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Bullying em escolares brasileiros: análise da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE 2012)

Resumos

OBJETIVO:

Descrever a vitimização e a prática de bullying em escolares brasileiros, segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), e comparar a evolução entre as pesquisas de 2009 e 2012.

MÉTODOS:

Trata-se de estudo transversal com análises univariadas e multivariadas das variáveis: não ser bem tratado, sofrer bullying e praticar bullying. Como variáveis independentes, foram analisadas: idade, sexo, raça/cor, tipo de escola, escolaridade materna. Foram comparadas as prevalências entre as edições da PeNSE de 2009 e 2012.

RESULTADOS:

Não foram bem tratados pelos colegas na escola 27,5% dos adolescentes, tendo sido maior a frequência entre meninos (OR = 1,50) mais velhos, 15 anos (OR = 1,29) e 16 anos (OR = 1,41), alunos de escolas públicas (OR = 2,08), de raça/cor preta (OR = 1,18) e cujas mães tinham menor escolaridade. Relatam ter sofrido bullying 7,2%, tendo sido a maior chance em alunos mais jovens (13 anos) do sexo masculino (OR = 1,26), da raça/cor preta (OR = 1,15) e indígena (OR = 1,16) e cujas mães apresentaram menor escolaridade. A prática de bullying foi relatada por 20,8% e mostrou maior chance em alunos mais velhos, 14 anos (OR = 1,08) e 15 anos (OR = 1,18), do sexo masculino (OR = 1,87), raça/cor preta (OR = 1,14) e amarela (OR = 1,15), filhos de mães com maior escolaridade e alunos de escola privada. Ocorreu aumento de bullying nas capitais, passando de 5,4 para 6,8% entre 2009 e 2012.

DISCUSSÃO:

A ocorrência de bullying revela que o contexto escolar brasileiro também tem se tornado um espaço de reprodução da violência, sendo fundamental atuar de forma intersetorial e articulando redes de proteção social, visando seu enfrentamento.

Bullying; Violência; Adolescência; Saúde escolar; Epidemiologia descritiva; Inquéritos poupulacionais


OBJECTIVE:

To describe the victimization and bullying practice in Brazilian school children, according to data from the National Adolescent School-based Health Survey and to compare the surveys from 2009 and 2012.

METHODS:

This is a cross-sectional study with univariate and multivariate analyzes of the following variables: to have been treated badly by colleagues, to have been bullied and to have bullied other children. The following independent variables were analyzed: age, sex, race/color, type of school, maternal education. Prevalence rates were compared between the editions of 2009 and 2012 of the survey.

RESULTS:

Of all the adolescents analyzed, 27.5% have not been treated well by peers at school, with greater frequency among boys (OR = 1.50), at the age of 15 years (OR = 1.29) and 16 (OR = 1.41), public school students (OR = 2.08), black (OR = 1.18) and whose mothers had less education; 7.2% reported having been bullied, with a greater chance in younger students (13 years old), male (OR = 1.26), black (OR = 1.15) and indigenous (OR = 1.16) and whose mothers had less education; 20.8% reported to have bullied other children, with a greater chance for older students, at the age of 14 (OR = 1.08) and 15 years (OR = 1.18), male (OR = 1.87), black (OR = 1.14) and yellow (OR = 1.15), children of mothers with higher education, private school students. There was an increase of bullying in the Brazilian capitals, from 5.4 to 6.8%, between 2009 and 2012.

DISCUSSION:

The occurrence of bullying reveals that the Brazilian school context is also becoming a space of reproduction of violence, in which it is crucial to act intersectorally and to articulate social protection networks, aiming to face this issue.

Bullying; Violence; Adolescent; School health; Descriptive epidemiology; Population surveys


INTRODUÇÃO

A Organização Mundial da Saúde define violência como "o uso da força física ou do poder real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha qualquer possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação"11. Organização Mundial da Saúde. Health topics: adolescent health [Internet]. Disponível em: http://www.who.int/topics/adolescent_health/en/ (Acessado em 30 de janeiro de 2013).
http://www.who.int/topics/adolescent_hea...
. A violência é um fenômeno multicausal e apresenta forte associação com desigualdades econômicas e socioculturais, mas também se relaciona com aspectos subjetivos e comportamentais22. Malta DC, Souza ER, Silva MM, Silva CS, Andreazzi MA, Crespo C, et al. Vivência de violência entre escolares brasileiros: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE). Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15(2): 3053-63.

3. Minayo MC. Violência e Saúde. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2006.
-44. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2009. Rio de Janeiro (RJ): IBGE; 2009..

No Brasil, a violência assumiu grande importância pela sua magnitude, gravidade, impacto social e capacidade de vulnerabilizar as vítimas e suas famílias. As crianças, os adolescentes e os jovens estão entre os grupos populacionais mais vitimizados pela violência55. Brasil. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação em Saúde. Saúde Brasil 2010: uma análise da situação de saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2011..

