelo Second Task Force17, em 1993, descrevem distribuições de acordo com a idade, em crianças americanas, para as pressões sistólica e diastólica. No presente estudo, a prevalência de hipertensão arterial essencial foi maior entre os meninos, principalmente quando considerada a pressão arterial diastólica. Brandão e col.22, em 1996, encontraram em adolescentes do município do Rio de Janeiro uma prevalência de 8,7%, considerando tanto aumentos isolados da pressão arterial sistólica e pressão arterial diastólica, quanto aumento em ambas. Este estudo encontrou prevalência de hipertensão arterial superior entre os meninos, provavelmente devido à maior prevalência de pressão arterial diastólica (Tabela 2). Este fato tem sido descrito na literatura como um fator associado à grande ansiedade manifestada pelos adolescentes no momento da tomada da pressão arterial. Alguns autores descrevem que a prevalência de adolescentes com valores aumentados da pressão arterial diastólica pode reduzir-se significativamente após várias tomadas da pressão arterial, principalmente em dias diferentes4. Assim, embora a limitação resultante do fato das aferições terem sido realizadas no mesmo dia, os valores médios de pressão arterial obtidos no presente estudo foram próximos às médias encontradas no estudo de Brandão e col.22, com tomadas em dias diferentes.

Tanto o trabalho de Brandão e col.22 quanto este, utilizaram como ponto de corte para definir hipertensão o percentil 95 da população americana. Esta não é, provavelmente, uma boa opção, dado que os níveis pressóricos dos adolescentes americanos são maiores do que os valores correspondentes aos adolescentes brasileiros e não há motivos para assumir que maiores níveis pressóricos sejam mais saudáveis.

Para avaliar o sobrepeso entre os adolescentes, optou-se por utilizar o IMC como critério de classificação, tendo como pontos de corte os valores propostos por Sichieri e Allam8, em 1996, baseados na população brasileira, ao invés de utilizar pontos de corte baseados em outras populações, como a americana. Neste sentido, é importante ressaltar que, quando avaliados os valores do IMC do percentil 90 da população brasileira, observou-se que estes foram inferiores aos propostos por Himes e Dietz23, em 1994. Desta forma, considerando ainda que os adolescentes brasileiros apresentam um déficit em relação ao crescimento, como apresentado nos dados da PNSN de 19897, a escolha do percentil 90 como ponto de corte para sobrepeso parece ser mais adequada, uma vez que neste percentil atingem-se, aos 17 anos, valores de IMC de 25 Kg/m2 entre mulheres, que é o limite superior da normalidade segundo a Organização Mundial de Saúde24. Da adolescência para a idade adulta, tanto homens quanto mulheres e, particularmente as mulheres, tendem a ganhar peso, não parecendo adequado utilizar uma classificação, como por exemplo proposta para americanos, onde aos 17 anos já se atinge um IMC de 30Kg/m2(8).

Nesta pesquisa, os meninos apresentaram maior prevalência de sobrepeso do que as meninas (Tabela 2). Alguns estudos têm demonstrado a tendência das meninas apresentarem maior grau de sobrepeso. Assim, no Segundo Inquérito de Saúde e Nutrição, de 1980, os adolescentes americanos de 12 a 17 anos apresentaram prevalência de sobrepeso de 25,5% para as meninas e 18,3% para os meninos25. Os resultados do estudo da Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição7 revelaram, também, que a prevalência de sobrepeso foi maior entre as adolescentes brasileiras, demonstrando que os meninos são mais magros quando comparados com as meninas. Entretanto, Fonseca26, em 1996, realizando um trabalho com um grupo de adolescentes de idades entre 15 e 17 anos, em uma escola privada no município de Niterói, no Rio de Janeiro, encontrou uma prevalência de sobrepeso bem maior entre os meninos (23,9%), quando comparados às meninas (7,2%), sendo este padrão feminino associado a expressivo percentual de meninas em dieta para emagrecer. É provável que este padrão mais recente de controle de peso entre as meninas já esteja ocorrendo na população de adolescentes como um todo e não somente nas classes mais altas.

Em consonância com dados da literatura, as variáveis antropométricas correlacionaram-se mais com a pressão arterial sistólica do que com a pressão arterial diastólica, em ambos os sexos25,27. O IMC apresentou correlação tanto com a pressão arterial sistólica, quanto com a pressão arterial diastólica, entre meninos e meninas. Clarke e col.28, em 1986, avaliaram mudanças longitudinais na pressão arterial e medidas de ponderosidade, no período de 1971 e 1981, em uma amostra de 2925 escolares, inicialmente, com idade de 6 a 15 anos, sendo o peso a variável que apresentou a maior correlação com a pressão arterial sistólica (r=0,31), seguida pelo IMC (r=0,29). Wabitsch e col.12, em 1994, acompanhando, por 6 semanas, um grupo de 116 meninas com idade média de 15,2 anos, durante um programa de redução de peso, observaram que o IMC apresentou correlação significativa com a pressão arterial sistólica (r=0,30) e com a pressão arterial diastólica (r=0,20). Observe-se que as correlaçõs destes estudos têm valores próximos aos observados nas crianças estudadas (Tabela 3).

Nestes estudos sobre a influência dos padrões antropométricos sobre os níveis pressóricos de adolescentes, é importante poder avaliar quanto das modificações na pressão arterial, que acompanham o desenvolvimento, dependem de variações na composição corporal, independentemente do processo de desenvolvimento. Para tanto, analisaram-se as associações entre a pressão arterial e variáveis antropométricas em modelos inicialmente ajustados para a idade. Nestes modelos foi possível observar que o IMC permaneceu associado com a pressão arterial (Figura 1), bem como a área de gordura braquial (Figura 2).

