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Análise espacial dos riscos à saúde associados à incineração de resíduos sólidos: avaliação preliminar

Spatial analysis of the health risks associated with solid waste incineration: a preliminary analysis

Resumos

OBJETIVO: examinar se as emissões do incinerador de resíduos sólidos Vergueiro estavam associadas a um risco aumentado de câncer entre a população residente em seu entorno. MÉTODO: a área de influência deste incinerador foi delimitada por um raio de 7 km a partir de seu centróide georeferenciado. Os óbitos de indivíduos residentes em distritos administrativos contidos nessa área, no período de 1998 a 2002, por câncer de pulmão, fígado, laringe e linfoma não-Hodgkin em adultos, e por leucemia e todos cânceres combinados em crianças, foram selecionados e geocodificados. A área estudada foi dividida em 7 (sete) anéis concêntricos delimitados por raios de 1 a 7 km a partir do incinerador. A análise da associação entre proximidade residencial ao incinerador e mortalidade por câncer foi baseada na comparação entre número de casos observados e esperados, utilizando-se o teste de Stone para examinar o declínio do risco (razão O/E) com a distância do incinerador. RESULTADOS: a área estudada incluiu 1.599.532 habitantes, sendo 92.894 crianças < 5 anos e 634.993 adultos > 40 anos. Não se observou um gradiente espacial nas razões de mortalidade conforme aumenta a distância do incinerador para nenhuma das causas e morte examinadas. CONCLUSÃO: embora não tenha sido detectado aumento no risco dos cânceres previamente selecionados, é importante monitorar as emissões de incineradores ainda em funcionamento e seus possíveis efeitos na saúde. O estudo da distribuição da morbimortalidade em áreas circunvizinhas a essas instalações pode vir a ser uma opção metodológica para atividades de vigilância.

Incinerador; Câncer; Mortalidade; Teste de Stone; Análise espacial


OBJECTIVES: to examine if emissions from the Vergueiro solid waste incinerator are associated with an increased risk of cancer in the population in its vicinity. METHODS: the area under influence of this incinerator was delimited by a 7 km radius from its geocoded centroid. Deaths of city residents in administrative districts inside this area due to cancer of lung, liver, larynx, non-Hodgkin's lymphoma in adults, leukemia, and all sites combined in children, in the 1998 to 2002 period, were selected and geocoded. The studied area was divided into 7 concentric rings delimited by a radius of 1 to 7 km from the incinerator. The analysis of the relationship between residential proximity to the incinerator and mortality due to cancer was based on the comparison of observed and expected cases, using the Stone test for decline in risk with distance from the incinerator. RESULTS: the area studied comprised 1,599,532 inhabitants, of which 92,894 were children less than 5 years old and 634,993 were adults over 40 years old. No spatial gradient in risk was observed for any outcome in relation to distance from the incinerator. CONCLUSION: although no excess risk for the selected cancers were observed, emissions of incinerators still operating and their possible health effects should be monitored. The study of the spatial distribution of health events in areas around point sources of air pollution can become a methodological option for surveillance activities.

Incinerator; Cancer; Mortality; Stone test; Spatial analysis


ARTIGOS ORIGINAIS

Análise espacial dos riscos à saúde associados à incineração de resíduos sólidos: avaliação preliminar

Spatial analysis of the health risks associated with solid waste incineration: a preliminary analysis

Nelson Gouveia; Rogério Ruscitto do Prado

Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Correspondência Correspondência: Nelson Gouveia Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP Avenida Dr. Arnaldo 455 CEP 01246-903 - São Paulo, SP E-mail: ngouveia@usp.br

RESUMO

OBJETIVO: examinar se as emissões do incinerador de resíduos sólidos Vergueiro estavam associadas a um risco aumentado de câncer entre a população residente em seu entorno.

MÉTODO: a área de influência deste incinerador foi delimitada por um raio de 7 km a partir de seu centróide georeferenciado. Os óbitos de indivíduos residentes em distritos administrativos contidos nessa área, no período de 1998 a 2002, por câncer de pulmão, fígado, laringe e linfoma não-Hodgkin em adultos, e por leucemia e todos cânceres combinados em crianças, foram selecionados e geocodificados. A área estudada foi dividida em 7 (sete) anéis concêntricos delimitados por raios de 1 a 7 km a partir do incinerador. A análise da associação entre proximidade residencial ao incinerador e mortalidade por câncer foi baseada na comparação entre número de casos observados e esperados, utilizando-se o teste de Stone para examinar o declínio do risco (razão O/E) com a distância do incinerador.