Diversos são os formatos de violências que envolvem crianças e adolescentes na sociedade. Entre eles, destacam-se a violência intrafamiliar, a violência na escola e a violência na comunidade66. Malta DC, Mascarenhas MM, Bernal RT, Andrade S, Neves A, Melo E, et al. Causas externas em adolescentes: atendimentos em serviços sentinelas de urgência e emergência nas Capitais Brasileiras - 2009. Ciênc Saúde Coletiva 2012; 17(9): 2291-304.. Uma das formas de violência escolar é o comportamento agressivo entre estudantes, conhecido como bullying, fenômeno frequente que compreende atos repetidos e intencionais de opressão, humilhação, discriminação, tirania, agressão e dominação de pessoas ou grupos sobre outras pessoas ou grupos, subjugados pela força dos primeiros77. Pingoelo I, Horiguela ML. Bullying na sala de aula. De Jure (Belo Horizonte) 2010; 15(2): 145-56.,88. Peguero AA. Bullying Victimization and Extracurricular Activity. J School Violence 2008; 7(3): 71-85..

O termo bullying vem do inglês bully, que é traduzido como os substantivos "valentão", "tirano" e como os verbos "brutalizar", "tiranizar", "amedrontar". Compreende, portanto, um subconjunto de comportamentos agressivos, caracterizado por sua natureza repetitiva e por desequilíbrio de poder99. Fante C. Fenômeno Bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. Campinas (SP): Verus Editora; 2005..

Embora mais estudado no contexto escolar, a prática do bullying permeia diversos outros espaços e faixas etárias. Esta prática tem sido tipificada de três maneiras:

  1. Direta e física - incluindo agressões físicas, roubar ou estragar objetos, extorquir dinheiro ou ameaçar fazê-lo, forçar comportamentos sexuais ou ameaçar fazê-lo, obrigar a realização de tarefas servis;

  2. Direta e verbal - que engloba insultar, colocar apelidos, "tirar sarro", fazer comentários racistas ou que digam respeito a qualquer diferença no outro; e

  3. Indireta - que se refere a situações de exclusão sistemática de uma pessoa do grupo, fazer fofocas, espalhar boatos, ameaçar de exclusão do grupo com o objetivo de obter algum favorecimento, manipulando, dessa forma, a vida social da vítima77. Pingoelo I, Horiguela ML. Bullying na sala de aula. De Jure (Belo Horizonte) 2010; 15(2): 145-56.,88. Peguero AA. Bullying Victimization and Extracurricular Activity. J School Violence 2008; 7(3): 71-85..

O bullying não deve ser considerado como uma característica normal do desenvolvimento das crianças e dos adolescentes, mas sim um indicador de risco para a adoção de comportamentos violentos mais graves, incluindo o porte de armas, agressões e lesões frequentes1010. Nansel TR, Overpeck M, Pilla RS, Ruan WJ, Simons-Morton B, Scheidt P. Bullying behavior among US youth: prevalence and association with psychosocial adjustment. JAMA 2001; 285(16): 2094-100.. A vivência do bullying expõe as crianças e os adolescentes à condição de vulnerabilidade1010. Nansel TR, Overpeck M, Pilla RS, Ruan WJ, Simons-Morton B, Scheidt P. Bullying behavior among US youth: prevalence and association with psychosocial adjustment. JAMA 2001; 285(16): 2094-100.. O bullying entre estudantes é, em geral, encontrado na maioria das escolas, independentemente das características sociais, culturais e econômicas de seus alunos. Estudos demonstram que se trata de um problema mundial, comum a diversos países e escolas22. Malta DC, Souza ER, Silva MM, Silva CS, Andreazzi MA, Crespo C, et al. Vivência de violência entre escolares brasileiros: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE). Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15(2): 3053-63.,1111. Carlyle KE, Steinman KJ. Demographic differences in the prevalence, co-occurrence, and correlates of adolescent bullying at school. J Sch Health 2007; 77(9): 623-9.,1212. Organização Mundial da Saúde. Inequalities in Young People's Health. Health Behaviour in School-Aged Children. International Report from the 2005/2006 Survey. Copenhagen: WHO; 2008. (Health Policy for Children and Adolescents, no. 5)..

A exposição ao bullying pode acarretar problemas comportamentais e emocionais, destacando-se o stress, a diminuição ou perda da autoestima, a ansiedade, a depressão, o baixo rendimento escolar e, até mesmo, em casos mais severos, o suicídio1313. Jankauskiene R, Kardelis K, Sukys S, Kardeliene L. Associations between school bullying and psychosocial factors. Soc Behav Personal 2008; 36(2): 145-62.,1414. Boynton-Jarrett R, Ryan LM, Berkman LF, Wright RJ. Cumulative violence exposure and self-rated health: longitudinal study of adolescents in the United States. Pediatrics. 2008;122(5):961-70..

