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Análise da tendência nas taxas de detecção de sífilis em gestantes e de incidência de sífilis congênita no Ceará no período de 2015 a 2021

RESUMO

Objetivo:

Analisar a tendência na taxa de detecção de sífilis em gestantes (SG) e na taxa de incidência de sífilis congênita (SC) no estado do Ceará.

Métodos:

Estudo ecológico que utilizou a técnica da série temporal interrompida para analisar os dados mensais de casos de SG e SC obtidos no Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) no período de janeiro de 2015 a julho de 2021. Utilizaram-se o teste de Kernel e a estimativa de Lincoln-Petersen para analisar a significância estatística.

Resultados:

Em 2015, estimou-se uma taxa de detecção mensal de SG de 5,4 e de incidência de SC de 8,2 por 1 mil nascidos vivos (NV). A implantação da portaria que alterou os critérios de definição de caso de SG e de SC implicou no aumento de 4,9 na taxa de detecção de SG (p<0,0001; IC95% 3,33; 6,61) e na queda de 0,1 na taxa de incidência de SC (p<0,001; IC95% -0,2; -0,1). A pandemia de COVID-19 não impactou na taxa de detecção mensal de SG (p=0,558; IC95% 5,92; 3,22), nem na sua tendência (p=0,7397; IC95% 0,28; 0,3), mas houve aumento de 0,19 na de SC (p<0,001; IC95% 0,1; -0,31).

Conclusões:

Entre os anos de 2015 e junho de 2021, a tendência na taxa de detecção de SG e na taxa de incidência da SC sofreu impacto das mudanças nos critérios de definição de caso desses agravos propostas pelo Ministério da Saúde e da pandemia de COVID-19.

Palavras-chave:
Gestação; Sífilis congênita; COVID-19; Epidemiologia

ABSTRACT

Objective:

To analyze the trend in the detection rate of Syphilis in Pregnant Women (SP) and in the incidence rate of Congenital Syphilis (CS) in the state of Ceará.

Methods:

This is an ecological study that used the technique of interrupted time series to analyze monthly data on cases of SP and CS obtained from the Department of Informatics of the Brazilian Unified Health System (DATASUS) from January 2015 to July 2021. The Kernel test and the Lincoln-Petersen estimate were used to analyze the statistical significance.

Results:

In 2015, a monthly detection rate of SP was estimated at 5.4 and a CS incidence rate of 8.2 per one thousand live births (LB). The implementation of the ordinance that changed the criteria for defining cases of SP and CS resulted in an increase of 4.9 (p<0.0001; 95%CI; 3.33; 6.61) in the detection rate of SP and a decrease of 0.1 on the incidence of CS (p<0.001; 95%CI -0.2; -0.1). The COVID-19 pandemic did not impact the monthly detection rate of SP (p=0.558; 95%CI 5.92; 3.22), nor its trend (p=0.7397; 95%CI 0.28; 0.3), but there was an increase of 0.19 in CS (p<0.001; 95%CI 0.1; -0.31).

Conclusion:

Between 2015 and June 2021, the trend in the detection rate of SP and in the incidence rate of CS was impacted by changes in the criteria for defining cases of these diseases proposed by the Brazilian Ministry of Health and the COVID-19 pandemic.

Keywords:
Pregnancy; Congenital syphilis; COVID-19; Epidemiology

INTRODUÇÃO

O controle da sífilis em gestantes (SG) e da sífilis congênita (SC) perpassa pela qualidade da assistência pré-natal, bem como do funcionamento e do monitoramento dos sistemas de informação em saúde, cuja notificação de casos e preenchimento adequado das informações possibilitam a identificação e o planejamento de estratégias de enfrentamento. Desde que esses agravos se tornaram de notificação obrigatória11. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Instrução Normativa no 2, de 22 de novembro de 2005. Regulamenta as atividades da vigilância epidemiológica com relação à coleta, fluxo e a periodicidade de envio de dados da notificação compulsória de doenças por meio do Sistema de Informação de Agravos de Notificação – SINAN [Internet]. Brasília: Diário Oficial da União, de 22 de novembro de 2005. [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: http://portalsinan.saude.gov.br/images/documentos/Legislacoes/IN_2_2005.pdf
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, o Ministério da Saúde (MS) vem adotando e modificando as definições de casos com o objetivo de manter o mesmo padrão das notificações em todo território nacional e alinhá-los aos critérios internacionais visando à comparação com outros países22. Brasil. Ministério da Saúde. Guia de vigilância epidemiológica [Internet]. 6a ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2005 [acessado em 15 ago. 2023] Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Guia_Vig_Epid_novo2.pdf
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.