RESULTADOS: a área estudada incluiu 1.599.532 habitantes, sendo 92.894 crianças < 5 anos e 634.993 adultos > 40 anos. Não se observou um gradiente espacial nas razões de mortalidade conforme aumenta a distância do incinerador para nenhuma das causas e morte examinadas.

CONCLUSÃO: embora não tenha sido detectado aumento no risco dos cânceres previamente selecionados, é importante monitorar as emissões de incineradores ainda em funcionamento e seus possíveis efeitos na saúde. O estudo da distribuição da morbimortalidade em áreas circunvizinhas a essas instalações pode vir a ser uma opção metodológica para atividades de vigilância.

Palavras-chave: Incinerador. Câncer. Mortalidade. Teste de Stone. Análise espacial.

ABSTRACT

OBJECTIVES: to examine if emissions from the Vergueiro solid waste incinerator are associated with an increased risk of cancer in the population in its vicinity.

METHODS: the area under influence of this incinerator was delimited by a 7 km radius from its geocoded centroid. Deaths of city residents in administrative districts inside this area due to cancer of lung, liver, larynx, non-Hodgkin's lymphoma in adults, leukemia, and all sites combined in children, in the 1998 to 2002 period, were selected and geocoded. The studied area was divided into 7 concentric rings delimited by a radius of 1 to 7 km from the incinerator. The analysis of the relationship between residential proximity to the incinerator and mortality due to cancer was based on the comparison of observed and expected cases, using the Stone test for decline in risk with distance from the incinerator.

RESULTS: the area studied comprised 1,599,532 inhabitants, of which 92,894 were children less than 5 years old and 634,993 were adults over 40 years old. No spatial gradient in risk was observed for any outcome in relation to distance from the incinerator.

CONCLUSION: although no excess risk for the selected cancers were observed, emissions of incinerators still operating and their possible health effects should be monitored. The study of the spatial distribution of health events in areas around point sources of air pollution can become a methodological option for surveillance activities.

Keywords: Incinerator. Cancer. Mortality. Stone test. Spatial analysis.

Introdução

A incineração é um método amplamente utilizado na destinação final dos resíduos sólidos em áreas urbanas. Este processo apresenta a vantagem de diminuir o peso e o volume dos resíduos, consequentemente diminuindo os custos de logística e gerenciamento do lixo, além de prevenir o crescimento de bactérias patogênicas e a proliferação de vetores de doenças, usualmente presentes em resíduos orgânicos. Por outro lado, a incineração produz quantidades variadas de substâncias tóxicas, orgânicas ou inorgânicas, que são emitidas na atmosfera.

Partículas, gases, metais pesados, compostos orgânicos, dioxinas e furanos são exemplos de substâncias perigosas emitidas pelos incineradores de resíduos sólidos1-3. Muitas dessas substâncias são consideradas potencialmente carcinogênicas para a saúde humana pela International Agency for Research in Cancer (IARC)4. Portanto, suspeita-se que populações residentes em áreas próximas a incineradores estão sujeitas a um risco aumentado de câncer, já que estão expostas a estes componentes diretamente (pela inalação de ar contaminado) ou indiretamente (por meio do consumo de água ou alimentos contaminados, ou contato dérmico com solo contaminado)5.

Vários estudos apontam que a exposição da população às emissões de incineradores, na maioria das vezes estimada utilizando alguma medida de distância do incinerador, está associada a um risco aumentado de alguns tipos de câncer, especialmente linfoma não-Hodgkin, sarcomas, câncer de pulmão, fígado e laringe5-12. Além disso, alguns estudos têm também relacionado essa exposição a diversos desfechos indesejados da gravidez, incluindo baixo peso ao nascer e anomalias congênitas5,13,14.