Alguns estudos também têm analisado as características do autor do bullying. Em muitas situações, o mesmo indivíduo que pratica o bullying pode ser a vítima, invertendo-se os papéis1515. Fleming LC, Jacobsen KH. Bullying among middle-school students in low and middle income countries. Health Promot Int. 2010;25(1):73-84.. Estudos incluindo a análise do autor da agressão ainda são escassos no país. Compreender as formas nas quais a violência se apresenta no âmbito escolar é um desafio no enfrentamento do problema.

No Brasil, a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), que monitora a saúde dos escolares brasileiros, incluiu temas sobre fatores de riscos e proteção em adolescentes, como alimentação, atividade física, consumo de substâncias, violência e bullying, entre outros, na sua primeira edição, em 200944. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2009. Rio de Janeiro (RJ): IBGE; 2009.. Já na sua segunda edição, a PeNSE 2012 ampliou o questionário e a amostra, visando representar Brasil e regiões, além de introduzir novos temas, inclusive sobre praticar bullying1616. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2012. Rio de Janeiro: IBGE, 2013..

O presente estudo visa descrever a vitimização e a prática bullying em escolares brasileiros, segundo dados da PeNSE, e comparar a evolução entre as duas edições da pesquisa.

MÉTODOS

Trata-se de estudo transversal, que analisou dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada pelo IBGE em parceria com o Ministério da Saúde. Participaram da PeNSE escolares do 9º ano (8ª série) do ensino fundamental de escolas públicas e privadas do Brasil, em 2012. Foram também comparados alguns resultados da PeNSE 2009.

A amostra foi dimensionada conforme o Censo Escolar de 20111717. Brasil. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo Escolar 2011. Brasília: INEP, 2011. Disponível em: http://portal.inep.gov.br/basica-censo (Acessado 26 de outubro de 2013).
http://portal.inep.gov.br/basica-censo...
, de modo a estimar parâmetros populacionais para o Brasil, cinco grandes regiões geográficas do país (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste) e cada uma das 27 capitais dos estados da federação. Considerando prevalências de 50%, estima-se um erro máximo de 0,03 (3%) em valor absoluto e intervalo de confiança de 95% (IC95%)1616. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2012. Rio de Janeiro: IBGE, 2013..

Cada uma das capitais foi definida como um estrato geográfico. Os demais municípios, que não capitais, foram agrupados dentro cada uma das cinco grandes regiões, formando cinco estratos.

Em 2012, o tamanho da amostra para o estudo foi de n = 132.123. Deste total, 110.873 estiveram presentes no dia do estudo (84%), e o número final de participantes foi de n = 109.104 (83%) escolares, correspondendo a uma taxa geral de não resposta de 17%. Foram utilizados pesos amostrais para os alunos respondentes, de forma a representar os alunos matriculados no 9º ano do ensino fundamental.

Segundo dados publicados1616. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2012. Rio de Janeiro: IBGE, 2013., na amostra de escolares estudada em 2012, 86% dos alunos têm idade entre 13 e 15 anos; 47,8% são do sexo masculino e 52,2% do sexo feminino; 36,8% são da raça/cor branca, 13,4% da raça/cor preta, 42,2% da raça/cor parda, 4,1% da raça/cor amarela e 3,5% da raça/cor indígena; 17,2% dos alunos estudados foram de escolas privadas e 82,8% de escolas públicas. Esta distribuição assemelha-se à distribuição real da população de escolares.

O questionário estruturado autoaplicável foi inserido no smartphone e aborda temas como alimentação, atividade física, acidentes, violências, saúde mental, sexualidade, entre outros. Esta foi a segunda edição da PeNSE e, em 2012, foram introduzidas novas perguntas, inclusive sobre a prática do bullying. Maiores detalhes sobre a pesquisa podem ser obtidos em outras publicações1616. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2012. Rio de Janeiro: IBGE, 2013..

Neste artigo, foram analisadas situações de violência envolvendo adolescentes e as seguintes variáveis foram investigadas:

  • Não ser bem tratado pelos colegas - nos últimos 30 dias, com que frequência os colegas de sua escola trataram você bem e/ou foram prestativos contigo? Agregado em: "Não fui bem tratado (Nenhuma vez, raramente)" e "Sim, fui bem tratado (às vezes, na maior parte das vezes, sempre nos últimos 30 dias)";

  • Sofrer bullying - Nos últimos 30 dias, com que frequência algum dos seus colegas de escola te esculacharam, zoaram, mangaram? Agregado em: "Sim (quase sempre, sempre)" e "Não (raramente, às vezes)";

  • Praticar bullying - Nos últimos 30 dias, você esculachou, zombou, mangou, intimidou ou caçoou algum de seus colegas da escola, tanto que ele ficou magoado, aborrecido, ofendido ou humilhado? Agregado em: "Sim" e "Não".

