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Estudo Pró-Saúde: observações adicionais sobre temas e métodos

Pro Health Study: additional observations on themes and methods

ESTUDOS DE COORTE

Estudo Pró-Saúde: observações adicionais sobre temas e métodos

Pro Health Study: additional observations on themes and methods

Eduardo FaersteinI; Dóra ChorII; Claudia de Souza LopesI; Guilherme Loureiro WerneckI, III

ICentro Biomédico, Departamento de Epidemiologia, Instituto de Medicina Social - UERJ

IIDepartamento de Epidemiologia, Escola Nacional de Saúde Pública - FIOCRUZ

IIINúcleo de Estudos de Saúde Coletiva - UFRJ

Correspondência Correspondência: Eduardo Faerstein Rua São Francisco Xavier, 524 bloco E - 7 andar - Maracanã 20559-900 Rio de Janeiro, RJ - Brasil E-mail: eduardof@uerj.br

Agradecemos os comentários elogiosos e as sugestões recebidas em relação ao nosso estudo - relatado por nós em alguns de seus aspectos1 – por parte de Célia L. Szwarcwald2 e Evandro S.F. Coutinho3. A seguir, aproveitamos a oportunidade para fazer observações adicionais motivadas por esses comentários, em continuidade aos interessantes debates ocorridos no seminário da Abrasco, realizado em agosto passado no Rio de Janeiro.

Em relação aos comentários de Coutinho, cabe mencionar:

  • Estudos conduzidos em locais de trabalho apresentam algumas vantagens, mas podem criar expectativas ampliadas entre os participantes sobre os benefícios que terão com sua participação. Na medida em que muitos desses participantes interagem em bases cotidianas, isso tenderia a ocorrer em maior intensidade do que em estudos em amostras da população geral. Freqüentemente, essas expectativas são difíceis de serem correspondidas por parte de pesquisadores, a não ser em circunstâncias excepcionais onde estão asseguradas formas diferenciadas de assistência à saúde, que possam ser de algum modo aprimoradas pelos resultados da pesquisa.

  • Excluímos da população do estudo apenas os docentes, que imaginamos serem menos propensos à participação e ao seguimento; entretanto, outros profissionais de nível superior não foram excluídos. Apesar de não se estudar os muito ricos e, em especial, os muito pobres e desempregados, verificamos em várias análises que a variabilidade socioeconômica existente nesta população do estudo permite detectar gradientes sociais expressivos em relação à obesidade

    4, hipertensão arterial

    5 e qualidade de vida

    6, por exemplo.

  • As aferições mencionadas (pressão arterial, medidas antropométricas e GHQ) são aquelas relacionadas a alguns dos desfechos prioritários do Estudo Pró-Saúde (hipertensão, ganho de peso e obesidade, transtornos mentais comuns). Como em todos os estudos multidimensionais, várias outras características e condições vêm sendo também tratadas como desfechos, como a morbidade auto-referida. A ausência de exames laboratoriais e outras avaliações clínicas, até o momento, não se deveu à nossa "livre escolha" - foi simplesmente devida à falta de recursos. Na fase 3 do estudo será aferida a altura sentada, para incluir em análises pretendidas o comprimento da perna, que parece ser especialmente sensível a condições adversa de vida na infância

    7.

  • A nosso ver, em vez de uma Teoria, é mais produtivo em nosso campo trabalhar com teorias específicas e testáveis empiricamente. Por exemplo, em relação a determinantes sociais da hipertensão arterial, postulamos a hipótese (que nossos dados parecem corroborar) de que o racismo (medido pela percepção de discriminação racial ao longo da vida) pode aumentar o risco de HA (até o momento, medida por HA prevalente) através da interveniência e/ou interação com a adversidade socioeconômica (nessas análises, medida por baixa escolaridade), agindo de modo direto (através de estresse psicossocial) e/ou através de mecanismos etiológicos mais proximais (nas nossas analises exploratórias, relacionados à obesidade)

    8.

No que diz respeito às questões abordadas por Szwarcwald:

  • O seguimento de indivíduos aposentados e de outros que se afastam da universidade, seja por motivo de saúde, morte ou aposentadoria, ainda não realizado, faz parte dos planos da equipe. Isso será realizado tanto através de busca domiciliar como por seguimento remoto através das bases nacionais de dados de mortalidade e morbidade. Estes últimos procedimentos já começaram a ser testados.