No Brasil, a partir do ano de 2017, o MS realizou modificações importantes que podem ter impactado nas taxas de detecção de SG e de incidência de SC. Estas ocorreram em relação à notificação e ao tratamento da SG. Considerava-se adequadamente tratada aquelas que concluíam o tratamento até 30 dias antes do parto; atualmente, considera-se adequado quando iniciado até 30 dias antes do parto. Sugeriu-se também a notificação da SG no parto ou puerpério. Antes, caso a gestante não fosse notificada no pré-natal, deveria ser notificada no parto e puerpério como caso de sífilis adquirida. Em relação à definição de caso de SC, passou-se a não mais se considerar a necessidade do tratamento do parceiro sexual da gestante com sífilis33. Brasil. Ministério da Saúde Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais. Nota Informativa no 02-SEI/2017 – DIAHV/SVS/MS. Altera os critérios de definição de casos para notificação de sífilis adquirida, sífilis em gestantes e sífilis congênita [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://portalsinan.saude.gov.br/images/documentos/Agravos/Sifilis-Ges/Nota_Informativa_Sifilis.pdf
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. Essas alterações tornaram as definições de caso menos sensíveis, podendo diminuir o número de crianças diagnosticadas e possível subnotificação.

Nos anos de 2020 e 2021 aconteceu a pandemia de COVID-19, maior da história recente da humanidade, evento que pode ter impactado nas taxas de detecção e de incidência de SG e SC, respectivamente. A COVID-19 acometeu milhões de pessoas em todo o mundo e matou, só no Brasil, 814.497 mil brasileiros44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente. Doença pelo Coronavírus – COVID-19. Boletim Epidemiológico Especial 2022; 146 [Internet]. 2022 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/covid-19/2022/boletim-epidemiologico-no-146-boletim-coe-coronavirus/view
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. Essa pandemia trouxe consequências imensuráveis, entre elas os altos custos para o sistema de saúde com queda nos atendimentos em saúde, especialmente na atenção primária. O estado do Ceará ocupou o terceiro lugar em maior número de casos notificados no país55. Ceará. Secretaria da Saúde. Secretária Executiva de Vigilância e Regulação em Saúde. Doença pelo novo coronavírus (COVID-19) e vírus respiratórios [Internet]. Boletim Epidemiológico 2022; 4. 2022 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.saude.ce.gov.br/wp-content/uploads/sites/9/2020/02/BOLETIM_COVID_N04_11.02.2022.pdf
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.

O isolamento social consequente da pandemia de COVID-19 exigiu medidas urgentes de reorganização dos serviços de saúde, especialmente os de atenção primária, que praticamente suspenderam os atendimentos eletivos e passaram a priorizar pessoas com síndromes respiratórias. Por outro lado, as pessoas também deixaram de procurar esses serviços por medo da exposição ao vírus. Essas situações provocaram falhas no diagnóstico e tratamento na atenção primária, com a interrupção dos padrões usuais de atendimento à saúde de forma global66. Saraceni V, Cruz OG, Cavalcante JR, Vieira FMSB, Cardoso BB, Cruz DM, et al. Excess mortality from all causes during the COVID-19 pandemic in the city of Rio de Janeiro, Brazil. Rev Bras Epidemiol 2023; 26: e230013. https://doi.org/10.1590/1980-549720230013
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.

Diante do exposto, este estudo teve como objetivo analisar a tendência na taxa de detecção de SG e na taxa de incidência de SC no Ceará no período de 2015 a 2021.