No entanto, enquanto alguns estudos sugerem algum tipo de efeito na saúde humana, outros estudos são inconclusivos ou não evidenciam qualquer associação2,15-17. Assim, tem sido difícil estabelecer a ocorrência e a magnitude real dos riscos da incineração de lixo, informação importante na avaliação das diferentes opções de gerenciamento dos resíduos sólidos.

O Município de São Paulo, com aproximadamente 11 milhões de habitantes, é o maior gerador de resíduos domésticos do país, produzindo diariamente 12.500 toneladas de lixo18. A cidade já possuiu quatro grandes incineradores de resíduos sólidos que foram progressivamente desativados com o passar dos anos. O último incinerador em operação foi o Vergueiro, que funcionou entre 1968 e 2002, localizado em uma área com alta densidade populacional. Com uma capacidade nominal de 300 ton/dia, evidenciou-se que as emissões deste incinerador continham concentrações relevantes de arsênico, cádmio e dioxinas19. Esse incinerador teve suas operações encerradas devido à persistente mobilização da população local, especialmente após a publicação, no ano 2000, de um relatório técnico indicando contaminação bacteriológica do ar na região do seu entorno (Roberta Simeoni, comunicação pessoal).

Um estudo publicado aproximadamente no mesmo período encontrou uma correlação espacial positiva entre as emissões deste incinerador e eventos mutagênicos medidos em um bioensaio20. No entanto, até o momento não foram realizados estudos avaliando o impacto destas emissões na saúde da população residente em sua vizinhança. Desse modo, a partir de registros de mortalidade e utilizando uma abordagem analítica espacial, a presente investigação teve por objetivo avaliar se as emissões deste incinerador estavam associadas a um risco aumentado de câncer entre a população residente em seu entorno.

Métodos

O incinerador Vergueiro está situado na região sudeste da cidade de São Paulo, em uma área densamente povoada (cerca de 11.000 hab/km²)20. Definiu-se a área de influência deste incinerador com base na literatura, com especial atenção ao estudo que mostrou uma queda na frequência de mutações em um bioensaio, de acordo com a distância do incinerador21. Portanto, a área de estudo foi delimitada em um raio de 7 km a partir do centróide georeferenciado do incinerador.

Foram selecionados dados de mortalidade no período de 1998 a 2002, a partir da base de dados do Programa de Aperfeiçoamento das Informações de Mortalidade (PROAIM) do Município de São Paulo. Foram extraídos os óbitos dos sujeitos cuja residência estivesse em um dos distritos administrativos contidos, total ou parcialmente, na área de estudo. Foram selecionados óbitos para as seguintes causas e grupos etários: câncer de pulmão (CID-10 C34.0 - C34.9), câncer de fígado (CID-10 C22.0 - C22.9), câncer de laringe (CID-10 C32.0), linfoma não-Hodgkin (CID-10 C82.0 - C82.9, C83.0 - C83.9, C85.0 - C85.9), para sujeitos > 40 anos; e todos os cânceres (CID-10 C00 - D48) e leucemia (CID-10 C91 - C95) para crianças < 5 anos. Todas as mortes foram geocodificadas pela variável endereço de residência, utilizando o programa de Sistema de Informação Geográfica (SIG) MapInfo (Professional version 8.5; MapInfo Corporation, New York, NY, USA). Foram também obtidos dados demográficos, como o número de habitantes por idade e gênero, do Censo 2000 para cada setor censitário na área de interesse.

A área estudada foi dividida em 7 anéis concêntricos (Figura 1) delimitados por raios de 1 a 7 Km a partir do incinerador. Cada um desses anéis incluiu todos os setores censitários cujo centróide estivesse contido no anel. Os óbitos foram também designados a cada um desses anéis, de acordo com a distância de seus endereços residenciais em relação ao incinerador. O grupo referência compreendeu aqueles localizados em um raio até 1 km do incinerador, enquanto os grupos de comparação estavam nos anéis de 1-2 km, 2-3 km e assim por diante.


A análise estatística da associação entre a proximidade residencial ao incinerador e a mortalidade por câncer foi baseada na comparação entre número de casos observados e esperados. Calculou-se o número esperado de óbitos em cada anel aplicando as taxas de mortalidade do município para os desfechos estudados, na população por sexo e faixa etária em cada área. Para esses cálculos considerou-se o ano 2000 como referência.