Inicialmente, foi realizado o cálculo das prevalências dessas variáveis e seus respectivos IC95% em relação ao sexo, idade, raça/cor, dependência administrativa da escola (pública ou privada) e escolaridade materna. Foram feitas também análises univariadas e multivariadas, isto é, estimado o odds ratio (OR) bruto e o ajustado por idade, sexo, raça/cor, dependência administrativa da escola e escolaridade materna. O OR superior a 1 indica maior chance, menor que 1 indica proteção, e se o IC95% não contém o número 1, então a maior chance ou proteção é estatisticamente significante.

Foi comparada a prevalência registrada pela variável Sofrer bullying na edição da PeNSE de 2009 com a de 2012, para os estratos das 26 capitais e DF. O tamanho da amostra para o estudo das capitais em 2009 foi de 60.973 escolares e, em 2012, de 61.145 escolares. Foram comparadas as prevalências das variáveis por cada capital e seus IC95%, para verificar se houve diferenças entre 2009 e 2012. As informações coletadas alimentaram uma base de dados e foram analisadas com auxílio do pacote estatístico SPSS (PASW Statistics, Versão 18).

O estudo foi aprovado pelo Conselho de Ética em Pesquisas do Ministério da Saúde sob o parecer nº. 192/2012, referente ao Registro nº 16805 do CONEP/MS em 27/03/2012. A participação dos estudantes foi voluntária, tendo sido informado a ele que tinha liberdade para não participar, ou deixar de responder parte ou todo o questionário. Todas as informações do aluno, bem como da escola, foram coletadas e mantidas em sigilo.

RESULTADOS

A Tabela 1 descreve a amostra de alunos segundo os desfechos não ser bem tratado, sofrer bullying e praticar bullying, e segundo as seguintes variáveis independentes: sexo, idade, cor/raça, dependência administrativa da escola e escolaridade materna.

Tabela 1
Prevalência, com intervalo de confiança de 95%, de não ser bem tratado, sofrer e praticar bullying entre escolares do 9º ano do ensino fundamental, segundo idade, sexo, cor/raça e escolaridade materna. Brasil, 2012

Entre os estudantes do 9º ano, em 2012, 27,5% (IC95% 26 - 29) relatam que nenhuma vez, ou quase nunca, foram bem tratados pelos colegas na escola, sendo a frequência maior entre meninos, 31,7% (IC95% 29,4 - 34,1); 30,1% (IC95% 28,9 - 31,4) em alunos de escolas públicas, versus 14,8% (IC95% 13,6 - 16,1) em alunos de escola privada; raça/cor preta, 31,9% (IC95% 29,8 - 31,4) e cujas mães têm nenhuma escolaridade, 39,8% (IC95% 36,9 - 42,9) e outras mães com menor escolaridade. Sofrer bullying (sentir-se humilhado sempre ou quase sempre) pelos colegas de escola foi relatado por 7,2% (IC95% 6,6 - 7,8) dos escolares. Os percentuais foram maiores entre estudantes do sexo masculino, 7,9% (IC95% 7,0 - 9,1), versus do sexo feminino, 6,5% (IC95% 6,2 - 6,7); e entre alunos cujas mães não têm nenhuma escolaridade, 8,3% (IC95% 7,2 - 9,4). A prática de bullying foi relatada por 20,8% (IC95% 19,5 - 22,2) e foi mais frequente entre os estudantes do sexo masculino, 26,1% (IC95% 24,5 - 27,9), do que do sexo feminino, 16,0% (IC95% 15,1 - 16,9); e entre filhos de mães com maior escolaridade (Tabela 1).

O OR ajustado de não ser bem tratado pelos colegas na escola é maior em alunos mais velhos, com 15 anos (OR = 1,29) e 16 anos (OR = 1,41); do sexo masculino (OR = 1,5); da raça/cor preta (OR = 1,18) e oriundos de escola pública (OR = 2,08). Maior escolaridade materna mostrou-se um fator protetor (Tabela 2).

Tabela 2
Odds ratio, bruto e ajustado, de não ser bem tratado, sofrer e praticar bullying entre escolares do 9º ano do ensino fundamental, segundo idade, sexo, cor/raça and escolaridade materna. Brasil, 2012.

O OR ajustado mostra que a chance de sofrer bullying é maior em alunos de 13 anos. A idade é um fator de proteção contra sofrer bullying: 16 anos e mais (OR = 0,73); 15 anos (OR = 0,76); 14 anos (OR = 0,88). A chance de sofrer bullying aumenta em alunos do sexo masculino (OR = 1,26); raça/cor parda (OR = 1,15) e indígena (OR = 1,16). A escola não mostrou diferença significativa, e maior escolaridade materna mostrou-se fator protetor (Tabela 2).