MÉTODOS

Estudo ecológico que utilizou a técnica de análise de Série Temporal Interrompida (STI) para analisar a tendência temporal na taxa de detecção de SG e na taxa de incidência de SC no estado do Ceará no período de 2015 a 2021. O estado do Ceará tem 184 municípios e é geograficamente dividido em cinco macrorregiões de saúde, é a quarta maior unidade federativa da Região Nordeste, com área territorial de 148.894,477 km² e população estimada de 8.791.688 habitantes, representando 4,33% da população do Brasil em 202277. Ceará. Secretaria da Saúde. Criada a 5a macrorregião de saúde Litoral Leste/Jaguaribe [Internet]. 2014 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.saude.ce.gov.br/2014/05/16/criada-a-5o-macrorregiao-de-saude-litoral-leste-jaguaribe/.
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,88. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico: resultados preliminares [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2022. [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/22827-censo-demografico-2022.html?edicao=35938&t=resultados.
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.

As taxas de detecção de SG e de incidência de SC foram calculadas no período de janeiro de 2015 a julho de 2021, cujos dados foram obtidos no sítio do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). As referidas taxas foram calculadas pela razão entre o número de casos notificados a cada mês para cada 1 mil nascidos vivos (NV) do mesmo ano e mês, para o período do estudo.

Os estudos de STI são utilizados para avaliar intervenções de base populacional e analisam os efeitos de determinada intervenção, considerando uma tendência esperada na sua ausência (contrafactual) e a tendência encontrada após (intervenção). A comparação entre a tendência esperada sem intervenção e a tendência após a intervenção permite identificar eventuais mudanças, avaliando assim o seu impacto. Essa estratégia de análise, considerada como método quase-experimental, apresenta forte validade interna, principalmente por causa de seu controle sobre os efeitos da regressão à média. O modelo de regressão, para um grupo único, assume a fórmula de Huitema e Mckean99. Huitema BE, Mckean JW. Design specification issues in time-series intervention models. Educ Psychol Measur 2000; 60(1): 38-58. https://doi.org/10.1177/00131640021970358
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(Equação 1):

(1) Υ t  = β 0  + β 1 T t  + β 2 X t  + β 3 X t T t  + ε t

Em que:

Yt = variável de desfecho, medida agregada em cada ponto do tempo igualmente espaçado t;

Tt = tempo desde o início do estudo;

Xt = variável dummy (indicadora) representando a intervenção (períodos de pré-intervenção/evento=0, caso contrário=1);

XtTt = termo de interação entre o tempo do estudo e a intervenção;

εt: erro aleatório presente em toda fórmula estatística.

No caso de um estudo em grupo único, tem-se que:

β0 = representa o nível de interceptação ou início da variável desfecho;

β1 = inclinação ou trajetória da variável desfecho até a introdução da intervenção;

β2 = representa a mudança no nível do desfecho que ocorre no período imediatamente após a introdução da intervenção (em comparação com o contrafactual);

β3 = representa a diferença entre as inclinações de pré-intervenção e pós-intervenção do resultado.

Assim, a análise fica concentrada nos valores p significativos em β2, para indicar um efeito da intervenção imediata, ou em β3, para indicar um efeito da intervenção ao longo do tempo1010. Linden A, Adams JL. Applying a propensity score-based weighting model to interrupted time series data: improving causal inference in programme evaluation. J Eval Clin Pract 2011; 17(6): 1231-8. https://doi.org/10.1111/j.1365-2753.2010.01504.x
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. Neste estudo, consideraram-se como marco temporal os meses de novembro de 2017 e fevereiro de 2018, para analisar como intervenções a mudança nos critérios de definição de caso de SG e SC, respectivamente, e o mês de março de 2020, para análise do impacto da COVID-19.

Inicialmente, foram realizadas análises por comparação simples das médias das taxas dos períodos “antes e depois” utilizando o teste t de Student. Em seguida, procedeu-se o ajuste dos modelos das séries temporais para SC e SG com o uso do software Stata/MP 16.1. As taxas mensais foram ajustadas para levar em conta as diferenças na duração do mês e foram decompostas em componentes de tendência (o valor crescente ou decrescente) e sazonais (o padrão sazonal mensal) usando a metodologia LOESS de decomposição de tendência sazonal.