Utilizou-se o teste de Stone22 para examinar o declínio do risco (razão O/E) com relação à distância do incinerador. Tomando como base os valores esperados de óbitos para cada área e desfecho, calculados para obter as razões de mortalidade padronizadas (RMP), nessa análise são gerados novos valores esperados supondo uma distribuição multinomial dos óbitos nas várias faixas de distância. Compara-se, então, o número de óbitos esperados estimados pelos dois métodos e verifica-se a hipótese (nula) de que não há tendência de decréscimo na RMP conforme se afasta do incinerador.

Este estudo foi aprovado pela Comissão de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa - CAPPesq da Diretoria Clínica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, sob número 1009/02.

Resultados

A área de até 7 km a partir do incinerador incluiu 26 dos 96 distritos administrativos do município de São Paulo. Nessa área, distribuídos em 120.038 domicílios, reside uma população de 1.599.532 habitantes, sendo 92.894 crianças < 5 anos e 634.993 pessoas > 40 anos. A distribuição dessa população entre as áreas ao redor do incinerador Vergueiro estão detalhadas na Tabela 1.

As causas de morte selecionadas para este estudo totalizaram 3.456 óbitos nos 26 distritos. Desses, apenas 14 (0.4%) não puderam ser georeferenciados, pela ausência do endereço residencial (10 eventos) ou devido a endereço incorreto (4 eventos). Assim, 3.442 óbitos foram incluídos no estudo, mas, desses, apenas 2.924 (85%) estavam dentro do raio de até 7 km a partir do incinerador. A grande maioria desses óbitos (61,9%) foi por câncer de pulmão, seguido de câncer de fígado (15,6%) e linfoma não-Hodgkin (12,8%). Os óbitos de menores de 5 anos por todos os cânceres representaram apenas 1,3% do total de casos selecionados nesse estudo.

O número de óbitos observado e o esperado em cada anel, para cada uma das causas selecionadas, assim como as razões de mortalidade padronizadas, estão dispostos na Tabela 2. O teste de Stone para declínio nos riscos não revelou gradiente espacial nas razões de mortalidade, segundo a distância do incinerador, para nenhuma das causas examinadas. Nota-se que o número de óbitos por câncer em crianças é bastante baixo em cada área estudada, o que dificulta uma avaliação mais precisa nesse grupo etário.

Discussão

Embora o incinerador Vergueiro tenha sido objeto de algumas investigações e tenha sido identificado que emitia substâncias potencialmente tóxicas à saúde humana19, este é o primeiro estudo a avaliar o impacto dessas emissões diretamente na saúde da população residente em sua vizinhança. Entretanto, os resultados do presente estudo não corroboram a hipótese de que residência em áreas próximas a esse incinerador aumenta o risco de alguns tipos de câncer. Não foram encontrados indícios de associação entre proximidade residencial ao incinerador Vergueiro e cânceres de fígado, laringe, e linfoma não-Hodgkin, para sujeitos > 40 anos; e todos os cânceres ou leucemia para crianças < 5 anos.

Há grande controvérsia na literatura sobre a existência de efeitos deletérios à saúde associados às emissões dos incineradores. Elliott et al.9 examinaram a incidência de câncer em pessoas residentes entre 3 e 7,5 km de incineradores de resíduos sólidos no Reino Unido e encontraram um declínio estatisticamente significante no risco para todos os cânceres. Em um estudo na França, por meio de uma análise espacial sofisticada, Viel et al.10 encontraram aglomerações (clusters) estatisticamente significantes para sarcoma de tecidos moles e linfoma não-Hodgkin em áreas no entorno de um incinerador. Em Roma, Michelozzi et al.6 encontraram um declínio estatisticamente significante na mortalidade por câncer de laringe entre homens conforme aumentava a distância de diferentes fontes de poluição atmosférica, incluindo um incinerador. Por outro lado, muitos estudos não encontraram qualquer associação com câncer ou outros desfechos2,15-17.