A prática do bullying, após ajuste por idade, sexo, raça/cor, dependência administrativa da escola e escolaridade materna, ao contrário, mostrou maior chance em alunos mais velhos, 14 anos e mais (OR = 1,08) e 15 anos (OR = 1,18); do sexo masculino (OR = 1,87); de raça/cor preta (OR = 1,14) e amarela (OR = 1,15). Alunos da escola pública praticaram menos bullying (OR = 0,87), e maior escolaridade materna mostrou-se associado com maior prática de bullying: ensino superior incompleto (OR = 1,38), completo (OR = 1,30) e ensino médio incompleto (OR = 1,32). Ao analisar apenas o conjunto das capitais, o relato de sofrer bullying aumentou entre 2009 e 2012 nos alunos da 9º ano das capitais brasileiras: de 5,4% (IC95% 5,1 - 5,7) para 6,8% (IC95% 6,4 - 7,2). As seguintes capitais apresentaram aumento estatisticamente significativo no período: Vitória, São Paulo, Rio Branco, Salvador, Natal, Macapá, Palmas, Campo Grande, Cuiabá. (Tabela 3)

Tabela 3
Prevalência de sofrer bullying, com intervalo de confiança de 95%, entre escolares do 9º ano do ensino fundamental, segundo capitais de estados e Distrito Federal. Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar, 2009 e 2012.

Não ser bem tratado apresentou maior frequência na região Norte (30,7%; IC95% 28,5 - 33,0) e menor na Sul (25,9%; IC95% 23,5 - 28,4); sofrer bullying apresentou maior prevalência na região Sul, (8,2%, IC95% 8,0 - 8,4) e menor na região Norte (5,7%; IC95% 4,0 - 7,3); a prática bullying foi maior na região Sudeste e Sul, respectivamente: (23,6%; IC95% 20,9 - 26,4 e 23,2%; IC95% 21,7 - 24,8), e menor nas regiões Norte e Nordeste (16,5%; IC95% 16,0 - 17 e 16,1%; IC95% 13,5 - 18,6, respectivamente) (Figura 1).

Figura 1
Prevalência, com intervalo de confiança de 95%, de não ser bem tratado, sofrer e praticar bullying entre escolares do 9º ano do ensino fundamental, segundo a região. Brasil, 2012.

DISCUSSÃO

O estudo aponta que cerca de um quarto os estudantes referem não ter sido bem tratados pelos colegas, sendo esta frequência maior entre os meninos, mais velhos, de cor preta, de escolas públicas e cujas mães tinham menor escolaridade. Sofrer bullying predominou em meninos, mais jovens, pretos e indígenas e cujas mães possuíam baixa escolaridade, sendo mais frequente na região Sul e menos frequente na região Norte. A prática do bullying foi relatada por um quinto dos estudantes, predominando em meninos, mas velhos, da raça/cor preta e amarela, filhos de mães com maior escolaridade, de escolas privadas, sendo mais frequente nas regiões Sudeste e Sul e menos frequente no Norte e Nordeste. Ocorreu aumento de bullying nas capitais entre 2009 e 2012.

Os estudos sobre violência no âmbito escolar vêm ganhando grande interesse dos educadores, da sociedade e das famílias. A violência presente nas escolas refere-se a um fenômeno complexo e tem afetado a vida cotidiana, como uma ameaça diária à integridade física, psíquica e da dignidade humana77. Pingoelo I, Horiguela ML. Bullying na sala de aula. De Jure (Belo Horizonte) 2010; 15(2): 145-56.,1818. Fischer RM, Lorenzi GW, Pedreira LS, Bose M, Fante C, Berthoud C, et al. Relatório de pesquisa: bullying escolar no Brasil. Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor (Ceats) e Fundação Instituto de Administração (FIA) [Internet]. 2010. Disponível em: http://catracalivre.folha.uol.com.br/wp-ontent/uploads/2010/03/Pesquisa-Bullying.pdf (Acessado em 16 de maio de 2010).
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Ser agressor ou uma vítima de bullying não se constitui em um problema escolar que deva ser minimizado. Ao contrário, trata-se de um problema que pode resultar em graves consequências tanto para vítimas como para os agressores, como a depressão, por exemplo, para as vítimas, e a criminalidade ou o comportamento antissocial para os agressores, até mesmo na vida adulta1919. Ttofi MM, Farrington DP, Lösel F, Loeber R. Do the victims of school bullies tend to become depressed later in life? A systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. J Aggress Confl Peace Res 2011; 3(2): 63-73.. Estudos comprovam que crianças e adolescentes que se envolveram em situações de bullying na escola enquanto agressores apresentaram, na juventude ou vida adulta, envolvimento com a criminalidade, inclusive com crimes violentos1919. Ttofi MM, Farrington DP, Lösel F, Loeber R. Do the victims of school bullies tend to become depressed later in life? A systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. J Aggress Confl Peace Res 2011; 3(2): 63-73..