Quando havia evidência de sazonalidade residual, foram feitos ajustes no parâmetro da janela sazonal até que nenhum padrão de resíduos permanecesse. O procedimento de Newey-West foi utilizado para calcular o erro padrão dos coeficientes de regressão, que produz estimativas consistentes na presença de autocorrelação, para além de uma possível heterocedasticidade1111. Wang Q, Wu N. Long-run covariance and its applications in cointegration regression. Stata J 2012; 12(3): 515-42. https://doi.org/10.1177/1536867x1201200312
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. A autocorrelação serial e a heterocedasticidade foram aferidas pelo teste de Cumby-Huizinga1212. Cumby RE, Huizinga J. Testing the autocorrelation structure of disturbances in ordinary least squares and instrumental variables regression. Econometrica 1992; 60(1): 185-95. https://doi.org/10.2307/2951684
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. A tendência foi calculada a partir da estimativa de Lincoln-Petersen. Considerou-se estatisticamente significativo p<0,05. Os resultados foram apresentados em tabelas e gráficos com os valores de coeficiente, erros padrões, tendência, p-valor e intervalos de confiança (IC95%).

Por se tratar de dados secundários de domínio público, em conformidade com o Decreto no 7.724/2012 e com a Resolução no 510/2016, que regulamentam sobre o acesso a informações e sobre as normas aplicáveis à pesquisa em banco de dados de domínio público, respectivamente, não foi necessária a autorização do comitê de ética em pesquisa.

RESULTADOS

No período de janeiro de 2015 a julho de 2021 foram notificados, no estado do Ceará, 10.562 casos de SG e 7.670 de SC. A Figura 1 apresenta a taxa de detecção de SG e de incidência de SC. Entre os anos de 2015 e 2017, observa-se maior taxa de incidência de SC em relação à taxa de detecção de SG. A partir de 2017, com a recomendação pelo MS da notificação da SG no momento do parto e puerpério, percebe-se um aumento considerável na taxa de detecção de SG. Em relação à SC, as notificações não acompanharam esse aumento, possivelmente em razão da mudança no critério de definição de caso de SC, que retirou a necessidade de tratamento do parceiro sexual da gestante.

Figura 1.
Taxa de detecção de sífilis em gestantes e de incidência de sífilis congênita. Ceará, janeiro de 2015 a julho de 2021.

A taxa de detecção mensal estimada de SG no início da série temporal foi de 5,4 por 1 mil NV (IC95% 4,5; 5,9), com tendência significativa de crescimento de 0,14 até outubro de 2017 (p<0,0001; IC95% 0,12; 0,20). A taxa média bruta de detecção no período analisado foi de 7,9 por 1 mil NV. No mês de novembro de 2017, a taxa de detecção passou para 12,3 por 1 mil NV, implicando em um aumento significativo de 4,9 (p<0,0001; IC95% 3,33–6,61), tendendo a estabilizar a partir desse ponto.

A estimativa de Lincoln-Petersen produzida pela especificação da pós-tendência apresentou redução da tendência anterior de 0,01, mantendo-se estável, demonstrando que a portaria aumentou a taxa de detecção sem, contudo, alterar a sua tendência. No tocante à pandemia de COVID-19, não houveram alterações significativas na taxa de detecção mensal (p=0,558; IC95% 5,92; 3,22), nem em sua tendência no período avaliado (p=0,7397; IC95% 0,28; 0,3) (Tabela 1; Figura 2).

Tabela 1
Taxa de detecção de sífilis em gestantes. Ceará, janeiro de 2015 a julho de 2021.
Figura 2.
Análise de série temporal interrompida das taxas detecção de sífilis em gestantes. Ceará, janeiro de 2015 a julho de 2021.

Em relação à SC, estimou-se uma taxa de incidência inicial no ano de 2015 de 8,2 por 1 mil NV, com indicação de aumento significativo de 0,07 na tendência mensal até o ano de 2021 (p<0,001; IC95% 0,0; 0,1). Em fevereiro de 2018, após a publicação da nota informativa que alterou a definição de caso de SC, não houve modificação significativa na taxa de incidência mensal. Entretanto, a partir do mês de março de 2017 verificou-se queda de 0,1 notificação por 1 mil NV na tendência mensal (p<0,001; IC95% -0,2; -0,1) quando comparada ao período anterior à mudança no critério de definição de caso. A estimativa Lincoln-Petersen mostrou queda na tendência mensal de 0,06 na taxa de incidência de SC por 1 mil NV até o mês de abril de 2020 (p=0,0113; IC95% -0,01; -0,02) (Tabela 2; Figura 3).