Uma das limitações importantes do presente estudo foi a utilização de dados de mortalidade por câncer obtidos das declarações de óbito (DO). Apesar da alta qualidade dos diagnósticos, uma vez que a grande maioria das DO em São Paulo é preenchida por médicos, e frequentemente o PROAIM realiza verificações nos procedimentos para garantir a qualidade dos registros, a mortalidade por câncer é um evento extremo e mais relacionado ao acesso adequado a diagnóstico e tratamento. Entretanto, inexistem bases de dados completas e fidedignas sobre a incidência de câncer para o Município de São Paulo para utilização em estudos epidemiológicos.

Além disso, o câncer é uma doença que tem um período de indução bastante extenso. Também não foi possível considerar a quantidade de tempo realmente despendida por cada sujeito naquele endereço. Neste estudo, a exposição de cada indivíduo foi definida de acordo com seu local de residência no momento da morte. Essas limitações são relativamente menos importantes quando se avalia a mortalidade por câncer em crianças menores de 5 anos, uma vez que o tempo de exposição e de indução para o surgimento do câncer fica delimitado a, no máximo, 5 anos. Todavia, o número de eventos para esse grupo etário foi pequeno, não permitindo uma avaliação mais rigorosa. Desfechos relacionados à gravidez, como o baixo peso ao nascer ou as malformações congênitas, podem ser indicadores muito mais sensíveis em avaliações futuras dessa exposição.

Outra limitação relevante em estudos desse tipo é que importantes variáveis de confusão, tais como tabagismo, exposições ocupacionais e condição socioeconômica, tampouco puderam ser consideradas nessas análises.

Esse estudo assumiu que a exposição foi homogênea dentro de cada raio ao redor do incinerador. Essa suposição não leva em conta o regime de ventos nem as condições climáticas que podem influenciar a dispersão dos poluentes emitidos. Embora seja razoável supor que as condições de operação do incinerador foram regulares, não havendo grandes variações temporais nos níveis de emissão, a utilização de um modelo de dispersão Gaussiano refletiria muito melhor a exposição da população nas vizinhanças.

Os mecanismos pelos quais os poluentes emitidos afetam a saúde humana são variados e dependem do tipo de substância predominantemente liberada. Algumas das que são reconhecidamente emitidas por incineradores têm algum potencial carcinogênico já comprovado4. Efeitos mutagênicos em vegetais já foram observados nas áreas sujeitas às emissões do incinerador Vergueiro20.

Embora não tenha sido detectado nenhum aumento no risco dos cânceres previamente selecionados para análise nesse estudo, a preocupação com as emissões de incineradores de resíduos sólidos deve ser mantida. A incineração é uma das opções para o gerenciamento de resíduos em áreas urbanas, um problema cada vez maior para as cidades. A proporção do lixo produzido que tem sido destinada à incineração vem crescendo em muitos países3. Mesmo que os equipamentos hoje utilizados disponham de novas tecnologias, é necessário manter um monitoramento de suas emissões e de seus possíveis efeitos na saúde.

Uma das possibilidades metodológicas para o monitoramento de efeitos é o estudo da distribuição da morbimortalidade por determinadas causas em áreas circunvizinhas a essas instalações. Com as bases de dados contendo informações sociodemográficas e de saúde hoje disponíveis, a avaliação do impacto à saúde das emissões de fontes fixas por meio de análise espacial pode revelar-se uma ferramenta útil para atividades de vigilância. Esse tipo de investigação, por ser relativamente rápido de ser executado e a custos baixos, pode ser a primeira abordagem na identificação de riscos à saúde da população. Assim, medidas preventivas podem ser tomadas rapidamente, enquanto se espera pelo resultado de estudos específicos e mais detalhados.

Recebido em: 16/09/09

Versão final reapresentada em: 23/02/10

Aprovado em: 24/02/10

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  • Correspondência:
    Nelson Gouveia
    Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP
    Avenida Dr. Arnaldo 455
    CEP 01246-903 - São Paulo, SP
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  • *
    Este estudo foi realizado com apoio da FAPESP (Processo nº. 02/06883-7).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Abr 2010
    • Data do Fascículo
      Mar 2010

    Histórico

    • Recebido
      16 Set 2009
    • Aceito
      24 Fev 2010
    • Revisado
      23 Fev 2010
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