  • De fato, ainda carecem de maior divulgação técnicas específicas para o correto tratamento das variações temporais dos fatores socioeconômicos, como, por exemplo, as possibilidades analíticas para modelar trajetórias de renda etc. Mas há um problema anterior ao tratamento analítico, que é a escassa disponibilidade desses dados em muitos estudos longitudinais. Nos estudos que não incluem aferições repetidas de marcadores de posição socioeconômica (limitando-se a medidas pontuais, quase sempre na linha de base) ficam comprometidas tanto sua investigação mais completa como variáveis explicativas, e também sua exploração analítica mais efetiva como potenciais variáveis de confundimento.

  • Cabe aqui comentar um pouco mais sobre outros construtos e fatores sociais e psicossociais de interesse para a saúde, em relação aos quais nosso grupo de pesquisa pretende conduzir adaptação transcultural e validação de escalas. No caso da experiência de discriminação racial, apenas recentemente foi divulgada a primeira escala submetida à avaliação de propriedades psicométricas em população norte-americana

    9. A coesão social é um construto considerado de crescente importância para o estudo dos efeitos contextuais em saúde, mas que ainda necessita maiores investimentos na definição de estratégias para sua mensuração e na distinção conceitual em relação a outros construtos relacionados, tais como eficácia coletiva, senso de comunidade, capital social e competência da comunidade

    10. Tendo em vista nosso grande interesse na vertente temática hoje conhecida como "epidemiologia do ciclo vital" (

    lifecourse epidemiology)

    11 estamos explorando também as possibilidades de aplicar técnicas de

    event history analysis, como as usadas no Pitt County Study

    12 .

Consideramos importante que estudos epidemiológicos em nosso meio incluam uma vertente metodológica, visto que do lado de baixo da linha do Equador muitas coisas podem se passar de modo diverso. Daí a importância, por exemplo, da validação das medidas de auto-avaliação da saúde com condições e diagnósticos mais objetivos, sugestão que já incorporamos a nossos planos.

Referencias

1. Faerstein E, Chor D, Lopes CS, Werneck GL. Estudo Pró-Saúde: características gerais e aspectos metodológicos. Rev Bras Epidemiol 2005; 8(5): 454-66.

2. Szwarcwald CL. Comentários sobre o Estudo Pró-Saúde. Rev Bras Epidemiol 2005; 8(4): 470-3.

3. Coutinho, ESF. Comentários sobre o texto "Estudo Pró-Saúde: características gerais e aspectos metodológicos" de Faerstein E, Chor D, Lopes CS, e Werneck GL. Rev Bras Epidemiol 2005; 8(4): 467-9.

4. Fonseca MJM. Índice de massa corporal de funcionários públicos do Rio de Janeiro: validade da informação referida e associação com posição sócio-econômica no Estudo Pró-Saúde. [tese de doutorado]. Instituto de Medicina Social da UERJ; 2003.

5. Alves MGM. Pressão no trabalho: estresse no trabalho e hipertensão arterial em mulheres no Estudo Pró-Saúde [tese de doutorado]. Escola Nacional de Saúde Pública, FIOCRUZ; 2004.

6. Moreno AB. Mobilidade Ocupacional e Qualidade de Vida entre Funcionários de uma Universidade no Rio de Janeiro: o Estudo Pró-Saúde [tese de doutorado]. Instituto de Medicina Social da UERJ; 2004.

7. Wadsworth MEJ, Hardy RJ, Paul AA, Marshall SF, Cole TJ. Leg and trunk length at 43 years in relation to childhood health, diet, and family circumstances: evidence from the 1946 national birth cohort. Int J Epidemiol 2002; 31: 383-90.

8. Faerstein E, Chor D, Werneck G, Lopes CS, Lynch J, Kaplan G. Race and perceived racism, education, and hypertension among Brazilian civil servants (abstract). Am J Epidemiol 2004; 159(11): S35.

9. Krieger N. Experiences of discrimination: validity and reliability of a self-report measure for population health research on racism and health Soc Sci Med 2005; 61:1576-96.

10. Lochner K, Kawachi I, Kennedy BP. Social capital: a guide to its measurement. Health Place 1999; 5: 259-70.

11. Lynch J, Davey Smith G. A life course approach to chronic disease epidemiology. Ann Rev Public Health 2004; 26: 1-35.

12. Curtis AB, Strogatz DS, James SA, Raghunathan TE. The contribution of baseline weight and weight gain to blood pressure change in African Americans: the Pitt County Study. Ann Epidemiol 1998; 8: 497-503.

  • Correspondência:
    Eduardo Faerstein
    Rua São Francisco Xavier, 524 bloco E - 7 andar - Maracanã
    20559-900 Rio de Janeiro, RJ - Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Fev 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2005
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