Tabela 2
Taxa de incidência de sífilis congênita. Ceará, janeiro de 2015 a julho de 2021.
Figura 3.
Análise de série temporal interrompida das notificações de sífilis congênita. Ceará, janeiro de 2015 a julho de 2021.

A partir de abril de 2020, primeiro mês da pandemia de COVID-19, não foi observada alteração significativa na taxa de incidência de SC em relação ao período pós-mudança de critério de caso. Contudo, a estimativa de Lincoln-Petersen confirma uma tendência significativa de aumento dessas taxas mensais de 0,19 (p<0,001; IC95% 0,1; -0,31). A mudança de critério de caso provocou uma redução nas taxas mensais de incidência de SC de 0,06 por 1 mil NV (p<0,011; IC95 -0,01; -0,31), enquanto a pandemia de COVID-19 provocou um aumento de 0,19 por 1 mil NV, apresentando diferença significativa de 0,26 (p<0,001; IC95% 0,1; 0,39) casos mensais por 1 mil NV (Tabela 2; Figura 3).

DISCUSSÃO

O presente estudo mostra que ocorreu elevação importante da tendência da taxa de detecção da SG entre o mês de janeiro de 2015 e julho de 2021 decorrente da mudança no critério de definição de caso e redução na velocidade da elevação após o período de pandemia de COVID-19. Ocorreu queda na tendência da taxa de incidência de SC após a mudança na definição de caso e preocupante elevação posterior. Ou seja, mesmo com uma definição de caso menos sensível, ocorreu aumento na tendência da taxa de incidência de SC no período da pandemia.

Esses achados corroboram com dados do MS que mostram elevação constante nas taxas de detecção de SG e de incidência de SC, que passaram de 10,9 para 27,1 e de 6,6 a 9,9 por 1 mil NV nos anos de 2015 a 2021, respectivamente1313. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Sífilis [Internet]. Boletim Epidemiológico 2022; 6(1). 2022 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/especiais/2022/boletim-epidemiologico-de-sifilis-numero-especial-out-2022/view
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. Dados mundiais que analisaram a taxa de incidência de SC entre os anos de 2012 e 2016 mostraram redução em várias regiões do mundo, exceto na região das Américas1414. Korenromp EL, Rowley J, Alonso M, Mello MB, Wijesooriya NS, Mahiané SG, et al. Global burden of maternal and congenital syphilis and associated adverse birth outcomes — estimates for 2016 and progress since 2012. PLoS One 2019; 14(2): e0211720. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0211720
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. O Brasil pode estar contribuindo para essa elevada taxa, considerando que outros fatores podem colaborar para o aumento da SG e da SC, como é o caso da implementação do teste rápido na rotina do pré-natal e do crescimento da sífilis adquirida na população1313. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Sífilis [Internet]. Boletim Epidemiológico 2022; 6(1). 2022 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/especiais/2022/boletim-epidemiologico-de-sifilis-numero-especial-out-2022/view
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Na busca de estudos em bancos de dados eletrônicos sobre a temática da sífilis, observou-se escassez de informação sobre efeitos resultantes de mudanças nos critérios de definição de casos nas notificações de SG e SC, bem como do impacto da pandemia da COVID-19 sobre esses eventos. Ressalta-se que, por se tratar de um tema muito atual e ainda em curso, não existem estudos robustos que permitam comparações e contrapontos, acarretando dificuldade para comparação nesse tipo de análise.