A prevalência do bullying varia conforme o país e as regiões. Estudo realizado nos Estados Unidos com 15.503 estudantes, em 158 escolas, revelou que 20,1% dos estudantes foram vítimas de bullying na escola nos 12 meses que antecederam à pesquisa, sendo mais frequente entre as meninas (22%) do que entre os meninos (18,2%)2020. EUA. Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Youth Risk Behavior Surveillance (YRBSS). Morbidity and Mortality Weekly Report. Atlanta: CDC; 2012.. A Organização Mundial de Saúde, em estudo entre adolescentes em países Europeus e outros países desenvolvidos, identificou o bullying em, em média, 14% dos adolescentes de 13 anos, embora existam grandes variações entre países1212. Organização Mundial da Saúde. Inequalities in Young People's Health. Health Behaviour in School-Aged Children. International Report from the 2005/2006 Survey. Copenhagen: WHO; 2008. (Health Policy for Children and Adolescents, no. 5)..

No Brasil, em 2010, estudo com amostra de 5.168 alunos de quinta a oitava séries de escolas públicas e privadas nas cinco regiões do país caracterizou bullying por agressões com frequência superior no ano e identificou 12,5% de vítimas1818. Fischer RM, Lorenzi GW, Pedreira LS, Bose M, Fante C, Berthoud C, et al. Relatório de pesquisa: bullying escolar no Brasil. Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor (Ceats) e Fundação Instituto de Administração (FIA) [Internet]. 2010. Disponível em: http://catracalivre.folha.uol.com.br/wp-ontent/uploads/2010/03/Pesquisa-Bullying.pdf (Acessado em 16 de maio de 2010).
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Verifica-se, tanto em estudos nacionais quanto internacionais, que o evento ainda predomina em meninos, seja como vítimas ou agressores, fato que corresponde aos achados na literatura1212. Organização Mundial da Saúde. Inequalities in Young People's Health. Health Behaviour in School-Aged Children. International Report from the 2005/2006 Survey. Copenhagen: WHO; 2008. (Health Policy for Children and Adolescents, no. 5).,1515. Fleming LC, Jacobsen KH. Bullying among middle-school students in low and middle income countries. Health Promot Int. 2010;25(1):73-84.,2121. Rech RR, Halpern R, Tedesco A, Santos DF. Prevalência e características de vítimas e agressores de bullying. J Pediatr 2013; 89(2): 164-70., bem como na PeNSE 200922. Malta DC, Souza ER, Silva MM, Silva CS, Andreazzi MA, Crespo C, et al. Vivência de violência entre escolares brasileiros: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE). Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15(2): 3053-63.. Recente pesquisa realizada no Brasil apontou que os meninos apresentaram mais do que o dobro de chance de serem agressores em relação às meninas em situações que envolvem o bullying na escola2121. Rech RR, Halpern R, Tedesco A, Santos DF. Prevalência e características de vítimas e agressores de bullying. J Pediatr 2013; 89(2): 164-70.. Nos Estados Unidos, estudo descreve maior prevalência entre meninas2222. Susan L, Wynne SL, Joo HJ. Predictors of School Victimization: Individual, Familial, and School Factors. Crime Delinq 2011; 57(3): 458-88..

Os resultados do presente estudo mostraram que alunos mais velhos, mesmo sendo da mesma série, 9º ano, sofrem menos bullying, o que também foi encontrado em outros estudos1818. Fischer RM, Lorenzi GW, Pedreira LS, Bose M, Fante C, Berthoud C, et al. Relatório de pesquisa: bullying escolar no Brasil. Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor (Ceats) e Fundação Instituto de Administração (FIA) [Internet]. 2010. Disponível em: http://catracalivre.folha.uol.com.br/wp-ontent/uploads/2010/03/Pesquisa-Bullying.pdf (Acessado em 16 de maio de 2010).
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,2323. Silva AP, Ferreira GA, Silva FP, Frazão IS, Cavalcanti AM. Perfil epidemiológico de adolescentes vítimas de bullying em escolas públicas e privadas. Rev Enferm UERJ 2012; 20(2): 808-13.. Alunos mais velhos reúnem outras características, podendo ser mais engajados socialmente e, por isto, mais protegidos da vitimização, o que ainda precisa ser aprofundado em outras investigações1818. Fischer RM, Lorenzi GW, Pedreira LS, Bose M, Fante C, Berthoud C, et al. Relatório de pesquisa: bullying escolar no Brasil. Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor (Ceats) e Fundação Instituto de Administração (FIA) [Internet]. 2010. Disponível em: http://catracalivre.folha.uol.com.br/wp-ontent/uploads/2010/03/Pesquisa-Bullying.pdf (Acessado em 16 de maio de 2010).
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. Os achados do atual estudo corroboram com os de outros autores, apontando maior prevalência de bullying entre meninos mais novos, na faixa de 11 a 14 anos, sendo menos frequente na educação infantil e ensino médio. Já com relação aos agressores, os dados não são claros e chegam a ser até mesmo divergentes2424. Lopes Neto AA. Bullying: comportamento agressivo entre estudantes. J. Pediatr 2005; 81(5): 164-72.. Na PeNSE, os agressores foram, em sua maioria, mais velhos.

