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Editorial especial: Secretaria de Vigilância em Saúde: novas perspectivas para o SUS

Editorial Especial

Secretaria de Vigilância em Saúde: novas perspectivas para o SUS

Maria da Glória Teixeira* * Editora Convidada

Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia

A recente criação da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) no Ministério da Saúde, em substituição ao Centro Nacional de Epidemiologia da Fundação Nacional de Saúde (CENEPI/FUNASA), representa, em vários aspectos, um grande avanço para o desenvolvimento das ações de controle, prevenção e proteção à saúde da população brasileira.

Para os que militam pela implantação dos princípios e diretrizes da Reforma Sanitária, esta iniciativa se reveste de um significado especial, e que comemoramos, pois na prática resultou no sepultamento de uma proposta espúria, que tramitava no Congresso Nacional, de criação de uma Agência. O texto de criação desta Agência incluía violações aos direitos constitucionais dos cidadãos, indo frontalmente de encontro à história da Saúde Pública no Brasil, que ao longo das últimas décadas vem substituindo as concepções e práticas autoritárias da Polícia Sanitária, por aquelas de promoção e proteção da saúde, concebida como dever do Estado e direito de todos.

Do ponto de vista formal, a SVS foi colocada no mesmo patamar da Secretaria responsável pela área de assistência médica individual, podendo ser entendida como um primeiro passo no sentido da superação da dicotomia do modelo assistencial vigente. Esta mudança é positiva, pois nos parece estar sinalizando que o novo governo está direcionando seus esforços para a construção de modelos de atenção "voltados para a qualidade, efetividade, eqüidade e necessidades prioritárias de saúde", conforme estabelecido na 11a Conferência Nacional de Saúde (CNS, 2000). Do mesmo modo, a simbólica denominação de "Vigilância em Saúde" está apontando para a perspectiva de fortalecimento das propostas de modelos alternativos de atenção à saúde, e favorece que esta instância do MS, legitimamente, possa liderar esse processo. O contexto político atual poderá propiciar à nova SVS um papel organizador e articulador, no sentido da superação de algumas das contradições, explícitas ou implícitas, que têm impedido que o sistema de saúde caminhe nessa direção.

Salienta-se contudo que, apesar do avanço e do caráter simbólico da criação da SVS, devemos estar atentos para que na prática isto não se transforme em um mero mecanismo de reorganização de alguns programas especiais do Ministério da Saúde que se encontravam dispersos em várias instâncias desta instituição. Isto não significa que suas especificidades e trajetórias históricas não devam ser respeitadas.

Esta Secretaria, sendo a sucedânea do CENEPI, tem como uma de suas responsabilidades utilizar positivamente a experiência acumulada na sua área de atuação. O CENEPI vinha implementando a reorganização do sistema de vigilância e controle de doenças e agravos e promovendo o uso da epidemiologia em todos os níveis do SUS, buscando subsidiar a formulação e a implementação das políticas nacionais de saúde. Além disso, ampliou seu escopo de atuação para a vigilância ambiental e pela primeira vez foram desenvolvidos esforços na direção da implantação de uma política de monitoramento e vigilância das doenças e agravos não transmissíveis, problemas que já há algum tempo se constituem nas primeiras causas de morbi-mortalidade da população, mas que vinham sendo sistematicamente colocados em segundo plano. Estimulou ainda o fortalecimento da autonomia administrativa e financeira dos municípios, contribuindo assim para a construção do modelo integral à saúde proposto pela Lei Orgânica e que vem sendo reiterado nas Conferências de Saúde e Conselhos Sociais do SUS.

Neste processo, dentro dos limites que lhe eram próprios, o CENEPI procurou desenvolver uma cultura de trabalho articulado, integrando instituições de ensino e pesquisa aos serviços de saúde, para o estabelecimento e consolidação de sistemas de informação, capacitação de recursos humanos e apoio a pesquisas estratégicas, que vêm resultando em expressivos avanços para a implantação e consolidação do uso da epidemiologia no SUS e para o delineamento do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde.

Contudo, além de consolidar todas estas iniciativas, entende-se que a SVS poderá se tornar o locus de formulação da política de promoção da saúde, em articulação com as outras estruturas de gestão e de controle social do SUS.

Por fim, a reconstituição do Comitê Consultivo de representantes da comunidade científica e de especialistas que atuam nos serviços de saúde, a exemplo do que existiu em um determinado período no CENEPI, e também já previsto no texto da Lei que criou a SVS, poderá contribuir sobremaneira na formulação, acompanhamento e avaliação desta política.

Do ponto de vista executivo, o cumprimento de missão de tal amplitude e complexidade exige que a SVS disponha de um quadro de técnicos altamente qualificados, capacitando-a a responder às demandas do sistema de saúde e da sociedade, e da instituição de mecanismos apropriados para mobilização da competência disponível nas instituições acadêmicas, de pesquisa e de serviços de todo o pais. Estas condições objetivam dotar a SVS de uma real e reconhecida capacidade técnico-científica, promovendo a sua maior visibilidade e credibilidade perante a sociedade e possibilitando o desempenho adequado do importante papel que lhe foi destinado.

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    Editora Convidada
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Abr 2005
    • Data do Fascículo
      Set 2003
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