Este estudo teve como limitação o fato de ter analisado dados secundários, ficando sujeito a questões relacionadas à incompletude dos dados e subnotificações. Ressalta-se que para minimizar esses efeitos e melhorar a qualidade do dado, foi realizado linkage entre diferentes bancos de dados. Ademais, não foi realizada uma análise de tendência das taxas de SG e SC após a implantação do teste rápido para sífilis na gestação considerando a indisponibilidade de registros, uma vez que esse indicador não se encontrava atrelado ao recebimento de recurso por parte dos municípios1515. Brasil. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria no 2.97 de 12 de novembro de 2019. Institui o Programa Previne Brasil, que estabelece novo modelo de financiamento de custeio da Atenção Primária à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, por meio da alteração da Portaria de Consolidação no 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017 [Internet]. Brasília: Diário Oficial da União, 13 de novembro de 2019 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2019/prt2979_13_11_2019.html.
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.

Identificou-se que no ano de 2018 houve aumento na taxa de detecção de SG e queda na taxa de incidência de SC, o que pode ter ocorrido em função da mudança na definição de caso de SC, que excluiu a necessidade de tratamento do parceiro como critério de notificação, e da recomendação de não notificar a gestante na ocasião do parto como caso de sífilis adquirida, e sim como SG, situação que vinha ocorrendo até o ano de 201733. Brasil. Ministério da Saúde Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais. Nota Informativa no 02-SEI/2017 – DIAHV/SVS/MS. Altera os critérios de definição de casos para notificação de sífilis adquirida, sífilis em gestantes e sífilis congênita [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://portalsinan.saude.gov.br/images/documentos/Agravos/Sifilis-Ges/Nota_Informativa_Sifilis.pdf
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. Dados nacionais mostram que entre os anos de 2016 e 2017 houve um aumento de 15% na taxa de incidência de SC (período anterior à mudança na definição de caso), ao passo que nos anos 2017 e 2018 (período posterior à mudança) esse incremento foi somente de 6%1616. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Sífilis [Internet]. Boletim Epidemiológico 2019; 5(1). 2019 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.gov.br/aids/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/2019/boletim-epidemiologico-sifilis-2019/view
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.

A recomendação de notificar as gestantes com sífilis no momento do parto/curetagem ou puerpério pode ter sido o motivo de não ter havido impacto na redução da taxa de incidência da SC, além de demonstrar perdas de oportunidade de tratamento da gestante com sífilis e de prevenção da transmissão da infecção para o bebê. Entretanto, foi uma recomendação importante considerando que deu maior visibilidade do problema da SG. A notificação do caso somente na ocasião do parto ou puerpério tinha como consequência muita subnotificação de casos. Aumento na taxa de detecção da SG revela a necessidade de melhoria da qualidade da assistência pré-natal e de adequação das políticas públicas de prevenção e combate à SC1717. Domingues CSB, Duarte G, Passos MRL, Sztajnbok DCN, Menezes MLB. Protocolo Brasileiro para Infecções Sexualmente Transmissíveis 2020: sífilis congênita e criança exposta à sífilis. Epidemiol Serv Saúde 2021; 30(spe1): e2020597. https://doi.org/10.1590/S1679-4974202100005.esp1
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.

Quando a notificação da gestante era realizada somente no pré-natal, em algumas capitais brasileiras, as taxas de detecção de SG eram inferiores às taxas de incidências de SC. Com a nova recomendação, as taxas de detecção de SG apresentaram aumento significativo em relação à incidência de SC1313. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Sífilis [Internet]. Boletim Epidemiológico 2022; 6(1). 2022 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/especiais/2022/boletim-epidemiologico-de-sifilis-numero-especial-out-2022/view
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, situação observada neste estudo. Vale salientar que a instituição da testagem rápida para sífilis na primeira consulta de pré-natal também pode ter contribuído para o aumento da taxa de detecção de SG.