Destaca-se que a PeNSE 200922. Malta DC, Souza ER, Silva MM, Silva CS, Andreazzi MA, Crespo C, et al. Vivência de violência entre escolares brasileiros: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE). Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15(2): 3053-63. não achou diferença significativa de escolaridade entre os pais dos meninos que sofreram bullying. No presente estudo, tanto para aqueles que referiram sofrer bullying quanto para os que não foram bem tratados pelos colegas, observaram-se mães com menor ou nenhuma escolaridade. Com relação aos alunos praticantes do bullying, evidenciou-se, ao contrário, serem filhos de mães com maior escolaridade, resultado encontrado em outros estudos2121. Rech RR, Halpern R, Tedesco A, Santos DF. Prevalência e características de vítimas e agressores de bullying. J Pediatr 2013; 89(2): 164-70.,2323. Silva AP, Ferreira GA, Silva FP, Frazão IS, Cavalcanti AM. Perfil epidemiológico de adolescentes vítimas de bullying em escolas públicas e privadas. Rev Enferm UERJ 2012; 20(2): 808-13.. Ou seja, a maior escolaridade materna mostrou-se fator protetor contra sofrer bullying, o que é confirmado por estudo que aponta que crianças oriundas de contextos familiares com capital cultural restrito, pouco incentivadas e acompanhadas pelos seus pais em suas tarefas acadêmicas e cujos pais não dialogam ou compartilham ideias com elas têm maior chance de bullying2525. Shetgiri R, Lin H, Avila RM, Flores G. Parental characteristics associated with bullying perpetration in us children aged 10 to 17 years. Am J Public Health 2012; 102(12): 2280-6. Reitera-se, portanto, que o papel dos pais e do grupo familiar também deve ser valorizado em investigações e intervenções sobre o desenvolvimento, a manutenção e a prevenção do bullying2626. Pepler D, Jiang D, Craig W, Connolly J. Developmental trajectories of bullying and associated factors. Child Dev 2008; 79(2): 325-38.,2727. Sentenac M, Gavin A, Arnaud C, Molcho M, Godeau E, Nic Gabhainn S. Victims of bullying among students with a disability or chronic illness and their peers: a cross-national study between Ireland and France. J Adolesc Health 2011; 48(5): 461-6..

Evidências científicas indicam que a redução da vulnerabilidade individual e social, incluindo o envolvimento com a violência escolar, decorre da implementação da estratégia de Escolas Promotoras de Saúde em um contexto educativo participativo. Abordagens interdisciplinares, intersetoriais e contínuas são mais efetivas. Uma abordagem global, em que existe coerência entre as políticas e as práticas da escola e que promove a inclusão social e o compromisso com a educação, facilita a obtenção de melhores resultados de aprendizagem, aumenta o bem-estar emocional e reduz os comportamentos de risco2828. Young I, Currie C. The HBSC study in Scotland: can the study influence policy and practice in schools? Int J Public Health 2009; 54(2): 271-7.

Esses dados corroboram com a afirmativa de recentes estudos, que têm apontado características étnico-raciais como um marcador de risco para determinadas condições de saúde2929. Kabad JF, Bastos JL, Santos RV. Raça, cor e etnia em estudos epidemiológicos sobre populações brasileiras: revisão sistemática na base PubMed. Physis 2012; 22(3): 895-918.. Nos Estados Unidos, estudo identificou que os alunos afro-americanos tiveram chance 46% maior de ter uma experiência de vitimização na escola em relação aos alunos brancos2020. EUA. Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Youth Risk Behavior Surveillance (YRBSS). Morbidity and Mortality Weekly Report. Atlanta: CDC; 2012.. Entre as causas que motivam o bullying, ainda são apontadas a intolerância contra negros, orientais e homossexuais nas escolas públicas e contra aqueles que fogem do padrão estético de altura/peso e de consumo nas escolas privadas11. Organização Mundial da Saúde. Health topics: adolescent health [Internet]. Disponível em: http://www.who.int/topics/adolescent_health/en/ (Acessado em 30 de janeiro de 2013).
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Neste sentido, é imprescindível refletirmos sobre o papel e a interferência dos diferentes contextos de socialização, a exemplo da família, da escola e da sociedade, na emergência de comportamentos agressivos. Modelos sociais dominantes em uma sociedade globalizada com base em uma economia neoliberal têm contribuído para o aumento das taxas de incidência de intimidação sistemática e vitimização escolar3030. Barboza GE, Schiamberg LB, Oehmke J, Korzeniewski SJ, Post LA, Heraux CG. Individual characteristics and the multiple contexts of adolescent bullying: an ecological perspective. J Youth Adolesc 2009; 38(1): 101-21..