Entretanto, deve-se destacar que a área muscular do braço, medida que avalia distribuição de massa magra na composição corporal, apresentou correlação importante com a pressão arterial, em ambos os sexos (p< 0,001).

Não são muitos os estudos utilizando a área muscular do braço como um indicador antropométrico na associação entre sobrepeso e pressão arterial. Allen e col.29 demonstraram que o volume sangüíneo no sexo masculino é determinado pelo peso e pela altura. Adicionalmente, Alexander e col.30 observaram que o volume sangüíneo aumenta mais com o aumento do peso corpóreo magro do que com o tecido adiposo. Se for considerado que a área muscular do braço avalia basicamente massa corpórea magra, estas hipóteses levantadas poderiam explicar as associações encontradas no presente estudo. É importante ressaltar, ainda, que apesar do peso e da gordura corporal serem amplamente discutidos como importantes fatores de risco para as variações da pressão arterial, são poucos os trabalhos que utilizam a área muscular do braço como variável independente na investigação das associações entre a composição corporal e a pressão arterial.

Logo, a questão que se coloca é a de avaliar se medidas de adiposidade, como a área de gordura braquial, e de distribuição regional de gordura, como a relação cintura/quadril, se correlacionam com a pressão arterial independentemente do IMC e da área muscular do braço. Desta forma, os modelos de regressão linear foram ajustados pelo IMC (Tabela 4) e, também, pela área muscular do braço (Tabela 5).

Com base nos resultados encontrados, a área de gordura braquial permaneceu, no sexo feminino, significativamente associada à pressão arterial, mesmo após os ajustes para a idade e para o IMC (Tabela 4). Entre os meninos, a associação destas variáveis com a pressão arterial foi observada após o ajuste do modelo de regressão linear pela área muscular do braço (Tabela 5). Estes resultados sugerem que riscos associados ao aumento da adiposidade na variação da pressão arterial sejam mais evidentes entre as meninas, sem entretanto perder sua significância entre os meninos.

Com relação à centralização de gordura, os resultados encontrados neste estudo sugerem que os riscos associados à gordura abdominal na adolescência e variações da pressão arterial sejam de pouca expressão e, basicamente, no sexo feminino. No estudo de Wabitsch e col.12 a relação cintura/quadril foi significante apenas para a pressão arterial sistólica, no grupo de meninas avaliadas. Moussa e col.31 não observaram correlações importantes entre a localização regional de gordura e variações na pressão arterial, ao avaliarem um grupo de adolescentes, sugerindo possíveis variações da composição corporal nesta faixa etária

Embora considerando as limitações referentes à aferição da pressão arterial, citadas anteriormente, e a baixa prevalência de hipertensão arterial, essencial no grupo de adolescentes avaliados, os resultados encontrados neste estudo sugerem que o IMC apresenta forte associação com a pressão arterial, principalmente com a pressão arterial sistólica, tal como acontece entre os adultos. Prevenir sobrepeso seria, portanto, uma medida importante, dado que as modificações na composição corporal durante a adolescência podem reverter aumentos da pressão arterial. Considere-se, contudo, que a massa corporal magra, representada pela área muscular do braço, associa-se de forma importante com a pressão arterial, ainda que a preservação desta seja desejada tanto na adolescência, quanto nas idades subseqüentes, devendo esta variável ser considerada como importante fator de confusão a ser avaliado nos modelos de análise.

Agradecimentos

As autoras gostariam de agradecer os comentários do professor Ayrton P. Brandão (Clinex/HUPE/UERJ), pelas informações referentes ao Estudo do Rio de Janeiro, bem como pelos comentários sobre aferição da pressão arterial na adolescência.

Summary

The hypertension in adulthood is a major health problem. There is evidence that risk factors for hypertension such as overweight, body fat and fat distribution are likely to be present in children and adolescents. This study investigated if overweight, obesity, and fat distribution would explain the relationship between growth and increase in blood pressure. It was evaluated a representative sample of households from Rio de Janeiro city was assessed. Of an estimated 857 adolescents, with ages between 12 and 19 years, 86% were included in this study and 646 adolescents had the following measurements taken: weight, height, triceps and subescapular skinfolds, arm circumference, waist and hip circumferences, and blood pressure. The prevalence of hypertension was measured according to the 95th percentile of the American population. Overweight was defined by the 90th percentile of body mass index (Kg/m2), from the Brazilian population. The overweight prevalence was higher among males (22,9 ± 2,3), than females (12,5 ± 1,9). The means of blood pressure, weight, height, body mass index, and arm muscle area were higher in males, than females, while the mean of arm fat area was greater among females. The prevalence of hypertension was higher in males (10,9±1,69), than in females (7,0±1,42), considering both systolic and diastolic blood pressure. Anthropometric measurements were more correlated with systolic blood pressure than diastolic blood pressure, in both genders. In females, the correlation between blood pressure, arm fat area, and body mass index was significant (p<0,05). The waist-to-hip circumference ratio was significantly correlated with blood pressure, especially with diastolic blood pressure in females (r=0,26). After adjusting for age, body mass index, and arm muscle area, the arm fat area kept significant correlation with blood pressure. In conclusion our data suggested that weight control may be related to reduction of hypertension in adult life.

Auxílio financeiro

CNPq Projeto integrado de pesquisa, ref. 523092/96.

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    Endereço para correspondência
    Instituto de Nutrição/UERJ
    CCS - Bloco J, 2º andar
    Ilha do Fundão
    21949-900 Rio de Janeiro, RJ - Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Jul 2005
    • Data do Fascículo
      Dez 1998
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