No ano de 2018, a relação entre a taxa nacional de detecção de SG e da incidência de SC foi de 2,4 gestantes com sífilis para uma criança com SC. O Distrito Federal e outros 14 estados — oito da Região Nordeste (incluindo o estado do Ceará), um da Região Sul, dois do Sudeste, um do Norte e dois do Centro-Oeste — apresentaram relação inferior ao patamar nacional1616. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Sífilis [Internet]. Boletim Epidemiológico 2019; 5(1). 2019 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.gov.br/aids/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/2019/boletim-epidemiologico-sifilis-2019/view
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. No estado do Ceará, enquanto nos anos de 2016 e 2017 houve aumento da taxa de incidência de SC de 12%, observou-se no biênio seguinte redução de 10,2 para 9,6 por 1 mil NV1616. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Sífilis [Internet]. Boletim Epidemiológico 2019; 5(1). 2019 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.gov.br/aids/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/2019/boletim-epidemiologico-sifilis-2019/view
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. Ademais, observa-se que a taxa de incidência de SC se mostra distante da meta pactuada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que deve ser de menos de 0,5 caso por 1 mil NV1818. Organização Pan-Americana da Saúde. Organização Mundial da Saúde publica novas estimativas sobre sífilis congênita [Internet]. Washington: OPAS, 2019 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.paho.org/pt/noticias/28-2-2019-organizacao-mundial-da-saude-publica-novas-estimativas-sobre-sifilis-congenita#:~:text=De%20coautoria%20da%20OMS%20e,significativa%20de%20mortes%20e%20doen%C3%A7a
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,1919. World Health Organization. Global guidance on criteria and processes for validation: elimination of mother-to-child transmission of HIV, syphilis and hepatitis B virus. Genebra: World Health Organization, 2021.