No Brasil, a Pesquisa Nacional da Saúde do Escolar (PeNSE), realizada em 2009, possibilitou dimensionar a ocorrência do bullying entre adolescentes nas escolas das capitais brasileiras, revelando que o contexto escolar brasileiro também tem se constituído em um espaço de reprodução da violência22. Malta DC, Souza ER, Silva MM, Silva CS, Andreazzi MA, Crespo C, et al. Vivência de violência entre escolares brasileiros: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE). Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15(2): 3053-63.,44. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2009. Rio de Janeiro (RJ): IBGE; 2009.. A PeNSE 2009 apontou que 5,4% dos estudantes relataram ter sofrido bullying e houve um aumento da prevalência em 2012. O estudo apontou diferenças entre as prevalências das capitais entre 2009 e 2012. Em 2012, Rio Branco, São Paulo e Vitória destacaram-se entre as capitais com maior frequência de sofrer bullying. Estudos locais ainda devem ser conduzidos para compreender estas diferenças locais.

Este estudo apresenta algumas limitações, que se referem à impossibilidade de realizar inferências causais entre o desfecho em estudo e a inclusão apenas de adolescentes que estavam frequentando a escola e presentes em sala de aula no momento da aplicação do questionário, decisão que pode ter ocasionado algum viés nos resultados, pois o absenteísmo ou evasão escolar pode estar relacionado ao fator estudado. Entretanto, essa limitação não inviabiliza os resultados, pois o trabalho foi realizado com uma amostra expressiva. Outros estudos são necessários, especialmente análises qualitativas, que possam responder às representações, aos significados e aos sentidos atribuídos ao bullying pelos estudantes e demais atores, a exemplo dos pais e professores.

Apesar de expressarem iniciativas muitas vezes fragmentadas e descontínuas, já existem no Brasil experiências de políticas públicas e ações que buscam a redução da violência e do bullying na escola, que demandam um olhar investigativo para avaliar sua pertinência e eficácia. Essas experiências têm se dado especialmente por meio de estratégias multidisciplinares, da participação efetiva de diferentes atores sociais, do cuidado integral e da educação em saúde como instrumentos de transformação, empoderamento e autonomia dos sujeitos. Esses programas e instrumentos têm se movido a partir de diretrizes políticas federais, mas incluem, também, ações próprias, planejadas no âmbito de cada Estado e na dinâmica administrativa e política de cada município99. Fante C. Fenômeno Bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. Campinas (SP): Verus Editora; 2005.,3131. Gonçalves LA, Sposito MP. Iniciativas públicas de redução da violência escolar no Brasil. Cad Pesqui 2006; 115: 101-38.

32. Chrispino A, Dusi ML. Uma proposta de modelagem de política pública para a redução da violência escolar e promoção da Cultura da Paz. Ensaio Aval Pol Públ Educ 2008; 16(61): 597-624.
-3333. Santos FP, Vidal LM, Bittencourt IS, Boery RN, Sena EL. Estratégias de enfrentamento dos dilemas bioéticos gerados pela violência na escola. Physis 2011; 21(1): 267-81..

CONCLUSÃO

O estudo possibilitou identificar a ocorrência do bullying entre adolescentes nas escolas das capitais brasileiras, considerando o observado em outros estudos nacionais e internacionais. Portanto, o contexto escolar brasileiro também tem se constituído em um espaço de reprodução da violência.

Nesse sentido, compreendemos que o bullying ocorre dentro de um contexto social amplo e as motivações são diversas. Existem os componentes individuais, aqueles relacionados ao grupo em que os escolares estão inseridos e, obviamente, às famílias, e aos componentes sociais e culturais, que compõem o mosaico e as complexidades envolvidas no bullying e que, apesar de não o explicarem, dão pistas sobre como intervir na realidade de modo eficaz.

Para impedirmos a (re)produção do ciclo do bullying no contexto escolar, as iniciativas sociopolíticas na área devem buscar responder aos desafios em tirar esse problema da clandestinidade. Torna-se importante articular múltiplos atores sociais e diferentes setores da sociedade no sentido de implementar políticas públicas que visem a estimular valores e atitudes de paz e convivência saudável.

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  • Fonte de financiamento: nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2014

Histórico

  • Recebido
    12 Jan 2013
  • Revisado
    19 Fev 2014
  • Aceito
    21 Fev 2014
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