É importante salientar que de acordo com o relatório da OPAS, no ano de 2017, dos 15 países que apresentaram dados que indicaram a eliminação da SC, sete receberam a certificação de eliminação pela OMS. Contudo, esse órgão destaca que os casos de SC estavam em ascensão em 37 outros países, com 22% a mais de casos nesse ano em relação aos registrados em 20161818. Organização Pan-Americana da Saúde. Organização Mundial da Saúde publica novas estimativas sobre sífilis congênita [Internet]. Washington: OPAS, 2019 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.paho.org/pt/noticias/28-2-2019-organizacao-mundial-da-saude-publica-novas-estimativas-sobre-sifilis-congenita#:~:text=De%20coautoria%20da%20OMS%20e,significativa%20de%20mortes%20e%20doen%C3%A7a
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. No Brasil foram certificadas 43 cidades que atingiram a meta estabelecida pela OMS para a eliminação de transmissão do HIV e da sífilis mãe para filho2020. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Certificação da eliminação da transmissão vertical do HIV e/ou sífilis [Internet]. 2022 [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2022/dezembro/meta-atingida-43-municipios-recebem-selo-de-boas-praticas-e-certificacao-por-eliminacao-da-transmissao-vertical-do-hiv-e-sifilis/lista_de_municipios_final_-1.pdf.
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No tocante à pandemia da COVID-19, há indícios de que, no mundo todo, os efeitos combinados da pressão no sistema de saúde e do bloqueio social, como medida atotada para reduzir a transmissão da doença, são apontados como causa de atraso global em diagnósticos das infecções sexualmente transmissíveis (IST), incluindo a SG, pela diminuição da testagem da população, resultante da interrupção dos padrões usuais de atendimento à saúde na atenção primária, que se tornaram sobrecarregados com os atendimentos de pacientes com sintomas respiratórios a partir de março de 2020, como evidenciado em pesquisas no Reino Unido, na Espanha, nos Estados Unidos e no Brasil2121. Carr S. Missed and delayed diagnoses of non-COVID conditions − collateral harm from a pandemic [Internet]. Improve Dx Newsletter 2020; 7(4): 1-7. [acessado em 15 ago. 2023]. Disponível em: https://www.improvediagnosis.org/wp-content/uploads/2020/07/Vol.-7-Issue-4.pdf
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22. Williams R, Jenkins DA, Ashcroft DM, Brown B, Campbell S, Carr MJ, et al. Diagnosis of physical and mental health conditions in primary care during the COVID-19 pandemic: a retrospective cohort study. Lancet Public Health 2020; 5(10): E543-E550. https://doi.org/10.1016/S2468-2667(20)30201-2
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-2323. Lima NT, Buss PM, Paes-Sousa R. A pandemia da COVID-19: uma crise sanitária e humanitária. Cad Saúde Pública 2020; 36(7): e00177020. https://doi.org/10.1590/0102-311X00177020
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Em estudo de análise de série temporal das notificações de IST entre 1o de agosto de 2017 e 1o de agosto de 2020 na Espanha, foi evidenciada redução de quase 50% das notificações naquela região. A sífilis apresentou 22% a menos de notificações seguida da clamídia, com redução de 28%2424. Sentís A, Prats-Uribe A, López-Corbeto E, Montoro-Fernandez M, Nomah DK, Olalla PG, et al. The impact of the COVID-19 pandemic on Sexually Transmitted Infections surveillance data: incidence dropo rastefact? BMC Public Health 2021; 21(1): 1637. https://doi.org/10.1 1.186/s12889-021-11630-x
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. Estudo que analisou as taxas de notificação de SG no Brasil no período anterior e durante a pandemia evidenciou redução de 51,4% de casos nos anos 2020 e 2021, com diferenças importantes por unidades da federação, sendo as regiões Norte e Nordeste as que apresentaram maiores reduções2525. Carvalho MCJ, Duarte TC, Carvalho GCJ, Miranda Neto G, Silva YV, Silva LMS, et al. Changes in incidence and clinical classifications of syphilis in pregnant women due to the COVID- 19 pandemic. Res Soc Dev 2022; 11(4):e e35411427433. https://doi.org/10.33448/rsd- v11i4.27433
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Esse declínio acentuado observado nas notificações no período da pandemia de COVID-19 dificilmente poderia ser explicado sem considerar a possibilidade de subnotificação significativa, a efetiva queda na taxa de detecção da sífilis adquirida, possivelmente decorrentes do isolamento social, as barreiras temporárias que dificultaram o acesso à atenção do pré-natal, a redução de consultas e exames de rotina, a priorização das emergências e a agudização de iniquidades sociais durante a pandemia2323. Lima NT, Buss PM, Paes-Sousa R. A pandemia da COVID-19: uma crise sanitária e humanitária. Cad Saúde Pública 2020; 36(7): e00177020. https://doi.org/10.1590/0102-311X00177020
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No entanto, como demonstrado nesta pesquisa, o Ceará apresentou taxa de detecção da SG ascendente, sinalizando o comprometimento e o cuidado dos profissionais na notificação dos casos mesmo frente a situações adversas, como sobrecarga de trabalho e consequente esgotamento físico e emocional, identificados entre trabalhadores da saúde durante a pandemia de COVID-192222. Williams R, Jenkins DA, Ashcroft DM, Brown B, Campbell S, Carr MJ, et al. Diagnosis of physical and mental health conditions in primary care during the COVID-19 pandemic: a retrospective cohort study. Lancet Public Health 2020; 5(10): E543-E550. https://doi.org/10.1016/S2468-2667(20)30201-2
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,2626. Teixeira CFS, Soares CM, Souza EA, Lisboa ES, Pinto ICM, Andrade LR, et al. A saúde dos profissionais de saúde no enfrentamento da pandemia de Covid-19. Ciênc Saúde Coletiva 2020; 25(9): 3465-74. https://doi.org/10.1590/1413-81232020259.19562020
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. É importante considerar que a partir de 2014 vem havendo um incremento na implementação do teste rápido para sífilis na primeira consulta de pré-natal, que também pode ter contribuído nessa taxa.

A magnitude da ocorrência da transmissão vertical da sífilis revela que essa epidemia está longe de ser controlada, tornando-se mais grave quando se sobrepõe a outra epidemia com alta taxa de morbimortalidade, por exemplo, a COVID-19, responsável pelo recente colapso do sistema de saúde, fato que impõe um grande desafio para os gestores e profissionais de saúde quanto à efetividade das ações para o controle e a eliminação da SC e suas consequências.

Com este estudo é possível concluir que, entre os anos de 2015 e junho de 2021, a tendência na taxa de detecção de SG e na taxa de incidência da SC sofreu impacto das mudanças nos critérios de definição de caso desses agravos, propostas pelo MS, e da pandemia de COVID-19.

REFERÊNCIAS

  • FONTE DE FINANCIAMENTO: nenhuma

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2023
  • Revisado
    01 Set 2023
  • Aceito
    06 Set 2023
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